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Bem Vindo a Pagina de Abdon Marinho, Ideias e Opiniões, Segunda-feira, 25 de Novembro de 2024



A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade.

Escrito por Abdon Marinho

A FÉ NOS LIBERTA.

Por Abdon C. Marinho*.

AMANHÃ será Domingo de Ramos, o dia/marco do início da Semana Santa, o fim e um novo começo. No domingo Jesus Cristo adentra em Jerusalém montado em jumento e sendo saudado por pessoas com ramos de árvores, depois sobrevém a traição de Judas, a prisão, a negação de Pedro, o julgamento, a condenação pela vontade do próprio povo que no domingo o saudara, sabendo-o inocente, Pilatos lava as mãos, entrega-o às solenidades oficiais da condenação: a preparação com a coroa de espinhos, o rasgamento de suas vestes para que sinta bem mais peso da cruz enquanto até o calvário em cortejo público de humilhação; sobrevém a árdua caminhada, com seus diversos significados; a crucificação com requintes de crueldade; o pedido de perdão de Cristo; a promessa a Dimas, o bom ladrão; a entrega da vida ao Pai e Senhor; a morte; o sepultamento; a ressurreição na Páscoa; a Ascenção para vida eterna. 

O sábado amanheceu chuvoso – uma chuva fina e intermitente que vem desde a madrugada. Após o café da manhã e alimentar os peixes, enquanto observava a chuva da varanda, pensava no quanto a Semana Santa foi importante para a minha vida – já disse isso aqui em um texto muito antigo –, mais importante que o Natal, Ano Novo, aniversários, ou qualquer outra.

A Semana Santa, para mim, sempre teve esse sentido de propósito, de finalidade, que as coisas, as pessoas e tudo mais, “acontecem” na nossa vida com uma finalidade e ao cabo de tudo teremos a recompensa, aqui, neste plano, noutro plano, na eternidade. 

A sequência de acontecimentos da Domingo de Ramos à ressurreição na Páscoa teve uma finalidade. Quando Cristo adentra triunfal em Jerusalém teve como propósito atrair a ira dos poderosos, sobretudo, daqueles que dominavam a fé; a traição de Judas, por motivações políticas ou monetárias, teve sua razão de ser, Cristo já era sabedor disso, tendo anunciado a traição na última ceia; e veio com um beijo a traição no Monte das Oliveiras, quando o senhor anunciou: — Judas, com um beijo, tu trai o filho do Homem; a prisão sem reação – a caso, se não estivessem nos planos, Cristo e os seguidores não teriam reagido? Não poderia ter clamado por uma legião de anjos para impedir a prisão? Nada disso foi feito e Jesus Cristo ainda restituiu a orelha decepada por um dos seguidores a dos soldados que o prendeu. 

A negação de Pedro, também anunciada por Jesus, serve para nos mostrar o quanto somos frágeis na nossa fé quando confrontados com o medo ou com outras circunstâncias extremas. É normal a nós, humanos, que fraquejemos algumas vezes e em algumas situações. Até com Pedro deu-se isso. Pedro, a pedra, a rocha sobre a qual ergueu-se toda uma fé.

A mesma análise dar-se em relação as demais “estações” de sofrimento de Jesus Cristo até a  ressurreição, quando, por derradeiro, o triunfo da vida se sobrepõe à escuridão da morte. 

A Semana Santa, ao longo dos anos da minha existência, sempre teve esse propósito de pensar e repensar os planos de Deus para nossa existência e para minha própria vida. 

Nos meus primeiros anos, ainda pequenino, lembro que toda a semana era Santa, se guardava todos os dias, e nunca fomos muito religiosos, morávamos em um povoado onde não havia igrejas. A fé que guardávamos nada tinha a ver com a igreja, era fruto do costume ancestral de uma ligação “direta” com o próprio Cristo Jesus e pelo respeito ao seu sofrimento em sua derradeira semana terrena. 

Ao que me recordo, a semana ia ganhando ares de gravidade à medida que se aproximava do seu ápice, já a partir da quarta-feira os animais não poderiam ser presos, não se ordenhava as vacas, o que significava que não teríamos leite. Na quinta-feira e na sexta-feira eram para jejum silencioso, não se ouvia rádio, não se falava alto, não se brincava, um silêncio cortante reinava somente sendo quebrado no sábado da Aleluia, quando já se podia brincar, os adultos se perdiam nos jogos de cartas ou de dominó e das cozinhas vinham o cheirinho gostoso de bolo de macaxeira ou de puba para comermos com um café com leite. 

O mesmo sentimento de respeito e reflexão sobre a Semana Santa e a Páscoa me foi companheiro de toda uma vida. Sempre servindo para a renovação da fé e que tudo que passava, ao menos aos olhos do Senhor tinha e tem um propósito como o teve o sofrimento do seu próprio filho. 

Mesmo nos momentos dos maiores sofrimentos e aflições, mantive-me firme e forte na fé, na certeza de que as provações tinham um propósito que mesmo não compreendendo o seu significado elas tinham uma significação aos planos de Deus. 

Muitas vezes – e ainda hoje –, em momento de dificuldades me pus a perguntar: —oh, Deus é mesmo necessário tudo isso? Livra-me de todos os males e poupa-me de mais esse sofrimento. 

Ao fazer tais questionamentos ao pedir por livramentos, trazia na lembrança que também Jesus Cristo, o filho de Deus, ao ser preso, também pediu ao pai que o livrasse todos os males, mas que fosse feita a sua vontade. 

Tudo faz parte dos planos de Deus e se crermos nisso as nossas cruzes, os nossos fardos são bem mais leves. 

Outro dia um amigo me questionou. Dizia ele que alguns textos meus, aqueles que retratavam a minha caminhada até aqui, era muito tristes e que não conseguia lê-los. Contra-argumentei dizendo a ele que se não conseguia ler, imagina eu que tive que vivê-los. 

Depois, com mais vagar, compreendi o que queria dizer. 

Vivemos hoje em um mundo no qual as pessoas “se entregam” com muita facilidade, entram em crise, se angustiam e por vezes, infelizmente, põem termo à própria existência. Não foram “formadas” para terem fé, para entenderem que os sofrimentos de hoje fazem parte de um plano que nos torna mais fortes. 

Nunca fui religioso ou santo – e longe de mim querer sê-los –, mas, conforme dito acima, sempre tive muita fé. Foi essa fé que me fez aguentar todos os “trancos” até aqui e os que, certamente, ainda virão – paciência, faz parte do plano –, foi a fé que me fez enxergar além, que me fez perceber que o bem que fazemos ao próximo, ainda que perdendo algo material, não nos faz perder e, sim, ganhar. 

A fé me fez perceber que sucessos, fracassos são circunstanciais, fazem parte da vida, da qual nada levamos e que não vale pena passar a vida em sofrimento por conta de bobagens. 

Finalmente, posso dizer, sem qualquer dúvida, foi a fé que me libertou e salvou. 

Um Bom Domingo de Ramos uma boa Semana Semana Santa e até a Páscoa da ressurreição de Cristo, nosso Senhor. 

Abdon C. Marinho é advogado.