AbdonMarinho - ASSEMBLEIA BOLIVARIANA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

ASSEM­BLEIA BOLIVARIANA.

ASSEM­BLEIA BOLIVARIANA.

Por Abdon Mar­inho.

NÃO SE ENGANEM pelo título. Esse texto não tratará das des­graças que cas­tigam nos­sos irmãos venezue­lanos – antes fosse –, falare­mos de um assunto bem mais próx­imo de nós que a maio­ria dos leitores e, com certeza, os cidadãos não sabem. E não sabem porque o assunto vem sendo tratado com inco­mum discrição.

Há pouco mais de uma sem­ana – no máx­imo duas –, li uma matéria dando conta que a Assem­bleia Leg­isla­tiva do Maran­hão, iria realizar eleições para sua mesa dire­tora. Ini­cial­mente, pen­sei tratar-​se de um engano, pois em fevereiro ocor­rera a eleição.

Reli a matéria e, aí, com­preendi que já estavam falando da eleição da mesa para o segundo biênio desta leg­is­latura (2021÷2022).

Impressionou-​me a veloci­dade com que suas excelên­cias trataram da questão. Mal os novos dep­uta­dos assumi­ram, sequer tiveram tempo de dizer a que vieram e já vão eleger a mesa que con­duzirá os tra­bal­hos leg­isla­tivos a par­tir de 2021.

Segundo soube, a matéria já trami­tou e a eleição poderá ocor­rer a qual­quer momento.

Nada tenho con­tra a atual mesa (ou mesmo os demais par­la­mentares) – até por que não os con­heço –, mas me pre­ocupa, sobre­maneira, que este tipo de casuísmo ocorra.

Primeiro, pelo que me con­sta, mudaram a regra, per­mitindo a que a dita eleição ocor­resse no ano ante­rior; agora, que já ocorra no primeiro ano da leg­is­latura; a próx­ima será que per­mi­tir que real­izem a eleição para os dois biênios de forma simultânea?

Ora, pelo que se anun­cia como ver­dade, a eleição ocor­rerá com pouco mais de sessenta dias do iní­cio da leg­is­latura, o que impede, o que na próx­ima mar­quem para ocor­rer de uma só vez, e se faça letra morta o entendi­mento constitucional?

Na história do Brasil, todas as con­sti­tu­ições, desde a do Império, até a de 1967 – e depois a Emenda Con­sti­tu­cional n. 01, de 1969 –, deixaram tal assunto para os reg­i­men­tos inter­nos das Casas Leg­isla­ti­vas.

Quase todas seguiram à linha da Con­sti­tu­ição de 1934 que esta­b­ele­cia: “Art 26 — Somente à Câmara dos Dep­uta­dos incumbe eleger a sua Mesa, reg­u­lar a sua própria polí­cia, orga­ni­zar a sua Sec­re­taria com observân­cia do art. 39, nº 6, e o seu Reg­i­mento Interno, no qual se asse­gu­rará, quanto pos­sível, em todas as Comis­sões, a rep­re­sen­tação pro­por­cional das cor­rentes de opinião nela definidas”.

Ape­sar de não con­star na Con­sti­tu­ição, desde a insta­lação do Par­la­mento Brasileiro, em 1826, a regra tem sido que as Mesas Dire­toras não se “per­petuem no comando”. Desde a cri­ação do par­la­mento, poucos foram os pres­i­dentes que ficaram na presidên­cia da Câmara Fed­eral mais que um biênio. Mesmo durante a longa noite da ditadura.

Nos raros casos que isso se deu – salvo uma ou outra exceção –, não ocor­reu den­tro da mesma leg­is­latura, podemos citar como exem­p­los recentes, o caso de Ulysses Guimarães (85 e 87; 87 e 89) e do atual pres­i­dente Rodrigo Maia (que assumiu para um mandato “tam­pão” em 2016, depois se elegeu para o biênio seguinte e agora, foi eleito para o biênio 20192020).

