AbdonMarinho - MARANHÃO - O ESTADO PROIBIDO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

MARAN­HÃO — O ESTADO PROIBIDO.


MARAN­HÃO — O ESTADO PROIBIDO.

Por Abdon Marinho.

QUEM acom­panha meus escritos já deve con­hecer a história de seu João da Silva – falei dele bem mais que uma vez.

Os que chegam agora darei uma “pal­hinha”. O seu João da Silva (nome fic­tí­cio) é um defi­ciente visual que cos­tuma pedir esmo­las alter­nada­mente em Belém, Pará e em For­t­aleza, Ceará. Passa um mês ou dois em Belém e vai para For­t­aleza e vice-​versa, con­forme a arrecadação.

Seu João da Silva entra na nossa crônica porque sem­pre que faz esse per­curso, em um sen­tido ou noutro, ao ingres­sar no Maran­hão, ele “avisa” ao motorista: — entramos no Maran­hão, né motorista?! Fazendo a mesma coisa quando sai do estado: — saí­mos do Maran­hão, né motorista?! Mesmo quando a “trav­es­sia” para o estado o alcança enquanto dorme, ao acor­dar, con­segue se situar para perce­ber que se encon­tra ou saiu do Maran­hão.

Essa ale­go­ria ini­cial é ape­nas para mostrar que somos tão mal servi­dos de rodovias – fed­erais e estad­u­ais –, que mesmo um cego con­segue saber quando entra e quando sai do estado. Entra gov­erno, sai gov­erno, entre­tanto, parece que uma cabeça de burro enter­rada no solo maran­hense impede que por aqui se façam estradas ou mesmo recu­per­ação de vias com um “prazo de val­i­dade” supe­rior a um ano.

Uma vez, sen­tado na Praça da Matriz de Luis Domingues, em um fim de tarde depois de cumprir uns com­pro­mis­sos, um amigo de lon­gas datas, cun­hou a frase enquanto tratá­va­mos deste tema: — ah, doutor, essas são obras de “morder”. Sem enten­der bem olhei-​o intri­gado, que com­ple­tou: — todo gov­er­nante que entra quer morder um pedaço.

Sobre obras de morder e estradas ruins temos muitos quilômet­ros roda­dos.

Lem­bro no iní­cio dos anos 2000, a estrada que lig­ava a BR a Caru­ta­pera (MA 101) era uma tão ruim, mas tão ruim, que voltando de lá ao avis­tar uma sumaúma que fica a 6km da BR, dizia: — cheg­amos em casa. Havíamos ven­cido ape­nas 80 km dos mais quin­hen­tos de dis­tân­cia. Depois que a rodovia foi feita, ainda no gov­erno Zé Reinaldo, con­tin­uei usando a frase a para lem­brar aos cole­gas de via­gens muitas das difi­cul­dades enfrentadas.

Com­ple­tando a série de infortúnios rela­ciona­dos à infraestru­tura do nosso estado, nos últi­mos dias não se fala de outra coisa que não o colapso – ou quase colapso –, do sis­tema de ferry-​boat que é o prin­ci­pal meio de deslo­ca­mento para a Baix­ada Maran­hense e para quem quer diminuir a dis­tân­cia, saindo de São Luís, para a região do alto Turi ou para o estado do Pará.

Desde que me tornei advo­gado, há vinte e cinco anos, que faço uso deste meio de trans­porte nas min­has andanças pela baix­ada ou nas idas até os lim­ites com o Pará. Noutras palavras: já ouvi em dema­sia o apito do ferry-​boat.

A última vez foi há menos de duas sem­anas.

Como não gosto de impro­visação, sem­pre com­pro min­has pas­sagens com quase um mês de ante­cedên­cia.

Ao longo deste quarto de século acostumei-​me a dizer que pes­soa impor­tante para mim é quem con­segue pas­sagem no ferry em cima da hora. Essa, sim, é impor­tante.

