AbdonMarinho - O INCÔMODO SILÊNCIO DO FISCAL DA LEI.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O INCÔ­MODO SILÊN­CIO DO FIS­CAL DA LEI.

O INCÔ­MODO SILÊN­CIO DO FIS­CAL DA LEI.

O ASSUNTO mais comen­tado dos últi­mos dias, no Maran­hão, é a tal “Oper­ação Pegadores”, des­en­cadeada pela Polí­cia Fed­eral para apu­rar mau uso de recur­sos públi­cos na área da saúde. Segundo as inves­ti­gações empreen­di­das pela Polí­cia Fed­eral, Min­istério Público Fed­eral e Con­tro­lado­ria Geral da União, tais recur­sos estavam tendo uso diverso dos fins a que se des­ti­navam, servindo, den­tre out­ras coisas para o paga­mento de inúmeros apanigua­dos, inclu­sive de pes­soas bem próx­i­mas aos donos do poder, quando não sendo desvi­a­dos, pura e sim­ples­mente, através de algu­mas empre­sas de fachada.

As imputações são sérias, se ape­nas metade do que está dito se con­fir­mar, muitos terão que se explicar com a Justiça, cor­rendo o risco de virarem hós­pedes do Estado.

Em meio a tudo isso, a tan­tos debates acalo­rados na esteira da oper­ação poli­cial e das inves­ti­gações em si, emerge um estranho silêncio.

Pas­sa­dos todos estes dias não vi uma man­i­fes­tação do Min­istério Público Estad­ual. Pro­curei nos jor­nais, na mídia dig­i­tal e até no sítio do órgão e não encon­trei uma linha sobre o assunto. Parece, até, que os fatos não ocor­rem no Maran­hão ou que o MPE não é daqui ou, mesmo, que não tem nada a ver com os supos­tos desvios dos recur­sos da saúde no estado.

Mesmo que não ten­ham uma par­tic­i­pação mais efe­tiva por conta da inves­ti­gação ocor­rer na esfera fed­eral, não faz sen­tido que, sequer, uma nota pro­to­co­lar cobrando rig­orosa apu­ração o MPE tenha lançado.

Ainda mais absurdo con­siderando que o MPE con­quis­tou o primeiro lugar no prêmio CNMP 2017 — na cat­e­go­ria redução de corrupção.

Essa infor­mação, aliás, é o destaque no site do MPE e ban­ners lou­vando o feito que estão espal­ha­dos Maran­hão a fora. Não soa estranho que o órgão, com um escân­dalo desta mag­ni­tude nas bar­bas de suas excelên­cias, se man­tenha silente?

Por onde passo tenho ouvido os cole­gas advo­ga­dos, sobre­tudo, os que atuam no inte­rior, teste­munhando sobre a inci­siva atu­ação dos pro­mo­tores em relação às admin­is­trações municipais.

São req­ui­sições, pedi­dos de ajustes e recomen­dações sobre tudo. Muitos destes cole­gas, mes­mos os mais expe­ri­entes e cor­da­dos, se ressen­tem com o excesso de atu­ação dos mem­bros do MPE. Não que estes este­jam erra­dos, não se trata disso, é que por vezes as solic­i­tações rep­re­sen­tam ver­dadeiras intro­mis­sões no que con­sid­eram o mérito administrativo.

Não sem razão, emb­ora com certo exagero, muitos gestores, dizem, aqui e ali, que entre­garão, as chaves das prefeituras aos promotores.

