AbdonMarinho - O MARANHÃO SEM MEDO DO RIDÍCULO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O MARAN­HÃO SEM MEDO DO RIDÍCULO.

O MARAN­HÃO SEM MEDO DO RIDÍCULO.
QUANDO menino lá no meu sertão, ouvia dos mais vel­hos que, quando o mundo estivesse perto do fim, veríamos a roda grande pas­sar por den­tro da pequena.
Andamos perto de ver isso ocor­rer com a inusi­tada decisão do dep­utado Waldir Maran­hão (PP/​MA), de anu­lar a decisão do plenário da Câmara dos Dep­uta­dos que admi­tiu a aber­tura de processo de impeach­ment con­tra a sen­hora Dilma Rouss­eff, ainda pres­i­dente da República.
A exdrúx­ula decisão de Maran­hão não tem efeito prático algum para o processo de impeach­ment, sequer foi lev­ada em conta pela classe política nacional. Não se trata de posição refratária dos que dela discordaram.
Vejamos, como seria pos­sível uma decisão solitária de um par­la­men­tar tornar nula a decisão da Câmara dos Dep­uta­dos ado­tada por seu plenário por quo­rum qual­i­fi­cado, mais de dois terços, mais pre­cisa­mente 367 par­la­mentares? Como pode­ria decidir sobre um processo já recep­cionado e aprovado por Comis­são Espe­cial do Senado da República? O dep­utado maran­hense pecou na forma e no con­teúdo. Uma dupla incom­petên­cia man­i­festa. Inclu­sive no sen­tido literal.
Se não tem efeito prático para o processo – o pres­i­dente do Senado, inclu­sive já deliberou pelo não con­hec­i­mento da decisão, os min­istros do Supremo têm deci­dido de forma reit­er­ada sobre a reg­u­lar­i­dade da trami­tação do mesmo –, teve o condão de virar uma piada instan­tânea. Por onde pas­sei ouvi as tiradas mais inusi­tadas. De um ouvi que Maran­hão teria acatado recurso do Brasil e anu­lado a der­rota de 7×1 da Ale­manha; de outro que acatara recurso do Botafogo e tomara o título do Vasco da Gama, con­quis­tado no último final de sem­ana; outro que vai anu­lar o jogo do Sam­paio Cor­reia con­tra o Moto; um outro que anu­lará o título do Botafogo con­quis­tado em 1910. Há quem sur­gira que poderá revogar a Lei da Gravidade.
Virou gal­hofa, o ridículo manifesto.
As primeiras notí­cias dão conta que o pres­i­dente interino da Câmara, que é vet­er­inário de for­mação, não se acon­sel­hou com a asses­so­ria da Casa, recon­hecida por sua com­petên­cia, antes, segundo dizem, bus­cou inspi­ração com o advogado-​geral da União, Eduardo Car­dozo e com o gov­er­nador do Maran­hão, Flávio Dino. Isso é o que dizem.
Em uma página atribuída ao gov­er­nador, con­sta como tendo dito que nada mais nat­ural que o dep­utado, seu ali­ado, tenha pedido sua opinião sobre a decisão que tomaria. Sendo ver­dade, não deixa de ser sur­preen­dente. Chego a duvi­dar que uma patus­cada deste naipe tenha tido o con­sór­cio de dois pro­fes­sores de dire­ito, até então «ven­di­dos» como dos mais inteligentes.
Se foram con­sul­ta­dos, o lógico seria que dissessem que a ideia do dep­utado, se foi mesmo dele, não tinha pé nem cabeça, pelas razões já dis­cor­ri­das acima.
Será que pen­savam que esse tipo de manobra infan­til pros­per­aria? Por que não o acon­sel­haram a desi­s­tir do ridículo papel que faria com a ten­ta­tiva de atro­pelar um processo em fase tão avançada e já dis­tante da seara da Câmara?
