AbdonMarinho - Desculpem, teremos que falar de sexo.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

Des­culpem, ter­e­mos que falar de sexo.


DESCULPEM, TER­E­MOS QUE FALAR DE SEXO.

Por Abdon Marinho.

OPOR­TUNO que ini­cie este texto colo­cando um pedido de des­cul­pas no título. E faço isso, por enten­der que assunto de tal jaez jamais dev­e­ria ser objeto de dis­cussão, que se gaste “papel” ou “bytes” para tratar de um assunto que só diz respeito à vida pri­vada, a intim­i­dade das pes­soas. Dito de outra forma, o sexo con­sen­sual entre as pes­soas capazes não diz respeito a ninguém além dos cidadãos envolvi­dos, que podem levar uma vida pública ou longe dos olhos dos bis­bil­hoteiros.

Emb­ora esta seja uma pre­missa de fácil com­preen­são, o que temos assis­tido ao longo dos sécu­los até à atu­al­i­dade – quando todos dev­e­riam cuidar das próprias vidas –, é uma pre­ocu­pação injus­ti­fi­cada com tema fomen­tando debates acalo­rados em diver­sos cam­pos soci­ais.

Não faz muito tempo trata­mos aqui, no texto “O Book Rosa do Maran­hão”, do suposto “affair” envol­vendo um suposto dep­utado e/​ou a suposta uti­liza­ção de uma suposta condição sex­ual para fins de chan­ta­gens políti­cas.

O assunto retorna a pauta por conta da reper­cussão nacional a uma postagem, em redes soci­ais, onde um jogador de vôlei crit­i­cava, a rev­e­lação de que o atual Super­man, Joe Kent, é bis­sex­ual. O jogador de vôlei ironi­zou a infor­mação divul­gada pela DC Comics, que pub­lica a HQ. «Ah, é só um desenho, não é nada demais. Vai nessa que vai ver onde vamos parar.»

A postagem do atleta cau­sou (e causa) enorme alvoroço, a ponto dos patroci­nadores ameaçarem reti­rar o patrocínio ao clube em que jogava e cul­mi­nar com a sua demis­são.

Por estas par­a­gens, foi um senador da República, tam­bém, através das redes soci­ais, que polem­i­zou ao criticar que um dos com­er­ci­ais da Sec­re­taria de Edu­cação do Estado, pre­gando a voltas às aulas fosse estre­lado por um ado­les­cente influ­en­ci­ador dig­i­tal transexual.

Insti­gado pelo com­bustível da política – ambos se iden­ti­fi­cam com as pau­tas do atual pres­i­dente da República –, os dois, o jogador e o senador, têm “sofrido” mais que “sovaco de alei­jado”, e antes que o escrete politi­ca­mente cor­reto venha para cima de mim, esclareço que posso fazer tal adje­ti­vação por ser “alei­jado”, logo, estou falando de mim.

O certo, meus ami­gos, é que essa pauta “tem ren­dido”. Vejam a que ponto cheg­amos, uma história em quadrin­hos e um com­er­cial no cen­tro dos debates políti­cos.

A per­gunta que não cala é: esse povo não tem nada mais impor­tante para fazer?

O atleta do vôlei, ape­sar das críti­cas que tem rece­bido e até do revés finan­ceiro sofrido, tem dito que man­tém suas críti­cas pois fun­dadas em seus val­ores pes­soais, encon­trando entre diver­sos segui­men­tos soci­ais, mesmo entre aque­les que não o con­hecia, defen­sores sob o argu­mento de que defen­dem a liber­dade de expressão ou mesmo que o país vive­ria sob uma suposta “ditadura gay”.

Muito emb­ora man­tendo a crítica que fez ao fato do com­er­cial estatal ter sido estre­lado por um ado­les­cente tran­sex­ual, o senador apagou a postagem das redes soci­ais e fez uma nota onde se des­cul­pava pela pub­li­cação ante­rior.

