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Bem Vindo a Pagina de Abdon Marinho, Ideias e Opiniões, Quarta-feira, 27 de Novembro de 2024



A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade.

Escrito por Abdon Marinho

BOLSONARO É TÃO INOCENTE QUANTO LULA. 

Por Abdon Marinho.

AOS AMIGOS mais próximos costumo dizer que nada se completa tão bem quanto bolsonarista e lulopetistas. Algo assim como goiabada com queijo, leite condensado com pão massa fina, pizza com guaraná, etc.

E são tantas as afinidades que os seguidores de ambas as seitas se testemunharem seus ídolos com as mãos no cofre dirão que estavam colocando dinheiro, completando a a burra da viúva, nunca retirando. 

Os ídolos da turma também não apresentam muita distinção entre si. Têm como passatempo falarem tolices – ainda que ofensivas a terceiros –, o despreparo e o péssimo hábito de jamais assumirem as responsabilidades pelos próprios erros e/ou crimes. Se apanhados com as “calças nas mãos” já sacam a mesma desculpa: “eu não sabia”. 

Quando, no longínquo 2005, veio à tona o escândalo do mensalão o então presidente Lula veio a público, de um luxuoso hotel de Paris, dizer que não sabia de nada; que voltando ao Brasil iria apurar se eram verdadeiros os fatos narrados e que fora traído pelas pessoas em quem confiava. 

O tempo foi passando e quanto mais fatos escabrosos do seu governo iam sendo revelados mais o senhor Lula adotava o bordão “eu não sabia”. Virou até “meme”, como se diz atualmente. 

Foi negando e contando com a leniência das autoridades de todos os poderes constituídos que ex-presidente passou incólume pelo “escândalo do mensalão” muito embora quase todos os seus companheiros e aliados partidários tenham sido chamado a prestar contas à justiça, tenham sido condenados e até cumprido penas por crimes diversos. 

Criou-se a exdrúxula situação em que praticamente todos no entorno do ex-presidente estavam envolvidos em “malfeitos” diversos que ele não tinha o menor conhecimento de nada.

O ex-presidente foi “traído” por todos ou quase todos. 

A sorte acabou no chamado “escândalo do petrolão” que, mais uma vez enredou os grandes da República em conluio com os grandes do empresariado numa teia de corrupção sem precedentes em qualquer lugar do mundo, em qualquer tempo da história, até aqui.

Investigado, denunciado por diversos delitos o ex-presidente chegou a ser condenado e até chegou a cumprir mais de um ano de pena, saindo enclausuro por conta de uma “generosa” decisão do Supremo Tribunal Federal - STF, que revendo entendimento já consolidado, entendeu por inconstitucional o cumprimento da pena sem que o ocorresse o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. 

Foi nestas condições que o ex-presidente Lula, que “nada sabia”, deixou de ser hóspede do Estado nas dependências da Polícia Federal no Paraná. 

Por fim, apesar de condenado em quase todas as instâncias da justiça, com infinitos recursos judiciais negados em todas as cortes um “habeas corpus” salvador enxergou uma suspeição já apreciada e negada incontáveis vezes e anulou-lhe as condenações e os processos.

Um dia antes, julgando um incidente processual qualquer, o relator da chamada “Operação Lava Jato” entendeu que o fórum compete para apreciar alguns dos processos contra o ex-presidente não era a 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba. 

Foi assim, aliás é assim, que o ex-presidente vem tornando pó milhares de provas coletadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público ao longo de quase uma década e que serviram de fundamento para condenações consistentes examinadas e confirmadas pelos tribunais ordinários e superiores.

Nada disso “valeu” diante da necessidade de impingir ao juiz que julgou o processo na base a pecha de suspeito. 

E assim, como se tivéssemos vividos nos últimos anos uma espécie de alucinação coletiva, descobrimos que o ex-presidente Lula é inocente, que a montanha dinheiro que os corruptos devolveram para abrandar suas penas e outros tantos que foram recuperados em paraísos fiscais nunca existiram.

Descobrimos que, até mesmo, as confissões feitas nas delações premiadas ou os acordos de leniência com as empresas que reconheceram terem pago propinas de nada valeram.

O que está posto é que os processos do ex-presidente foram nulos e/ou mudados para outras varas que não concluirão seus julgamentos tão cedo ou tão breve, talvez nunca.

Assim, para todos os efeitos o senhor Lula é inocente. 

O senhor Bolsonaro que elegeu-se com a promessa de fazer um governo honesto viu-se outro dia na contingência de vir a público utilizar o mesmo argumento do ex-presidente Lula. Acossado, em plena pandemia com uma suspeita de corrupção no seu governo na compra por valor bem acima do mercado de um imunizante indiano sem aprovação total da Anvisa, o presidente, de forma bem compungida, disse aos seguidores: não tenho como saber o que se passa nos ministérios. 

