AbdonMarinho - SOBRE GOVERNOS E GALINHAS.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

SOBRE GOV­ER­NOS E GALINHAS.

SOBRE GOV­ER­NOS E GAL­IN­HAS.

Por Abdon Marinho.

UMA amiga a quem não via há algum tempo visitou-​me recen­te­mente. Lá pelas tan­tas, após ter­mos tratado do obje­tivo da visita, indagou-​me:

— Abdon, o que você acha dos atu­ais gov­er­nos? Referia-​se aos gov­er­nos das três esferas.

Respondi-​lhe:

— Olha, com as hon­radas exceções, que jus­ti­fi­cam as regra, os gov­er­nos da atu­al­i­dade parece-​me geri­dos por gal­in­has.

Olhou-​me intri­gada e perguntou-​me:

— Como assim?

Expliquei-​lhe sobre uma das mais anti­gas ale­go­rias. Aquela que explica a razão dos ovos de gal­in­has venderem mais que ovos de patas.

— Como sabes ovos de patas pos­suem as mes­mas pro­priedades dos ovos de gal­in­has e é bem maior. Ape­sar disso tem pouca saída se com­para­r­mos à venda da outra ave. A razão é que a pata não divulga seu pro­duto, já a gal­inha coloca um “ovinho” e sai fazendo escân­dalo, anun­ciando aos qua­tro ven­tos.

A quadra atual é a da gestão das gal­in­has. Os gestores, de cima a baixo do estado e do país, fazem quase nada, mas ten­tam, com uma mídia regia­mente paga, con­vencer os eleitores, os cidadãos pagadores de impos­tos que fiz­eram muito ou que estão fazendo muito.

A dis­torção começa pelo gov­erno fed­eral. Quanto os mais vari­a­dos órgãos não gas­tam, anual­mente, com pro­pa­ganda para ten­tar con­vencer os cidadãos que se estão fazendo muita coisa?

A mesma coisa é vista nos gov­er­nos estad­u­ais. Se olhar­mos com cuidado ver­e­mos que o inves­ti­mento na “pro­pa­ganda” é bem supe­rior aos inves­ti­men­tos noutras áreas com alcance social mais rel­e­vante para a pop­u­lação.

As prefeituras não ficam atrás. Gas­tam impor­tante parcela de recur­sos públi­cos com “pro­pa­ganda”, com mídia, com remu­ner­ações de jor­nal­is­tas ou blogueiros e a quem se dis­puser a vender seu peixe.

A pro­pa­ganda, da forma como é ven­dida, parece mais impor­tante que a suposta obra ou serviço disponi­bi­liza­dos aos cidadãos.

Não reclamo que divulguem o que fazem. Aliás, um dos princí­pios da admin­is­tração pública é jus­ta­mente pub­li­ci­dade dos atos e ativi­dades públi­cas. Tal princí­pio ganha maior relevo a par­tir da pro­mul­gação das leis e decre­tos rel­a­tivos à transparên­cia.

Os reclamos que faço é por tentarem incu­tir com pro­pa­ganda exager­ada que aquele pouco é uma grande coisa, que aquela insignificân­cia é algo extra­ordinário, quando não é.

Outro dia, já per­plexo com esse tipo de coisa, escrevi sobre tais fatos. Cri­tiquei que o gov­erno estad­ual tenha deslo­cado uma comi­tiva para a inau­gu­ração de um poço arte­siano e o ofer­ec­i­mento de out­ros serviços essen­ci­ais em um longín­quo povoado. Foi o que bas­tou, ime­di­ata­mente uma tropa de choque de adu­ladores se for­mou para elo­giar o feito.

Pre­sos num sec­tarismo tosco não enten­deram que a crítica não se des­ti­nava a obra. Qual­quer um sabe o enorme sig­nifi­cado de um poço arte­siano, ainda que com um sim­ples cha­fariz para uma comu­nidade que não pos­sui água potável ou ainda é abaste­cida por cacim­bas.

