A RESPONSABILIDADE DOS PARTIDOS NA SOLUÇÃO DA CRISE.
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- Criado: Domingo, 14 Janeiro 2018 17:08
- Escrito por Abdon Marinho
A RESPONSABILIDADE DOS PARTIDOS NA SOLUÇÃO DA CRISE.
Por Abdon Marinho.
UMA notícia que li outro dia chamou-me a atenção para o tema que trago à discussão no texto hoje.
Pois bem, desde que a atual crise econômica, política, social e judiciária eclodiu, um debate tem se tornado recorrente, sobretudo pelas pessoas mais ilustradas: a crise precisa ser resolvida pela política. Isso quer dizer, sem golpes de Estado, sem intervenção militar, sem qualquer outra intervenção, que não a livre manifestação dos cidadãos, através do voto, na solução dos conflitos.
Corroborando com a ideia de que a crise precisa ser solucionada pela “Política”, esta com “P” maiúsculo, surge uma reclamação, em tons desafiadores: a necessidade de se colocar fim ao que ficou conhecido como a “criminalização da política”.
Diante disso temos um questionamento: existe a tal da “criminalização da política” ou existem políticos criminosos usando do poder político, por infindáveis anos, para escaparem impunemente?
Não tenho dúvidas que estamos diante de uma questão de larga complexidade, uma vez que incidência de criminosos dentro da atividade política é tamanha – acredita-se ser possível contar nos dedos das mãos o número de políticos honestos –, que fica-se com a impressão de que a atividade política, em si, é criminosa.
Dito de outra forma: são tantos criminosos na política que a população, os eleitores, chegam a confundir a Política, como espaço de solução para os problemas da nação, estados e municípios, com a pessoa do político, este cada vez mais preocupado – e se ocupando –, na solução dos seus problemas, seja levar vantagens nos negócios públicos ou privados, seja buscando a proteção do poder por conta dos crimes já cometidos ou a cometer.
Um amigo, político, confidenciou-me: muitas vezes ouvira do pai – e também da mãe –, que em poucas décadas não se encontraria pessoas “de bem” dispostas a se candidatarem a cargos públicos eletivos.
Como profecia ruim do Brasil tem quase data certa para ocorrer, chegamos a este quadro lamentável: as pessoas boas e competentes não querem saber de candidatar-se a qualquer cargo, de vereador a senador.
Tal ojeriza abre espaço para toda sorte de arrivistas, criminosos e essa chusma que, não servindo para outra coisa, nada que valha, resolveram conduzir os destinos da nação.
Este ano de 2018, ano de eleições gerais, teremos a chance de comprovar o quanto a atividade política tornou-se um antro de criminosos.
O pior é que a infiltração de criminosos na política já não ocorre mais como uma atividade solitária, hoje temos grupos criminosos organizados se preparando para tomar o poder, fazendo isso através de interpostas pessoas, financiando suas campanhas ou colocando seus próprios integrantes na disputa.
Neste cenário desolador é que se faz necessário o chamamento dos partidos políticos à razão na solução da crise em que estamos envolvidos, partindo do pressuposto de que acreditamos – e até pregamos –, que crise deva ser resolvida pela Política.
Resta claro que para “descriminalizar a política” o primeiro passo é fomentar a participação de pessoas “de bem” nos pleitos e, concomitante a isso, afastar os criminosos da disputa.
No sistema brasileiro temos a vantagem (?) de não serem permitidas candidaturas avulsas, logo, caberá aos partidos políticos a responsabilidade de “filtrar”, inicialmente, os nomes que colocará para disputa, dificultando o ingresso de pessoas, que se sabe, não terão compromissos com a sociedade ou mesmo com o ideário que o partido defende.
Os partidos políticos precisam de rigor na escolhas de seus integrantes de sorte a impedir que pessoas sem afinidade com suas posições na solução dos conflitos sociais e políticos, elejam-se sob suas legendas.
Se queremos que as crises sejam resolvidas dentro da “Política”, qual seja, através de representantes eleitos diretamente pela população precisamos que os partidos tenham responsabilidade na escolha de seus integrantes e, ainda, que deixem claro para a população as propostas que defenderão na eventualidade de eleição de seus representantes para as casas legislativas e para os cargos executivos.
Pois bem, feitas estas considerações, retorno à notícia que motivou o presente texto e que vem na mais absoluta contramão do que foi exposto acima: a ideia de se resolver a crise nacional através da “Política” com “P” maiúsculo.
Dizia a referida notícia que importante secretário estadual, uma espécie de coringa da atual gestão, estaria na iminência de filiar-se ao Partido Democratas — DEM, com o propósito de trazê-lo para o arco de alianças do Partido Comunista do Brasil — PCdoB, que prepara-se para disputar a reeleição no estado. De quebra ainda se livrariam da incômoda pretensão de certo ex-governador, pré-candidato ao Senado da República que corteja e é cortejado pelo Democratas há bastante tempo.
Nesta ilação, o secretário, filiado ao DEM seria candidato a vice-governador ou mesmo senador.