Para usar um termo da moda, uma variante do “eu não sabia”.

O governo do senhor Bolsonaro, por mais que seus “aluados” insistam em não querer enxergar não fica distante do governo do senhor Lula no quesito probidade administrativa. Basta dizer que a exceção do Partido dos Trabalhadores - PT, todos os demais partidos políticos que se lambuzaram não era petista integram e dão sustentação ao governo ocupando posições de destaque nos ministérios e noutros organismos por onde correm os dutos de dinheiro da República. 

Ao dizer que não tem como saber o que se passa nos ministérios – e aí precisaríamos discutir o papel dos órgãos de controle que assessoram à Presidência –, está buscando uma “carta de seguro” para fugir às suas responsabilidades. 

O presidente sabe muito bem como se deu a eleição dos seus candidatos para as mesas da Câmara e do Senado e o quanto os cofres públicos tiveram que ser aliviados; sabe muito bem o que tem feito para garantir, diante das enormidades que faz, para não sofrer um processo de impeachment; sabe muito bem quem são os aliados que trouxe para o núcleo do poder, inclusive aqueles que foram julgados e condenados pelos esquemas de corrupção dos governos petistas. 

O senhor Bolsonaro, com quase três décadas de Congresso Nacional, não seria ingênuo a ponto de acreditar que essa turma que ele levou para dentro do Palácio do Planalto teria se regenerado. 

Essa suposição é confirmada com a declaração do deputado Miranda, em rede nacional, de que ao alertar o presidente sobre a possível bandalha dentro do Ministério da Saúde ele fora logo dizendo tratar-se de “rolos” de deputado fulano de tal.

Logo, por dedução, é de imaginar-se que o presidente, diferente do afirmado que não poderia saber de tudo que se passaria no seus ministérios, já tinha, pelo menos uma vaga ideia da existência de raposas vigiando o galinheiro.

O episódio da vacina é ainda mais grave para o presidente quando recordamos de alguns episódios, como por exemplo que a Pfizer quase “arrebentou” às portas do palácio para oferecer sua vacina, uma das mais requisitadas do mundo, a um preço bem inferior ao que estava oferecendo a outros países e o governo “esnobou”; quando lembramos que o presidente disse – e o áudio está aí para quem quiser pesquisar e ouvir –, que os vendedores de vacinas que viesse nos procurar; quando desautorizou publicamente, em rede de rádio televisão e canais digitais, a compra pelo Ministério da Saúde da vacina do consórcio Butantan/Sinovac; quando falou todas aquelas tolices contra as vacinas.

Aí você pega tudo isso compara com a pressa em adquirir a polêmica vacina indiana, com o processo correndo como nunca; com o presidente mandando carta ao primeiro-ministro indiano dizendo que tinha interesse em adquirir esse imunizante; com o filho do presidente abrindo as portas do BNDES para empresa Precisa, por coincidência sócia de outra empresa que já dera um calote milionário no próprio Ministério da Saúde; com o Ministério da Saúde ignorando textuais recomendações da Advocacia-geral da União para a celebração do contrato; ignorando a rejeição da Anvisa as condições do próprio laboratório produtor da vacina.

Quando você se dar ao trabalho examinar e fazer essas comparações percebe que tem “caroço nesse angu”, como diria vovó. 

Sou tentado a acreditar que esse “rolo”, como disse o presidente, não envolve apenas o deputado que continua líder do governo. 

Muito embora, assim como o ex-presidente Lula, o atual presidente possa alegar que não tem como saber tudo que acontece no governo, pelo menos neste episódio da vacina não tem como alegar não saber. Além dele próprio e de familiares terem praticados atos a favor do negócio, conforme declarou o deputado Miranda e seu irmão, ele foi avisado o que estava se passando, inclusive sobre as incomuns pressões para os servidores públicos autorizarem pagamentos a serem feitos para empresa Off Shore, em paraíso fiscal, e que nada tinha a ver com o contrato celebrado. 

Mesmo assim, somos obrigados a aceitar que tanto o senhor Lula quanto o senhor Bolsonaro são inocentes. O primeiro por ter sido “descondenado” pelo STF e o segundo por nunca ter sofrido qualquer incômodo da parte do Ministério Público e justiça do país. 

Assim, temos que o senhor Bolsonaro é tão inocente quanto o senhor Lula. 

A literatura jurídica do país poderia até criar um novo tipo penal: o tipo dos inocentes por excesso de provas. 

Abdon Marinho é advogado.