AbdonMarinho - O SORVETE E A LITURGIA DA MENTIRA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O SORVETE E A LITUR­GIA DA MENTIRA.

O SORVETE E A LITUR­GIA DA MEN­TIRA.
ALGUÉM me manda um artigo suposta­mente escrito pelo ex-​presidente José Sar­ney, inti­t­u­lado “Gov­erno Sorvete”. Come­cei a ler e, antes mesmo de ter­mi­nar, ape­sar de não ser longo, fui ao site do escritor e político certificar-​me da auto­ria.
No seu site, que divide em duas partes: o escritor e o político, está, de fato, o texto, que devo dizer não faz justiça a nen­hum dos dois, nem ao escritor mem­bro da Acad­e­mia Brasileira de Letras, nem ao político, que foi de dep­utado a Pres­i­dente da República.
O escritor pro­duziu uma ficção meio ridícula e o político um texto de uma polit­i­calha atroz que já se esper­ava super­ada nos dias atu­ais.
O ex-​presidente que já foi tudo que son­hou – e até além dos son­hos –, afi­nal, um político do inte­rior do Maran­hão que chega à presidên­cia da República, tendo antes sido dep­utado, senador, não é para qual­quer um – e ele chegou lá –, e depois ainda foi senador por mais 24 anos pelo estado do Amapá, sendo, até hoje, respeitado como um dos mais argutos políti­cos brasileiros, pode­ria se dar ao respeito de não escr­ever ou assi­nar qual­quer coisa que lhes põem as mãos.
Não que o ex-​presidente nunca tenha sido capaz de escr­ever ou até fazer coisas bem piores na luta pelo poder.
A ele, foi e é atribuída uma das mais tor­pes obras de ficção política já cri­adas no Maran­hão: a farsa da suposta morte de Reis Pacheco, cuja a auto­ria imputou, igual­mente, num artigo, ao adver­sário de então, o can­didato ao gov­erno Cafeteira, no longín­quo ano de 1994.
Aquela trama de ficção con­sis­tiu em for­jar a morte de um cidadão que tivera par­tic­i­pação – através de um aci­dente de trân­sito – na morte do con­sel­heiro Hilton Rodrigues, sogro de Cafeteira.
Como, sim­ples­mente, não daria certo dizer tal absurdo, a obra fic­cional “criou” um irmão para Reis Pacheco, um per­son­agem chamado Ana­cleto, que, através de um advo­gado do Ceará, denun­ciou que o senador da República, Cafeteira, ao Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, como man­dante da suposta morte do irmão. Quanta cria­tivi­dade e ousa­dia.
Às vésperas do pleito o autor da ficção escreve um artigo “Liber­dade e Reis Pacheco” – em deter­mi­nada pas­sagem do texto, se não me falha a memória, chega a dizer que Cafeteira, no velório do sogro, teria lhe con­fes­sado o desejo de ver morto o cau­sador do aci­dente –, atribuindo ao adver­sário a morte de Reis Pacheco.
A farsa só foi des­baratada, após inves­ti­gação ráp­ida empreen­dida pelos dep­uta­dos Juarez Medeiros e Ader­son Lago, poucos dias antes daquele pleito quando, pelas difi­cul­dades de comu­ni­cação de então e a sab­o­tagem, como falta de ener­gia em quase todo o inte­rior e mesmo falta de sinal de tele­visão no horário da pro­pa­ganda eleitoral de rádio e tele­visão, impediu que fosse reposta a ver­dade: Cafeteira nunca man­dara matar ninguém, Reis Pacheco estava “viv­inho da silva”, morando no Amapá, e o tal irmão Ana­cleto não exis­tia.
Acred­ito que quem escreve, sobre­tudo, quem tem a honra de dizer-​se escritor – e que já foi tudo que quis na vida –, tem cer­tos deveres éti­cos e o com­pro­misso indelével com a ver­dade. Aliás, como dizia o próprio ex-​presidente: tem que respeitar a litur­gia do cargo – e do encargo.
Já vivendo o seu out­ono, o ex-​presidente e escritor, dev­e­ria zelar um pouco mais por sua biografia, a fim de evi­tar que as tor­pezas prat­i­cadas na ânsia desme­dida pelo poder se sobres­saíam mais que as qual­i­dades que, acredita-​se, possa ter. Afi­nal, todos, ao menos para os seus, têm algu­mas qual­i­dades.
Ao escr­ever o texto “Gov­erno Sorvete”, talvez numa ten­ta­tiva de ironizar o atual gov­er­nador, acaba por arran­har a própria biografia.
