A NOVA REPÚBLICA CHEGOU AO FIM? EXISTE LUZ NO FIM DO TÚNEL?
O Regime Militar (1964-1985), chegou ao fim devido a exaustão. Ninguém mais cogitava, nem os militares, que após o presidente-general João Figueiredo outro militar o sucedesse no comando do país. Conscientes disso, o presidente-general Ernesto Geisel iniciou a fase de distensão política, abrindo lugar para a eleição da chapa Tancredo/Sarney no colégio eleitoral.
Os políticos brasileiros, sobretudo os esquerdistas, dizem que eles colocaram fim à ditadura. Escutamos essa tolice pelo simples fato de termos ouvidos. O regime caiu porque não possuía mais qualquer sustentação, política, social, econômica. Ou seja se exauriu.
Com a eleição de Tancredo Neves e posse de José Sarney iniciou-se o período apelidado de Nova República, que, de crise em crise, chegou aos trinta e enfrenta seu pior momento. Será que a Nova República chegou ao fim? O que virá depois dela? Existe alguma solução para o momento político que vivemos?
Sem qualquer pretensão de está certo ou de ser o dono da razão, tentaremos esclarecer algumas coisas já certo, que não será fácil.
Se analisarmos bem os últimos trinta anos, chegaremos a conclusão que sempre estivemos politicamente em crise.
Já no alvorecer da Nova República a crise se instalou. O próprio nascimento da Nova República deu-se sob crise. A morte de Tancredo Neves e posse do vice, José Sarney, foi um dos momentos mais tensos da história do país, havendo quem falasse em ruptura da ordem democrática para impedir a posse de Sarney, outros falando em empossar no lugar do vice-presidente eleito o presidente da Câmara e outras soluções mais heterodoxas.
O governo Sarney foi tomado pela crise. Faltava-lhe a legitimidade das ruas, posto que eleito como vice e oriundo do partido que dera sustentação política a ditadura, a crise econômica com inflação nas alturas, a corrupção sempre presente, fazia com que o governo fosse uma espécie de cadáver insepulto à espera do enterro. FHC, então senador da República, dizia que a crise era o próprio Sarney, tanto que quando este viajava, dizia: "a crise viajou”.
A crise era tamanha, tanto a econômica quanto política, que a solução encontrada pelo Congresso Constituinte, convocado pelo próprio Sarney, foi encurtar-lhe o mandato em um ano. Isso depois de muita barganha, pois muitos queriam cortar-lhe dois anos. Após muito toma lá dá cá e muitas concessões de rádio e televisão depois, chegou-se ao meio termo que possibilitou a a eleição presidencial de 1989, a primeira desde 1961.
Na disputa de 1989, apesar dos muitos candidatos melhores – como Mário Covas, Ulysses Guimarães, Leonel Brizola –, sagraram-se como as grandes vedetes da disputa os notórios, e hoje aliados, Fernando Collor de Mello e Luís Inácio Lula da Silva. Tendo como vencedor, após disputa apertada no segundo turno das eleições, o primeiro.
O curto governo Collor – apeado do poder pelo Congresso Nacional através de um processo de impeachment, em 1992, após infindáveis denúncias de corrupção –, em que pese, legitimamente eleito, foi tomado pela crise desde a posse, já naquele dia, perdeu grande parte de sua legitimidade e apoio ao confiscar os ativos financeiros do país que os brasileiros mantinham nos bancos.
Aliados ao confisco, tivemos a forma destrambelhada e autoritária, a corrupção galopante, a inflação sem controle. Isso e outras coisas mais, levaram a sua queda.
Após Collor tivemos o governo do vice, Itamar Franco, que foi uma espécie de governo de conciliação nacional para superar o trauma do impedimento do primeiro presidente eleito pelo povo.
Essa relativa calma do governo Itamar, aliada ao fato de não se ter denúncias tão graves de corrupção criaram as condições para a implementação do Plano Real, pela equipe do seu ministro da fazenda, FHC, que debelou a inflação e permitiu a eleição do ministro em 1994.
Na esteira do sucesso do Plano Real, o governo de FHC foi relativamente calmo, as denúncias de corrupção nos processos de privatizações, na aprovação da emenda da reeleição, não foram capazes de causar maiores estragos.
O maior sobressalto, mesmo assim, diante do vemos hoje, um leve aborrecimento, foi a crise causada pela maxidesvalorização da moeda brasileira em 1999. Mesmo assim FHC terminou bem seu mandato, fazendo uma transição civilizada para o vencedor das eleições de 2002.
Em 2003 tem inicio o que podemos chamar de a era do Partido dos Trabalhadores no governo. E que, ao meu sentir, é a gênese da crise que vivemos nos dias de hoje.
Aqui não se discute os propalados e vendidos avanços na área social.
Como já tratei noutras oportunidades, o Sr. Lula ao chegar ao poder, nos braços do povo como chegou, possuía todas as condições de levar o país a um novo patamar de desenvolvimento, dando continuidade aos avanços dos governos de Itamar/FHC, aliando-se aos setores da sociedade e da política que fosse progressistas.
