AbdonMarinho - O TESTE DE FOGO DA DEMOCRACIA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O TESTE DE FOGO DA DEMOCRACIA.

O TESTE DE FOGO DA DEMOC­RA­CIA.
Aden­trava a sala de sessões do TRE/​MA quando um jovem advo­gado cobrou-​me uma posição sobre impeach­ment da pres­i­dente da pres­i­dente da República Dilma Rouss­eff: – Dr., esta­mos esperando seu artigo sobre a polêmica do impeach­ment.
Lem­brei ter tratado deste assunto ainda no ano pas­sado. Fi-​lo por ocasião das descober­tas da oper­ação da Polí­cia Fed­eral na Oper­ação Lava Jato e tam­bém diante da pro­posta do gov­erno em burlar a lei orça­men­taria anual para garan­tir, arti­fi­cial­mente o cumpri­mento das metas fis­cais de super­avit. Tudo com a garante situ­ação de haver um decreto condi­cio­nando a lib­er­ação de emen­das par­la­mentares à aprovação da arti­manha con­tá­bil.
Após a posse da pres­i­dente, as medi­das econômi­cas ado­tadas na con­tramão do que fora prometido durante o pleito, os desac­er­tos políti­cos e econômi­cos e as provas de cor­rupção con­t­a­m­i­nando todo o gov­erno, trás de volta a ideia de um pos­sível processo de impeach­ment à ordem do dia.
Pare­cer do ilus­tre advo­gado Ives Gan­dra Mar­tins sus­tenta a tese do imped­i­mento. Fazendo com que o assunto, antes dis­cu­tido em cír­cu­los fecha­dos, gan­hasse o debate das ruas.
Na opor­tu­nidade em tratei do assunto, assim como agora, entendo a man­datária da nação preenche os req­ui­si­tos da Lei 1.079÷54. Acho impos­sível que ten­ham feito o que fiz­eram com a Petro­bras e não só lá, sem o con­hec­i­mento dos gov­er­nantes, prin­ci­pal­mente a pres­i­dente da República, que já ante de sê-​lo, fora min­is­tra de minas e ener­gia e chefe da casa civil, cumu­lando, em ambos os car­gos, a presidên­cia do Con­selho de Admin­is­tração da Empresa. Ao menos, em tese, have­ria motivo para a aber­tura do processo.
Ainda que muitos sus­ten­tem a neces­si­dade da prática de um ato de impro­bidade resta claro que não houve zelo na guarda e no emprego dos din­heiros públi­cos, preenchendo um dos tipos da lei, de um total de oito.
Outro argu­mento con­tra o proces­sa­mento da man­datária é que os fatos são todos ante­ri­ores ao atual mandato.
Ora, a lei, de 1954, não pre­viu a hipótese da reeleição, uma real­i­dade no país há quase vinte anos. Emb­ora a cor­rupção, dizem as provas, tenha acon­te­cido até o ano de 2014, mesmo depois das inves­ti­gações.
O entendi­mento cria a situ­ação de se ter uma autori­dade que tendo prat­i­cado atos de impro­bidade ou não tendo zelado o din­heiro público, durante o primeiro mandato, se reeleito, saia ileso do processo político sob esse argu­mento. Essa é a tese da eleição/​esponja, serve para apa­gar tudo.
São teses jurídi­cas respeitáveis a favor e con­tra o processo de imped­i­mento da man­datária.
O debate sobre o assunto, fato nor­mal em qual­quer democ­ra­cia não pode gan­har ares de escân­dalo no Brasil. Mem­bros do par­tido do gov­erno acusam a oposição e os que defen­dem a tese do impeache­ment de “golpis­tas”.
Qual a razão de chamar de golpe uma man­i­fes­tação legit­ima da sociedade e até mesmo da oposição? Se fiz­er­mos uma com­para­ção justa, os fatos de hoje, são infini­ta­mente mais graves do que aque­les dos anos 199192 e que levaram o ex-​presidente Col­lor a ser proces­sado e cas­sado.
Aliás, os mes­mos que hoje dizem ser golpe con­tra a democ­ra­cia os protestos con­tra os gov­er­nantes são, pelo menos grande parte deles os que saíram às ruas com a cara pin­tada pedindo a cas­sação de Col­lor – numa iro­nia que só a vida é capaz de brindar o homem, pois a real­i­dade vai muito além da arte, o líder do movi­mento con­tra o ex-​presidente é seu com­pan­heiro de inquérito no atual escân­dalo.