Outro dia, enquanto aguar­dava o iní­cio da sessão, no TRE, alguns jovens cole­gas me cer­cavam com tais histórias – que até reputo exager­adas, repito –, um, por exem­plo, disse-​me: —Mestre, pedi­ram o afas­ta­mento do gestor por que, em deter­mi­nado pro­ced­i­mento lic­i­tatório, não tinha, no edi­tal, um tal de QR Code (nem sabia de tal neces­si­dade, nem sei dire­ito que é isso); outro: — Dr., entraram com uma Ação Civil Pública de Impro­bidade, con­tra o prefeito porque uma secretária do municí­pio tem a tia nomeada dire­tora de uma escola em deter­mi­nado povoado, ou seja incor­ria em nepo­tismo; um outro: — Dr., recomen­daram que fos­sem demi­ti­dos todos os par­entes, até ter­ceiro grau, de prefeito, vice-​prefeito, secretários munic­i­pais, vereadores ou de qual­quer ocu­pante de cargo comis­sion­ado. Como o municí­pio é pequeno e todo mundo é par­ente, está difí­cil achar quem não se enquadre na vedação. Mesmo os car­gos, antes tidos por de agentes políti­cos, como secretários, entraram na restrição.

E muitas out­ras histórias assim ou semel­hantes. Um até disse – acho que com pil­héria –, que Procu­rado­ria de Justiça impusera metas a serem atingi­das pelos pro­mo­tores nestes que­si­tos: nepo­tismo, con­curso, transparên­cia, etc.

Em que pese alguns exageros, por vezes, até aço­da­men­tos, não tenho dúvi­das que suas excelên­cias, os pro­mo­tores, o Min­istério Público Estad­ual, como um todo, estão cor­re­tos ao cobrar o cumpri­mento dos princí­pios con­sti­tu­cionais da pro­bidade, moral­i­dade, impes­soal­i­dade, pub­li­ci­dade, e tan­tos out­ros no âmbito das administrações.

Essa é a boa prática ao redor do mundo.

Em muitos países não se cogita, sequer, par­entes tra­bal­hando com gestores eleitos ou nomea­dos; out­ros não per­mitem asses­sores pes­soais ou que os car­gos públi­cos sejam remu­ner­a­dos – a função pública é remu­ner­ada com o salário do cidadão, quando muito uma ajuda de custo sob o escrutínio dos cidadãos que têm acesso a nota fis­cal, uma min­is­tra de um destes países perdeu o cargo por conta de uma barra de choco­late numa nota de despesa.

Muitos são os exem­p­los, entre­tanto, soa incom­preen­sível que ao passo em que sejam feitas essas recomen­dações e se adotem medi­das con­tra os gestores munic­i­pais, no âmbito do gov­erno estad­ual, sobre­tudo na cap­i­tal, onde a estru­tura do MPE é infini­ta­mente maior, não hajam as mes­mas cobranças ou medidas.

As inves­ti­gações em curso rev­e­lam desvios nas con­tratações através de enti­dades de gestão de mão de obra, OCIPS, OS, etc., enquanto nos municí­pios são cobra­dos e exigi­dos con­cur­sos públi­cos. Há anos que o Estado faz uso de con­tratação através de tais enti­dades, sem ser dev­i­da­mente molestado, sem que os respon­sáveis respon­dam por impro­bidade administrativa.

Muitos servi­dores, médi­cos, enfer­meiros, odon­tól­o­gos, e tan­tos out­ros, muitas das vezes, nem têm con­tratos assi­na­dos, muitos, sequer, sabem quem lhes pagam, só sabem que o din­heiro caiu na conta, isso quando não atrasam, dois, três ou qua­tro meses.

Enquanto os municí­pios são exigi­dos para que demi­tam todos os servi­dores não efe­tivos e que sejam par­entes até ter­ceiro grau, de prefeito, vice-​prefeito, secretários munic­i­pais, vereadores ou de qual­quer ocu­pante de cargo comis­sion­ado, no estado, o que mais tem são par­entes de dep­uta­dos, secretários, mag­istra­dos, e tudo que é autori­dade pública comis­sion­ada, famílias inteiras vivem de car­gos em comis­são, sem serem molesta­dos pelo Min­istério Público Estadual.

Sem fazer ilação, não duvido que tenha, na estru­tura admin­is­tra­tiva Estad­ual, par­entes de inte­grantes do órgão min­is­te­r­ial. Não seria nepo­tismo? Ou essa regra só vale para os municípios?

