AbdonMarinho - AUDITORIA NA DÍVIDA PÚBLICA DO MARANHÃO: UMA PRIORIDADE
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

AUDI­TO­RIA NA DÍVIDA PÚBLICA DO MARAN­HÃO: UMA PRIORIDADE

AUDI­TO­RIA NA DÍVIDA PÚBLICA DO MARAN­HÃO: UMA PRI­OR­I­DADE
Por Abde­laziz Aboud Santos

Os números da dívida pública são alu­ci­nantes. O paga­mento que o Brasil faz anual­mente, rela­cionado a juros e amor­ti­za­ção da dívida, con­some, em média, 45,11% do orça­mento fed­eral. Per­centual algu­mas vezes supe­rior ao dis­pên­dio com trans­fer­ên­cias a Esta­dos e Municí­pios (9,19%); Saúde (3,98%) e Edu­cação (3,73%).
Em artigo pub­li­cado no “Jor­nal Pequeno”, em 2014, referi-​me aos estu­dos de Lúcia Fat­torelli, em que ela demon­strava que nada menos de 42,42% da pre­visão orça­men­tária fed­eral daquele ano destinavam-​se ao paga­mento de juros e serviços da dívida pública.
Em 2015, já sabe­mos que a conta junto aos cre­dores chegará ao redor de 47%, jus­ta­mente em razão do refi­nan­cia­mento da dívida (troca de títu­los do Tesouro Nacional por out­ros títu­los), o que se traduz na prática de juros sobre juros, con­sti­tu­cional­mente proibidos, bas­tando com­pul­sar a Súmula 121 do STF, que diz, tax­a­ti­va­mente, “ainda que tenha se esta­b­ele­cido em con­trato, não pode”.
Fat­torelli foi con­vi­dada recen­te­mente para exam­i­nar a dívida pública da Gré­cia, após ter prestado exce­lente serviço ao Equador (onde reduziu a dívida em 70%), mostrando que grande parte da dívida era incon­sis­tente, muitas das quais já quitadas. A mesma coisa a audi­tora iden­ti­fi­cou na Gré­cia, for­t­ale­cendo sua con­vicção de que existe um “sis­tema da dívida”, baseado na uti­liza­ção da dívida pública como veículo para desviar recur­sos públi­cos em direção ao sis­tema finan­ceiro das grandes cor­po­rações.
Seus estu­dos sobre a dívida brasileira são bem pre­cisos e clara­mente descritos: que isso vem desde o gov­erno Fer­nando Hen­rique, pas­sando pelo de Lula e, agora, pelo da Dilma; elu­cida a balela do paga­mento da dívida externa em 2005, de 15 bil­hões de dólares (Gov­erno Lula), mostrando que o Brasil tro­cou uma dívida com juros de 4% por outra de 19% ao ano, ao leiloar títu­los do Tesouro Nacional para esse fim; demon­stra que, no mín­imo, mais de 50% da dívida pública brasileira é incon­sis­tente e incon­sti­tu­cional.
O “sis­tema da dívida” é uma das mais efi­cientes estraté­gias de manutenção e for­t­alec­i­mento do poder do cap­i­tal finan­ceiro na ordem global. Seu obje­tivo é man­ter o con­t­role sobre esta­dos nacionais a par­tir das ram­i­fi­cações de seu poder na vida política e na estru­tura econômica. O con­tínuo processo de pri­va­ti­za­ção (entrega de patrimônio estratégico) no Brasil, a exem­plo da Vale do Rio Doce, Usim­i­nas, tele­fôni­cas, empre­sas de ener­gia elétrica, hidrelétri­cas, siderúr­gi­cas, e mais recen­te­mente aero­por­tos, além dos mecan­is­mos con­denáveis de finan­cia­mento pri­vado de cam­pan­has eleitorais, com­pro­vam a tese.
Não há nada mais explo­sivo no Brasil hoje do que a epi­demia da dívida, bem mais dev­as­ta­dora que a do mos­quito, per­manecendo, con­tudo, soter­rada, “invisível”. A mídia está repleta de prob­le­mas, como inflação, saúde, edu­cação, ajuste fis­cal, cor­rupção, vio­lên­cia, e, ao mesmo tempo, fecha os olhos a fatos crim­i­nosos como o de pagar­mos, todo ano, 962 bil­hões de reais, ref­er­entes a uma dívida pública repleta de incon­sistên­cias, incon­sti­tu­cional­i­dades e, incrível, sem evi­den­ci­ação de con­tra­partidas para a pop­u­lação. Porque a política de transparên­cia pública não chega lá?
Pelos grandes números, o Brasil paga, por dia, pas­mem, nada menos do que 2,63 bil­hões de reais de juros aos cre­dores. O estoque da dívida interna, no final de 2015, era de 3,9 tril­hões de reais e da dívida externa de 545,3 bil­hões de dólares. Impos­sível sair da crise e garan­tir o futuro do Brasil sem enfrentar esse desas­tre e os seus hor­rores.
