AbdonMarinho - OS IDOSOS E OS JOVENS ANCIÃOS.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

OS IDOSOS E OS JOVENS ANCIÃOS.

OS IDOSOS E OS JOVENS ANCIÃOS.

Por Abdon Mar­inho.

OUTRO DIA, pela segunda vez, vi uma fotografia e uma reportagem depre­cia­tiva sobre o grupo político que apoia a ex-​governadora Roseana Sar­ney. Lis­tavam os nomes, um a um, com a respec­ti­vas idades para discriminá-​los por isso, pelo fato de terem, 60, 70, 80 ou 90 anos.

Nen­hum tipo de pre­con­ceito merece con­sid­er­ação – e deve­mos repu­diar a todos –, entre­tanto, ao meu sen­tir, o pre­con­ceito pela idade me parece o mais imbe­cil, uma vez que todos nós, um dia, ser­e­mos idosos. Quer dizer, os que tiverem sorte de chegar lá.

O saudoso jor­nal­ista Wal­ter Rodrigues, que se vivo fosse já estaria se aprox­i­mando dos setenta anos, cos­tu­mava dizer – e com ele con­cor­dava inteira­mente –, que as repri­men­das dev­e­riam recair sobre as ati­tudes das pes­soas, o bem ou mal, que ten­ham prat­i­cado e não sobre as condições sobre as quais o crit­i­cado não tenha responsabilidade.

Com isso quer se dizer que, como já o disse certa vez Rui Bar­bosa, que os canal­has tam­bém envel­he­cem, mas a crítica se dev­ida é pela canal­hice, jamais pela idade.

Assim como o fato de alguém ser jovem não o torne imune da prática de deli­tos ou con­du­tas ver­gonhosas.

Idade nada tem a ver com o caráter ou crimes que um ou outro possa cometer.

O mesmo val­endo para todas as demais condições, seja cor, raça, gênero, defi­ciên­cia, etc.

Cer­ta­mente aque­les que chegaram até aqui na leitura e que acham bonito criticar pes­soas por serem elas idosas, mul­heres, negros, homos­sex­u­ais (ou o resto da sopa de letrin­has), defi­cientes, estarão me chamando, ainda que inter­na­mente: “— esse alei­jado, filho de uma égua!”.

Não ligo. Só inco­moda o fato de não respeitarem minha santa mãez­inha que nada tem a ver com o que escrevo e que já nos deixou há mais de quarenta anos.

Gosto muito de con­ver­sar e de tra­bal­har com pes­soas de idade mais avançada – é uma chance de apren­der –, recomen­dando sem­pre aos meus cole­gas o máx­imo de atenção, diligên­cia e paciên­cia. Cos­tumo dizer: — enten­dam que as causas dos idosos têm mais pri­or­i­dade porque eles já não têm muito tempo para esperar. Com­preen­dam isso!

Idade cronológ­ica nunca foi sinôn­imo de atraso, pelo con­trário, muita das vezes, pela exper­iên­cia acu­mu­lada, é até uma forma de ver as coisas com uma visão mais arguta e com tol­erân­cia de quem já pas­sou por diver­sas situações.

Não faz muito, a velha democ­ra­cia amer­i­cana, através do seu Poder Judi­ciário, deter­mi­nou que o pres­i­dente Don­ald Trump, 71 anos, não pode­ria blo­quear os seguidores na sua conta do Twit­ter. No entendi­mento da justiça, se ele usa essa rede social para divul­gar suas ideias, para os seus e para o mundo, não pode impedir que tais ideias e pen­sa­men­tos sejam crit­i­ca­dos pelos que deles dis­cor­dam.

Numa espé­cie de coin­cidên­cia reversa, aqui, no “mod­erno” Maran­hão, leio uma nota do Sindi­cato dos Poli­ci­ais Civis onde acusam o jovem gov­erno maran­hense de impedir seu protesto con­tra a política gov­er­na­men­tal numa placa de out­door.

Segundo o sindi­cato, o gov­erno teria “obri­gado” a empresa respon­sável a reti­rar a crítica feita, sob pena de perder o espaço de veic­u­lação e ter a própria placa – o meio físico –, reti­rada do local.

Em sendo ver­dade, esta­mos diante de algo muito “avançado”, “mod­erno”, estre­ita­mente em con­sonân­cia com o espírito de “jovi­al­i­dade” dos atu­ais gov­er­nantes, SQN, na lin­guagem dos jovens: “só que não”.

Ainda na esteira da decisão judi­cial sobre Twit­ter do pres­i­dente amer­i­cano, me veio à lem­brança a infor­mação de um blogueiro de que ele fora “blo­queado” por um órgão do gov­erno, no caso o PRO­CON. Foi necessário um outro colega dele reclamar/​denunciar ao próprio órgão o absurdo da con­duta para que blogueiro/​bloqueado voltasse a inter­a­gir com o órgão.

A história é inter­es­sante porque os nos­sos “jovens” gov­er­nantes são ardentes críti­cos dos Esta­dos Unidos, a quem acusam de impe­ri­al­ismo, opres­sores aos povos do mundo, entre­tanto lá, ate a conta pes­soal do pres­i­dente pode ser crit­i­cada enquanto que por aqui, como no exem­plo citado, mesmo os órgãos públi­cos se acham no dire­ito de cen­surar a crit­ica livre dos cidadãos. Nem se fale que nas con­tas pes­soais – são cor­rentes as notí­cias –, não gostando do que leram blo­queiam sem a menos cer­imô­nia ou con­strang­i­mento.