Sig­amos. Durante os oito anos de mandato de Fer­nando Hen­rique, todos lem­bram, os mes­mos que dizem ser golpista a man­i­fes­tação da sociedade con­tra o gov­erno, eram jus­ta­mente os que tam­bém saiam as ruas pedindo a cas­sação do pres­i­dente. Car­tazes, man­i­festos, ade­sivo com o “Fora FHC”, ainda estão por aí.
A per­gunta que faço: por que só agora é golpe? Só agora é aten­tado à democ­ra­cia? Tanto Col­lor quanto FHC não foram eleitos demo­c­ra­ti­ca­mente? A democ­ra­cia brasileira evoluiu para não admi­tir que se proteste con­tra o gov­erno?
A democ­ra­cia com­porta protestos, não só, exige, impõe o reg­u­lar fun­ciona­mento das insti­tu­ições do país. Se a pop­u­lação quiser ir as ruas em protestos con­tra o seu gov­erno está em gozo de um dire­ito legit­imo da sociedade, igual dire­ito tem o Con­gresso Nacional se assim dese­jar, de ado­tar qual­quer providên­cia con­tra o gov­erno. Não foi esse mesmo dire­ito que garan­tiu os protestos e a cas­sação de Col­lor? A infind­ável onda de greves e protestos durante quase todo o mandato de FHC? Só agora não pode? Por acaso os atu­ais gov­er­nantes dirigem o país por inspi­ração div­ina? Só agora é ter­ceiro turno? Será que não cansam de falar bobagens?
Qual­quer gov­erno legit­imo pode e deve ser sujeito à críti­cas, a protestos, a pro­ced­i­men­tos inves­ti­gatórios dos poderes Leg­isla­tivo e Judi­ciário. Difer­ente disso, é ditadura. É isso que vem ocor­rendo em alguns países viz­in­hos, onde se apar­el­hou o estado de tal forma que os adver­sários são joga­dos nas mas­mor­ras ao argu­mento que estão preparando golpe, que estão con­spir­ando con­tra o gov­erno.
Será que isso que anseia fazer o gov­erno brasileiro? Encar­cerar os líderes da oposição? Qual­quer do povo que proteste con­tra o gov­erno?
Qual­quer cidadão brasileiro tem razão de protes­tar con­tra o gov­erno. Temos um gov­erno que foi eleito dizendo uma coisa e, empos­sado faz o oposto do prometido. A sociedade foi vítima de um este­lion­ato eleitoral sem prece­dentes e todos somos teste­munhas disso.
Assim como somos teste­munhas que grande parte dos nos­sos prob­le­mas são fru­tos do apar­el­hamento do estado, da incom­petên­cia endêmica e da cor­rupção desen­f­reada. Quando pag­amos mais pela ener­gia, pelos ali­men­tos, pelo com­bustível, sabe­mos que parte deste custo é ori­undo do din­heiro que foi irri­gar as con­tas dos cor­rup­tos e finan­ciar o pro­jeto de poder.
Quer dizer que isso não é golpe? Enga­nar uma nação inteira faz parte do jogo democrático?
Os dizem ser golpis­tas man­i­festos da pop­u­lação e dos par­tidos políti­cos de oposição (o que é que tem os par­tidos par­tic­i­parem? Não fiz­eram isso a vida inteira?), que dizem que há dis­sem­i­nação de ódio, são os mes­mos que nada dizem quando um ex-​presidente da República, o Sr. Lula, fala em chamar para as ruas o “exército de Stédile”, numa alusão ao líder dos sem-​terra.
A colo­cação do ex-​presidente foi de tal forma imper­ti­nente que um dos coman­dantes das Forças Armadas do Brasil chegou a dizer, em nota, que Exército, o Brasil só tem um.
Quer dizer que o ex-​presidente Lula, líder máx­imo do par­tido do gov­erno, dizer que vai colo­car o “exército de MST” nas ruas, não é golpe? Não é uma ameaça as insti­tu­ições democráti­cas? Será que a ninguém socor­reu per­gun­tar con­tra quem o ex-​presidente pre­tende colo­car o “exército”? Será con­tra o povo? Con­tra as insti­tu­ições democráti­cas?
O mais grave disso tudo é que o Sr. Lula, ex-​presidente, líder máx­imo do par­tido do gov­erno e con­sel­heiro da pres­i­dente, não diz isso como figura de retórica.
O povo brasileiro protes­tar é golpe. O Sr. Lula ameaçar o país com uma guerra civil é nor­mal.
A democ­ra­cia brasileira e suas insti­tu­ições terão que ser maiores que os golpes. Esse é o seu teste de fogo.
Abdon Mar­inho é advogado.