AbdonMarinho - SAÚDE: O GOVERNO AMEAÇA COM O INFERNO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

SAÚDE: O GOV­ERNO AMEAÇA COM O INFERNO.

SAÚDE: O GOV­ERNO AMEAÇA COM O INFERNO.

Dias desses, a cam­inho do escritório, uma sen­hor­inha – que pela aparên­cia beirava os 70 anos –, pediu-​nos uma carona pois pre­cisava “ten­tar” consultar-​se com um médico de uma espe­cial­i­dade qual­quer que, naquele dia, estaria aten­dendo numa Unidade de Saúde em outro bairro.

Emb­ora saindo um pouco do meu roteiro, levei aquela sen­hora à unidade de saúde, como se fir­mava numa ben­gala, pelos idos dos anos ou por alguma enfer­mi­dade, deixei-​a na porta e pude ver, já esperando para ser aten­di­dos, cerca 40 ou 50 pacientes. Naquele horário, antes das 7 horas, se tivesse sorte, seria aten­dida lá para as 14 ou 15 horas. Isso se já não esgo­tado o número de sen­has e man­dada voltar outro dia, na sem­ana seguinte, no mês seguinte, no ano seguinte.

Adi­ante, na Avenida dos Holan­deses, vi a cena – que se repete todos os dias: cen­te­nas, talvez mil­hares de cidadãos, madru­gando na fila da cen­tral de mar­cação de con­sul­tas, ten­tando mar­car um atendimento.

Naquele mesmo dia assisto a uma reportagem/​desabafo de um médico (agora em São Paulo), na qual dizia que pes­soas ficariam cegas por não con­seguir fazer cirur­gias sim­ples de catarata, por falta de condições mínimas.

A reportagem trouxe a história de duas sen­ho­ras: uma, feliz por haver con­seguido o atendi­mento e voltado a enx­er­gar com mais qual­i­dade; a outra, triste por ter via­jado mais de 200 km e não ter con­seguindo o trata­mento para um deslo­ca­mento de retina, com risco de ficar cega.

Den­tre os male­fí­cios enfrentado pelo homem, acred­ito que a cegueira, seja uma das mais graves.

Não con­sigo dimen­sionar o sofri­mento de uma pes­soa que via tudo, de uma hora para outra, perder a visão. O drama se torna mais desco­mu­nal quando sabe­mos que aquela cegueira pode­ria ser evi­tada, que a cidadão pode­ria con­tin­uar usufruindo da sua visão se não o Estado tivesse lhe garan­tido ape­nas o básico.

Diari­a­mente ouvi­mos relatos dando conta que médi­cos, muitos ainda res­i­dentes, mal saí­dos da ado­lescên­cia, têm que escol­her, nas emergên­cias dos prontos-​socorros da vida, aque­les que terão uma segunda chance de viver e aque­les que mor­rerão que, sequer, serão aten­di­dos; ou casos de recusa de atendi­mento hos­pi­ta­lar por falta de vagas, leitos; ou casos que vão para ter­mi­nar nas del­e­ga­cias de polícias.

Agora se encerra uma cam­panha de pre­venção ao câncer de mama (uma das maiores taxas de mor­tal­i­dade entre as mul­heres). Emb­ora sejam cam­pan­has fun­da­men­tais e essen­ci­ais, sabe­mos que seu alcance ainda é muito restrito. Mil­hões de mul­heres con­tin­uarão sem acesso ao trata­mento pre­ven­tivo e até sem saber se acometi­das ou não deste mal, desco­brindo ape­nas quando o trata­mento é mais penoso e muitas vezes sem chance de cura.

No dia a dia os dra­mas, de tão comuns, são vis­tos com nat­u­ral­i­dade. São con­sul­tas sendo mar­cadas para dali a três, seis meses, muitas das vezes, para até um ano depois. São retornos médi­cos pre­vis­tos para as calendas.

Talvez não para muitos médi­cos, talvez não para muitos gestores ou buro­cratas, mas a questão da saúde vai muito além dos seus números, sejam eles de mor­tos, de cirur­gias, de atendi­men­tos, de recur­sos investidos.

A questão da saúde afeta o ser humano, o indi­ví­duo, suas famílias, no momento de maior fragilidade.

Qual­quer mal-​estar, as vezes um sim­ples acú­mulo de gases, já nos torna frágeis.

O que dizer do sofri­mento cau­sado pela per­spec­tiva de um câncer, de uma doença degen­er­a­tiva, um prob­lema cardíaco com­plexo e tan­tos out­ros males graves? Como fazer ou exi­gir que estas pes­soas esperem meses por um atendi­mento, anos por uma cirur­gia ou um trata­mento con­tin­u­ado? Como ficar indifer­entes ao sofri­mento daque­les que adorme­cem e aman­hecem nas por­tas dos hos­pi­tais sem saberem se serão ou não atendidos?

O gov­erno brasileiro acha pouco tudo que já vem acon­te­cendo no sis­tema de saúde: seja a rede insu­fi­ciente, sejam as espe­cial­i­dades inex­is­tentes na maio­ria dos municí­pios, sejam os pacientes ficando defi­cientes por falta de insumos essen­ci­ais, seja a falta de medica­men­tos de uso con­tinuo, seja a lote­ria de vida e morte que acon­te­cem diari­a­mente nas emergências.

Leio e entendo como ameaça o que disse recen­te­mente o min­istro da saúde: “o que está ruim poderá piorar”.

Não devíamos nos sur­preen­der com esse tipo de declar­ação vinda de um min­istro do atual gov­erno. Quando pen­samos que atingi­mos o fundo do poço, sem­pre aparece algum inte­grante do gov­erno mostrando que podem cavar um pouco mais ou que o fundo do poço é móvel. Podemos dizer que até o fundo do poço já roubaram.

A declar­ação do min­istro da saúde – o mesmo que disse que o imposto sobre oper­ações finan­ceiras dev­e­ria ser cobrada nas duas pon­tas: quem paga e quem recebe, pois os con­tribuintes nem sen­tiriam –, deve-​se ao fato de quer­erem sac­ri­ficar o con­tribuinte, mais uma vez, com a ele­vação de impos­tos e a cri­ação de novos, para suprir a voraci­dade da cor­rupção e da má gestão. Daí, sua excelên­cia, prom­e­ter um sis­tema de saúde pior que o já exper­i­men­tado pela população.

Ora, a questão nem é pagar ou não a nova CPMF. O prob­lema é saber­mos que tais recur­sos não chegarão aos pacientes ou aos aposen­ta­dos ou pen­sion­istas. O prob­lema é saber­mos que o gov­erno é inca­paz de fazer qual­quer gesto de econo­mia e gasta o din­heiro público em supér­fluo como se o mesmo fosse infinito. Outro dia a própria pres­i­dente, mobi­li­zou avião, helicóptero, segu­ranças, hospedagem e todo aparato que cerca o poder para ir apa­gar as velin­has no aniver­sário do Sr. Lula. Assim como esta, são infini­tos os ralos por onde escoam os recur­sos fru­tos do nosso tra­balho, dos impos­tos que pag­amos, sem que usufru­amos de nada. Querem mais din­heiro mas nada darão em troca, mais din­heiro para enricar os cor­rup­tos de sempre.

E ainda se acham no dire­ito de nos ameaçar com o inferno que nem Dante ousou imaginar.

Abdon Mar­inho é advogado.