Não se faz iro­nias ou se escreve sobre assun­tos tão sérios sem tomar por base argu­men­tos reais. A falta desse cuidado, acaba, infe­liz­mente por igualar, um escritor que já teve até a honra de pre­sidir o Brasil a um destes venais blogueiros capazes de alu­gar a pena e vender a con­sciên­cia por qual­quer tro­cado.
Emb­ora estivesse via­jando por ocasião da defla­gração da Oper­ação Pegadores (gostei demais deste apelido pela cria­tivi­dade), entendi, desde o primeiro momento, que o gov­erno estad­ual pagara por algo a uma empresa que, no pas­sado, fora uma sorvet­e­ria. Entendi assim.
A história de que estavam pagando pro­ced­i­men­tos médicos-​hospitalares a uma sorvet­e­ria ou pagando por sorvete, picolés ou casquin­has, já foi exer­cí­cio cria­tivo daque­les que se ocu­param de explo­rar o episó­dio politi­ca­mente.
Depois, os próprios gov­ernistas, apan­hados com as calças nas mãos por con­tas de suas estrip­u­lias pouco orto­doxas, acabaram usando a tal ver­são para ten­tar desmor­alizar a oper­ação poli­cial, colo­cando em dúvida todo um tra­balho real­izado por agentes poli­ci­ais, inte­grantes do Min­istério Público Fed­eral da Con­tro­lado­ria Geral da União e do Poder Judi­ciário.
Os fatos apu­ra­dos até aqui, são graves e mere­cem rig­orosos esclarec­i­men­tos por partes dos atores impli­ca­dos, temos mais de uma dezena de pes­soas pre­sas pro­vi­so­ri­a­mente, sendo exe­cra­dos pub­li­ca­mente, temos denún­cias de que os recur­sos públi­cos da saúde estavam sendo usa­dos para paga­men­tos de inúmeros apanigua­dos e que, serviam, inclu­sive, para paga­men­tos de pen­sões ali­men­tí­cias e de “Bolsa Quenga” por alguns altos dig­natários do poder. Isso é sério, muito sério, não com­porta grace­jos ou grac­in­has.
Se o texto do ex-​presidente pre­tendeu ser irônico, dev­e­ria antes de tudo, cercar-​se da ver­dade para não fazer coro aos que querem, com infor­mações fal­sas, prej­u­dicar e achin­cal­har o tra­balho, que se quer acred­i­tar seja sério e desprovido de qual­quer outra moti­vação que não seja zelo pela coisa pública e a ver­dade real.
Os fatos nar­ra­dos na inves­ti­gação são coisas bas­tante sérias, repito, não havendo lugar para iro­nias de mau gosto como a história do “sorvete de coco ou cocô” ou de que o trata­mento dos pacientes que agon­i­zam nos hos­pi­tais estad­u­ais, con­siste na dis­tribuição de picolés, casquin­has ou out­ros ingre­di­entes.
Que falta de respeito com os enfer­mos, Dr. Sar­ney.
Ao fazer iro­nias fic­cionais sem graça e gosto duvi­doso, tendo como questão de fundo infor­mações desprovi­das de ver­dade, o ex-​presidente presta um desserviço não só as inves­ti­gações mas à boa lit­er­atura maran­hense onde se destacaram nacional­mente fig­uras como Gonçalves Dias, os irmãos Azevedo, Josué Mon­telo, João Lis­boa, Fer­reira Gullar, e tan­tos out­ros.
Se ten­tou fazer graça com assunto de tamanha gravi­dade não con­seguiu mais que sor­riso amarelo e cho­cho, indigno de valer um sorvete, este, de ver­dade.
Abdon Mar­inho é advogado.

PS. O texto do ex-​presidente você ler em www​.jos​esar​ney​.org/

Comen­tários

0 #1 Daniel Lin­doso 21-​11-​2017 12:59
Quero ape­nas cor­rob­o­rar com suas breves e impor­tantes palavras Dr Abdon, ficando mais enfa­ti­zadas quando refere-​se aos nos­sos enfer­mos nos hos­pi­tais do nosso Estado, isso é muito serio, veja, 18 mil­hões, com 18 mil­hões, quan­tas vidas de con­ter­râ­neos pode­ria ser sal­vas, exames que se marca e não é real­izado porque a maquina esta que­brada, a fila se alonga, e muitas das vezes o paciente não tem mais tempo de realizar o exame, porque a doença já avançou. Pra mim, isso é crime, seja qual for o gov­erno oper­ante, não deixa de ser crime, e as pes­soas arro­ladas nesses crimes, tem que prestar con­tas de seus atos que estão cau­sando a morte de muitos val­orosos maranhenses.
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