Passando batido e dormindo no ponto.
Se Félix (o da novela) dissesse num dos seus chistes: “– Pelas contas do rosário, só posso ter dormido no banquete de Herodes para permitir a entrega da cabeça de João Batista a dançarina Salomé”, não retrataria de forma mais perfeita o que aconteceu na reunião da Comissão de Intergestores Bipartite – CIB, em que foi aprovada uma resolução que termina por liquidar a nossa já combalida saúde municipal.
Li que a CIB, reunida no último dia 23 de janeiro, decidiu, que São Luís irá remunerar os tratamentos feitos em anos anteriores, pela cidade de Teresina, de pacientes oriundos do Maranhão, por proposta do secretário de saúde do estado. Em sentido figurado, apenas isso, temos o banquete de Herodes (a reunião CIB) na qual foi entregue a cabeça de João Batista (a verba da saúde) para Teresina (Salomé). Isso só foi possível por que Félix (o secretário) dormiu e deixou passar a patranha. Para evitar que a saúde municipal quebre faz-se necessário que o município recorra imediatamente as instâncias próprias do Ministério da Saúde e até da justiça, se for o caso. Se passaram batido e dormiram no ponto é hora de correr atrás e evitar o prejuízo.
Não sou militante da área, apenas uma das tantas pessoas que vem acompanhando o assunto desde muito tempo, e como tal, sei que as decisões da CIB são fruto de consenso entre os secretários de saúde dos municípios, integrantes da CIB. Não posso acreditar que ninguém, nem mesmo o secretário de saúde do Município de São Luís tenha se erguido para alertar a violência que se estava fazendo contra a saúde da capital. Ademais, o Município de São Luís, até por sua condição de gestor pleno teria o poder de vetar a decisão absurda que querem transformar em resolução obrigando São Luís a pagar atendimentos pretéritos feitos pelo Estado do Piauí, que pelo volume torna impraticável qualquer política de saúde daqui para frente.
Ora, pelo que me informei, até essa nova resolução, estava em vigor uma outra pactuada tempos atrás, que vinha estabelecendo que os atendimentos deveriam ser feitos nas unidades onde o município do paciente é referenciado, se o município desejar mandar o paciente para outra unidade que não a de referência deveria fazê-lo através de uma guia própria para que o município que receba o paciente possa cobrar da Secretaria de Estado e esta descontar do teto do município que encaminhou.No caso da dívida existir, e acredito que exista, que seja descontada dos tetos de quem mandou os pacientes.
Diante disso, da falta deste controle, que se desconte do teto de São Luís, os valores destes atendimentos para o qual o município não contribuiu de nenhuma forma, e para o qual não se tem como aferir de forma devida, é uma temeridade que beira a irresponsabilidade tanto por omissão quando por comissão do membros da CIB.
Causa espanto é que diante de um fato tão absurdo ninguém tenha se levantado e erguido a voz contra. Não se compreende sequer a posição da Secretaria de Saúde do Estado em propor e encapar tal proposição. A impressão que fica é que ninguém sabe fazer conta ou fizeram ouvidos moucos ao que fora pactuado anteriormente. Em qualquer dos casos imperou o silêncio, da forma que imperou quando Salomé pediu a cabeça do profeta João Batista.
Em qualquer dos casos ainda isso não elide a responsabilidade do secretário de saúde do município que não usou do seu poder para impedir o que estava acontecendo. Aliás, cada vez mais se torna palpável o desconhecimento da atual equipe da saúde para gerir o sistema. Parece que ninguém sabe o que é o SUS. Eu e as pessoas acostumadas com o SUS ainda não conseguimos entender que convênio foi aquele que o município assinou com o HUUFMA na semana passada uma vez que a unidade já faz parte da rede municipal desde 2004, quando São Luís passou a gestor pleno do sistema, recebendo mais de R$ 80 milhões anuais, dos quais R$ 43 milhões repassados diretamente pelo Ministério da Saúde do teto do município para o HUUFMA e o restante mediante apresentação de faturamento. Isso sendo feito na última década.
O município é que não tem cobrado e enviado os pacientes, como deveria, para unidade, causando como resultado a sobrecarga da rede própria municipal. Ora, se se trata de um convênio novo, significa que vão pagar o dobro que já vem sendo pago? Vão onerar ainda mais o teto financeiro do município? Se não é convênio novo, porque submeteram o prefeito a apresentar uma novidade de museu? Se não é novo e agora dizem que vão fazer o deveriam vir fazendo na última década, o HUUFMA vai devolver o que já recebeu durante esse tempo todo? Confesso que ainda não entendi o que aconteceu. Vão apenas fazer o que já deviam está fazendo? Vão dobrar a capacidade de atendimento? O HUUFMA tem condições para fazer isso? Vão pagar o dobro pelo serviço? São perguntas que exigem do Sr. Félix (o secretário), os esclarecimentos devidos.
A impressão que fica é que a Secretaria de Saúde, conduziu o prefeito, num exemplo de absurdo, a comprar um carro que já lhe pertencia. Pois a unidade já rede do município, apresentar como novidade é agir como o cidadão que compra o carro que já lhe pertencia. Vamos combinar que esse tipo de coisa é de matar de inveja, os competentes vendedores de carros que fazem ponto ali na pedra que funciona na Praça Catulo da Paixão Cearense. Acho que nenhum deles conseguira tal feito.
O prefeito da cidade deve ser admirado pela paciência com que tem tolerado tantos desacertos, infelizmente; cada dia que passa essa paciência com a falta de gestão causa danos muitas das vezes irreparáveis à população ludovicense. Ainda ontem, li uma notícia que pela dureza, até hoje me custo acreditar. Li que um cidadão que acidentou-se na Avenida dos Africanos, praticamente no coração da cidade, veio a óbito, segundo dizem, pela demora no atendimento de urgência e emergência da cidade. Me custa acreditar que isso tenha ocorrido. Estamos numa capital de mais de um milhão de habitantes e que é gestora plena do sistema de saúde, não tem cabimento que pessoas morram por falta de atendimento. Não dá para acreditar. Acho que nem o Félix (o da novela) seria capaz de achar normal esse tipo de coisa.
Abdon Marinho é advogado.