AbdonMarinho - AS BATATAS DOS VENCEDORES.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

AS BATATAS DOS VENCEDORES.

AS BATATAS DOS VENCE­DORES.

Por Abdon Marinho.

OS MAIS anti­gos devem lem­brar da expressão “ao vence­dor, as batatas”.

Em “Memórias Pós­tu­mas de Brás Cubas”, Machado de Assis nos apre­senta o filó­sofo Joaquim Borba dos San­tos, o autor da tese do “humanitismo”, segundo a qual somente os mais aptos sobre­vivem e enx­erga a guerra como forma de sele­cionar a espécie.

Em «Quin­cas Borba» a tese do «humanitismo» é apre­sen­tada pelo próprio filó­sofo que expõe seus con­ceitos a Rubião, per­son­agem daquela obra, diz ele: “Supõe tu um campo de batatas e duas tri­bos fam­intas. As batatas ape­nas chegam para ali­men­tar uma das tri­bos que assim adquire forças para trans­por a mon­tanha e e ir à outra ver­tente, onde há batatas em abundân­cia; mas, se as duas tri­bos dividi­rem em paz as batatas do campo, não chegam a nutrir-​se sufi­cien­te­mente e mor­rem de inanição. A paz nesse caso, é a destru­ição; a guerra é a con­ser­vação. Uma das tri­bos exter­mina a outra e recolhe os despo­jos. Daí a ale­gria da vitória, os hinos, acla­mações, rec­om­pen­sas públi­cas e todos os demais feitos das ações béli­cas. Se a guerra não fosse isso, tais demon­strações não chegariam a dar-​se, pelo motivo real de que o homem só comem­ora e ama o que lhe é aprazível ou van­ta­joso, e pelo motivo racional de que nen­huma pes­soa can­on­iza uma ação que vir­tual­mente a destrói. Ao ven­cido, ódio ou com­paixão; ao vence­dor, as batatas”.

Vez ou outra cos­tumo usar a expressão “ao vence­dor, as batatas”. Uso-​a, quase sem­pre para dizer que as vezes nos apeg­amos as míseras vitórias, con­quis­tadas a qual­quer preço, pas­sado por cima de tudo e de todos, travando-​se guerra de destru­ição con­tra “tribos-​irmãs, con­tra com­pan­heiros de ontem que, quando pré­cisá­va­mos nos esten­deu as mãos, para rece­ber as “batatas” como troféus, ante a grandiosi­dade da vida.

Pen­sava sobre isso enquanto anal­isava o resul­tado do último pleito.

A mídia e os puxa-​sacos fes­te­jando a vitória como a tribo que acabara de diz­imar a outra para ter acesso ao “vale das batatas”. No caso da vito­ria eleitoral, as gor­das ver­bas, os cala-​boca, as sinecuras ou mesmo os car­guin­hos para os par­entes e aderentes.

Para estes tudo é motivo de ale­gria e para fes­te­jar. Tanto que até per­dem a capaci­dade de análise dos números e cotejando-​os com os fatos.

Ainda no começo do ano, bem antes do iní­cio do processo eleitoral me per­gun­taram se acred­i­tava na vitória do atual gov­er­nador.

Respondi: –– E ele vai perder para quem? Só se for para ele mesmo.

Como pre­visto, a vito­ria ocor­reu ainda em primeiro turno, obtendo, o can­didato vence­dor quase 60% por cento dos votos váli­dos, ele­gendo os dois senadores e as maiores ban­cadas de dep­uta­dos fed­erais e estad­u­ais.

Ape­sar de fes­te­jarem como uma vitória “avas­sal­adora” sobre os adver­sários, um ver­dadeiro “fim da história”, não é isso que se depreende dos números e dos fatos.

Como dis­se­mos ante­ri­or­mente o can­didato ao gov­erno não teve adver­sários à altura, senão vejamos:

A can­di­data Roseana Sar­ney, que ficou em segundo lugar nas pesquisas, foi para dis­puta ape­nas “por dever de ofí­cio”, demon­strando a mesma empol­gação da tor­cida do Ibis Fute­bol Clube, con­hecido como o pior time do mundo, diante do campe­onato nacional.

