AbdonMarinho - CAFETEIRA E SARNEY: O QUE DEIXARAM DE DIZER.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

CAFETEIRA E SAR­NEY: O QUE DEIXARAM DE DIZER.

CAFETEIRA E SAR­NEY: O QUE DEIXARAM DE DIZER.

Por Abdon Mar­inho.

EXTINTO o ex-​governador Epitá­cio Afonso Pereira Cafeteira, às vésperas de com­ple­tar seu 94º aniver­sário, no último 13 de maio, não foram pou­cas as man­i­fes­tações que rece­beu dos ami­gos sin­ceros e dos opor­tunistas – sem­pre pre­sentes nes­tas horas na expec­ta­tiva de reti­rar alguma van­tagem das exéquias fúne­bres.

Em se tratando do Maran­hão, como não pode­ria deixar de acon­te­cer, a visão da morte e do morto é retratada con­forme o inter­esse do freguês ou o lado politico do autor da per­oração: se con­tra ou a favor de Sar­ney.

O apreço aos fatos, a ver­dade e a história pouco interessa.

O próprio ex-​presidente embar­cou nesta visão dicotômica das coisas.

Ao fazer um belo texto de elo­gio ao morto – como con­vém as boas regras de con­vivên­cia –, fê-​lo não ape­nas ocul­tado os defeitos do morto, até porque os mor­tos não têm defeitos, mas, sobre­tudo, ocul­tando os seus próprios defeitos e a sua par­tic­i­pação na história.

E, assim agindo, deixou de col­her o mais deli­cioso dos fru­tos: o recon­hec­i­mento. Este é o defeito da história con­tada em fatias con­forme as con­veniên­cias dos contadores.

O ex-​presidente traz a luz os primeiros anos na política de ambos: Cafeteira e a sua e, após con­sid­er­ações diver­sas sobre as várias eleições, encerra por colo­car, com justiça, o morto no pan­teão dos grandes políti­cos maran­henses, como Clodomir Mil­let, Alexan­dre Costa, La Rocque, Neiva Mor­eira, Odylo Costa, filho, Manuel Gomes, Nunes Freire, Luís Rocha, Alarico Pacheco, Lino Machado, Gené­sio Rêgo, Clodomir Car­doso, Satu Belo e tan­tos out­ros, a quem, nas suas palavras, o tempo, tam­bém, consumiu.

Em tom saudoso exalta a velha polit­ica de um tempo em que o ódio e as perseguições ainda não con­sumira as relações. Seria uma alusão aos dias atuais?

Com o igual propósito de hom­e­nagear o ex-​governador, no dia seguinte à pub­li­cação do texto de Sar­ney, foi a vez do Jor­nal Pequeno, em matéria do não menos com­pe­tente jor­nal­ista Manoel San­tos Neto, trazer a luz um dos episó­dios mais nefas­tos da história polit­ica do Maran­hão: o Caso Reis Pacheco.

O jor­nal­ista desnuda a trama artic­u­lada pelo ex-​presidente e senador da República José Sar­ney, para incrim­i­nar o senador Cafeteira com uma denún­cia falsa no Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, onde um falso irmão, de um falso morto, apontando-​o como o respon­sável pela morte de “Reis Pacheco” que, anos antes teria se envolvido num aci­dente de trân­sito que viti­mou seu sogro, o con­sel­heiro Hilton Rodrigues.

A trama tem as indeléveis dig­i­tais do ex-​presidente que uma sem­ana antes do segundo turno das eleições de 1994, em 06 de novem­bro, escreveu o famoso artigo “Liber­dade e Reis Pacheco” –que pode ser lido na edição do Jor­nal Pequeno –, onde ques­tiona o slo­gan da cam­panha de Cafeteira: Liber­dade. Dizendo que o can­didato que­ria a liber­dade para expulsá-​lo do Maran­hão, pro­mover desvios. E vai além, com a insin­u­ação enviesada de que Cafeteira teria feito “sumir” com Reis Pacheco.

