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Bem Vindo a Pagina de Abdon Marinho, Ideias e Opiniões, Quarta-feira, 27 de Novembro de 2024



A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade.

Escrito por Abdon Marinho

SERIA O MARANHÃO A GRANJA DO SOLAR?

Por Abdon Marinho.

DIZEM que a vida imita a arte – ou seria o contrário: a arte que imita a vida –, seja como for, ao examinar a atual quadra da história maranhense tenho por mim que esta é inspirada no clássico da literatura inglesa “A Revolução dos Bichos”, de George  Orwell. O livro que teve sua primeira edição lançada em 1945 trazia o subtítulo “Um conto de fadas”, embora, apesar de narrar a tomada do poder na granja solar pelos bichos, todos soubessem tratar-se de uma clara alusão à Revolução Russa, de 1917, que levou os comunistas ao poder – e seus desdobramentos. O que teríamos a arte a imitar a vida. 

Aqui, por sua vez, todos somos sabedores, que não fizeram um “roteiro” de governança inspirado na obra referida – é até provável nunca tenham lido tal obra, muitos até duvidam que saibam ler –, entretanto, em quase tudo, é como se a vida imitasse a arte.

Claro, tudo muito caricatural e, como toda caricatura, sobressaindo-se mais os defeitos que as supostas e invisíveis qualidades. 

Se tomássemos o Maranhão pela Granja do Solar, veríamos os antigos donos da “granja” foram apeados do poder pelos comunistas que tais como os animais do conto de fadas, se autodenominam de “camaradas”. 

Tal como no conto, as promessas foram se esvaindo a ponto de os bichos já não perceberem a diferença  na administração da “granja”, entre os humanos, a família Jones e os seus camaradas que agora estavam no poder. 

Muitas coisas para o conjunto dos bichos até pioraram. 

No poder os novos líderes da granja retomaram muitas das velhas práticas oriundas da antiga administração, e, dizem, “elegeram” alguns protegidos, com direto a receberem regularmente os favores da administração da granja em detrimento de outros.

Consta do livro a repressão a todos aqueles que “ousassem” dizer qualquer coisa contra o que se passava. De uma só vez diversos bichos foram sacrificados ou expulsos da granja.

Por fim, restaram na granja apenas aqueles que concordavam com tudo que o líder dizia e aqueles que não tinham coragem de dizer nada em contrário. 

A concordância pela conveniência e/ou pelo medo.

No livro consta que circularam boatos de uma aliança entre os bichos que estavam na administração da granja e os antigos proprietários, a família Jones. Alguma verossimilhança?

Apesar de cometer uma indelicadeza devo dizer que a obra encerra com a granja sendo chamada pelo antigo nome e alguns bichos enquanto olham pelas frestas da casa grande onde acontecia uma festa dos líderes já não enxergavam mais como aqueles que os lideraram no início da tomada do poder dos humanos. 

O livro “A Revolução dos Bichos” é incontornável para entendermos, a partir de uma visão crítica, o que passa ao nosso redor. Lembro de tê-lo lido pela primeira vez em meados dos anos oitenta, quarenta anos depois de lançado, e, desde então, mais algumas vezes. 

Noutras ocasiões – e, também, me referindo a atual quadra política no estado –, já o tinha citado. 

Nos últimos dias alguns acontecimentos – entre tantos –, me fizeram recordar o velho livro. 

O primeiro, aprovação pela assembleia legislativa do projeto de lei que alterou a alíquotas de contribuição dos servidores. 

Os senhores deputados quase que aprovam a matéria poucas horas depois da chegada ao parlamento. Só não o fizeram em razão de algum parlamentar haver pedido vistas, o que levou a aprovação “vapt-vupt” para o dia seguinte. 

Não se ouviu um protesto. Nem mesmo dos “valentes” representantes das categorias. 

Como disse em um texto sobre o assunto, ainda que a matéria fosse importante e se estivesse apenas replicando uma norma constitucional aprovada pelo Congresso Nacional, a interdição ao debate democrático é contrária a qualquer sentimento do que seja democracia. 

Mesmo aqueles passam os dias criticando o governo federal – e o presidente –, acusando-o de ditador, truculento, e tantos outros xingamentos de baixo calão, emudeceram. Calaram-se, diante da forma como o governador do Maranhão aprovou a matéria que “garfou” parte dos rendimentos dos servidores públicos. Ainda que todos saibam que foi o atual governo que quebrou a previdência.

Agora mesmo, no Paraná, onde o governo local levou a Assembléia Legislativa matéria semelhante, tivemos protestos violentos por parte dos servidores. 

O segundo, foi o episódio em que um auxiliar do governo estadual foi compelido a desculpar-se por falar a verdade. Nunca tinha visto algo semelhante. Talvez no tempo do cangaço, em que, nos bailes, os cidadãos de bem pediam desculpas aos cangaceiros quando tinham a infelicidade de ter os pés pisados por eles. 