Tratar-se, por óbvio de apenas uma maldosa ilação – por isso mesmo até evito colocar o nome do secretário para não expô-lo –, não faz qualquer sentido – a menos que se negue, totalmente, o que seja Política como solução dos conflitos sociais –, uma coligação entre Democratas e Comunistas.
Vou além, não faz sentido, sequer que um apoie o outro, menos ainda que dividam uma chapa majoritária seja na chefia do Governo, seja na chapa do Senado.
Caso tal absurdo tivesse fundo de verdade, estaríamos diante de um estelionato eleitoral histórico.
Um ou outro partido ou ambos, estariam enganando seus adeptos e eleitores.
Seria a negação, para os dois partidos, da ideia de que possuem alguma consistência ideológica.
Por isso mesmo custo acreditar que tenham cogitado tal ideia. Daí, minha incredulidade.
Os dois partidos são, em tudo, opostos com visões de mundo, economia, sociedade, de governo inconciliáveis.
Numa análise histórica da política nacional sempre estiveram em campos distintos. Mesmo na história recente, a partir de 1964, do século passado, enquanto um tem origem na agremiação que sustentou o régime, a ARENA ou outro, na clandestinidade, se abrigava no partido opositor, o velho MDB.
Estão, matematicamente falando, a cento e oitenta graus de distância um do outro. Usando uma alegoria da infância seria como se acreditar no casamento do Sol com a Lua.
O primeiro item do ideário do DEM é o compromisso com a liberdade sob todas as formas. Ainda ontem, mais precisamente em novembro, o PCdoB, reafirmou seu “apoio e solidariedade” as ditaduras comunistas da China, Coreia do Norte, Cuba, Laos e Vietnã; e, ainda, ao régime de Nicolás Maduro que oprime e destrói a Venezuela e sua população, a qual mata de fome na promessa de libertá-la.
Um é contra a excessiva atividade estatal na economia, já o outro, não é só estatista, é a favor do fim da iniciativa privada e advoga pela coletivização das riquezas e dos meios de produção.
Enquanto um defende a atividade planificada, estatista e coletivista o outro já defende a liberdade criadora individual.
E por aí vai, são dois partidos cuja os ideários são diametralmente opostos, repito.
Não existindo, portanto, qualquer ponto em comum capaz de justificar uma união entre ambos. Basta pegar os programas, ideários e manifestos das agremiações para verificar que o simples fato de um partido apoiar o outro já significa uma “traição” aos seus filiados e simpatizantes a reclamar, inclusive, intervenção judicial.
Aliás, esta é uma ideia que ofereço ao Ministério Público Eleitoral e à Justiça Eleitoral: que intervenham no sentido de impedir as alianças programaticamente incompatíveis. Será uma forma de combater o fisiologismo político tão danoso à representação política.
Claro, não podemos deixar de considerar que a Constituição Federal assegura ampla liberdade de organização partidária, inclusive a relativa à política de alianças, entretanto, não é aceitável que partidos defensores de ideias opostas se coliguem para vencerem eleições enganando o povo – que é o detentor do poder originário –, pois isso representaria uma fraude ao direito dos cidadãos escolherem um conjunto de ideias para verem implementadas no país, Estados ou municípios.
Vejam o absurdo: o cidadão se elege por um partido que defende determinadas ideias tendo por vice alguém cujo o partido defende o oposto daquelas ideias. O que servirá de norte para escolha do eleitor?
Vamos além: e se o titular morrer (toc, toc, toc, na madeira três vezes), será implantada o ideário do partido do titular ou do vice que herdou mandato?
Se as pessoas realmente sábias que eu acreditam ser possível resolver as crises que o país vem vivenciando ao longo dos séculos, através da política, faz-se necessário que esta atividade seja levada a sério, com compromissos claros, por parte dos representantes legitimamente eleitos.
Se pacto social será através da política é necessário que se evite a infiltração dos marginais e que tenhamos regras claras.
O eleitor precisa ter a garantia que estará escolhendo pessoas sérias, filtradas pelos partidos, para defenderem um conjunto de ideias previamente estabelecidas.
Sem isso continuaremos emendando uma crise na outra e com políticos com a consistência ideológica de uma ameba, sem querer desrespeitar as amebas, claro.
Encerro contando um dos causos que vivi e que está relacionado ao tema.
Após as eleições, ao chegar em determinado município, perguntei o que acontecera com determinada pessoa que pensei estar apoiando o grupo.
— Ah, doutor, o senhor não vai acreditar. Descobrimos que fulano era melancia?
— Melancia!?? Como assim? Indaguei sem entender.
— Sim, doutor, melancia. Descobrimos que ele só era verde (a cor da campanha) por fora, por dentro era vermelhinho (a cor da outra campanha).
Ri da história e fiquei matutando sobre ela. No quanto ainda estamos distantes de uma verdadeira democracia.
Um conselho que me permito aos leitores eleitores é que fiquem atentos a flora e fauna política: os candidatos melancia, os jabuticabas aos jabutis trepados em árvores.
Abdon Marinho é advogado.