AbdonMarinho - A AGONIA DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A AGO­NIA DOS MUNICÍ­PIOS BRASILEIROS.

A AGO­NIA DOS MUNICÍ­PIOS BRASILEIROS.

Em meio ao tur­bil­hão que con­fla­grou a política nacional, pas­sou desaperce­bido uma reunião entre a pres­i­dente Dilma Rouss­eff e diver­sos gov­er­nadores de estado para tratar da dívida impagável destes entes fed­er­a­dos. Segundo fui infor­mado existe a ideia de abater de suas dívi­das cerca de 40% (quarenta por cento). Ao se con­fir­mar as trata­ti­vas trata-​se de um grande alento para os estados.

Se é certo que os esta­dos estão em difi­cul­dades – e eles pos­suem muito mais capaci­dade de arrecadação –, a situ­ação dos municí­pios, prin­ci­pal­mente os dos nordestes é de insolvência.

Acom­panho, presto asses­so­ria e con­sul­to­ria aos municí­pios maran­henses há mais de vinte anos, con­fesso que nunca vi situ­ação tão difí­cil. Os números são ater­radores e eles não mentem.

Não há mis­tério nen­hum. Nos últi­mos anos os municí­pios veem per­dendo, anual­mente, cerca de 30% (trinta por cento) com a dete­ri­o­ração do Fundo de Par­tic­i­pação dos Municí­pios — FPM, quem lida com a admin­is­tração pública no dia a dia, sus­tenta que essa redução é bem maior.

Ainda que sejam ape­nas trinta por cento, a Con­fed­er­ação Nacional dos Municí­pios — CNM, tem um estudo sobre todos os municí­pios brasileiros, ape­nas para ficar nos mais próx­i­mos, municí­pios como, São Luís tem per­dido por ano quase 150 mil­hões de reais; Cax­ias quase 30 mil­hões; per­das idên­ti­cas sofrem Timon e Imper­a­triz. Para estes, que são grandes – emb­ora com prob­le­mas tam­bém grandes –, o impacto pode até ser mino­rado dev­ido a capaci­dade de obtenção receitas próprias.

Bem pior é a situ­ação dos municí­pios médios e pequenos, que depen­dem uni­ca­mente das receitas do FPM. O impacto destas per­das é cat­a­stró­fico. Emb­ora sig­nifique pouco para Açailân­dia perder 10 ou 11 mil­hões de reais por ano, Axixá perder 3 mil­hões, Mor­ros perder 4,5 mil­hões ou Belágua perder 2 mil­hões por ano, dese­qui­li­bra, por com­pleto, suas finanças e é isso que tem acontecido.

Emb­ora o prob­lema das per­das já tenha um efeito dev­as­ta­dor para as finanças públi­cas munic­i­pais, a situ­ação ainda é muito mais grave.

Além das per­das, a inflação de janeiro de 2012 a fevereiro de 2016, chegou a 30,46%. Tal inflação tornou os serviços e obras públi­cas muito mais caras. Qual­quer um é capaz de aferir o impacto no bolso do aumento da gasolina ou do óleo diesel nos últi­mos anos. O mesmo acon­tece com os municí­pios, se vai fazer uma obra ela se tornou mais cara, se vai fazer um trans­porte esco­lar, de pacientes, etc, não con­segue fazer ao custo que fazia antes.

Os impactos não ficam ape­nas nisso.

O salário mín­imo que tem um grande impacto na folha de pes­soal saltou de R$ 622,00 (seis­cen­tos e vinte e dois reais), em 2012 para R$ 880,00 (oito­cen­tos e oitenta reais) em 2016. Tem mais, o piso nacional dos pro­fes­sores mais que dobrou nos últi­mos anos saltando de R$ 1.024 (hum mil e vinte qua­tro reais) em 2010 para R$ 2.135 (dois mil cento e trinta e cinco reais) em 2016. Emb­ora se diga, no caso dos pro­fes­sores, que tam­bém houve um incre­mento nos val­ores repas­sa­dos pelo FUN­DEB, o impacto nas finanças públi­cas per­manece pois a maio­ria dos municí­pios só ele­vam com justeza os salários dos pro­fes­sores, mas há anos não con­seguem dar nada de aumento as out­ras cat­e­go­rias, muitas mal con­seguem gan­har o mínimo.

O resul­tado é que, como as receitas públi­cas não evoluíram na mesmo padrão das despe­sas, muito pelo con­trario, quase noventa por cento dos municí­pios brasileiros, ultra­pas­saram os lim­ites esta­b­ele­ci­dos pela Lei de Respon­s­abil­i­dade Fis­cal — LRF para os gas­tos com pes­soal. Estão todos na faixa emer­gen­cial, muitos com gas­tos de 60, 70 e até 80% de gas­tos ape­nas com pes­soal. Um ligeiro estudo mostra que os municí­pios estão em situ­ação de insolvên­cia sem con­seguirem hon­rar com­pro­mis­sos impor­tantes e urgentes.

Como é pos­sível um municí­pio que já ultra­pas­sou em muito os 51,30% com gas­tos com pes­soal, con­siga arcar com mais 112 avos de ferias, 13º salário e ainda 22% (vinte e dois por cento) de encar­gos prov­i­den­cia­rias (INSS)?

A conta não fecha.

Como disse Jesus Cristo, dêem a César o que é de César. Parte da respon­s­abil­i­dade insta­l­ada nas finanças públi­cas teve a par­tic­i­pação dos órgãos de con­t­role, tanto do TCE’s quanto do min­istério público, os estad­u­ais e o federal.