Pois bem, o auxiliar do governo, articulista de um jornal local, escreveu, com base em dados técnicos, uma crítica à educação municipal. No texto, tendo o cuidado de não “ofender” ninguém lançou a responsabilidade pelo desastre da educação municipal a uma entidade abstrata. 

Pra quê?! Os camaradas comunistas partiram para cima do homem “com tudo”, por pouco não disseram que a educação municipal é modelo para o Brasil – a mesma patranha que dizem em relação a educação estadual. 

Menos de quarenta e oito horas depois de publicado o texto, lá estava o auxiliar governamental pedindo desculpas por “dizer a verdade”. 

Ficou a dúvida se ele mentiu ao escrever o texto ou ao pedir desculpas por tê-lo escrito. 

O articulista trabalha com educação e auxilia o governo justamente nisso. Aí você vê que essa pessoa não pode dizer aquilo que pensa, fundado em dados técnicos inquestionáveis, sem sofrer uma reprimenda dos dirigentes partidários do governo. 

Onde estamos? Na União das Repúblicas Socialistas Soviética - URSS, stalinista?

Vejam, a educação pública municipal é uma vergonha. 

Ainda hoje se trabalha com “escolinhas” comunitárias e, se os números apresentados pelo auxiliar do governo estadual corresponderem à verdade, a educação pública municipal é, também, criminosa, por privar um grande número de crianças do acesso a educação pública de qualidade.

Querem saber mais? A educação pública estadual é também uma desgraça. 

As autoridades estaduais tentam, por todas as formas, aparecer bem na fita, mas a realidade é que os estudantes sabem cada vez menos, os professores não podem cobrar ou reprovar aqueles que não sabem o mínimo para passar de ano e, para completar o tragédia, a rede estadual, em detrimento do currículo básico, está “treinando” os alunos para o Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM, ao invés de educá-los verdadeiramente.

Querem saber mais? A educação brasileira é uma coisa horrenda. 

Os dados do PISA/OCDE divulgados recentemente atestam que o Brasil continua na “rabeira” em tudo: línguas; ciências e matemática. 

A tragédia é pior. Os dados comprovam que esse modelo educacional “errado” estagnou a aprendizagem no país na última década. 

Os governos brasileiros, sobretudo,  municipais e estaduais, “roubaram” uma década de educação das nossas crianças.

Os “nossos” governantes vão mandar calar o PISA/OCDE? Vão exigir que se desculpem?

Vejam, é verdade que o alcaide municipal não é o único responsável pela “tragédia” da educação municipal, mas ele tem, sim, parcela de culpa. Ele está no poder há sete anos, o governador há cinco anos, esse é tempo mais que suficiente, senão para resolver um problema que vem de décadas, pelo menos apresentar encaminhamentos.

O que fizeram? Nada ou quase nada?

Nos últimos sete anos, a notícia que se tem é que o Município de São Luís “perdeu” diversas creches e escolas no padrão MEC, porque não foram capazes de executar os projetos, de conseguir os terrenos ou por outras coisas mais prosaicas. 

Em diversas outras áreas da administração se deu a mesma coisa. 

O que se diz do atual gestor é que somente agora, na reta final do sétimo ano de mandato, é que ele ressurgiu com algumas obras, nos sete anos para trás ninguém sabe onde estava. 

Ora, temos que, para os atuais donatários do poder, dizer a verdade, expor a realidade com dados é mais grave do que a situação em si.

O terceiro episódio – que já tratamos aqui, mais de uma vez –, nos foi exposto por um jornalista em redes sociais. Dentre tantos outros, narra-nos que tem sofrido processos judiciais do governo estadual. 

Não se trata de uma execução de dívida inscrita na fazenda pública, ou coisa que o valha. 

O “estado” sente-se “ofendido” por algo que o jornalista escreveu, chama um dos seus procuradores, pago pelo contribuinte, para processar ... o contribuinte. 

Apesar da situação deveras grave, pois não concebo que o estado processe cidadãos por,  supostamente,  se sentir “ofendido” – ato para o qual o Ministério Público ainda não enxergou improbidade administrativa –, causa-me perplexidade que não haja um protesto veemente de entidades jornalísticas; das de defesa da liberdade de imprensa; das de garantias individuais e da cidadania. 

Além dos processos que os jornalistas já sofrem por parte das autoridades, governador, secretários e servidores diversos, não me parece razoável que o estado processe cidadãos pelo fato destes expressarem o que pensam sobre o estado. 

Pelo contrário, é papel do estado garantir que isso ocorra. 

A prática do estado reprimir a liberdade de expressão é incompatível com a democracia, sendo comum, apenas, nas ditaduras mais sanguinárias ou na Granja do Solar sob o comando dos camaradas. 

Abdon Marinho é advogado.