Havia me pro­gra­mado para atrav­es­sar no ferry das 17:30 horas. Como os com­pro­mis­sos mar­ca­dos não iriam acon­te­cer ou con­segui resolvê-​los antes do pre­visto, pelas 9 horas já estava em Gov­er­nador Nunes Freire, o antigo Encruzo, voltando.

Fiz alguns con­tatos para ten­tar ante­ci­par a pas­sagem, não tive êxito, nen­hum amigo “impor­tante” con­seguiu tro­car a pas­sagem. Con­sul­tei os com­pan­heiros de viagem se prefe­riam voltar pela BR ou de ferry argu­men­tando que chegaríamos até antes do horário mar­cado para trav­es­sia. Quedei-​me ven­cido sob o argu­mento de que as estradas estão tão ruins que era prefer­ível esperar para depois das 17:30 horas que seguir viagem rodando.

Rodando deva­gar, parando mais do que o necessário na estrada para fazer alguma coisa ou mesmo para apre­ciar a cheia dos rios, antes do começo da tarde já está­va­mos livres, mesmo tento parado para aten­der uns com­pro­mis­sos de última hora em Pin­heiro e Bequimão, ainda estava longe da hora da trav­es­sia quando resolve­mos ir para o Cujupe, ten­tar “in loco” tro­car a pas­sagem.

Quando nos aprox­i­mamos vi o tamanho do prob­lema e porque os ami­gos “impor­tantes” não tiveram êxito em ante­ci­par a pas­sagem com­prada com um mês de ante­cedên­cia: a fila de espera, ou seja, dos “sem pas­sagem”, estava chegando na curva oposta à Igreja Assem­bleia de Deus do Povoado Cujupe. Quem con­hece sabe a dis­tân­cia até o ponto de embar­que e a difi­cul­dade para embar­car estes veícu­los.

Comentei com os cole­gas de viagem: — meus fil­hos, a coisa aí está feia. Fazia tempo que não via a “fila de espera” deste tamanho, fora os áureos tem­pos dos con­cor­ri­dos car­navais de Curu­rupu ou Pin­heiro.

Munidos do “salvo-​conduto” da pas­sagem, avançamos na con­tramão até o ter­mi­nal, uma vez que a pista é sim­ples e “mão” já estava tomada pelos veícu­los esta­ciona­dos na “fila de espera” quilométrica – e sem pre­visão de embar­que.

Ainda não eram 15 horas, calor de fazer inveja as caldeiras do inferno, ainda teríamos um temp­inho até a hora do embar­que.

Um colab­o­rador da empresa que opera o sis­tema de trans­porte informou-​nos a razão do “caos”: só dois ferry-​boat estavam operando – mesmo quando tín­hamos sete ou oito já era complicado.

Sem inter­net ou tele­fone para tra­bal­har ou mesmo nos dis­trair fiquei a pen­sar que o Maran­hão tornara-​se um “estado proibido” com sua pop­u­lação ou mes­mos os transe­untes de out­ros esta­dos em poderem se loco­mover com um mín­imo de con­forto ou dig­nidade.

Diante do caos insta­l­ado e em véspera de eleições não fal­taram foi políti­cos – com ou sem mandatos –, apon­tando cul­pa­dos e ten­tando se pro­mover.

Na ver­dade, todos tem uma parcela de respon­s­abil­i­dade no caos que viven­ci­amos, não ape­nas no sis­tema de ferry-​boat, mas, tam­bém, nas rodovias fed­erais e estad­u­ais que são feitas e refor­madas todos os anos e, rara­mente, encon­tramos uma que dure mais que um inverno.

Não é de hoje ou de agora que a pop­u­lação reclama das pés­si­mas condições das estradas – tanto que os que moram nas áreas limítro­fes com out­ros esta­dos pref­erem tran­si­tar pelas rodovias dos esta­dos viz­in­hos –, das pés­si­mas condições do trans­porte de ferry-​boat ou se ressen­tem da falta de trens de pas­sageiros ou das condições desumanas do trans­porte urbano, etc.

Essas recla­mações vêm de décadas.