A crit­ica, na linha do que venho dizendo, destinava-​se ao exagero na pub­li­ciza­ção de uma coisa que dev­e­ria ser encar­ada como uma rotina nor­mal de tra­balho e que as pes­soas dev­e­riam “corar” por faz­erem tanto “car­naval” por ofer­e­cerem um poço a uma comu­nidade nos rincões do Maran­hão.

A inau­gu­ração de um poço dev­e­ria ser algo que com­por­taria ao pres­i­dente de uma asso­ci­ação ou sindi­cato fazer, mesmo para um vereador ou prefeito, ao nosso sen­tir, é algo exager­ado, fazer tal coisa vendendo-​a como um grande feito de um gov­erno estad­ual é algo a refle­tir a “grandiosi­dade” dos gov­er­nos destes tempos.

Como somos car­entes de uma imprensa livre e crítica acabam por “vender” como grandes feitos coisas ínfi­mas.

Na ver­dade muitos dos que se inti­t­u­lam “jor­nal­is­tas” se prestam a fomentarem este tipo de equívoco, investindo-​se, na ver­dade, em asses­sores de imprensa das gestões, pro­pa­gando o cocoricó das gestões galináceas.

Querem ver outro exem­plo da nossa real­i­dade? O gov­erno estad­ual “vende” como a “redenção” da edu­cação maran­hense o pro­jeto “Escola Digna”.

Com efeito, a con­cepção do pro­jeto é muito boa. Sub­sti­tuir esco­las de chão batido, latadas ou casas de far­inha por escola com um mín­imo de con­forto é algo muito bom. Entre­tanto, como já expliquei noutras opor­tu­nidades, trata-​se de uma medida que está longe de sig­nificar avanços para edu­cação, pelo con­trário, os recur­sos que estão sendo gas­tos com con­strução de cen­te­nas de escol­in­has, rep­re­sen­tariam um avanço sig­ni­fica­tivo se ao invés de ape­nas sub­sti­tuir uma por outra, sub­sti­tuíssem diver­sas destas escol­in­has por uma escola de qual­i­dade com todos os recur­sos de esco­las de ponta, em sis­temas de polar­iza­ção.

Tal solução seria mais viável para os municí­pios e rep­re­sen­taria uma mel­ho­ria sig­ni­fica­tiva para educação.

Pois bem, ao invés de se ten­tar con­struir uma política edu­ca­cional con­sis­tente aux­il­iando os municí­pios pref­erem o efeito midiático dos números, falar de cen­te­nas de escol­in­has con­struí­das ou refor­madas, pouco impor­tando se as mes­mas con­tin­uarão a fun­cionar em sis­tema mul­ti­sse­ri­ado, não pos­suirem acesso à inter­net banda larga, bib­liote­cas, lab­o­ratórios e out­ros recur­sos que, recon­heci­da­mente, con­tribuem para ele­var o nível do ensino.

Quer me pare­cer, infe­liz­mente, que a pro­pa­ganda, o impacto da mídia, é mais impor­tante que a final­i­dade perseguida pela admin­is­tração que é o bem comum, o inter­esse da sociedade, o cresci­mento de todos, o ofer­ec­i­mento de serviços de qual­i­dade aos contribuintes.

Vive­mos uma estranha quadra na admin­is­tração pública.

Antiga­mente, ainda lem­bro, os gov­er­nantes quando iam a uma inau­gu­ração, faziam questão de con­ferir se aquela obra pos­suía qual­i­dade, as vezes munidos de picare­tas, tes­tavam a qual­i­dade o asfalto, via se era de qual­i­dade, se a espes­sura estava cor­reta, etc.

Nos dias atu­ais, a foto da inau­gu­ração na redes soci­ais, nos meios de comu­ni­cação, na pro­pa­ganda ofi­cial pos­sui mais relevân­cia que a obra em si. Pior que isso, não se “gasta” com pro­pa­ganda ape­nas na inau­gu­ração da obra.