Em todos os casos, a regra tem sido até admitir-​se a eleição seguida da mesa em caso de mudança de leg­is­latura quan­tos os mandatos foram ren­o­va­dos pelo voto.

Ainda assim, entendo que não dev­e­riam per­mi­tir casuís­mos como o que se deu com o atual pres­i­dente Rodrigo Maia.

A regra esta­b­ele­cida com a pro­mul­gação da Con­sti­tu­ição de 1988, é bas­tante clara e ela esta­b­elece: “Art. 57. O Con­gresso Nacional reunir-​se-​á, anual­mente, na Cap­i­tal Fed­eral, de 2 de fevereiro a 17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezem­bro. (Redação dada pela Emenda Con­sti­tu­cional nº 50, de 2006).

§ 4º Cada uma das Casas reunir-​se-​á em sessões preparatórias, a par­tir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da leg­is­latura, para a posse de seus mem­bros e eleição das respec­ti­vas Mesas, para mandato de 2 (dois) anos, vedada a recon­dução para o mesmo cargo na eleição ime­di­ata­mente sub­se­qüente. (Redação dada pela Emenda Con­sti­tu­cional nº 50, de 2006)”.

Com tal orde­na­mento o leg­is­lador con­sti­tu­inte pre­tendeu que a rep­re­sen­tação da Casa do Povo fosse sem­pre ren­o­vada, per­mitindo a ampla par­tic­i­pação de todas as cor­rentes e/​ou mino­rias, e ainda, que a cor­re­lação de forças pudessem ser alter­adas na vigên­cia das leg­is­lat­uras.

Não fosse assim, pode­ria esta­b­ele­cer que os mandatos das mesas dire­toras das casas leg­isla­ti­vas fos­sem de qua­tro anos.

A regra inserta no pará­grafo quarto é jus­ta­mente o con­trário disso: vedando a recon­dução para o mesmo cargo na eleição ime­di­ata­mente sub­se­quente, como vimos acima.

No Maran­hão, onde tudo pode acon­te­cer, e segundo Vieira, até os céus mentem, trataram de “des­cumprir” a regra inserta na Con­sti­tu­ição Fed­eral, per­mitindo através das suces­si­vas Emen­das Con­sti­tu­cionais de nº. 20, 40 e 60, de 21 de dezem­bro de 2010, no apa­gar das luzes, que pudesse haver a pos­si­bil­i­dade de reeleição infini­ta­mente.

Vejamos: “Art. 29 – A Assem­bleia Leg­isla­tiva reunir-​se-​á, anual­mente na Cap­i­tal do Estado, de 02 de fevereiro a 17 de julho e de 1o de agosto a 22 de dezem­bro. (mod­i­fi­cado pelas Emen­das à Con­sti­tu­ição no 14 e no 49, de 30/​05/​2006).

§ 3o — A par­tir de 1o de fevereiro, no primeiro ano da Leg­is­latura, a Assem­bleia Leg­isla­tiva reunir-​se-​á em Sessões Preparatórias, para a posse de seus mem­bros e eleição da Mesa Dire­tora para o mandato de dois anos, per­mi­tida a reeleição. (mod­i­fi­cado pelas Emen­das à Con­sti­tu­ição nº. 20, nº. 40 e nº. 60, de 21/​12/​2010)”.

Em resumo, o que os par­la­mentares maran­henses fiz­eram – e con­tin­uam fazendo –, foi per­mi­tir o surg­i­mento de uma estru­tura de poder arcaica, anti­democrática e que nos remete ao que existe de mais atrasado no mundo, sobre­tudo, agora com a pos­si­bil­i­dade de eleições, como se dizia lá no sertão, “encan­gadas”, sem per­mi­tir que o tempo mod­i­fiquem as cor­re­lações de forças e humores e, ainda, com o risco de se tornarem úni­cas.

Com uma res­olução leg­isla­tiva “enges­saram” o par­la­mento e des­cumpri­ram o que dese­jou o leg­is­lador con­sti­tu­inte orig­inário.