Até às vésperas das con­venções acon­te­ciam apos­tas de que ela não seria can­di­data, não teria “cor­agem” para entrar.

Não bas­tasse essa “empol­gação de velório”, a can­di­data enfrenta o “peso da história” de per­tencer a um grupo politico “acu­sado” de des­man­dar no estado por cinquenta anos, ela própria tendo gov­er­nado o estado por qua­torze anos. Isso cansa.

Lem­bro que um mês antes do pleito, na bar­bearia que fre­quento na COHAB, ouvia alguns os pop­u­lares diz­erem: –– Roseana nova­mente, não, já deu. Que vote­mos em qual­quer outro.

Acho até que foi longe ao alcançar pouco mais de trinta por cento dos votos válidos.

A can­di­data que ficou em ter­ceiro lugar, ex-​prefeita Maura Jorge, emb­ora demon­strando mais inter­esse pela dis­puta, não dis­punha de tempo algum de rádio e tele­visão, não era con­hecida em todo o estado e não teve a exper­iên­cia necessária para “colar» sua cam­panha na do can­didato a presidên­cia Jair Bol­sonaro, visto serem do mesmo partido.

Emb­ora dando o desconto de que o can­didato por conta do aten­tado pas­sou o primeiro turno quase que todo inter­nado num hos­pi­tal de São Paulo, fal­tou à Maura a “sacação» para ir visitá-​lo, pegar um depoi­mento em video a seu favor e espal­har nas redes para «casar» os votos dele aos seus.

Se tivesse feito isso, talvez até tivesse chegado ao segundo turno. Com certeza teria muito mais votos que teve. Arrisco que teria mais de vinte por cento ao invés dos oito por cento que teve.

Não fez isso – não o quanto se esper­ava –, como resul­tado, os eleitores do can­didato Bol­sonoro votaram no comu­nista can­didato à reeleição. Duas pro­postas total­mente antagônicas.

O ter­ceiro can­didato do trio oposi­cionista, o senador Roberto Rocha, o único, a meu sen­tir, com condições de enfrentar o sen­hor Flávio Dino de “igual para igual”, apre­sen­tou um bom plano de gov­erno, um rumo efe­tivo para o Maran­hão, mas demorou para «engatar» na cam­panha – talvez dev­ido as prob­le­mas de saúde na família, a falta de recur­sos finan­ceiros, etc.

O certo é só foi para o enfrenta­mento con­tra o can­didato a reeleição nos últi­mos dias.

Até que teve uma inques­tionável mel­hor par­tic­i­pação no debate pro­movido pela TV Globo, mas aí já fal­tavam ape­nas três dias para o pleito, a Inês jazia morta.

Não bas­tasse a demora em “pegar» na cam­panha, o can­didato pas­sou qua­tro anos tendo sua imagem sendo descon­struída pela máquina de destruir rep­utações for­madas pelos diver­sos meios de comu­ni­cação alin­hados e/​ou sub­ven­ciona­dos pelo gov­erno e seus ali­a­dos.

Con­fesso que não esper­ava que o estrago em sua imagem tivesse sido no tamanho que foi, mas não chegou a ser uma sur­presa.

Já no iní­cio deste ano escrevi um texto inti­t­u­lado “Um senador e seus moin­hos”, onde aler­tava para as situ­ações que teria que “vencer” caso pre­tendesse ser um can­didato com alguma chance.

Infe­liz­mente, pouco ou nada chegou a fazer para mudar a pés­sima imagem que ele próprio aju­dou a con­struir, mas que foi infini­ta­mente ampli­ada por seus adver­sários nos últi­mos anos.

Como con­sid­erar como uma vitória “avas­sal­adora” uma dis­puta em que o “Exército Ver­melho” – com todos os recur­sos que só poder podem pro­por­cionar –, enfren­tou um autên­tico “Exército de Bran­ca­le­one” e só colo­cou cerca de nove pon­tos per­centu­ais para evi­tar um impre­visível segundo turno?

