AbdonMarinho - ABORTO, MACONHA E OUTRAS POLÊMICAS (parte 2)
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Quinta-​feira, 21 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

ABORTO, MACONHA E OUT­RAS POLÊMI­CAS (parte 2)

ABORTO, MACONHA E OUT­RAS POLÊMI­CAS (parte 2).

Por Abdon C. Marinho.

Con­tin­u­ação …

O segundo tema polêmico diz respeito a decisão do STF sobre a maconha.

Mais uma vez o clima de rad­i­cal­ismo extremo tomou conta do debate com cada um pre­gando “sua ver­dade” como se fosse a mesma uma inspi­ração div­ina.

Até mesmo pes­soas que dev­e­riam ter a respon­s­abil­i­dade de esclare­cer os fatos manifestaram-​se para con­fundir e para fazer explo­ração política barata sobre os dra­mas indi­vid­u­ais de mil­hares ou mil­hões de pes­soas.

Depois de 09 (nove) anos de trami­tação o processo de um cidadão apan­hado com uma ínfima quan­ti­dade de entor­pe­cente, suposta­mente, para con­sumo próprio foi jul­gado pelo STF que decidiu fazer uma dis­tinção entre o usuário de dro­gas e o traf­i­cante, esta­b­ele­cendo como lim­ite para a posse, com out­ros fatores, car­ac­ter­i­zadores da condição de usuário e não traf­i­cante 40 gra­mas da erva.

A primeira con­tro­vér­sia esta­b­ele­cida dizia respeito ao suposto fato de que o tri­bunal estaria “leg­is­lando” sobre um tema.

O artigo 5º da Con­sti­tu­ição, em um dos seus incisos esta­b­elece: “XXXV — a lei não excluirá da apre­ci­ação do Poder Judi­ciário lesão ou ameaça a dire­ito”.

Pois bem, tive­mos um cidadão que foi con­de­nado por estar por­tando deter­mi­nada quan­ti­dade de erva, a defesa bus­cou a justiça para, na sua visão, impedir uma lesão ao seu dire­ito à liber­dade, ao meu sen­tir o mais impor­tante.

O que STF fez foi decidir sobre tal assunto. Essa “lacração” dos fal­sos moral­is­tas, a meu sen­tir, é despro­por­cional e desproposi­tada.

Esta­b­ele­cendo, no seu entendi­mento, as bal­izas quanto à definição dos papéis de cada um em relação proces­sual, a corte máx­ima da República esta­b­elece efe­tivi­dade a lei de entor­pe­centes.

A questão da quan­ti­dade de maconha a fazer a dis­tinção é um segundo ponto da con­tro­vér­sia.

Agora bradam que mil­hões de jovens que não tra­bal­ham nem estu­dam, com a suposta “brecha” deix­ada pelo STF vão se dedicar ao trá­fico de peque­nas quan­ti­dades de dro­gas com o argu­mento que se trata de pro­duto para con­sumo próprio.

Não sei se tal argu­mento é fac­tível, mas, mais uma vez, recorre-​se ao antigo bro­cado jurídico que ensina ser mais útil a norma que solta os cul­pa­dos do que aque­las que encar­ce­ram os inocentes.

O prob­lema da falta de per­spec­tiva de mil­hões de jovens tem sua origem na falta de uma edu­cação básica de qual­i­dade que os estim­ulem a desen­volver suas poten­cial­i­dades.

Essa falha é do Estado, mas tam­bém das famílias que os aban­donaram à própria sorte e da sociedade de um modo geral.

Essa “vul­ner­a­bil­i­dade” não é algo que surgiu “do nada”; e a sua solução não se apre­senta de forma tão sim­ples.

As dro­gas, todos sabe­mos, são um fla­gelo para humanidade. Diari­a­mente assis­ti­mos car­reiras destruí­das, famílias destruí­das tanto finan­ceira quanto emo­cional­mente por causa das dro­gas.

Quem já não “perdeu” um amigo, um famil­iar ou um ente querido para as dro­gas? Acred­ito que quase todo mundo. Eu já perdi, e não ape­nas uma pessoa.

Sou, pes­soal­mente, total­mente con­trário ao con­sumo de dro­gas, sejam elas líc­i­tas ou ilíc­i­tas. Não acho saudável que um ser humano seja depen­dente de um vício, qual­quer que seja.

Mas, nem por isso acho que deva­mos fugir ao debate do que é rel­e­vante para a sociedade.

Será que todas as pes­soas que con­somem ou já con­sumi­ram dro­gas são traf­i­cantes? Cer­ta­mente que não.

Então não se deve ter alguma bal­iza dis­tin­guindo um usuário (que muitas das vezes tam­bém é vítima) daquele que é traficante?

