AbdonMarinho - O ESTADO, LUISLINDA, A AMMA E OS PENDURICALHOS.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O ESTADO, LUIS­LINDA, A AMMA E OS PENDURICALHOS.

O ESTADO, LUIS­LINDA, A AMMA E OS PENDURICALHOS.

um tempo pas­sou na tele­visão mais de um reportagem sobre os par­la­men­tos ao redor do mundo, suas van­ta­gens, as remu­ner­ações dos seus agentes políti­cos, o que tin­ham dire­ito o que não tinham.

Se não falha a memória pas­sou, tam­bém, uma reportagem especí­fica sobre o par­la­mento sueco, onde suas excelên­cias dividiam a lavan­de­ria e lavavam suas próprias roupas.

Aque­les que não tiveram a opor­tu­nidade de assi­s­tir, sugiro que façam uma pesquisa nos canais da inter­net. Os que assi­s­ti­ram dev­e­riam fazê-​lo novamente.

Emb­ora o caso da Sué­cia seja um mod­elo ideal, acho impor­tante que ten­hamos con­hec­i­mento que as coisas no Brasil é que estão fora de ordem.

Não é de hoje – já se vão vinte anos –, que bato na tecla de que o país pre­cisa de uma reforma estru­tural, uma reforma do nosso mod­elo de Estado que obrigue os agentes políti­cos a um uso racional dos recur­sos públi­cos, ou seja, do nosso din­heiro uma vez que pois pas­samos quase seis meses do ano tra­bal­hando só para pagar trib­u­tos, não é justo, por­tanto, que estes trib­u­tos sejam empre­ga­dos em mor­do­mias diver­sas, em pen­duri­cal­hos sem qual­quer sentido.

As elites brasileiras sem­pre se acharam mere­ce­do­ras de viverem no fausto, de gozarem férias inter­mináveis, pon­tos fac­ul­ta­tivos indeco­rosos, pos­suirem uma enormi­dade de asses­sores, aju­das disso, daquilo e daquilo mais, sem se pre­ocu­par em saber de onde vem o din­heiro que paga a conta. Ou, sabendo, achando-​se mere­ce­dora de mais benesses que os demais brasileiros.

Não acred­ito que haja no mundo uma nação que gaste tanto com a máquina pública quanto o Brasil. São gas­tos desnecessários, mas que os ben­e­fi­ci­a­dos por eles acham pouco e querem sem­pre mais.

Segundo uma visão dis­tor­cida, esse é o preço que os cidadãos deve­mos pagar por viver­mos numa democ­ra­cia. Acred­i­tam, provavel­mente, que a Sué­cia, só para citar um exem­plo, vive longe da democ­ra­cia uma vez que lá os vereadores e dep­uta­dos estad­u­ais não são remu­ner­a­dos e os inte­grantes do par­la­mento gan­ham cerca de R$ 13 mil reais, sem dire­ito a asses­sores, motoris­tas, car­ros ofi­ci­ais, pas­sagens aéreas, moram em imóveis fun­cionais de 40 ou 50 met­ros quadra­dos e lavam a própria roupa.

A visão que esta elite tem é que o Estado deve prover essas mor­do­mias. E, ainda aque­les alcançaram o sucesso graças ao próprio esforço, como a aprovação em con­curso para um cargo público, pas­sam a se acharem cre­dora da sociedade e não empre­ga­dos da mesma.

Por estes dias tive­mos exem­p­los cristal­i­nos disso.

O primeiro, a min­is­tra de Estado Luis­linda Val­ois, que requereu gan­har o dobro do teto do serviço público – já ele­vado, cerca de R$ 33 mil reais, se com­parado ao salário-​mínimo nacional –, vez que como desem­bar­gadora aposen­tada já recebe o teto e estaria recebendo verba irrisória pelo cargo de min­is­tra. Na sua visão, o rece­bi­mento de R$ 3 mil, pelo exer­cí­cio do cargo de min­is­tra equiv­a­le­ria a “tra­balho escravo”.

O caso da min­is­tra Val­ois é emblemático pois ela pos­sui uma história extra­ordinária de quem venceu inúmeras difi­cul­dades para chegar onde chegou. Não é todo dia que vemos uma mul­her, negra, de origem humilde chegar a juíza, depois desem­bar­gadora e agora min­is­tra de Estado, no nosso país. Casos assim são exceções.

Daí o fato de ser emblemático, a min­is­tra ao requerer um ganho já supe­rior ao que ganha a larga maio­ria dos cidadãos brasileiros, negou a própria origem e pas­sou a inte­grar ou achar-​se como inte­grante de uma elite que se pre­tende mel­hor que a maior parte dos cidadãos brasileiros.