Como poder­e­mos crescer e desen­volver nossa econo­mia con­sumindo 50% do orça­mento da União em paga­mento dos juros e serviços da dívida, sem com­pro­m­e­ter­mos irre­me­di­avel­mente o pre­sente e o futuro das ger­ações mais novas? A recente história política do País mostra a talante que PSDB e PT mostraram-​se impo­tentes para enfrentar e resolver essa questão, per­manecendo sub­ju­ga­dos às grandes cor­po­rações.
Assim como a União, o Estado do Maran­hão pre­cisa audi­tar a sua dívida pública. A isto já me referi em 2014, em artigo com o título: Maran­hão: o desas­tre da dívida pública. Considero-​o ainda atu­alís­simo. O gov­erno estad­ual não só deseja, como pre­cisa, urgen­te­mente, aumen­tar a sua capaci­dade de inves­ti­mento, o que sig­nifica ado­tar essa medida com a máx­ima pri­or­i­dade.
Volto aos pon­tos cru­ci­ais da questão, desta­ca­dos em man­i­fes­tações ante­ri­ores: os resul­ta­dos pre­lim­inares da audi­to­ria que mandáramos fazer, no gov­erno inter­rompido de Jack­son Lago, deix­avam claro que a União sobre­car­regava o Tesouro Estad­ual com acessórios finan­ceiros não pre­vis­tos nos con­tratos orig­i­nais, além de terem sido iden­ti­fi­ca­dos paga­men­tos em dupli­ci­dade de encar­gos e prestações; que o Banco do Brasil, na qual­i­dade de agente finan­ceiro do Tesouro Nacional, relu­tava em con­sen­tir que hou­vesse incor­rido em erro nos juros inci­dentes sobre a dívida, pois estava desacos­tu­mado a ser inter­pelado sobre a justeza dos encar­gos que cobrava; que o Estado estaria cel­e­brando oper­ação de crédito externa com o Bank of Amer­ica e a Mer­ril Lynch (BofaML), no valor de US$-661.967.121,34, para quitação dos “resí­duos” das Leis 8727 e 9496 (Pare­cer PGFN/​COF/​Nº 1224/​2013, de 24.06.2013), e que isto se tratava de refi­nan­cia­mento de uma dívida par­cial ou total­mente já quitada.
Ao ler a entre­vista do sen­hor Gov­er­nador do Estado, recen­te­mente con­ce­dida ao “Jor­nal Pequeno”, em que mostrava o que foi pos­sível realizar em 2015, o que pre­tendia realizar em 2016, e quais as difi­cul­dades finan­ceiras por que pas­sam as finanças públi­cas estad­u­ais – só de pre­catórios atrasa­dos o Estado deve R$ 858.947.026,82 — resolvi voltar à esta questão da neces­si­dade de audi­tar a dívida pública, como sug­estão ao Gov­erno, pois entendo que esse cam­inho, a médio prazo, poderá não só alargar a min­guada capaci­dade de inves­ti­mento público, como garan­tir ao poder público a cen­tral­i­dade no processo de desen­volvi­mento sus­ten­tável do Maran­hão.
A audi­to­ria da dívida não se resume a uma mera ban­deira político-​ideológica. Não se trata da questão já super­ada de aplicar um calote nas finanças da “bur­gue­sia finan­ceira”. Audi­to­ria, em ter­mos con­tem­porâ­neos, é uma política de estado e uma estraté­gia de defesa da sobera­nia nacional, feita com todo o rigor téc­nico.
Pre­cisamos mirar o amanhã sem tirar os pés do chão. Gov­ernar um estado tão com­plexo como o Maran­hão requer capaci­dade e com­petên­cia para resolver prob­le­mas, sep­a­rando os fal­sos dos ver­dadeiros. Ger­ação de com­petên­cias, con­hec­i­men­tos, emprego, tra­balho e renda são desafios maiores que qual­quer engen­haria de poder. Não há mais como atribuir aos demônios a nossa inca­paci­dade de enfrenta­mento dos prob­le­mas estru­tu­rais maran­henses.
A esper­ança está viva, mesmo com tan­tas nuvens car­regadas de tem­pes­tades. O nosso atraso é de mais de cinco décadas, em um país desnorteado. A insta­lação do novo gov­erno estad­ual e dos 217 novos que se insta­larão em menos de um ano rep­re­sen­tam a opor­tu­nidade de saltos de qual­i­dade.
O gov­erno estad­ual assumiu em 2015 a respon­s­abil­i­dade histórica, política e cul­tural de lid­erar o novo momento que se abrirá. Só o con­seguirá, todavia, se for capaz de tra­bal­har muito e com afinco, ousar pen­sar e descon­struir a engen­haria de poder que ali­men­tou e con­tinua ali­men­tando o atraso maran­hense. Não há como superar os obstácu­los sem ten­tar tirar leite das pedras e sem afas­tar defin­i­ti­va­mente os nós cegos dados a favor dos priv­ilé­gios e dos priv­i­le­gia­dos. Audi­tar a dívida maran­hense é o começo do exorcismo.