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Bem Vindo a Pagina de Abdon Marinho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novembro de 2024



A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade.

Escrito por Abdon Marinho

O COMBATE À DESIGUALDADE E AO RACISMO COMEÇA COM A EDUCAÇÃO. 

Por Abdon C. Marinho*.

HÁ ALGUNS DIAS foi divulgada uma pesquisa no jornal nacional, da rede globo, cujo dado principal apontava para o fato da educação básica de pretos e pardos encontrar-se uma década de atraso em relação a educação dos jovens brancos. 

Já nesta semana que finda, se não me falha a memória, na terça ou quarta-feira, saíram dados do IBGE mostrando essa mesma desigualdade ou distorções entre a educação de crianças e jovens pretos ou pardos em relação aos branco. 

Além da notória, discrepância, pesquisa traz outros dados desalentadores, como por exemplo o fato de, apenas, em 2022, 40% (quarenta por cento) dos jovens deixarem o estudo por necessidade de trabalhar; e que 7,4% dos brasileiros pretos e pardos são analfabetos, ou seja, segundo a pesquisa, o dobro de analfabetos da população branca. 

O dado, entretanto, que mais me chamou a atenção na divulgação da pesquisa é a que trata do abandono escolar, quando temos que setenta por cento dos jovens que não completam o ensino médio são pretos ou pardos. 

Uma outra pesquisa, essa de 2020 ou com dados anteriores à pandemia, torna a situação da educação brasileira, sobretudo a educação pública, ainda mais dramática – e que já tratei dela em textos anteriores –, o fato da educação brasileira encontrar-se com um atraso de uma década em relação a outros países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Trazendo ainda um dado bem mais alarmante: que a correção de tal distorção levará seis décadas. 

Caso os dados contidos nos dois estudos científicos não sejam cumulativos, podemos dizer que a educação de pessoas pretas e pardas no nosso país encontra-se duas décadas atrasada em relação aos outros países. 

Ora, como podemos falar em mobilidade social, em igualdade entre os brasileiros e mesmo entre estes e os demais cidadãos do mundo, com tamanha discrepância naquela que seria o motor propulsor da ascensão social?

A educação, sabemos desde sempre, exceto por alguma rara exceção, é uma das poucas, senão a única ferramenta capaz de permitir a ascensão social de qualquer cidadão possibilitando que no exercício profissional ou de suas vidas estejam em condições de igualdade com os demais cidadãos independente de cor, raça, etnia ou quaisquer outras condições. 

Logo, para combatermos os outros males que “assombram” a sociedade nos nossos dias, temos que começar pela educação. 

Somente ela é capaz de promover a igualdade de tratamento e oportunidades a quem vida deu origens e caminhos distintos. 

O que essas pesquisas revelam não é nada diferente do venho afirmando há quase quarenta anos – há cerca de uma década materializando em textos escritos para a posteridade. 

Outro dia, em uma palestra a um partido político, dizia que desde que cheguei a ilha do Maranhão, justamente atrás de melhores condições de educacionais – naquele período o interior onde morava na possuía ensino médio –, que “brigamos” em torno das mesmas pautas: melhorias no ensino, na saúde, nas condições habitacionais, no transporte, na urbanização, etc. e, não avançamos, ou avançamos muito pouco, em cada uma das pautas, a ponto de chegamos hoje, só no quesito educação, ostentando a discrepância registrada nas pesquisas. 

E vejam que nem precisaríamos de pesquisas pra atestarmos isso. 

Já nos anos oitenta, noventa, e sempre, bastávamos olhar as relações de aprovados nos vestibulares. 

Os jovens oriundos dos melhores colégios privados, encabeçavam as listagens dos aprovados nos cursos mais concorridos, como medicina, direito, engenharia, ciências da computação, contábeis, e outros. 

Quando alguém oriundo da escola pública conseguia passar em um desses cursos ou mesmo quaisquer outros, era motivo de comemoração na escola e/ou no bairro onde morava. E tínhamos razão para comemorar, pois aquele acesso, aquela pequena vitória era o coroamento, o fruto de horas e horas de esforço individual. Enquanto os jovens das melhores escolas privadas  “passavam direto” do ensino médio para a faculdade, os seus congêneres das escolas públicas passavam (e ainda passam) meses, anos, fazendo cursinhos pré-vestibulares para alcançar a tão desejada vaga na faculdade. 