O que fiz­eram ou têm feito os rep­re­sen­tantes do povo que estão há vinte, dezes­seis, doze, oito ou mesmo qua­tro anos no poder? As excelên­cias fed­erais, estad­u­ais ou mesmo munic­i­pais só se deram conta do que são as difi­cul­dades dos cidadãos agora? Por que nunca recla­ma­ram ou cobraram providên­cias dos respon­sáveis antes do caos se insta­lar? Por que nunca cobraram sat­is­fações pelo fato das emen­das par­la­mentares que des­ti­nam as obras viárias serem tão mal empre­gadas?

O sis­tema de ferry-​boat – assim como o viário -, não ruiu do dia para noite, assim como fun­cionará com efi­ciên­cia “do dia pra noite”, não tem ferry-​boat no super­me­r­cado para com­prar um, dois, três ou uma dúzia, colo­car em fun­ciona­mento para resolver o prob­lema. De igual forma, é impos­sível, mesmo que tivésse­mos disponíveis, “bus­car” um ferry-​boat de helicóptero para colocá-​lo na trav­es­sia de vapt-​vupt.

No máx­imo, o que podem fazer é ten­tar con­ser­tar algu­mas “sucatas” para ten­tar aliviar o sofri­mento das pes­soas que diari­a­mente pre­cisam atrav­es­sar a baía de São Mar­cos.

Aju­daria bas­tante, tam­bém, se nos dois lados da baía tivésse­mos um mín­imo de estru­tura.

Por incrível que pareça as autori­dades não se pre­ocu­pam nem em cobrar das oper­ado­ras de tele­fo­nia móvel que disponi­bi­lizem inter­net e/​ou tele­fone que “preste” nas ime­di­ações dos dois ter­mi­nais. Já na Ponta da Madeira é sofrível, no Cujupe sequer tem sinal.

Vejam que situ­ação: não basta o cidadão ser pri­vado do sagrado dire­ito de loco­moção, ele deve, tam­bém, ficar inco­mu­nicável.

Pre­sos e inco­mu­nicáveis é a sen­sação dos cidadãos enquanto aguardam a vez de embar­car em um serviço cada vez mais ine­fi­ciente e perigoso, pois com ape­nas dois ou três ferry-​boat, fun­cio­nando sem parar, é quase certo que não segu­rarão o “tranco” levando ao colapso total do sis­tema.

Esse é o preço que pag­amos por ter­mos escol­hido, aos longo de décadas, rep­re­sen­tantes sem visão de futuro, que não con­seguem enx­er­gar além do almoço do dia seguinte.

Vejam um prob­lema que par­tic­i­pamos diari­a­mente: as MA’s que cor­tam e interligam os municí­pios da região met­ro­pol­i­tana pre­cisam ser dupli­cadas com urgên­cia.

Até aqui os gov­er­nos não ape­nas não fazem isso como per­mitem que façam edi­fi­cações quase den­tro da pista de rola­mento.

Com isso os engar­rafa­men­tos são cada vez mais fre­quentes na estrada de Riba­mar, na estrada da Maioba, na estrada da Raposa e até mesmo na MA 204, que interliga as três vias.

Há décadas sabe­mos da importân­cia de ter­mos uma ponte lig­ando a cap­i­tal à baix­ada.

É inviável uma ponte marí­tima? Por que não faz­er­mos uma ponte lig­ando a Estiva a Tauá-​Mirim e de lá, para Ilha dos Carangue­jos e a sede de Cajapió? Seria o cam­inho mais curto para baix­ada.

Tudo bem que o gov­erno ante­rior demorou mais de sete anos para fazer uma ponte sobre o Rio Per­icumã e que três pontes sobre a foz do Mearim deman­daria mais tempo, mas se nunca plane­jarem ou ini­cia­rem, nunca serão feitas, e como cos­tuma dizer o amigo And­inho, lá de Santa Helena: o “baix­adeiro” con­tin­uará a sofrer.

Abdon Mar­inho é advogado.