Se o trio esteve con­sor­ci­ado na ideia, fico pen­sando o teria pas­sado por suas cabeças, se é que pas­sou algo.
Será que acharam ser razoável um único par­la­men­tar anu­lar um processo findo e já na outra casa do con­gresso? Pior que acharam.
Os meios de comu­ni­cação infor­mam que não ape­nas acharam razoável, como o advogado-​geral da União, con­ver­tido em advo­gado da sen­hora Dilma Rouss­eff, pas­sou o fim de sem­ana pres­sio­n­ando pela decisão favorável à presidente.
A lou­cura rev­ela não ape­nas falta de con­hec­i­mento jurídico, mas, sobre­tudo, de bom-​senso.
O resul­tado é o que esta­mos teste­munhando: a decisão sendo tratada como o maior «mico» da história do Con­gresso Nacional, sendo tratada com indifer­ença, iro­nia, indig­nação, uma pisada de bola, uma piada de salão.
A afronta poderá aumen­tar o número de votos já favoráveis ao imped­i­mento da ainda presidente.
Noutra quadra a comem­o­ração pre­coce de líderes gov­ernistas rev­ela o quanto o deses­pero se aba­teu sobre os que hoje estão no poder.
Se o dep­utado maran­hense ten­tou uma última car­tada para ben­e­fi­ciar o gov­erno, pelo nível reações que se viu, não deu certo. O Senado vai prosseguir com o processo igno­rando a decisão de Maran­hão e os mer­ca­dos viram que a decisão não era «séria».
Mas, como tudo na vida, ainda que não tenha con­seguido seu intento a decisão de Maran­hão, terá con­se­quên­cias, a começar pelo escrutínio que a mídia e seus pares farão da sua ati­tute, impen­sada e/​ou mal acon­sel­hada. Já começaram por desco­brir que um filho do dep­utado seria fun­cionário fan­tasma. Pior, fun­cionário fan­tasma do Tri­bunal de Con­tas do Estado. Trata-​se de algo muito sério.
O TCE tem sido rig­oroso com os erros dos gestores munic­i­pais. Se um prefeito con­trata uma pes­soa sem as dev­i­das for­mal­i­dades, têm as con­tas rejeitadas. Como admi­tir que o próprio tri­bunal con­trate uma asses­so­ria de alguém que mora noutro estado e com ativi­dades e for­mação oposta ao que se espera de um tri­bunal de con­tas? O Min­istério Público Estad­ual, tão cioso, deixará pas­sar «equívoco» de tamanha monta? Casa de fer­reiro espeto de pau? O din­heiro será devolvido? Os respon­sáveis serão punidos?
Out­ras con­se­quên­cias dizem respeito ao próprio Maran­hão. Será que con­seguirá se man­ter no cargo de vice-​presidente e Câmara, cargo que per­tence ao par­tido? Será que con­seguirá se man­ter no par­tido depois desta patus­cada? Será que con­seguirá se man­ter no mandato?
São per­gun­tas rel­e­vantes. Não resta dúvida que o pres­i­dente extrapolou de suas funções reg­i­men­tais; que desre­speitou o con­junto dos par­la­mentares e incor­reu, cer­ta­mente, em ofensa ao decoro.
A cane­tada intem­pes­tiva de Maran­hão vai além de atin­gir a si próprio, pes­soas e insti­tu­ições já referi­das, ela alcança, tam­bém, os con­sor­ci­a­dos na decisão, o advogado-​geral Eduardo Car­dozo, já visto com reser­vas pelo mundo jurídico e, prin­ci­pal­mente, o gov­er­nador Flávio Dino, que, ao menos em tese, con­duz um «ali­ado» ao cadafalso político, isso, sem falar na sua própria biografia jurídica ao defender uma decisão tão desproposi­tada. Ao que parece o ridículo de Maran­hão, o dep­utado se esten­deu ao próprio Maran­hão, o estado.
Abdon Mar­inho é advogado.