O senador, ques­tion­ado por um blogue a respeito do assunto: “Não é uma crítica à opção sex­ual. Man­tenho minha posição crítica em relação ao gov­erno do Estado, ao ten­tar influ­en­ciar out­ras cri­anças com essa pro­pa­ganda ofi­cial. Você mesmo, ao chamar a cri­ança de dig­i­tal influ­encer, recon­hece a capaci­dade dela de influ­en­ciar out­ras. Ora, se fosse uma pro­pa­ganda da cri­ança de batom, por exem­plo, não teria nada demais. Mas, neste caso, seria pri­vado. Por­tanto, volto a dizer, minha crítica política é única e exclu­si­va­mente ao gov­erno”, disse.

Sem querer “pas­sar pano”, vejo que ambas as pub­li­cações, estopins de toda a celeuma, muito emb­ora dis­tin­tas, têm uma raiz comum e partem de um pres­su­posto equiv­o­cado.

Ambos, jogador e senador, tratam a “situ­ação sex­ual” das pes­soas como “opção” e acham que essa opção pode ser “influ­en­ci­ada” por uma história em quadrin­hos que apre­senta o Joe Kent, filho nosso herói Clark Kent, como um jovem bis­sex­ual ou pelo fato de um dos com­er­ci­ais públi­cos chamando para a voltas às aulas ser estre­lado por um ado­les­cente tran­sex­ual.

Emb­ora desnecessário, pelo menos para as pes­soas com um mín­imo de instrução, tais pre­mis­sas são fal­sas. Noutras palavras, “viadagem” não pega.

Opção, ensina-​nos os dicionários, é um sub­stan­tivo fem­i­nino que sig­nifica “Ato, fac­ul­dade ou resul­tado de optar; livre escolha, prefer­ên­cia”. Quer um e exem­plo? Fulano fez opção de nunca casar. Ape­nas para ficar no tema.

Não con­sta em nen­hum estudo ou mesmo nas práti­cas da vida que, quanto à sex­u­al­i­dade, o cidadão ou cidadã tenha essa fac­ul­dade, possa optar, fazer essa livre escolha ou exercer esse dire­ito de prefer­ên­cia.

Ora, desde que Kal-​El chegou aqui vindo do plan­eta Kryp­ton man­dado por seu pai Jor-​El, ante a iminên­cia de explosão daquele plan­eta e foi ado­tado Jonathan Kent e Martha Kent e pas­sou a chamar-​se Clark Joseph Kent, em 1938 – já se vão 83 anos –, engatando pouco tempo depois uma relação e depois casa­mento com Lois Lane, que todos os super-​heróis são “pegadores” sem que isso tenha impe­dido ou inspi­rado mil­hões de cri­anças e ado­les­centes homos­sex­u­ais a virarem het­eros­sex­u­ais.

Nem mesmo uma legião de super-​heróis e heroí­nas foram capazes de fazer isso. Nem o Fan­tasma, o Man­drake, o Aqua­man, o Homem-​Aranha ou mesmo o Bat­man – se bem que sem­pre pairou aquela dúvida em relação ao Robin, não é?

Mesmo que a condição sex­ual das pes­soas fosse uma “opção” como a tra­tou o jogador e o senador, o risco de alguém se deixar “influ­en­ciar para virar gay” seria nulo ou próx­imo disso, pois rara­mente se encon­tra alguém que goste de sofrer diu­tur­na­mente pre­con­ceitos e dis­crim­i­nações.

O que encon­tramos, feliz­mente, cada vez mais fre­quente, são pes­soas que resolveram viver suas vidas com altivez e dig­nidade sem se pre­ocu­parem com o que pensa os demais no seu entorno.

Seres humanos, não impor­tando a idade, cor, raça, religião ou situ­ação sex­ual, pre­cisam de acol­hi­mento, amor e respeito.

