AbdonMarinho - A FÉ NOS LIBERTA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A NOS LIBERTA.

A NOS LIBERTA.

Por Abdon C. Marinho*.

AMANHÃ será Domingo de Ramos, o dia/​marco do iní­cio da Sem­ana Santa, o fim e um novo começo. No domingo Jesus Cristo aden­tra em Jerusalém mon­tado em jumento e sendo saudado por pes­soas com ramos de árvores, depois sobrevém a traição de Judas, a prisão, a negação de Pedro, o jul­ga­mento, a con­de­nação pela von­tade do próprio povo que no domingo o saudara, sabendo-​o inocente, Pilatos lava as mãos, entrega-​o às solenidades ofi­ci­ais da con­de­nação: a preparação com a coroa de espin­hos, o ras­ga­mento de suas vestes para que sinta bem mais peso da cruz enquanto até o calvário em cortejo público de humil­hação; sobrevém a árdua cam­in­hada, com seus diver­sos sig­nifi­ca­dos; a cru­ci­fi­cação com requintes de cru­el­dade; o pedido de perdão de Cristo; a promessa a Dimas, o bom ladrão; a entrega da vida ao Pai e Sen­hor; a morte; o sepul­ta­mento; a ressur­reição na Pás­coa; a Ascenção para vida eterna.

O sábado aman­heceu chu­voso – uma chuva fina e inter­mi­tente que vem desde a madru­gada. Após o café da manhã e ali­men­tar os peixes, enquanto obser­vava a chuva da varanda, pen­sava no quanto a Sem­ana Santa foi impor­tante para a minha vida – já disse isso aqui em um texto muito antigo –, mais impor­tante que o Natal, Ano Novo, aniver­sários, ou qual­quer outra.

A Sem­ana Santa, para mim, sem­pre teve esse sen­tido de propósito, de final­i­dade, que as coisas, as pes­soas e tudo mais, “acon­te­cem” na nossa vida com uma final­i­dade e ao cabo de tudo ter­e­mos a rec­om­pensa, aqui, neste plano, noutro plano, na eternidade.

A sequên­cia de acon­tec­i­men­tos da Domingo de Ramos à ressur­reição na Pás­coa teve uma final­i­dade. Quando Cristo aden­tra tri­un­fal em Jerusalém teve como propósito atrair a ira dos poderosos, sobre­tudo, daque­les que domi­navam a fé; a traição de Judas, por moti­vações políti­cas ou mon­etárias, teve sua razão de ser, Cristo já era sabedor disso, tendo anun­ci­ado a traição na última ceia; e veio com um beijo a traição no Monte das Oliveiras, quando o sen­hor anun­ciou: — Judas, com um beijo, tu trai o filho do Homem; a prisão sem reação – a caso, se não estivessem nos planos, Cristo e os seguidores não teriam reagido? Não pode­ria ter cla­mado por uma legião de anjos para impedir a prisão? Nada disso foi feito e Jesus Cristo ainda resti­tuiu a orelha decepada por um dos seguidores a dos sol­da­dos que o pren­deu.

A negação de Pedro, tam­bém anun­ci­ada por Jesus, serve para nos mostrar o quanto somos frágeis na nossa fé quando con­fronta­dos com o medo ou com out­ras cir­cun­stân­cias extremas. É nor­mal a nós, humanos, que fraque­je­mos algu­mas vezes e em algu­mas situ­ações. Até com Pedro deu-​se isso. Pedro, a pedra, a rocha sobre a qual ergueu-​se toda uma fé.

A mesma análise dar-​se em relação as demais “estações” de sofri­mento de Jesus Cristo até a ressur­reição, quando, por der­radeiro, o tri­unfo da vida se sobrepõe à escuridão da morte.

A Sem­ana Santa, ao longo dos anos da minha existên­cia, sem­pre teve esse propósito de pen­sar e repen­sar os planos de Deus para nossa existên­cia e para minha própria vida.