Será que tratar e igualar usuários de traf­i­cantes, encarcerando-​os sem qual­quer dis­tinção, não esta­mos favore­cendo o for­t­alec­i­mento do crime organizado?

Outra coisa, esse tipo de estraté­gia não favorece ainda mais o “apartheid” social entre pobres e ricos, bran­cos e pre­tos, bairro nobre e per­ife­ria.

Alguém imag­ina que o rico, o bem nascido, vai amar­gar dias na cadeia porque foi fla­grado com uma poção de dro­gas? Mas o vul­nerável nas mes­mas condições do rico, exceto pela condição finan­ceira, cer­ta­mente pas­sará pou­cas e boas nas celas até que alguém o solte … se soltar.

Imag­inem a situ­ação da família, do pai, da mãe dos irmãos, tios, etc., que já têm de lidar com o ente que faz uso de dro­gas – e isso, como geladeira branca, tem em quase toda casa –, ter que lidar com a situ­ação de encar­cer­ado desse dependente/​usuário.

Faz-​se necessário que as pes­soas apren­dam a colocar-​se na situ­ação do próx­imo: isso chama-​se de empatia.

Assim como sei que não existe pes­soas que sejam favoráreis que engravi­dem com o único propósito de abortarem – mesmo aque­las mul­heres que apelam a tal expe­di­ente o fazem como recurso extremo de deses­pero –, sei, tam­bém, que as pes­soas não se tor­nam depen­dente de alguma droga porque acham “bonito”. Muitos até podem começar assim, mas, depois, muitas das vezes se tor­nam víti­mas e pas­sam por todo tipo de con­strang­i­mento e humil­hação por não con­seguirem se tratar do vício.

A lei igua­lando traf­i­cantes e usuários, como querem muitos, será capaz de fazer esse mila­gre? Acred­ito, mais uma vez, que não.

Quer me pare­cer – mas posso está errado –, que o “fra­casso” do Estado em com­bater o trá­fico e per­mi­tir que as dro­gas invadam as cidades e lares, destru­indo vidas e famílias, tenta com­par­til­har a sua respon­s­abil­i­dade com medi­das repres­si­vas “na ponta” sem atacar o prob­lema na sua origem, na pro­dução e na dis­tribuição das dro­gas.

Ainda daque­las man­hãs na fac­ul­dade trago outro apren­dizado: as leis são feitas e des­ti­nadas aos homens de bem que infe­lic­i­ta­dos por alguma situ­ação come­tem crimes. Essa lei deve ter por norte a punição mas, tam­bém, a recu­per­ação do cidadão.

Indaga-​se, por opor­tuno: o encar­ce­ra­mento de usuários de dro­gas em prisões onde sabe­mos são as “uni­ver­si­dades do crime” dom­i­nadas, com a com­placên­cia do Estado, por facções crim­i­nosas não é a forma mais ráp­ida de se aumen­tar a vio­lên­cia e fornecer “mão de obra” ao crime?

Difer­ente dos sen­hores da razão, que têm respostas para tudo, esses ques­tion­a­men­tos julgo opor­tunos para, ao menos, sus­ci­tar ques­tion­a­men­tos de algum leitor.

Entendo que tanto no caso do aborto quanto no caso da decisão do STF sobre a maconha, como disse no iní­cio, o que pre­cisamos fazer é abrir canais de dis­cussões sobre os temas, sem aço­da­men­tos e sem encará-​los como “dog­mas de fé” ou de “vin­gança” entre as facções políti­cas.

É dizer, você não vai con­seguir impedir que acon­teça abor­tos legais ou clan­des­ti­nos levando quem os prat­ica a cumprirem penas de até vinte anos, antes pre­cisamos fazer um tra­balho sério de pro­teção e edu­cação de nos­sas cri­anças desde o momento pos­sam com­preen­der o que seja um abuso ou uma vio­lên­cia con­tra elas.

Igual modo, não se pode imag­i­nar que encar­cerando alguém que estava fumando ou por­tando um “baseado”, vá se resolver a chaga do trá­fico de dro­gas que infe­licita o país e o mundo.

Em out­ras palavras, pre­cisamos acabar com essa “fulaniza­ção” do debate político no Brasil.

Não pensem, os mais diver­sos lob­bies, envolvi­dos nes­sas pau­tas, muitas vezes para gan­hares seguidores nas redes soci­ais, que estão dando alguma con­tribuição para o Brasil e para a sociedade.

Na ver­dade estão con­tribuindo para obscure­cer um debate sério, insolúvel, até aqui, e que causa bil­hões de pre­juí­zos anual­mente aos países, em per­das finan­ceiras e humanas.

Abdon C. Mar­inho é advogado.

PS. A imagem é uma das mil­hares que cir­cu­lam na internet.