Não bas­tasse isso, ten­tam calar quais­quer críti­cas através de infini­tas ações judi­ci­ais – ainda que desproposi­tadas. Muitas, com o claro propósito intim­i­datório, uma vez que mesmo que a crit­ica seja legit­ima e reg­u­lar, o jor­nal­ista, blogueiro, escritor, “gas­tará” tempo e recur­sos para se defender. Tempo, esse, sub­traído do tra­balho de pesquisa, do tempo que pode­ria ser investido noutras críti­cas na defesa da sociedade.

Este é o papel dos jor­nal­is­tas: serem fis­cais da sociedade, inves­ti­gando e denun­ciando os abu­sos dos gov­er­nantes.

Estran­hamente, emb­ora “mod­er­nos” não con­seguem enten­der isso é, por isso mesmo, os reprimem e perseguem.

Será que no mundo civ­i­lizado exista algo mais arcaico que a cen­sura e a intim­i­dação àque­les que criti­cam ou opinam des­fa­vo­rav­el­mente aos que se acham “donos do poder”?

Será que podemos ter como “novo” mod­e­los de opressão que tenta impin­gir aos cidadãos que vivam de joel­hos, sem poderem, sequer, se man­i­festarem livremente?

Entendo que não. Daí o reafir­mar que a idade cronológ­ica de uma pes­soa não torna “nova” ou “velha” na definição do que seja práti­cas aceitáveis de respeito à boa con­vivên­cia entre os povos, o respeito à liber­dade dos cidadãos e à própria democracia.

Ao longo da vida sem­pre vi e con­vivi com pes­soas que ape­sar da idade cronológ­ica avançada tin­ham ou têm uma con­cepção do seja democ­ra­cia, do que seja liber­dade, do que seja respeito, bem mais aceitável e razoável do que vimos na prática cotid­i­ana destes “jovens anciãos” com os quais con­vive­mos na atu­al­i­dade.

Vi, não faz muito tempo – e até escrevi sobre o assunto –, posando sobre uma máquina de asfalto, em uma obra, diver­sas jovens autori­dades – mais velha não se afa­s­tando muito dos cinquentenário. Todos fazendo sinal de “pos­i­tivo” ou “V” da vitória, num claro abuso político e de autori­dade, vez que era uma chapa com­pleta majoritária (lançada pub­li­ca­mente recen­te­mente) e mais três can­didatos pro­por­cionais.

Ora, existe algo mais ultra­pas­sado que tais práti­cas? Este é o exem­plo que os jovens políti­cos querem legar à pos­teri­dade? O exem­plo do abuso e do vício? É assim mesmo? Essa é a jovem classe política que nos levará ao futuro?

São jovens anciãos, que não se despren­dem das vel­has práti­cas, dos vel­hos preconceitos.

Por estes dias, tam­bém, o Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, negou segui­mento a uma ação de uma jovem sen­hora, esposa de um jovem dep­utado fed­eral, pro­posta con­tra um jovem senador da República.

A ação em tela era por suposta ofensa à sua moral. A questão de fundo, como lebram, foi uma declar­ação do senador dizendo não enten­der as críti­cas à sua pes­soa, pro­feri­das pelo dep­utado fed­eral e o pres­i­dente do seu par­tido, uma vez que sem­pre “torceu pela feli­ci­dade do casal”, aludindo, obvi­a­mente, a uma suposta relação homoafe­tiva entre ambos.

Por ocasião dos fatos, tratei do assunto no texto “A Ofensa Gay”, onde explico enten­der como absurdo quem em pleno século 21, quando as pes­soas tanto falam em liber­dade e respeito às diver­si­dades, ten­hamos um senador da República suposta­mente aludindo a uma relação homos­sex­ual para desmere­cer e, pior que isso, que os supos­tos “ofen­di­dos” ten­ham encar­ado a tal alusão como ofensa.

Por a caso, dizer que alguém é gay e man­tém uma relação homoafe­tiva é algo indigno a ponto de um senador da república dizer e o dep­utado (e seus famil­iares) rece­ber como ofensa à tal assertiva e ir bater às por­tas do STF recla­mando? Como ousam ofend­erem tan­tas pes­soas por sua condição sex­ual e depois virem pedir seus votos?

Pois é, assim pen­sam nos­sos “jovens anciãos”. Dizem que são mod­er­nos, atu­al­iza­dos, mas volta e meia “deslizam” nos próprios pre­con­ceitos. E, pior, não se dão conta disso. Bem fez o STF ao rechaçar o arremedo de ação pela ile­git­im­i­dade e ausên­cia de justa causa.

Tive a sorte da con­vivên­cia com muitos idosos que a despeito da idade cronológ­ica avançada, davam – e dão –, de dez a zero em muitos destes jovens pre­sos e escrav­iza­dos às vel­has práti­cas e pre­con­ceitos do pas­sado. Ainda cri­ança adquiri o gosto pela leitura e pelo pen­sa­mento crítico com uma jovem sen­hora de quase oitenta anos.

Encerro dizendo que mim é mais saudável a con­vivên­cia com idosos jovi­ais do que com jovens anciãos.

Viva a mel­hor idade!

Abdon Mar­inho é advo­gado.