Ao invés disso, talvez com medo de partilhar o poder com os tucanos – para os petistas e aliados, equivocadamente, a encarnação do mal –, preferiu, aliar-se aos setores mais fisiológicos e aos movimentos sociais pelegos, que sobrevivem, até hoje, como parasitas do Estado brasileiro.
A crise do governo Dilma Rousseff, embora ela tenha sua parcela de culpa, foi plantada lá atrás, no governo do senhor Lula, com o estilo petista de governar, com a política de aparelhamento do Estado, com o projeto de implantar um estado bolivariano ao estilo do modelo venezuelano.
Vejam que, já em 2003, começaram a fazer concessões as piores pessoas do cenário político nacional, começaram a compra do apoio no Congresso Nacional. Já no primeiro ano de mandato, conforme foi exposto na Ação Penal 147 (o processo do Mensalão). O passo seguinte foi a institucionalização da corrupção como prática de governo.
Com a revelação do esquema em 2005, tivemos a primeira grande crise do estilo petista de governar. Para sair dela, mais uma vez, fizeram as opções erradas – talvez não pudessem fazer diferente, pois o escândalo atual, a sangria escancarada na Petrobras, já estava em pleno funcionamento, a corrupção já era bem maior que poderiam dominar –, o fortalecimento da aliança com os políticos mais nefastos para o país.
Os grandes aliados do Partido dos Trabalhadores - PT, nestes doze anos, foram os políticos do naipe de José Sarney, de Fernando Collor, de Renan Calheiros, de Jader Barbalho, Romero Jucá, Eduardo Cunha, Waldemar da Costa Neto, Paulo Maluf, e outros de menor calibre, nem por isso menos danosos.
Não pensem que foram apoios escondidos (escondidas estavam as condições, o rateio dos cargos, a divisão da propina), o partido sempre se orgulhou de seus aliados, comungaram e conviveram muito bem até aqui. O Sr. Lula, fez questão de chamar Sarney de irmão de alma, de afagar o o Collor, de louvar Rena, Barbalho, Jucá e Cunha.
O resultado do que fizeram é a crise que o governo Dilma está colhendo. Uma crise para a qual não se vislumbra uma solução dentro da normalidade institucional e que pode, como afirmam alguns significar o fim da Nova República.
Não temos dúvida que esta é uma crise bem maior que as antecessoras, maior que a do governo Sarney, que a do governo Collor, e bem maior que crise do governo Lula por causa da descoberta do esquema do mensalão.
A gravidade da crise não ocorre por que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, declarou-se rompido com o governo e com o Partido dos Trabalhadores - PT e por que este (o partido) faz “biquinho" para toda e qualquer iniciativa do presidente da Câmara.
A crise é grave porque envolve todos os poderes da República. Se nos tempos de Sarney, podia se dizer que a crise viajara, pois se circunscrita ao Planalto, se no tempo de Collor a crise podia ser facilmente isolada, só para citar as duas maiores, atualmente o mesmo não acontece.
A presidente da República e seu vice com risco de perder o mandato na Justiça Eleitoral; os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal sendo investigados pelo Supremo Tribunal Federal (sabemos que com o aprofundamento das investigações muito mais coisas surgirão); dois ex-presidentes sob investigação e inúmeros outros políticos na iminência dos dissabores; as maiores empresários do país presos ou na iminência de serem presos.
Estas as razões da gravidade crise. Os poderes carcomidos pela corrupção, não favorecem o equilíbrio institucional. Nos momentos difíceis anteriores, se a crise era no planalto tínhamos pessoas no Congresso Nacional com lucidez, para amenizar a situação, se era nas casas legislativas tinhamos no Planalto a fiança da democracia. Hoje não temos ninguém. A ponto do presidente da Câmara dizer que o Planalto está tomado pelos aloprados.
Os poderes da República estão conflagrados, não temos lideranças políticas ou institucionais capazes de conduzir um processo de conciliação sem com isso passar a ideia de impunidade pelos malfeitos cometidos.
O que vemos são lideranças legislativas e do Poder Executivo ameaçando, direta ou indiretamente, as instituições, juízes, procuradores, como se isso, ao invés de arrefecer não aumentasse ainda mais a crise.
O Supremo, até aqui incólume na crise e que poderia conduzir o processo de conciliação nacional, não tem uma presidência à altura do momento histórico, uma vez que o ministro Ricardo Lewandowski, não passa à nação, sobretudo por seus posicionamentos durante o julgamento do mensalão, a confiança à população brasileira, que o identifica como alguém ligado ao petismo, partido repudiado pela população como nunca vimos antes na história do país.
Dentro do Supremo Tribunal Federal, a única pessoa capaz de passar a confiança que a sociedade necessita, com certeza de que os malfeitos seriam punidos e as instituições (ou que restam delas) preservadas, seria o ministro Celso de Melo, decano corte.
Numa situação de ruptura não existe qualquer outra liderança capaz de unir o país, garantindo a ordem democrática.
O momento atual desapego em nome dos interesses da nação e das instituições. Não temos como apagar o fogo jogando gasolina. A crise é política, econômica e de legitimidade dos dirigentes do país e de suas instituições. Os riscos de um arrivista, falso salvador da pátria surgir no cenário político e ganhar as eleições é iminente. O que será bem pior para o país e para os brasileiros.
Abdon Marinho é advogado.