O segundo, em sen­tido inverso, foi a renún­cia do juiz Roberto de Paula a uma série de «pen­duri­cal­hos» que com­põe e eleva os salários dos magistrados.

A decisão, inédita, como era de se esperar, atraiu a ira da asso­ci­ação dos mag­istra­dos que enx­er­gou hipocrisia na incia­tiva do associado.

O posi­ciona­mento do pres­i­dente da asso­ci­ação e de tan­tos out­ros que não com­preen­deram a ati­tude do mag­istrado é fruto, por óbvio, do descon­hec­i­mento de sua história. Quem o con­hece, há mais tempo é sabedor que estes “pen­duri­cal­hos» nos con­tra­cheques dos mag­istra­dos – e de tan­tas cat­e­go­rias –, era algo que o incomodava.

Acred­ito que ulti­mas “novi­dades”, neste sen­tido, aprovadas pelo cole­giado do Tri­bunal de Justiça do Maran­hão, era o que fal­tava para que fizesse a opção de renun­ciar a todas elas, ainda que con­trar­iando muitos dos cole­gas e ami­gos que não vêem nada demais em auferi-​las.

Ora, o que o Judi­ciário nacional tem feito, diante do silên­cio de todos, inclu­sive do Min­istério Público e Tri­bunal de Con­tas da União e dos esta­dos, é seguir o roteiro traçado desde muito tempo pelos out­ros poderes: criar for­mas de mel­ho­rar as remu­ner­ações dos seus mem­bros através de auxílios diver­sos, con­trar­iando ou não o man­da­mento con­sti­tu­cional de que a remu­ner­ação deva ocor­rer em sub­sí­dio de parcela única, vedado acrésci­mos de quais­quer natureza.

Chego a pen­sar que se ninguém, nem do Min­istério Público, nem dos órgãos de con­tas, das diver­sas con­tro­lado­rias, se deram conta que estes “pen­duri­cal­hos» estavam ou estão erra­dos, cer­ta­mente é porque estão certos.

Se não, qual a razão de tão ensur­de­ce­dor silêncio?

Vou além para dizer que cer­ta­mente estas van­ta­gens não estariam em con­fronto com a Con­sti­tu­ição da República uma vez que ninguém nunca se deu conta disso sendo tão sábios.

Se não, estariam acima da con­sti­tu­ição estes dig­natários da República?

O que sei, entre­tanto, é que mesmo que hou­vesse uma recomen­dação expressa na Carta Con­sti­tu­cional para que os recur­sos públi­cos fos­sem gas­tos da forma como os vem sendo (em mor­do­mias, pen­duri­cal­hos e tan­tas coisas mais), ainda assim, não estaria certo.

Não estaria cor­reto porque os recur­sos públi­cos sobre­tudo num país como o nosso, repleto de desigual­dades, deve ser gasto com parcimô­nia e critério – e, em bene­fí­cio da sociedade. Não faz sentindo pos­suirmos uma ou mais cas­tas, que se achem no dire­ito ou mais mere­ce­dora os demais cidadãos.

Os agentes políti­cos e servi­dores públi­cos pre­cisam enten­der que quando se can­di­datam ou são investido, por con­curso ou nomeação, em um cargo público lá estão para servir ao público, a sociedade e não para servir-​se dos recur­sos da nação.

Claro que não se está pre­tendendo que sirva a nação gra­tuita­mente ou em tra­balho “escravo» como ale­gou a min­is­tra Luis­linda Val­ois, mas, medi­ante uma remu­ner­ação justa que não ofenda, com os exces­sos, o con­junto da sociedade, que não sejam bene­fí­cios aos quais, nem em son­hos, os pagadores de impos­tos alcançam.

Estes agentes e servi­dores público pre­cisam com­preen­der o real sen­tido de servir ao público.

São con­ceitos que tran­scen­dem a legal­i­dade. Vai muito além, tem mais com justiça, sol­i­dariedade, bom senso.

Ao se perderem na dis­cussão sobre hipocrisia, ganho pouco, tra­balho escravo e out­ras coisas mais, esque­cem o fun­da­men­tal, que é a dis­torção do que seja o Estado.

Abdon Mar­inho é advogado.

Comen­tários

+1 #1 abde­laziz san­tos 11-​11-​2017 21:39
Meu caro Abdon,
Essa ideia de remu­ner­ação em sub­sí­dio de parcela única, vedado acrésci­mos de quais­quer natureza, foi ten­tada aqui no Estado em 2007 (gov­erno Jack­son). Os servi­dores de remu­ner­ação robusta em razão dos ditos pen­duri­cal­hos foram à guerra e fiz­eram valer «seus» dire­itos junto ao STF (leia-​se Eros Graus).
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