Quando vejo um jogador profis­sional, promis­sor ou de sucesso e um senador da República, bem como, os mil­hares ou mil­hões pes­soas que comungam com o que pen­sam, se expres­sarem como fiz­eram não imag­ino que os moti­vam o ódio. Talvez até exista, mas acred­ito que são movi­dos por con­ceitos (ou pre­con­ceitos) que não têm lugar, nos nos­sos dias, na ciên­cia ou nos princí­pios cristãos.

Uma história em quadrin­hos ou um com­er­cial, repito, por mais influ­entes que sejam seus pro­tag­o­nistas não têm o poder de mod­i­ficar a sex­u­al­i­dade de ninguém, por outro lado, podem influ­en­ciar para que ten­ham respeito e tol­erân­cia com a diver­si­dade, cada vez mais pre­sentes em suas vidas.

Quando o senador diz: “Nada con­tra a opção sex­ual de alguém. Agora querer obri­gar a aceitação desta opção de alguns como regra e apolo­gia a prática homos­sex­ual isso não dá para aceitar!!!”, acred­ito que cometa um duplo equívoco (ou mais) primeiro, como dito, por achar que sex­u­al­i­dade é uma “opção” e, depois, por querer “obri­gar” as pes­soas que tem uma condição sex­ual dis­tinta da sua a viverem na clan­des­tinidade, tran­ca­dos eter­na­mente no armário do pre­con­ceito.

Ora, se tem com­er­ci­ais estre­la­dos por todo tipo de pes­soas, por não um ou mais com uma pes­soa tran­sex­ual? Qual é o mal que isso pode causar? Ah, vai influ­en­ciar as cri­anças ou ado­les­centes a virarem gays. Me per­doem mas isso é lou­cura.

A jovem que pro­tag­on­iza o com­er­cial da Sec­re­taria Estad­ual de Edu­cação já pos­suía quase meio mil­hão de seguidores – acho que depois deste episó­dio con­siga out­ros mil­hares. Vão proibir a inter­net – prin­ci­pal veículo de comu­ni­cação da juven­tude –, por conta da “má-​influência” que ela possa causar nas cri­anças e ado­les­centes?

Acho que é a China – a ditadura comu­nista –, que ensaia algo neste sen­tido. Vão copiar?

Ah, a pre­ocu­pação do senador é com o uso do din­heiro público numa pro­pa­ganda ofi­cial que vai “influ­en­ciar” out­ras cri­anças.

Ainda por este viés, não assiste razão ao nobre rep­re­sen­tante do estado.

O “din­heiro público”, quase sem­pre uti­lizado para engor­dar con­tas pri­vadas de políti­cos, destina-​se a pro­moção do bem comum, do desen­volvi­mento, da igual­dade e frater­nidade entre os cidadãos, isso implica que todos, e digo todos no seu sen­tido mais amplo, devem ser des­ti­natários e agentes do que os recur­sos públi­cos podem pro­mover.

Um com­er­cial que um ado­les­cente het­eros­sex­ual pode­ria ser ape­nas “mais um”, ao ser pro­tag­on­i­zado por um ado­les­cente tran­sex­ual sig­nifica para tan­tos out­ros mil­hares ou mil­hões ao redor do mundo que eles tam­bém “exis­tem”.

Um der­radeiro argu­mento quanto à falá­cia do uso do din­heiro público “para a pro­moção da homos­sex­u­al­i­dade” é que na hora de cobrar impos­tos os gov­er­nantes não cobram con­forme a “opção sex­ual” de cada um, mas, sim, de todos indis­tin­ta­mente, logo, se tem com­er­ci­ais estre­la­dos por het­eros­sex­u­ais por que não pelos demais?

Encerro, dizendo que o jogador e o senador acabaram fazendo uma opção pela tolice e “jog­a­ram” a bola fora.

No mais, a vida é breve. Aproveitem como quis­erem e pud­erem.

Abdon Mar­inho é advo­gado.