Acho que falta humil­dade no folguedo. Um gov­er­nador com a máquina na mão (e gov­erno é gov­erno, já dizia papai), enfrentando esse time adver­sários, só con­segue ficar a nove pon­tos do segundo turno não pode “subir nos saltos” e achar que “abafou”.

Basta ver os números de Alagoas, da Bahia, do Ceará e de Per­nam­buco.

Além do mais no último quadriênio, para chegar até aqui, sua excelên­cia, foi se aliando e abrindo as por­tas do palá­cio para notórias fig­uras da política local e seus par­tidos, muitos dos quais com pro­gra­mas abso­lu­ta­mente antagôni­cos ao do seu par­tido, sem con­tar os históri­cos expoentes do grupo Sar­ney.

Foi assim com o dep­utado Maran­hãoz­inho e seu PR; com o dep­utado Rezende e seu DEM; com o dep­utado Fufuca e seu PP; com o dep­utado Fer­nan­des e seu PTB; com o ex-​deputado Gastão Vieira do PROS, o prefeito Luís Fer­nando, e tan­tos out­ros.

Alguns destes o governador/​candidato ergueu suas mãos e os “apre­sen­tou” como as mel­hores pes­soas para acompanhá-​lo.

Mas não é só, segundo os opos­i­tores, para con­seguir essa “magra” vitória a chapa gov­ernista teria cometido uma série de abu­sos e ilíc­i­tos que já estão sendo – e out­ros que serão –, dis­cu­ti­dos per­ante a Justiça Eleitoral.

Com tudo isso, só ficou a nove pon­tos da “nota de corte” do segundo turno, e ainda teve uma votação nom­i­nal infe­rior ao do seu can­didato a senador, o não menos notório dep­utado Wev­er­ton Rocha, pres­i­dente do PDT local.

Como con­selho, talvez sua excelên­cia devesse con­sid­erar que, bem difer­ente do que alardeia, não faz um bom gov­erno, e que os cidadãos de bem não aprovam muitas de suas ati­tudes tais como o vale tudo político/​eleitoral; a “ingratidão” em relação ao ex-​governador José Reinaldo; a política trib­utária que aumen­tou os impos­tos sobre os menores, mas que ben­efi­ciou ape­nas um ou dois gru­pos econômi­cos; a política de “tomar” os veícu­los dos cidadãos que por uma ou outra razão atrasaram o paga­mento dos impos­tos e taxas, bem como, inscrevê-​los, por conta disso, nos órgãos de pro­teção ao crédito.

Difer­ente do que é ven­dido para o público interno e externo, a mis­éria no Maran­hão só aumen­tou nos últi­mos anos, esta­mos na rabeira de quase tudo quanto é indi­cador social e de desen­volvi­mento, con­tin­u­amos sem pro­duzir quase nada, sem gerar riquezas e com uma grande parcela da pop­u­lação sobre­vivendo de esmo­las – isso num estado tão rico quanto o nosso.

Quem teve a opor­tu­nidade de, na sexta-​feira ante­rior ao pleito, assi­s­tir ao pro­grama Globo Repórter, da Rede Globo, teve a opor­tu­nidade de ver um pouco da real­i­dade de muitos dos nos­sos municí­pios: uma estrada só de “puaca” no verão e lama no inverno, levando a uma escola sem qual­quer tipo de estru­tura de ensino; viu tam­bém cri­anças con­duzindo jumen­tos por quilômet­ros para fazer chegar em casa a água de beber, coz­in­har, etc. e mul­heres lavando rouba numa espé­cie de “bica” cole­tiva.

Essa é a real­i­dade de uma grande parcela da pop­u­lação do inte­rior mas, tam­bém, das per­ife­rias da cap­i­tal e out­ros cen­tos.

Como disse no iní­cio do ano: sua excelên­cia gan­hou porque não tinha para quem perder. Se tivesse, o resul­tado talvez fosse bem outro.

Ainda assim, ao vence­dor, as batatas.

Abdon Mar­inho é advo­gado.