Naque­les últi­mos dias de cam­panha os coor­de­nadores tendo Ader­son Lago, can­didato a dep­utado e Juarez Medeiros, can­didato a vice-​governador na chapa de Cafeteira, tiveram que se des­do­brar entre São Luís, Belém e Macapá, para encon­trar o falso morto e des­man­char a maior história de fraude da política maran­hense, na qual se ignorou todos os lim­ites, até então con­heci­dos.

Quando con­seguiram apu­rar e com­pro­var toda armação só restava o último pro­grama de pro­pa­ganda eleitoral.

No dia de sua veic­u­lação, pas­sando a limpo toda história, só tín­hamos a notí­cia de que emis­sora de tele­visão respon­sável saíra do ar em diver­sos lugares, noutros foi a ener­gia que fal­tou. Naquela noite, e no dia seguinte, choveram os tele­fone­mas infor­mando isso. Lem­brando que não haviam celu­lares, a inter­net engat­in­hava, nem se usava ainda. A comu­ni­cação era toda através do rádio, tele­visão e tele­fones fixos.

Além do res­gate do assunto feito pelo Jor­nal Pequeno na edição já referida, um outro doc­u­mento é impre­scindível para a com­preen­são do assunto: o mem­o­rável dis­curso feito pelo dep­utado estad­ual Juarez Medeiros, na Assem­bléia Leg­isla­tiva do Maran­hão.

O dis­curso apel­i­dado de “Sar­ney é Mar­ginal”, onde o dep­utado diz ser o senador e ex-​presidente um mar­ginal, no sen­tido de, à margem da lei, ter sido capaz de urdir uma trama que nem os mais reno­ma­dos escritores e cineas­tas tin­ham ousado no campo fic­cional e ele colo­cara em prática.

Muito antes da mod­ernidade ter nos trazido o con­ceito do que hoje se chama “fake News”, um quarto de século antes, um ex-​presidente, escritor, senador da República, não ape­nas o con­hecia como já o exerci­tava com inve­jável desen­voltura e falta de pudor.

Poder-​se-​ia dizer que o ex-​presidente é uma espé­cie de bisavô das tais “fake News”, tão em voga nos nos­sos dias.

Uma mácula, mas, bem mais do que isso, parte da história política do estado.

Entre­tanto a história de Cafeteira e de Sar­ney não pode ser exam­i­nada ape­nas tendo como refer­ên­cia o nar­rado pelo ex-​presidente em seu artigo-​homenagem ou tendo com refer­ên­cia o res­gate feito pelo jor­nal­ista Manoel San­tos Neto, do Jor­nal Pequeno, ela é bem maior.

Pre­cisa con­sid­erar as condições políti­cas do Brasil que per­mi­tiu a união dos dois nas eleições de 1986, aquela que na visão de Ader­son Lago, foi a mel­hor cam­panha da qual par­ticipou, um ver­dadeiro “pas­seio”, onde tudo se tinha com abundân­cia e a tempo; ou as condições em que ocor­reu a rup­tura em 1990.

Lem­bro que quando tra­bal­hava na cam­panha de 1994, mais de uma vez ouvi Cafeteira dizer que cumprira com o com­pro­misso que assumira em 1986. E acres­cen­tava: — eu, com mais de oitenta por cento de aprovação pop­u­lar, estava lá, na descida da rampa do Palá­cio do Planalto, com Sar­ney, que tinha mais oitenta por cento de rejeição.

Depois da eleição de 1998, não lem­bro de ter encon­trado muito com o ex-​senador Cafeteira, sabia dele, ape­nas através de ami­gos comuns, como Chico Branco, Ader­son Lago, Bened­ito Ter­ceiro e out­ros.

Não par­ticipei ou soube como se deu a aprox­i­mação entre Cafeteira e Sar­ney nas eleições de 2006, quando elegeu-​se Senador na chapa da ex-​adversária de duas cam­pan­has, Roseana Sar­ney.

