AbdonMarinho - Pandemia ideológica.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

Pan­demia ideológica.

PAN­DEMIA IDEOLÓGICA.

Por Abdon Marinho.

UM AMIGO me manda uma fotomon­tagem com um quadro com­par­a­tivo da situ­ação da pan­demia no Maran­hão e em Minas Gerais. Indaga-​me o que acho das infor­mações ali contidas.

Em con­tra­posição, um outro amigo, por sua vez, manda idên­tica fotomon­tagem, mostrando, desta feita, o quadro com­par­a­tivo da pan­demia no Brasil e na Índia.

As duas, por assim dizer, são “provo­cações” sobre a mel­hor forma de tratar a pan­demia do coro­n­avírus que se espalha pelo mundo e que, no Brasil, virou instru­mento de uma guerra ide­ológ­ica nunca vista ou imag­i­nada em qual­quer tempo da história – é essa, a guerra política e ide­ológ­ica, ao nosso sen­tir, uma das causas de estarem ocor­rendo tan­tas mortes no Brasil.

Começando pela segunda peça que com­para a situ­ação do Brasil e a da Índia diz que aquele país, a despeito de pos­suir uma pop­u­lação de 1 bil­hão e 300 mil­hões de pes­soas, reg­is­tra números de infec­ta­dos e de mor­tos bem infe­ri­ores aos números do nosso país para ambos os que­si­tos.

Cred­i­tando isso à rígida política de iso­la­mento social ado­tada por lá, o que difere, em muito, do que defende o gov­erno fed­eral do Brasil.

Não sei em que está­gio se encon­tra a pen­e­tração do coro­n­avírus no ter­ritório indi­ano, de qual­quer modo há de se recon­hecer que só o fato de reg­is­trar, em qual­quer está­gio, os números que reg­is­tram, con­siderando as condições extrema­mente precária em que vive a maio­ria da sua imensa pop­u­lação, é digno de elo­gios.

Não há como negar, tam­bém, que todos os países que min­i­mizaram per­das humanas nesta primeira onda da doença foram aque­les que ado­taram medi­das rig­orosas de restrições e que tra­bal­haram com a testagem da pop­u­lação.

Foi assim com Ale­manha, a Aus­trália, a Nova Zelân­dia, Por­tu­gal, e mesmo a Argentina.

Por outro lado, aque­les que demor­aram a ado­tar medi­das ou apos­taram na chamada “imu­nidade de rebanho”, enfrentaram per­das humanas sig­ni­fica­ti­vas, é o caso da Itália, da França, da Espanha, do Reino Unido e dos Esta­dos Unidos.

No chamado mundo oci­den­tal ape­nas a Sué­cia não impôs restrições à cir­cu­lação de pes­soas – apo­s­tando na imu­nidade de rebanho –, e reg­is­tra um número muito alto de víti­mas se com­para­dos aos países viz­in­hos, Noruega, Fin­lân­dia e Dina­marca.

Diante disso, até aqui, pelo menos, temos por certo que o con­senso cien­tí­fico em torno do tema tem se mostrado correto.

Com relação ao primeiro quadro com­par­a­tivo referido, o que com­para a real­i­dade do Maran­hão à de Minas Gerais, entendo caberem algu­mas considerações.

A primeira delas é que difer­ente do que aponta o quadro, Minas Gerais não apre­senta um resul­tado mel­hor no com­bate ao vírus por “man­ter flex­i­bi­lizado o comér­cio”, como coloca o quadro, em con­tra­posição ao Maran­hão que man­teve (e man­tém) “restrições ao comér­cio”, e agora até implan­tou, por deter­mi­nação da justiça, o chamado lock­down, nos municí­pios de São Luís, São José de Riba­mar, Paço do Lumiar e Raposa, onde se encon­tra o maior número de casos.

Emb­ora a pre­missa no quadro com­par­a­tivo seja falsa, não foi a flex­i­bi­liza­ção no comér­cio que “impediu” a expan­são do vírus em Minas Gerais ou restrição do comér­cio a “respon­sável” pela expan­são do vírus no Maran­hão, é certo que alguém fez mel­hor o “dever de casa” do que out­ros.

Os números falam por si e não mentem.

A Orga­ni­za­ção Mundial da Saúde — OMS, declarou situ­ação de pan­demia global no dia 14 de março, já nos dias seguintes começaram as restrições no estado, aulas sus­pen­sas, ativi­dades não essen­ci­ais par­al­isadas.