Só para lem­brar, logo no iní­cio do atual gov­erno quando inúmeros casos de nepo­tismo foram denun­ci­a­dos, o gov­er­nador encer­rou a dis­cussão sobre o tema com uma frase sin­gela de que não seria cor­reto punir o amor.

Não se sabe – pelo menos nunca foi divul­gada – qual­quer medida do MPE para apu­rar e coibir tanto amor às cus­tas dos contribuintes.

Tanto que as inves­ti­gações atu­ais rev­e­lam que par­entes de autori­dades, estavam, inclu­sive, recebendo, inde­v­i­da­mente, recur­sos da saúde. Nem se fale nas esposas, irmãos, tios, de uns e de out­ros lota­dos nas mais diver­sas sec­re­tarias, autar­quias e órgãos da admin­is­tração direta e indireta.

Não seria nepo­tismo tais par­entes de secretários e demais autori­dades estarem abo­le­ta­dos nos diver­sos órgãos e sec­re­tarias estaduais?

Todos no Maran­hão, até porque não é seg­redo, ex vi as palavras do próprio gov­er­nador, sabem disso, exceto o MPE, pois se soubesse, cer­ta­mente, faria no âmbito Estad­ual o que tem exigido que se façam nos municípios.

Não tem um dia que abramos os jor­nais e não nos deparamos com uma notí­cia, muitas da asses­so­ria do MPE, dando conta de ações con­tra gestores munic­i­pais e ex-​gestores, mesmo quando os tri­bunais e câmaras munic­i­pais aprovam con­tas surgem ações dizendo que aqui ou ali, numa lic­i­tação ou processo foram feri­dos os princí­pios da admin­is­tração pública, com mul­tas altís­si­mas, devoluções nas alturas, ineleg­i­bil­i­dade, proibição de con­tratar com o poder público e até ser con­tratado pes­soal­mente para algum tra­balho – muitos gestores e ex-​gestores saem infini­ta­mente mais pobres e sem sossego das admin­is­trações que par­tic­i­param –, entre­tanto, não se tem muitas notí­cias deste tipo de coisa con­tra gov­er­nadores ou secretários estad­u­ais (quando ocorre é como exceção).

Quan­tas vezes os veícu­los de comu­ni­cação não denun­cia­ram os exces­sos de aluguéis pro­movi­dos pelo gov­erno estad­ual, apel­i­dado jocosa­mente de “aluguéis cama­radas” quase sem­pre envol­vendo apanigua­dos, ali­a­dos políti­cos ou mesmo par­entes de autori­dades? Quan­tas inves­ti­gações estão em curso para apu­rar tais fatos?

Se exis­tem cor­rem no rig­oroso sigilo.

Agora mesmo esta­mos diante de algo que con­firma o que se acaba de dizer: o inusi­tado silên­cio do Min­istério Público Estad­ual diante das inves­ti­gações e rev­e­lações feitas nesta oper­ação poli­cial dos “Pegadores” que é um des­do­bra­mento da Oper­ação “Ser­mão dos Peixes”, ocor­rida lá atrás.

O que foi feito pelas autori­dades estad­u­ais, e aqui, não só o MPE, em relação àque­las rev­e­lações? Será que se tivessem feito algo teríamos chegado a “Oper­ação Pegadores”?

Por vezes fico imag­i­nando se, em algum momento, os dili­gentes pro­mo­tores per­di­dos nos rincões do Maran­hão, não ficam con­strangi­dos ao con­statarem, tal como agora, o trata­mento difer­en­ci­ado exis­tente entre os gestores munic­i­pais e os gestores estad­u­ais em relação ao órgão. Um erro, mesmo mín­imo ou for­mal, pode impactar a vida dos primeiros para sem­pre enquanto os segun­dos pare­cem inatingíveis.

Haverá Justiça nisso?

Abdon Mar­inho é advogado.