Voltei a encontrá-​lo quando me procurou para patroci­nar sua defesa na Justiça Eleitoral.

Os que que­riam tomar-​lhe o mandato, pelo que recordo, ale­gavam que ele não gas­tara quase nada para eleger-​se, que o vol­ume de recur­sos despendi­dos eram incom­patíveis com o vol­ume de votos obti­dos.

Só não con­hecendo o velho Cafifa, nem aquilo tinha gas­tado, fiz­era a cam­panha inteira na “carona” da cam­panha majoritária de gov­er­nador.

O engraçado é que naquela eleição tra­bal­hei no grupo oposto ao que Cafeteira se encon­trava, no primeiro turno na cam­panha de Ader­son e no segundo turno, dando alguma assistên­cia a cam­panha de Jack­son Lago, que veio a gan­har a eleição, além de prestar alguma asses­so­ria ao gov­er­nador de então, José Reinaldo Tavares.

Ape­sar disso, um dia, pela manhã, recebo uma lig­ação de Chico Branco: — Estou indo aí com o chefe. Ele quer falar con­tigo.

Era para que assumisse a sua defesa.

Em princí­pio não entendi bem. Eu estava “do outro lado”. Com ele, com Sar­ney, Roseana, estavam uma infinidade de advo­ga­dos de bril­han­tismo inques­tionável. Até me per­gun­tei a razão de me escol­her.

Quando chegou, desfez-​se a dúvida, disse-​me, com todas as letras: — meu filho, eu con­fio em você para me defender.

Já sabia o assunto é o que dizer ficamos con­ver­sando e tro­cando ideias sobre vários assun­tos. Não lhe per­gun­tei porque tinha ido para o lado do ex-​presidente Sarney.

Entre­tanto, entre uma con­versa ou outra, acabou por dizer que estava bem com o grupo do ex-​presidente e que resolvera esque­cer e per­doar as coisas que acon­te­ce­ram no pas­sado.

Não me recordo se nesta ou noutra opor­tu­nidade, contou-​me que agrade­cia a Sar­ney por ter sido solidário a ele por conta de uma enfer­mi­dade sofr­era. Disse algo, mais ou menos, com estas palavras: — meu filho, eu estava mor­rendo, encontrava-​me nu, enro­lado com um lençol, sobre uma maca de hos­pi­tal e o Sar­ney apare­ceu lá para segu­rar minha mão.

Não sei se nos últi­mos anos o ex-​senador man­tinha o mesmo nível de relação em relação ao ex-​presidente – com o fim do processo e agrava­mento do seu quadro de saúde, perdemos o con­tato –, mas naquele momento em que esteve comigo, seu sen­ti­mento era de amizade e reconhecimento.

Este, tam­bém, é um fato para a história.

Ambos os mis­sivis­tas, o próprio Sar­ney e o jor­nal­ista do Órgão das Mul­ti­dões, talvez por igno­rar ou por con­veniên­cia, abor­daram ape­nas frag­men­tos de uma história bem mais ampla.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

Comen­tários

0 #1 Edi­nar 23-​05-​2018 09:54
Cafeteira, foi o politico da minha infân­cia e ado­lescên­cia. Vi meu pai acompanhar-​lo , pelas ruas e praças de minha cidade em cam­panha ou even­tos. É não foram poucos. Cafeteira esta sem­pre em apoio ao então politico e já fale­cido Bete Lago.
Quando fiz 18 anos, pas­sei a votar em Cafeteira, votei em todas as vezes que foi can­didato a par­tir daí.
Tam­bém estudei na Escola Téc­nica do Com­er­cio, de minha cidade , por 3 anos, com uma bolsa de estudo que me foi dada pelo na época dep­utado fed­eral Cafeteira. Con­segui, ape­nas com uma carta man­u­scrita.
Sou muito grata a ele. Infe­liz­mente não tive opor­tu­nidade de agrade­cer pes­soal­mente pelo que fez por.
Cafeteira, um grande politico, um grande homem.
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