ELEIÇÃO: A ESTRATÉGIA DO TERCEIRO TURNO.
Por Abdon Marinho.
ACOMPANHANDO o processo eleitoral desde a infância, o que representa quase quarenta anos de “janela”, confesso que tenho dificuldades em fazer uma avaliação do vem acontecendo neste pleito, no Maranhão.
Faltando pouco mais de quatro meses para eleição, os adversários do atual governador, que, em tese, deveriam correr “atrás do prejuízo” como no dito popular, parecem pouco dispostos para a disputa. Não se ouve falar em formação de chapas, em críticas acaloradas, em embates diretos. Até parece que teremos uma eleição com candidatura única, com o atual governante ganhando por WO.
E, é aí, neste cenário, que as coisas ficam mais esquisitas.
Vejam, a “trupe” governista não cansa de ocupar todos os espaços de comunicação social, inclusive as redes “vendendo” a ideia de que a “fatura” está liquidada e que a vitória acachapante ocorrerá logo no primeiro turno da disputa.
Pois bem, ao mesmo tempo que fazem isso, vendem a ideia de vitória por antecipação, tornam-se se clientes preferenciais da Justiça Eleitoral. São diversas ações, pelas mais diversas condutas ilegais, propostas, não apenas pelos opositores, mas também, pelo Ministério Público Eleitoral.
Muitas das ações, pelo que noticia a mídia, tem fundamento sólido, tanto que o MPE tem se incomodado com as condutas praticadas. E não se pode dizer que o governador e seus aliados desconhecem as leis. Ele próprio é jurista dos mais respeitados – seus aliados costumam dizer que que foi aprovado em primeiro lugar no concurso em que também foi aprovado o juiz Sérgio Moro; seus aduladores ainda fecham a sentença dizendo que ele “possui OAB” –, foi juiz eleitoral, o governo, segundo dizem com certa troça, “tem mais advogado que gente”, ou seja, estamos falando de pessoas ao menos teoricamente competentes e conhecedoras da lei.
Assim, é de causar especie que, sem adversários fustigando, ensaiando, pelo menos, na garganta, que levará a vitória ainda no primeiro turno, insistam em desafiar a Justiça Eleitoral e colocar em risco a “vitória certa”.
Se é certo que são competentes e profundos conhecedores da lei, fica-se a dúvida se o desafio a legislação é perpetrado porque se acham acima da lei ou porque não têm tanta certeza da vitória ou, talvez, seja uma “estratégia” para levarem a eleição a um terceiro turno.
Mas, perderão para quem? Se os supostos adversários, até o momento, não mostraram a cara ou disseram que irão para o embate.
Talvez, como já disse alguém, sem adversários, trabalhe para perder para si mesmo.
A foto colhida das redes sociais – e que acompanha esse texto –, é um claro exemplo do pouco apreço pela legislação eleitoral ou do receio que têm os inquilinos de “perderem a eleição que ganharão no primeiro turno” ou como disse, a prova cabal da “estratégia” de levarem a eleição para o terceiro turno.
Na foto, o governador e sua chapa apresentada formalmente a patuleia: ele próprio, o vice-governador e seus dois candidatos ao Senado, e ainda, um candidato a deputado federal, também já apresentado formalmente e dois candidatos a deputado estadual, posam em cima de uma máquina de asfalto no lançamento do programa governamental “Mais Asfalto” no Município de Trizidela do Vale.
Acho que pouca coisa ilustraria tão bem o “uso da máquina pública” quanto a foto em referência. Literalmente estavam usando “máquina”.
Vejam: numa semana, em evento público, com dezenas de representantes de partidos e lideranças políticas apresentam a chapa, dias depois essa mesma “chapa” aparece sobre maquinário de obras públicas. Isso tudo a pouco mais de quatro meses para o dia da eleição.
Não restam dúvidas: só pode ser uma estratégia para levar as eleições para o terceiro turno. É isso, pois não contentes apenas com o ato em si, tratam de ampliá-lo com divulgação e compartilhamento infinitos nas redes sociais.
Será que surgirá algum áudio com pedidos de votos como foi feito outro dia num evento partidário divulgado na rede mundial de computadores?
O que faziam pessoas que não têm qualquer ligação com aquela comunidade participando de “lançamento de programas públicos”, quê não campanha eleitoral? O que faziam pessoas que não são agentes públicos “lançando” obras? O que faziam, inclusive autoridades do primeiro escalão, suados como tampa de chaleira, em comitiva, lançando singela obra de asfaltamento num município que nem é dos maiores, faltando tão pouco tempo para a eleição?
Ora, aquelas pessoas “sobre a máquina” não estavam lá para verem o asfalto ou para operarem a máquina. Estavam lá para serem vistas pelos cidadãos. Coincidentemente eram as mesmas pessoas que estão com as pré-candidaturas lançadas aos diversos cargos em disputa.
Ainda que não façam “comícios”, peçam votos durante o ato oficial, suas presenças têm o condão de desequilibrar o pleito. E isso é matéria de interesse da Justiça Eleitoral.
Causa espanto que pessoas tão sábias, certamente conhecedoras dos limites da lei; os limites entre o que podem e o que não podem fazer, a linha – que não é tão tênue –, entre o legal e o ilegal, cometam tantos desatinos.
É isso que não consigo entender. Pois tanto o governador quanto os demais que estiveram naquele ato – e em tantos outros –, têm plena consciência disso, são conhecedores da lei. Logo, qual o sentido de desafiarem a legislação, afrontar a Justiça Eleitoral, levar para a Justiça o resultado de uma eleição que, segundo eles mesmo dizem, está tranquila? Liquidada em primeiro turno?
Seria apenas o desejo de darem “trabalho” aos adversários? Estimulá-los a saírem da letargia e entrarem na disputa? Trazer o Ministério Público Eleitoral para o centro das discussões políticas, aumentando sua carga de trabalho?
Fosse eu o candidato e estivesse tão certo da vitória, convencido que adversário algum me faria frente, jamais cometeria qualquer deslize capaz de suscitar questionamentos sobre a legitimidade do pleito. Pelo contrário. Faria tudo no sentido da obediência estrita da lei. Não fazendo e não permitindo que qualquer aliado tivesse comportamento dúbio capaz de sugerir controvérsias futuras. Estaria cuidando da confecção do terno da posse e correndo milhares de quilômetros na esteira para estar em forma neste dia.
Pois é, estranhamente, apesar de dizerem que voam em céu de brigadeiro, comportam-se como náufragos em busca da última tábua de salvação.
Já vi, noutras eleições, candidatos que estavam mal posicionados ou derrotados, tentarem levar a disputa para o terceiro turno, candidatos, supostamente, bem posicionados, segundo eles mesmos dizem, é a primeira vez.
Não tem qualquer justificativa para comportamento tão atabalhoado e contrário à legislação e ao bom senso.
Como disse, só pode ser uma estratégia milimetricamente planejada para levar a eleição para o campo judiciário.
Uma outra justificativa seria o desejo de afrontar ou colocar-se acima da lei. Vai entender, né? Acredito mais que seja uma estratégia. Eleição é uma coisa tão boa, mas tão boa, que apenas um ou dois turnos são insuficientes, bom mesmo é um “terceirão” com a participação das partes, procuradores, advogados e juízes.
Deve ser isso.
Abdon Marinho é advogado.