Atual­mente os gestores não pos­suem con­strang­i­mento de “inau­gu­rarem” ordens de serviços, faz­erem festa em pedra fun­da­men­tal. Os mais “afoitos” ou sem noção, têm o des­plante de “inau­gu­rarem” a intenção de fazer deter­mi­nada obra. O cidadão diz que tem a intenção de fazer tal coisa e já faz a festa, a “inau­gu­ração” da intenção.

Um dado curioso que deve servir de alerta aos cidadãos: a sanha pro­pa­gandís­tica cresce na mesma pro­porção que diminui a qual­i­dade das obras públi­cas.

Os exem­p­los estão aí, à vista de todos. Bas­tou um inverno um pouquinho mais rig­oroso para inúmeras obras públi­cas se dis­solverem, os alaga­men­tos apare­cerem e os pre­juí­zos destru­irem as finanças dos contribuintes.

Obras que con­taram com ver­dadeiras for­tu­nas em inves­ti­men­tos não resistindo a um inverno. Não pre­cisa ir muito longe, olhe para as ruas dos bair­ros, as pis­tas das prin­ci­pais avenidas, as rodovias estad­u­ais e fed­erais. Estão todas a com­pro­var a sua pés­sima qual­i­dade.

Aproveitem e puxem pela memória para lem­brarem o quanto de pro­pa­ganda, matérias jor­nalís­ti­cas (cer­ta­mente pagas) se fez de tais obras, o quanto se gastou.

Este é o retrato do Brasil, um pais onde os gov­er­nantes não se con­strangem em venderem ilusões e enganarem os cidadãos.

Este é o retrato de um pais em que a pro­pa­ganda tem mais importân­cia que o inves­ti­mento real em bene­fí­cio da sociedade.

Maior respeito merece, de fato, as gal­in­has pois elas próprias fazem seu com­er­cial, mas difer­entes dos atu­ais gov­er­nantes, entregam um pro­duto de qual­i­dade.

Abdon Mar­inho é advogado.

Comen­tários

0 #2 Léo Costa 25-​04-​2018 15:31
De outro lado, a última Avali­ação Nacional de Alfa­bet­i­za­ção (ANA) do MEC detec­tou a tragé­dia brasileira: somente 46 por cento das cri­anças alfa­bet­i­zadas aos 8 Nos de idade na ter­ceia série do fun­da­men­tal. No Maran­hão de 2016, ape­nas 23 por alfa­bet­i­zadas. Se pudésse­mos des­do­brar para o mundo rural, será certo dizer que menos de 10 por cento das cri­anças do nosso campo con­seguem ser alfa­bet­i­zadas: uma catástrofe. Em vez do nosso bom gordo jun­tar o Estado para debater novos rumos, nos entope com pro­pa­ganda e, não sat­is­feito, ordena nos espi­onar e nos fichar. Daqui a pouco, declara a inde­pendên­cia, sai do Brasil e proclama um novo país… o Maran­hão do Norte.
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0 #1 Léo Costa 25-​04-​2018 15:07
Caro Abdon: exce­lente artigo, sobre o qual gostaria de con­ver­sar pes­soal­mente. Permita-​me, porém, adi­cionar algu­mas infor­maçôes. O Gov­erno do Sr. Dino está espal­hando out-​doors do Escola Digna. Prom­ete entre­gar 300 (trezen­tas) delas até o final de 2018. Estou acom­pan­hando. Fol­he­ando o site do Pro­grama, sem­ana a sem­ana desde o laça­mento em 2015, cheguei a 53 delas sub­sti­tuindo esco­las rurais de taipa e palha. Ora, só em Bar­reir­in­has temos 155 esco­las rurais. Nas zonas rurais do Maran­hão inteiro (217 municí­pios), são mais de DEZ MIL esco­las rurais. Se esse rapaz dos Leões con­seguir entre­gar 100 esco­las con­struí­das no lugar das taperas, terá atingido UM POR CENTO dos povoa­dos com escola. Até agora, ás vésperas das eleições, só chegou a meio por cento. Nesse rítmo, seriam necessários mais 99 mandatos comu­nistas para resolver este lado do prob­lema que é a questão da infraestrutura.
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