ALIENADOS.
Talvez a presidente, o governo, o partido e seus aliados esperem uma manifestação como aquela contra Colllor no 7 de setembro de 1991, para acordarem. Minimizam as manifestações das ruas, as desqualificam e chegam ao risível argumento de que se trata de uma orquestração patrocinada pela oposição, que não se conformou com a derrota e quer um terceiro turno; pela tal elite branca, rica, preconceituoso contra o partido, este, vítima de tudo.
Esse discurso, já feito pela própria presidente, por ministro do governo, pelas lideranças partidárias não de uma argumentação tosca, chegando às raias do insulto à inteligência do povo brasileiro.
Um breve histórico dos fatos lança luz de como chegamos ao panelaço de domingo e os seus desdobramentos.
Durante a campanha eleitoral a presidente/candidata acusou os adversários de, caso eleitos, destruírem os programas sociais, de plantar juros altos para colherem recessão, de aumentar os preços públicos, retirar os avanços D a educação, a saúde e mais um rosário de sandices. Lembram dos livros perdendo as letras, do bife sumindo da mesa?
Eleita, a presidente, começou a fazer justamente aquilo que jurara, solenemente, não fazer, "nem que a vaca tussa", disse.
Assim, começou por aumentar o preço da energia elétrica, aumentar os juros, levar o país à recessão, ao crescimento negativo; dificultou o acesso dos trabalhadores ao seguro-desemprego, a aposentadoria. Achou oportuno reduzir o valor das pensões. Diariamente tomamos conhecimento do calvário que tem sido para as famílias conseguirem acessar a página do FIES.
Em seguida achou que era a hora de elevar os preços dos combustíveis, justamente no momento em que o barril de petróleo atingiu, no mercado internacional, sua menor cotação, descendo de mais de US$ 100 dólares para pouco mais US$ 40 dólares. Com isso o Brasil passou a ter um do mais caros combustíveis de todo mundo. Logo o nosso país, vendido nos últimos anos, como uma potência no setor.
O preço dos gêneros alimentícios que já vinham numa crescente elevação, causada por diversos fatores, inclusive a escassez de água, subiram ainda mais, reduzindo o poder de compra dos salários num cenário de crescimento nulo.
Pois bem, qualquer dona de casa, trabalhador, sabem que as coisas estão bem mais caras; que o mesmo dinheiro que enchia o carrinho de supermercado, não está dando nem para chegar a metade.
Esse mesmo cidadão, essa dona de casa, jovem, paga mais caro pelo transporte público e os que conseguiram comprar um carro, não conseguem mais usá-lo porque o combustível tornou o uso do carro um luxo que poucos podem se permitir.
Não bastasse isso, temos a certeza que uma quadrilha se instalou em diversos nichos de poder com o claro propósito de roubar recursos públicos. Os números do alcance, revelados até aqui é que desconfiamos serem bem maiores, fogem à compreensão quantitativa do cidadão comum, dos que pagam impostos.
No fatídico domingo, 8 de março, a presidente ignorou toda essa retrospectiva para fazer um discurso que não unia léu com créu e que era, claramente, recheado de mentiras, falsidades.
A reação ao discurso, que o governo, o partido e seus aliados tentam minimizar, vai muito além do bater panelas chiques em sacadas.
Convidada para uma exposição da construção civil, a presidente compareceu antes da abertura do evento, ainda assim, recebeu estrepitosas vaias dos expositores e dos empregados do evento tendo que interromper a visitação. Para completar o vexame, foi falar sobre o nada para uma platéia de pouco mais cem pessoas num auditório com capacidade para mais de oitocentas. Temos aí, ou um equívoco monumental ou a constatação de que limitaram o acesso de mais pessoas para evitar outras situações constrangedoras. Será que entre os que vaiaram estavam só os ricos, brancos, como costumam dizer?
No mesmo momento, na capital da República, numa Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara dos Deputados, um depoente revelava, ao vivo, em rede nacional, que conseguiu, ele, o sub do sub, alocado numa diretoria menor da Petrobras, US$ 100 milhões de dólares, deixando claro que o restante da propina era repassada a pessoas do partido. Fora a falta de pudor do depoente (acho que ao expor as vísceras do esquema corrupto presta um serviço ao país), o fato mais emblemático durante o tempo que durou o depoimento, foi o partido da presidente e seus aliados não erguerem a voz para contestar o lamaçal em que se enredaram ou revelar qualquer constrangimento com o que estava sendo dito. Ao invés disso, apesar do depoente deixar claro que a partir de 2004, houve a "institucionalização" da corrupção, insistiam em querer chamar para associar-se à bandalheira, o governo do partido que os antecedeu no poder. A já conhecida e avacalhada tese de que o culpado por tudo foi o FHC. Depois de 13 anos no poder dizerem que a culpa é antecessor só tem uma definição: patetice.
A presidente, o governo, seu partido e aliados, revelando que acabaram de chegar de uma galáxia distante, insistem em dizer que o protesto é de uma elite minoritária, rica, que sequer conhece a cozinha. Além de ser um argumento bobo, pois ainda que fosse, é legítimo a qualquer brasileiro, rico, pobre, branco, preto, amarelo, vermelho, protestar sem, com isso serem considerados golpistas ou antidemocrático. Aliás, numa democracia, diferente do que pensam, não existem temas-tabus, qualquer assunto, ao menos em tese pode ser debatido, criticado. Essa é uma conquista da cidadania brasileira. O governo, qualquer que seja, não pode estabelecer as pautas da sociedade e dizer os temas que podem ou não serem debatidos e por quem.
Além disso, o argumento é fajuto. Todas as pessoas com quem converso, isso inclui, donas de casas, secretarias, motoristas, estudantes, pedreiros, qualquer um, dizem que as vaias foram e são merecidas e que também vaiariam se tivessem oportunidade.
A exceção dos grupelhos que o dinheiro público sustenta, todos os demais brasileiros, sérios, trabalhadores, pagadores de impostos, sentem-se traídos pelo atual governo, estão insatisfeitos. O governo, o partido e seus aliados não conseguem entender que a presidente praticou um estelionato eleitoral para obter a vitória e que, foi e tem sido, no mínimo, leniente com a corrupção que tomou de conta do país. Esquecem que os primeiros que sentiram no bolso o custo da bandalheira, são justamente os mais pobres, a classe média, em seus vários extratos. Essas pessoas não estão satisfeitas, estão apertando os cintos, fazendo milagre com o salário para que o dinheiro não acabe antes do mês.
Acho difícil que façam colar o argumento de que os mais pobres estão felicíssimos com o governo da presidente Dilma Rousseff e com a corrupção.
Insistir na tese de que os ricos, brancos e a classe média não têm o direito ao protesto é quase tão inverossímil quanto, como querem, a existência dos pobres masoquistas, estes que vendo tudo isso aplaude o governo.
Abdon Marinho é advogado.
Escrito por Webmaster
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