202 anos da Independência — Reflexão sobre soberania, patriotismo …
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- Criado: Domingo, 15 Setembro 2024 16:50
- Escrito por Abdon Marinho
202 ANOS DA INDEPENDÊNCIA — REFLEXÃO SOBRE SOBERANIA, PATRIOTISMO …
Por Abdon C. Marinho.
QUANDO ainda era menino aprendi aquela frase de Karl Marx que dizia: “a história se repete, a primeira vez como tragédia, a segunda vez como farsa”. Nunca concordei inteiramente com ela, exceto na parte em que a história se repete. Muitas vezes como tragédia, muitas vezes como farsa. De certo é que, parece-me, nunca conseguimos aprender nada.
Em diversas partes do mundo estamos tendo a oportunidade de assistirmos a história se repetir, as tragédias se desenvolverem.
Os mais antigos ou mesmo aqueles que em alguma fase da vida tiveram a oportunidade de passar perto de um livro de história devem saber o significado da expressão “república de bananas”, muito em voga na primeira e na segunda metade do século passado. Se não, uma dica, eram aqueles países que, a despeito de serem considerados soberanos, outras nações ou mesmo corporações exerciam mais poderes sobre os assuntos estatais que os cidadãos e/ou governos locais.
Era comum grandes empresas do setor de infraestrutura, de energia ou mineração, etcetera, se julgassem acima das leis locais, as ignorassem ou dissessem “as leis”.
Como muitas dessas nações tinham como ponto forte da sua economia a produção de bananas, essas nações acabaram por serem apelidadas de “república de bananas” ou “república bananeira”.
Pois bem, não faz muito tempo, por ocasião das celebrações do 202º aniversário da Independência do Brasil, testemunhei alguns fatos que fizeram repensar repensar sobre a antiquíssima frase.
Imaginem que vi (e ouvi) um deputado federal, um representante do povo fazer um pronunciamento no dia da Pátria em que começava por “agradecer” a empresário, um megaempresário, por este afrontar a soberania nacional.
Fiquei pensando se não estávamos diante da repetição da história como farsa ou como tragédia.
O mais curioso disso tudo é que o dito parlamentar e outros próceres do mesmo evento se dizem patriotas, conservadores, defensores da liberdade, da pátria, da família, dos bons costumes, etcetera e tal.
E lá estavam eles “quebrando lanças” numa espécie de Cruzada por alguém, um megaempresário “ianque”, como se dizia outrora, que escudado no seu poderio econômico “se acha” e se coloca acima das leis do Brasil.
Vejam, estamos diante de um campeão das liberdades civis? Um Mandela? Um Gandhi? Um Martin Luther King?
Não. Se assim o fosse teríamos esse mesmo cidadão fazendo o que tenta fazer no Brasil em outras nações onde mantém negócios “brigando” pelas liberdades individuais daqueles povos verdadeiramente oprimidos.
Vemos isso? Não. Na Índia, na China, na Turquia e em tantos outros países, se mantém cordado e servil. Talvez porque tais países possuem regimes mais democráticos que o nosso.
Então quer me parecer que o “campeão” das liberdades individuais que os patriotas nacionais passaram a venerar não é tão comprometido quanto dizem com as causas dos cidadãos oprimidos.
Dessa compreensão surgem outras indagações: o que leva pessoas que se dizem “patriotas” se postarem contra a soberania da república e favoráveis as ingerências estrangeiras? Pior que isso, se colocarem ao lado do megaempresário estrangeiro que na sua megalomania se acha superior às leis do nosso país?
Não parece bisonho que justamente aqueles que dizem patriotas sejam os primeiros a se colocarem contra a soberania do próprio país?
Engraçado, para dizer o mínimo, que a principal “bandeira” desses neo patriotas é o combate ao “comunismo” e/ou o medo que país se torne comunista.
E aí me recordo das primeiras aulas de história do ginásio onde aprendi que um dos pilares da doutrina comunista era justamente o fim dos Estados Nacionais. Aliás, o Manifesto Comunista, de 1848, de Karl Marx e Friedrich Engels, se não me falha a memória, é de onde surge a exortação: «Proletários de todos os países, uni-vos!» (no seu original alemãoProletarier aller Länder, vereinigt euch!). A versão popular do slogan é «Trabalhadores do mundo, uni-vos!», e, ainda, há «Trabalhadores do mundo, uni-vos, vós não tendes nada a perder a não ser vossos grilhões», misturando as três últimas frases do Manifesto Comunista. Uma variação desta frase («Trabalhadores de todas as terras, uni-vos») está escrita no túmulo de Marx.
Esses slogans clamam pela derrubada de fronteiras para que todos os povos se unam sob a famosa “ditadura do proletariado”.
Ora, ao fazerem tábua rasa da soberania nacional, os tais patriotas, direta e indiretamente, estão defendendo os estatutos coloniais da subordinação das nações a outras potências – o caso em comento a um conglomerado econômico e em derradeira instância a um único homem –, a ideia que não deve existir soberania das nações e os próprios ideais que dizem combater: a ideologia comunista.
Mas vejam que tais quais os comunistas com seus slogans: “proletários de todos países uni-vos”, “trabalhadores do mundo uni-vos” os nossos, por assim dizer “patriotas” tem slogans semelhantes, onde pregam a supremacia do povo. São eles que dizem quando pregam contra as instituições: “supremo é o povo”.
No fundo não há distinção entre os slogans, ambos pregam, no primeiro, a soberania dos trabalhadores sobre tudo, inclusive os Estados Nacionais, o segundo que não interessa as instituições da república pois o grito do povo nas suas é que é “supremo”.
Dessa construção lógica elementar se depreende que tanto os comunistas do passado quanto os nossos patriotas do presente são (ou defendem) a mesma coisa.
Como sei que não é bem assim, chego a conclusão que o que falta efetivamente a essas pessoas que vão às ruas fazerem saudações a empresários imperialistas e se colocarem contra as instituições republicanas e a soberania nacional é aula de história. Não estudaram nada no passado e por isso mesmo não conseguem entender os conceitos elementares do que seja uma nação soberana.
É essa ignorância que leva um deputado federal, um representante do povo brasileiro a subir em um palanque para agradecer um empresário que só quer uma coisa: colocar-se acima das leis do país.
Esse é o “ponto de corte”, independente de qualquer consideração de fundo, o que precisa ficar bem claro e estabelecido é que em nenhuma hipótese a soberania nacional pode ser violada. Pode se discutir e/ou questionar o que se desejar – e é bom que se faça isso –, o que não pode ser sujeito de qualquer debate é alguém achar-se superior às leis.
É nesse ponto que os “patriotas” perdem a razão e viram “patriotários”.