A EVOLUÇÃO DA COMUNICAÇÃO.
Por Abdon Marinho.
NA SEXTA-FEIRA saí mais cedo do escritório. Tinha um assunto para resolver no fórum eleitoral de São José de Ribamar. Encontrei-o fechado, sendo informado pelo vigia do local que o expediente regular é apenas até as 14 horas.
Ao manobrarmos para retomar vi a cena da fotografia abaixo: um cidadão fazendo uma ligação de um telefone público, o popular “orelhão”.
O colega que estava comigo indagou-me sobre como era funcionamento do aparelho: se com ficha ou cartão. Informe-lhe que agora, de acordo com a legislação que rege o setor, as ligações dos telefones públicos podem ser feitas gratuitamente, sem necessidade de ficha (já abolidas há décadas) ou cartão telefônico.
A cena me trouxe a lembrança do quanto evoluímos em matéria de telecomunicações a partir da privatização do setor. Muito criticada na época pelas corporações e críticos de sempre.
A cena do rapaz usando o orelhão soou estranha pelo fato de hoje, praticamente, todo mundo possuir um ou mais telefone celular ou linhas telefônicas e os valores das ligações, mesmo paras ligações interurbanas custarem quase nada ou até mesmo serem gratuitas tanto através das operadoras quanto via internet.
A primeira vez que tive contato com um telefone foi há pouco mais de trinta anos quanto inauguraram um posto da Telma (Telecomunicações do Maranhão) em Gonçalves Dias.
Lembro que foi um evento, se não me falha a memória, até o governador se fez presente. Se não foi mandou alguém muito importante para representá-lo no ato.
A municipalidade construiu o Posto da Telma na Praça Miguel Bahury, a principal e mais importante da cidade.
As ligações eram recebidas com hora marcada.
As moças responsáveis pelo posto da Telma tinham o status de autoridade.
Alguém ligava querendo falar um parente ou amigo e desligava enquanto o mensageiro ia avisar que tinha ligação na Telma e a pessoa ia lá receber o telefonema na cabine.
Ligar era mais fácil. Se a pessoa ligasse para casa de quem tinha telefone era menos trabalhoso.
As ligações custavam “os olhos da cara” e as funcionárias da Telma (geralmente alguém cedido pelo município) controlavam, com cronômetros, o tempo do telefonema para cobrar o valor da ligação.
Vez ou outra havia discussão sobre o valor cobrado, os minutos de ligação e, até mesmo, por alguém ligar e a responsável pelo posto não mandar avisar.
Depois, com o passar dos tempos, já na capital, vi que possuir um telefone em casa, era um luxo para poucos. Era muito caro.
E, por ser caro, as pessoas colocavam cadeados nos aparelhos ou os guardavam em lugar seguro. Se não pagavam a conta a empresa de telefonia “cortava” a comunicação. Primeiro para ligar e, persistindo o atraso, também para receber.
Além de ser “feio” vazar a informação de que o telefone de alguém fora “cortado”, o inadimplente ainda tinha que pagar uma taxa de religação.
Para conseguir uma linha as pessoas se inscreviam e ficavam até anos na fila esperando uma linha.
Era símbolo de status a ocupar as conversas, dizer que estava no plano de expansão Telma.
— Ah, estou no plano de expansão, daqui a quatro anos minha linha deve sair. Era uma “vantagem”, Um luxo.
Os mais aquinhoados (ou amigos do poder) viviam da renda de alugar linhas telefônicas. Os muito ricos possuíam até dez linhas alugadas.
Na Deodoro haviam os vendedores de fichas telefônicas que eram usadas nos “orelhões”. Às vezes perdíamos a ficha pois a colocávamos e a ligação não era feita ou não completava. Ficávamos furiosos com isso. Dizíamos que o aparelho nos roubara.
Mas, também, nos “vingávamos”. Colocávamos a ficha amarrada numa linha e a puxávamos feita a ligação e antes de cair no depósito. Também tentávamos diversos outros métodos de usar os aparelhos sem pagar.
Quem tinha a “manha” cobrava para revelar o segredo: um lanche na cantina do Liceu ou passe escolar e, até, dinheiro.
Um prêmio era se descobrir um telefone defeituoso que se pudesse ligar sem ficha.
— Eh, rapaz, o telefone lá do canto da Gonçalves Dias está ligando sem ficha.
O segredo revelado, fazia-se filas para ligar.
A privatização, assim como toda evolução tecnológica no setor, trouxe a situação que temos hoje mais linhas que pessoas para usá-las, além de preços que cabem em todos orçamentos.
Sempre que alguém critica a ideia de se privatizar determinado setor da economia, lembro da história da telefonia no Maranhão. Como a privatização e evolução tecnológica fizeram bem a economia e a vida das pessoas. Claro que deve haver cuidados e se evitar passar patrimônio público a preço de “banana”, mas deve-se pensar também nos benefícios para o conjunto da sociedade. N~ao vejo sentido em sustentarmos com impostos determinados setores sem se receber nada em troca, além de serviços de péssima qualidade.
O setor de telecomunicações é um exemplo.
O grande problema hoje não é a dificuldade de acesso aos meios de comunicação, ao telefone, já em desuso, é que hoje as pessoas não querem mais falar umas com as outras.
Quando muito mandam um “áudio” ou mensagem de texto.
Deve ser a evolução.
Abdon Marinho é advogado.