Ora, enquanto o atual pres­i­dente con­seguir o voto para se eleger – o que não será difí­cil com os suces­sivos acú­mu­los de força política decor­rente do cargo –, será sem­pre o pres­i­dente do par­la­mento estad­ual.

Como disse, nada tenho con­tra o cidadão, até porque não o con­heço, o prob­lema é que isso atenta con­tra as mais comez­in­has nor­mas democráti­cas e a exper­iên­cia é sen­hora que isso sem­pre trouxe prob­le­mas, den­tre os quais o “enfraque­c­i­mento” dos demais deputados.

Quando se fala em lim­i­tação de mandatos par­la­mentares como forma de se reduzir dis­torções e o pat­ri­mo­ni­al­ismo, a ideia de alguém poder se eleger infini­ta­mente ao comando de um par­la­mento é algo ver­dadeira­mente absurdo.

A per­pet­u­ação no poder, repito, é incom­patível com os ideais democráti­cos que tanto son­hamos e ansi­amos.

É algo que com­bina com os regimes autoritários, com as ditaduras comu­nistas, boli­var­i­anas – ou não –, que tan­tos males causaram a humanidade.

É algo que se assemelha ao mod­elo da antiga União Soviética em que o Secretário-​geral do Par­tido Comu­nista ficava no poder man­dando em todo país até a morte.

Mas o Brasil e o Maran­hão não é e não tem “inveja” de tais mod­e­los. Não podemos dese­jar a implan­tação de um mod­elo anti­democrático por aqui.

O que me causa espanto diante desse cenário, não é a con­spir­ação dos políti­cos con­tra a democ­ra­cia é o silên­cio das demais insti­tu­ições do estado e dos demais cidadãos.

Até agora o Min­istério Público Estad­ual, que “ se mete” até em jogo de cas­tanha no inte­rior, diante do que vem se con­sol­i­dando, não temos notí­cia de ter dito nada, cobrado um esclarec­i­mento ou ten­tado bar­rar as ini­cia­ti­vas anti­democráti­cas pela via judi­cial, que aliás, começaram lá atrás. Falta uma Con­sti­tu­ição ao fis­cal da lei?

Nunca ouvi dizer que con­trariar a Con­sti­tu­ição é regra “interna corporis”.

Mas o silên­cio, parece não ser priv­ilé­gio do MPE, a Ordem dos Advo­ga­dos do Brasil — OAB, que, nos ter­mos da Con­sti­tu­ição tem um papel rel­e­vante – não é sem razão o “Art. 133. O advo­gado é indis­pen­sável à admin­is­tração da justiça, sendo invi­o­lável por seus atos e man­i­fes­tações no exer­cí­cio da profis­são, nos lim­ites da lei” –, tam­bém não tem nada a dizer, deve achar tudo “bonito” ou que não tem nada com isso.

Aliás, quem parece não ter “nada com isso” é a imprensa, não falo da oposição porque esta ou deixou de exi­s­tir ou sim­ples­mente não sabe qual é o seu papel. Já a imprensa não, ela pos­sui garan­tias con­sti­tu­cionais para exercer um papel crítico e ser a voz da sociedade. Ape­sar disso devota um silên­cio cúm­plice a estas for­mas de desmandos.

O que Assem­bleia vem fazendo já trazem reflexos para os par­la­men­tos munic­i­pais, com todo tipo de manobras sendo feitas para manip­u­lar as eleições nos coman­dos das Câmaras Munic­i­pais, sendo que muitas delas só estão se resol­vendo con­forme os “humores” do Poder Judi­ciário.

Essa bal­búr­dia começou lá atrás, com as suces­si­vas alter­ações na Con­sti­tu­ição Estad­ual, para aten­der o “inter­esse da hora”, con­forme já expli­camos.

A sociedade pre­cisa ficar atenta ao que vem ocor­rendo para não acabar endos­sando as práti­cas espúrias que sem­pre combateu.

Abdon Mar­inho é advo­gado.