Explico: a par­tir de mea­dos dos anos noventa, com as mel­hores das intenções, cer­ta­mente, cer­raram fileiras para que os municí­pios não tivessem um servi­dor con­tratado. Todos dev­e­riam ser con­cur­sa­dos, inclu­sive aque­les, que tra­bal­hariam nos pro­gra­mas cri­a­dos e impos­tos pelo gov­erno fed­eral aos municípios.

Assim, os prefeitos foram con­vo­ca­dos a assinarem ajus­ta­mento de con­duta, comprometendo-​se a encer­rar todos os con­tratos e a fazer con­curso público, inclu­sive para os pro­gra­mas. Lem­bro que numa destas audiên­cias ques­tionei o rep­re­sen­tante do min­istério público se não estaria havendo demasi­ado aço­da­mento uma vez que se os pro­gra­mas acabassem os municí­pios não teriam como arcar com as despe­sas. Como resposta me dis­seram que isto seria impos­sível. Uma fez cri­ado um pro­grama ele não pode­ria acabar, por conta de um princí­pio lá qualquer.

A real­i­dade econômica parece igno­rar tais princí­pios e a boa von­tade destes órgãos de con­t­role: o gov­erno fed­eral já acabou com alguns, demora a fazer os repasses de out­ros e os municí­pios é que têm que arcar com tais despe­sas. Os servi­dores, quando tem o din­heiro do gov­erno fed­eral, querem gan­har como servi­dores da União, quando esta atrasa, dizem sem nen­hum [pudor, porém com acero: somos servi­dores do município.

Caso emblemático é dos Agentes Comu­nitários de Saúde. Estes servi­dores – impor­tan­tís­si­mos por sinal – ingres­saram no serviço público numa exceção con­sti­tu­cional. Hoje, querem rece­ber todas as benesses dos repasses e ainda os quin­quênios, añuênios e demais pen­duri­cal­hos do serviço público. Não dis­cuto se têm ou não razão, é até capaz que ten­ham. Acon­tece, que o gov­erno fed­eral criou situ­ações e as pas­sou para os municí­pios admin­is­trar sem que estes recebessem recur­sos para tal.

A situ­ação dos municí­pios e seus gestores é calami­tosa. Muitos não terão como fechar as con­tas, criando prob­le­mas de ordem pes­soal para si e suas equipes, levando a todos a sérios prob­le­mas no futuro próximo.

O malfeitor quer ape­nas uma des­culpa, não se quer aqui, de forma alguma, fin­gir descon­hecer a malan­dragem ou a má-​fé de muitos. Estes, inclu­sive, até se aproveitam das difi­cul­dades para tirar van­ta­gens indevidas.

Mas, por outro lado, não podemos descon­hecer a real­i­dade apre­sen­tada pelos números. Eles estão postos.

As autori­dades, dep­uta­dos estad­u­ais, fed­erais, senadores, pre­cisam se debruçar a este prob­lema com urgên­cia. A maio­ria dos atu­ais gestores cor­rem o sério risco de sairem dos seus mandatos com prob­le­mas judi­cias decor­rentes destas situ­ações, des­cumpri­mento da s metas da LRF, incon­sistên­cia nos repasses prev­i­den­ciários, etc. Emb­ora muitos ten­ham parcela de culpa, os demais não têm, são ape­nas víti­mas do achata­mento bru­tal de suas receitas e o aumento das despesas,

Urge que os órgãos de con­t­role – ao invés de só bus­carem os malfeitos nas gestões –, dev­e­riam con­vo­car, com urgên­cia, uma audiên­cia pública para dis­cu­tir e bus­car soluções para a calami­tosa situ­ação dos municípios.

Em finanças públi­cas não exis­tem mila­gres. Não é pos­sível resolver despe­sas sem receitas.

Outro dia o Min­istério Público Estad­ual divul­gou, como se tivesse feito uma grande coisa, que solic­i­tara ao Tri­bunal de Justiça a relação de gestores públi­cos con­de­na­dos em segunda instância.

A ideia do órgão min­is­te­r­ial é pedir o ime­di­ato cumpri­mento das penas. Emb­ora, pes­soal­mente, seja con­tra a decisão do Supremo em relação a questão, o que me chamou a atenção na ini­cia­tiva do MPMA é o fato dele ter solic­i­tado a relação de ex-​gestores públi­cos, muitos rep­re­sen­tantes do povo, antes de haver solic­i­tado a relação dos latro­ci­das, homi­ci­das, estupradores, etc.

Não é que não deva fazer isso. A questão posta é o grau de pri­or­i­dade. O valente min­istério público colo­cou os ex-​gestores à frente da turma toda acima referida.

O Min­istério Público, parte do Judi­ciário e dos demais órgãos de con­t­role, pre­con­ce­beram a ideia de que todo gestor público é ban­dido. Tomam tal con­ceito como ver­dade sem con­hecerem a real situ­ação em que foi mer­gul­hada a admin­is­tração pública à rev­elia dos gestores.

Claro que, como existe em toda cat­e­go­ria, como advo­ga­dos, mem­bros do min­istério público, do judi­ciário, da polí­cia, dos médi­cos, tam­bém deve haver ban­di­dos, entre os gestores públi­cos, o que não podemos é tomar tal situ­ação como regra. Sob pena de torn­ar­mos o serviço público um antro de mar­gin­ais a ponto das pes­soas sérias não pre­tenderem mais dis­putar a rep­re­sen­tação política.

O que seria a pior solução, pois aí sim entre­garíamos o serviço público ape­nas aos mal intencionados.

Diante de tudo isso alguém aí se habilita a ser prefeito?

Abdon Mar­inho é advogado.