OS FARSANTES.
Lembro que chorei, quando, naquele segundo turno de 1989, o resultado das urnas consagrou a vitória de Fernando Collor de Mello sobre Luis Inácio Lula da Silva.
Aquela, sentia assim, era a derrota do povo – não apenas da campanha que emocionou o Brasil com seu jingle que dizia algo do tipo: "Lula lá, cresce a esperança. Lula lá, o Brasil criança... Lula lá é a gente junto. Lula lá, meu primeiro voto para fazer brilhar nossa estrela" –, para o farsante que, apoiado pelas elites, pelos mais reacionários do país, vendeu a ideia, aos mais humildes, de que era um caçador de marajás do serviço público, o caçador de corruptos que iria modernizar o Brasil e tirá-lo das garras do Sarney, do mar de corrupção que tomava conta República.
Aquela foi uma noite de pesar, triste. Embora fosse uma vitória da maioria, impressionava como não nos representava, não representava o povo brasileiro.
Collor foi eleito com o apoio dos velhos coronéis, sua votação era oriunda dos "grotöes" mais atrasados do país. Como, em tempos recentes, foram as vitórias do Partido dos Trabalhadores.
Lula, como a música dizia, representava a esperança daquelas pessoas que queriam um Brasil melhor, mais justo.
Diferente de Lula, Collor nunca me enganou, sempre tive convicção que seu discurso com voz empostada de combatente dos maus hábitos do serviço público, seu arrojo de gestor competente, moderno, pouco afeto ao decoro e liturgias do cargo, eram falsos.
Uma de suas primeiras medidas, antes mesmo de meter a mão nas economias dos cidadãos, foi comunicar à patuleia que não moraria no Palácio da Alvorada, ao invés disso, continuaria a habitar a residência privada da família, a famosa Casa da Dinda.
Os incautos vibraram, que presidente moderno, desprendido, atleta. Enquanto usava o palácio como academia de ginástica, tratava de tornar a residência privada num local digno do tão elevado posto e de suas infindáveis vaidades. Assim como a Casa da Dinda, mais famosos ainda, foram os jardins que mandou construir, com cascatas monumentais, fontes e outros mimos.
Já Lula foi melhor na arte de enganar. Enganou-me por quatro eleições seguidas(1989 a 2002). O fato de cansar na primeira página de um livro, de não ser muito dado ao trabalho, de morar por anos e anos de favor na casa do amigo empresário, via tudo como pecados menores. Inocente, imaginava que Lula no poder iria romper com as velhas estruturas, debelar a corrupção que sangrava o país.
Ledo engano, no poder, Lula, a medida que a ganância aumentava, afastava-se dos aliados de primeira hora e se aproximava dos que ajudaram a eleger Collor naquela emblemática primeira eleição após a ditadura.
Aqui cabe o registro. O Lula não foi forçado a isso, ele buscou e gostou das novas amizades que fazia. Enquanto isso o país, ao invés de afastar-se da corrupção, afundava cada vez mais.
Os ex-presidentes Collor e Lula são quase iguais. Quase a mesma pessoa.
Os escândalos do mensalão e do petrolão são apenas a prova mais aparente de tudo. A união de Collor e Lula, revelam as provas, além da comunhão ideológica (a ideologia de afanar o país) foi motivada por milhões de motivos, jorrados da Petrobras.
Como Collor, as outras diletas amizades também foram forjadas assim, no vil metal. Jader Barbalho saudado por Lula como grande homem, José Sarney como irmão de alma, Renan Calheiros como estadista, Paulo Maluf (até Maluf), como exemplo de probidade.
Collor possui um fetiche por carros, lá atrás um Fiat Elba, esteve no epicentro do processo que levou ao seu impedimento. Apeado do poder, umas das primeiras medidas foi ir compras, adquiriu um Lamborghini, dos mais caros.
Agora, pelos portões da Casa da Dinda, por onde um dia entrou o Fiat Elba do infortúnio pessoal – um veículo nacional, chamado por ele de carroça –, vimos sair a Ferrari vermelha, o Porsche preto e o Lamborghini prata, todos pilotados por agentes da polícia federal, como exemplo aparente do mar de lama de onde parece nunca ter saído. Os mandados judiciais esqueceram apenas de mandar recolher, também, o luxuoso Rolls-Royce Phanton mantido na residência de São Paulo.
O fetiche de Lula é por casas. Melhor dizendo, casas bancadas pelos outros. Nos tempos de eterno candidato morava, de favor, na casa do amigo empresário. Findo o mandato de presidente da República, curte a vida rural em sítio de um amigo-sócio do filho, em Atibaia (SP) podendo usar também um triplex do Guarujá (SP), se quer curtir o ar marinho, ambos gentilmente reformados por empreiteiros amigos. Ah, o filho, outrora monitor de zoológico, também mora, de favor, num luxuoso apartamento, cedido por um amigo e sócio. Sempre tive bons e generosos amigos, nunca tão generosos quanto são os amigos da família do ex-presidente Lula.
No escândalo do petrolão, Collor é apontado como beneficiário de propinas superiores a vinte milhões. Parte do dinheiro mal-havido, depositado em contas de sua titularidade. Um dos delatores do esquema de sangria dos recursos da Petrobras disse ter entregue nas próprias mãos do ex-presidente uma "peteca" de sessenta mil reais. Em mãos, bateu na porta e disse está aqui a sua encomenda, os sessenta mil que o goleiro mandou deixar. Um ex-presidente da República recebendo propina é algo que envergonha a nação. Receber diretamente, em mãos é algo que embrulha o estômago de nojo.
Até aqui não se sabe se o Lula recebeu algo assim. Deve ser mais sabido, recebe disfarçadas de doações para o o instituto que leva seu nome ou através uma empresa de palestra. Faltando saber o que as investigações internacionais ainda irão dizer.
O discurso de Collor da tribuna do Senado Federal, passados mais de vinte anos desde que foi apeado do poder, é o mesmo. A mesma falsa indignação, o mesmo falar empolado, as mesmas desculpas esfarrapadas do tempo que dizia não saber nada do que fazia o senhor PC Farias.
Assim como Collor o cerco também vai se fechando sobre o esquema de Lula. Outros países, graças a acordos internacionais, começam a se interessar pelos caminhos trilhados pelo dinheiro sujo.
Nos idos de 1989, Lula dizia que Sarney era o maior ladrão do país desde que Cabral chegou por aqui; Collor dizia que o mandaria prender. Hoje estão todos juntos. Mais unidos que nunca. Para o Brasil, a certeza que sempre foram iguais e que sempre disseram a verdade quando se referiam uns aos outros.
A união de três ex-presidentes seria um feito extraordinário, se unidos para ajudar o país a superar seus desafios. Infelizmente, para nós, não é o caso. Temos três ex-presidentes unidos para tentar acabar com investigações policiais, arquivar processos, menosprezar a justiça; unidos contra as instituições republicanas que, em algum momento de suas vidas, juraram defender e respeitar; unidos contra o Brasil.
Abdon Marinho é advogado.