A nossa falta de consciência crítica era tamanha (e ainda é), que achávamos normal que aqueles jovens que tiveram condições de estudarem a “vida toda” nas melhores escolas privadas ocupassem as melhores vagas, nos cursos mais concorridos na faculdade pública. 

E aqui não vai nenhuma crítica ao acesso de pessoas ricas ou em melhores condições financeiras aos melhores cursos das faculdades públicas, a crítica que se faz, e com veemência, é ao fato do Estado não garantir as mesmas condições de ensino a todos para que “todos” disputem em condições de igualdade as mesmas vagas. 

Achávamos – e ainda achamos –, normal situações de desigualdade social entre os brasileiros e, também por isso, jamais seremos uma nação de cidadãos iguais. 

Não lembro de algum dia ter visto algum daqueles ricos, bem nascidos que passaram “de primeira” nos vestibulares das universidades públicas se questionando ou questionando a razão dele estar na faculdade pública enquanto aquele outro jovem oriundo da escola pública teria que passar mais alguns anos para ingressar naquela mesma faculdade, em um curso qualquer, se não desistisse antes se achando “burro” ou tangido pela necessidade de trabalhar, como ainda hoje apontam os dados do IBGE. 

E, quantas vezes, nós mesmos, na outra ponta da corda, não achamos “normal” que aqueles jovens cidadãos que tiveram oportunidades que jamais sonhamos em ter, passassem “de primeira” nos vestibulares das faculdades públicas, enquanto tínhamos que esperar? E, ainda dizíamos: — fulano de tal é muito inteligente, é um gênio, etc.

Pois é, aqueles cidadãos, anos depois “viraram” os governantes brasileiros e continuaram achando normal a desigualdade social, onde os ricos, os bem nascidos, tivessem mais direitos que os demais.

Com a mesma ignorância que tinham na juventude, continuam sem saber de onde vem o racismo estrutural, de onde vem a violência, de onde vem a pobreza dos cidadãos e dos estados. 

Não sabem, por exemplo, que a grande maioria do público das escolas públicas brasileiras é composta por pretos e pardos e que, ao negarmos um ensino de qualidade na base, nos anos iniciais da vida escolar, essas crianças nunca terão, salvo as exceções, chance alguma de ascender socialmente, de serem grandes profissionais, de serem agentes públicos, etc.

Ao negarmos, ainda nos primeiros anos de vida, que crianças pretas, pardas, pobres, tenham chance de ascender socialmente, pois os estamentos sociais não permitem, estamos praticando aquilo que condenamos “da boca pra fora”, o racismo. 

O jogador de futebol Vinicius Júnior tem mobilizado o mundo contra o racismo. Esse jovem jogador ao partir para o enfrentamento contra os racistas e preconceituosos de todos os naipes presta um grande serviço à sociedade mundial. Temos vistos autoridades de todo mundo condenando o racismo no futebol.

As autoridades brasileiras – também para tirar suas vantagens –, têm aviado protestos diversos contra a situação. 

Acontece que o racismo sofrido pelo Vinicius Júnior é apenas a face mais grotesca e escancarada do racismo, a mais boçal e que também deve ser combatida e que ele, como um jogador de renome internacional tem feito um excelente trabalho. 

Por outro lado, não podemos esquecer ou fingir que não sabemos do outro racismo estampado em números nas planilhas do IBGE. 

Enquanto o horrendo racismo que vitima o Vinicius Júnior ocorre durante as partidas de futebol, esse outro racismo que nos mostra o IBGE vitima milhões de brasileiros todos os dias, por anos, por décadas, por toda vida. 

O combate ao racismo não se faz com revisionismo de obras literárias, de novelas ou mesmo com o apoio e solidariedade de “celebridades” a jogadores de futebol ou de outros esportes vítimas de racismo.

O verdadeiro combate ao racismo somente acontecerá no Brasil e no mundo quando conseguirmos ofertar as mesmas condições educacionais a todas as crianças. 

Educação de qualidade, educação igualitária para todos é a chave para combatermos o racismo e as desigualdades sociais. 

*Abdon C. Marinho é advogado.