Resta saber o que as autori­dades do Maran­hão deixaram de fazer – ou não fiz­eram à con­tento –, para reg­is­trar números tão des­fa­voráveis, não ape­nas em relação ao Estado de Minas Gerais, que pos­sui uma pop­u­lação três vezes supe­rior à nossa, mas, tam­bém, em relação a out­ros esta­dos da fed­er­ação, como o Rio Grande do Sul, que tem pouco mais de um terço, em relação aos casos de con­tá­gios reg­istra­dos por aqui e nem um terço dos óbitos, se com­para­dos aos nos­sos; Mato Grosso, com pouco mais de qua­tro­cen­tos casos, e pouco mais de uma dezena de mor­tos; Mato Grosso do Sul, com cerca de trezen­tos casos de con­tá­gio e uma dezena de mor­tos; ou mesmo o viz­inho estado do Piauí, que pos­sui pouco mais de mil casos de con­tá­gio e pouco mais de trinta óbitos, dez vezes menos que o reg­istrado aqui.

Além destes esta­dos, ainda merece destaque o Tocan­tins, com pouco mais de qua­tro­cen­tos casos de con­tá­gio e menos de dez mortos.

Os Esta­dos cita­dos como exem­p­los não estão aguardando o pico de con­tá­gio chegar por lá, pelo que vi na mídia, já estão, sim, ten­tando retornar à vida nor­mal – que torce­mos, seja feita com todas as caute­las necessárias para que não se tenha um recrude­sci­mento de con­tá­gio.

Emb­ora não me caiba jul­gar – ainda mais estando de fora –, talvez seja hora das autori­dades do estado avaliarem o que fiz­eram, até aqui, de errado – ou não tão certo –, a ponto de provo­car números tão des­fa­voráveis e que, infe­liz­mente, con­tin­uam subindo, enquanto vemos out­ros esta­dos já flex­i­bi­lizando as medi­das de restrições.

Com tris­teza reg­istro que ao serem com­peli­dos, pela justiça, para adotarem medi­das mais duras, como lock­down, autori­dades “fes­te­jem” por estarem na “van­guarda”.

Talvez na van­guarda do atraso.

Não vejo os mineiros, os mato-​grossenses, sul-​mato-​grossenses, ou mesmo os piauienses cobiçando nossa “vanguarda”.

Não sei se por conta da pan­demia ide­ológ­ica, chegam-​nos áudios e/​ou men­sagens de texto acu­sando o gov­erno local de não uti­lizarem (ou uti­lizarem menos do que dev­e­riam) os testes repas­sa­dos pelo gov­erno fed­eral; ou de não ado­tar (ou retar­dar) o uso da hidrox­i­cloro­quina no trata­mento dos enfer­mos, suposta­mente, para não darem razão ao pres­i­dente da República, que recomen­dou o trata­mento – ainda que sem qual­quer embasa­mento cien­tifico –, desde o inicio.

Não sabe­mos se existe qual­quer amparo para as acusações, mas por outro lado, em que pese ter­mos um sig­ni­fica­tivo número de recu­per­a­dos e a curva de con­tá­gio não seja tão ascen­dente como no Ama­zonas, Amapá, Ceará ou Per­nam­buco – só para citar os exem­p­los mais próx­i­mos –, o número de infec­ta­dos cresce assus­ta­do­ra­mente, inclu­sive no inte­rior, e os óbitos já se con­tam nas cen­te­nas.

Há bem pouco tempo – pouco mais de um mês –, quando a pan­demia começava a reg­is­trar seus óbitos no Brasil, lem­bro que quando atingiu a fatídica marca de 300 mor­tos, o gov­er­nador do estado escreveu um tuíte, dizendo que aman­hecera aquela quan­ti­dade de mor­tos na porta do pres­i­dente, sendo admoes­tado, por sua insen­si­bil­i­dade, pelo gen­eral Augusto Heleno.

Hoje, para o nosso pesar, só o Maran­hão ultra­passa essa marca. Em respeito às víti­mas e seus famil­iares jamais se dev­erá dizer que os mor­tos aman­hece­ram na porta dos Leões.

O que não fize­mos dire­ito, já que sabíamos criticar? Por que seguimos o exem­plo dos esta­dos onde os números da tragé­dia estão nas alturas ou invés de seguirmos aque­les esta­dos de forma silen­ciosa e sem alarde con­seguiram ou estão con­seguindo apre­sen­tar mel­hores resultados?

Como disse desde o iní­cio não é com pirotec­nia, excesso de pro­pa­ganda ou pros­elit­ismo politico que ire­mos com­bater a pan­demia e poupar vidas, mas, sim, com o tra­balho sério, dis­creto, trans­par­ente e sem ide­ol­o­gismo, como aquele real­izado pelos esta­dos que, até aqui, apre­sen­tam os mel­hores resul­ta­dos que os nos­sos.

As autori­dades e, prin­ci­pal­mente, a pop­u­lação talvez devesse refle­tir sobre isso.

Abdon Mar­inho é advogado.

* Os números que apare­cem nas ima­gens, como de se esperar, estão defasa­dos, rep­re­sen­tava a situ­ação naquele momento.