Nos meus primeiros anos, ainda pequenino, lem­bro que toda a sem­ana era Santa, se guar­dava todos os dias, e nunca fomos muito reli­giosos, morá­va­mos em um povoado onde não havia igre­jas. A fé que guardá­va­mos nada tinha a ver com a igreja, era fruto do cos­tume ances­tral de uma lig­ação “direta” com o próprio Cristo Jesus e pelo respeito ao seu sofri­mento em sua der­radeira sem­ana ter­rena.

Ao que me recordo, a sem­ana ia gan­hando ares de gravi­dade à medida que se aprox­i­mava do seu ápice, já a par­tir da quarta-​feira os ani­mais não pode­riam ser pre­sos, não se orden­hava as vacas, o que sig­nifi­cava que não teríamos leite. Na quinta-​feira e na sexta-​feira eram para jejum silen­cioso, não se ouvia rádio, não se falava alto, não se brin­cava, um silên­cio cor­tante reinava somente sendo que­brado no sábado da Aleluia, quando já se podia brin­car, os adul­tos se per­diam nos jogos de car­tas ou de dom­inó e das coz­in­has vin­ham o cheir­inho gos­toso de bolo de macax­eira ou de puba para com­er­mos com um café com leite.

O mesmo sen­ti­mento de respeito e reflexão sobre a Sem­ana Santa e a Pás­coa me foi com­pan­heiro de toda uma vida. Sem­pre servindo para a ren­o­vação da fé e que tudo que pas­sava, ao menos aos olhos do Sen­hor tinha e tem um propósito como o teve o sofri­mento do seu próprio filho.

Mesmo nos momen­tos dos maiores sofri­men­tos e aflições, mantive-​me firme e forte na fé, na certeza de que as provações tin­ham um propósito que mesmo não com­preen­dendo o seu sig­nifi­cado elas tin­ham uma sig­nifi­cação aos planos de Deus.

Muitas vezes – e ainda hoje –, em momento de difi­cul­dades me pus a per­gun­tar: —oh, Deus é mesmo necessário tudo isso? Livra-​me de todos os males e poupa-​me de mais esse sofri­mento.

Ao fazer tais ques­tion­a­men­tos ao pedir por livra­men­tos, trazia na lem­brança que tam­bém Jesus Cristo, o filho de Deus, ao ser preso, tam­bém pediu ao pai que o livrasse todos os males, mas que fosse feita a sua von­tade.

Tudo faz parte dos planos de Deus e se crermos nisso as nos­sas cruzes, os nos­sos far­dos são bem mais leves.

Outro dia um amigo me ques­tio­nou. Dizia ele que alguns tex­tos meus, aque­les que retratavam a minha cam­in­hada até aqui, era muito tristes e que não con­seguia lê-​los. Contra-​argumentei dizendo a ele que se não con­seguia ler, imag­ina eu que tive que vivê-​los.

Depois, com mais vagar, com­preendi o que que­ria dizer.

Vive­mos hoje em um mundo no qual as pes­soas “se entregam” com muita facil­i­dade, entram em crise, se angus­tiam e por vezes, infe­liz­mente, põem termo à própria existên­cia. Não foram “for­madas” para terem fé, para enten­derem que os sofri­men­tos de hoje fazem parte de um plano que nos torna mais fortes.

Nunca fui reli­gioso ou santo – e longe de mim querer sê-​los –, mas, con­forme dito acima, sem­pre tive muita fé. Foi essa fé que me fez aguen­tar todos os “tran­cos” até aqui e os que, cer­ta­mente, ainda virão – paciên­cia, faz parte do plano –, foi a fé que me fez enx­er­gar além, que me fez perce­ber que o bem que faze­mos ao próx­imo, ainda que per­dendo algo mate­r­ial, não nos faz perder e, sim, gan­har.

A fé me fez perce­ber que suces­sos, fra­cas­sos são cir­cun­stan­ci­ais, fazem parte da vida, da qual nada lev­a­mos e que não vale pena pas­sar a vida em sofri­mento por conta de bobagens.

Final­mente, posso dizer, sem qual­quer dúvida, foi a fé que me lib­er­tou e salvou.

Um Bom Domingo de Ramos uma boa Sem­ana Sem­ana Santa e até a Pás­coa da ressur­reição de Cristo, nosso Sen­hor.

Abdon C. Mar­inho é advo­gado.