Um pouco de coerência e decoro, por favor.
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- Criado: Quarta, 18 Novembro 2020 10:49
- Escrito por Abdon Marinho
UM POUCO DE COERÊNCIA E DECORO, POR FAVOR.
por Abdon Marinho.
JÁ DISSE AQUI mesmo – e por mais de uma vez –, que no dia que ouvir dizer que um.boi se encontra sobrevoando o Largo do Carmo ou a Praça D. Pedro II, não irei lá conferir. É bem provável que seja verdade.
Dando razão a um antigo ditado popular, o governador do estado despiu-se de toda a liturgia que o cargo requer e declarou apoio incondicional e irrestrito a um dos seus ex-auxiliares que disputou a eleição na capital e que, segundo a oposição, integraria uma espécie de consórcio de candidatos com o fito de dividir os votos no primeiro turno para juntá-los no segundo e derrotar o adversário real, que, por sinal, chegou em primeiro lugar.
Não satisfeito em declarar-se o primeiro “cabo eleitoral” do estado, segundo as mais diversas fontes de informações, teria, sua excelência, determinado que todos secretários, diretores, ocupantes de cargos em comissão e, até mesmo, os xerimbabos menos qualificados, de uma forma geral, também, o fizesse.
Em outras palavras, o governo estadual, a máquina pública, custeada, com o seu, o meu, o nosso dinheiro, entrou em “campanha” a favor do candidato favorito do governador. É o que dizem, e, também, o que passamos a observar.
Embora não se saiba o alcance do uso da “máquina” o simples apoio ostensivo do governo já tem o condão de desequilibrar o pleito.
Rememorando as lembranças que tenho da história do Maranhão, acredito que nem o velho Vitorino Freire, de quem, inclusive, falei em texto recente, ousou tanto.
Não tenho dúvida que se trata do maior atentado contra a democracia neste século e também dos passados.
Nada tenho contra este ou aquele candidato, favorito ou preferido de quem quer que seja, mas vislumbro que estamos diante de um abuso, uma clara intervenção, no que deveria ser um “duelo” justo e com paridade de armas.
Como, aliás, requer toda e qualquer democracia.
Desde a declaração do governador, ainda no domingo, que fervilham nos meios de comunicação, blogues, redes sociais e etcetera, declarações de apoio ao candidato “do governador”, da parte dos seus auxiliares – não sei se feitas, inclusive, em horário de expediente e com uso dos meios e instrumentos públicos – o que não faz diferença. Estes servidores ocupam cargos em tempo integral e dedicação exclusiva.
Algo, que pelo exagero, parece-me tão acintoso que deveria chamar a atenção dos órgãos de controle, sobretudo, do Ministério Público Estadual e do Ministério Público Eleitoral e, principalmente, do Poder Judiciário.
Durante os dois últimos anos acompanho, dia sim e no outro também, o governador do estado reclamar de autoritarismo e de abusos que estariam sendo cometidos pelo presidente da República.
Como podemos classificar o ato de um governo que atenta, como estamos assistindo, contra a liberdade de escolha dos cidadãos, usando dos meios que vem utilizando?
Neste último ano, desde que iniciou a pandemia no país, tenho assistido, o governador do estado reclamar dos maus modos do presidente da República na condução da crise sanitária. O que faz com razão, tendo em vista que o chefe da nação opta de forma irresponsável e criminosa por uma atitude negacionista, por não respeitar regras de distanciamento, recusar-se, por diversas vezes a usar máscara, e por último, até ontem, dizer que o país não pode ser um país de “maricas”, numa alusão às pessoas que temem a doença.
Esse “destrambelho” do presidente, assim como a “torcida” para que a vacina feita em parceria entre o Instituto Butantã e uma empresa chinesa, é assunto para um texto específico, que, inclusive, seria publicado antes deste.
Por conta dos errôneos ou criminosos atos do presidente, o governador, valendo-se de sua “amizade” com a “grande” imprensa, é o que mais se manifesta, denuncia e cobra compostura.
Pois bem, esse mesmo governador que cobrou – e tanto cobra –, postura do presidente da República no trato da pandemia é o mesmo que, sem tirar a camisa ou a máscara, declarou possuir um candidato “favorito” para o segundo turno das eleições municipais na capital do estado, sendo que este mesmo candidato foi acusado de, entre os dias 5 e 11 de novembro, ter feito campanha eleitoral, abraçado velhinhas e enfermos e a outros integrantes dos grupos de risco para a COVID-19, sabendo-se infectado.
Quer dizer que o presidente República, estando saudável, pelo simples fato de sair sem máscara, atentava contra a saúde pública da nação, mas o republicano candidato favorito do governador, sabendo-se infectado poderia fazer o que fez e ainda receber o prêmio de alcaide da capital?
É isso mesmo produção?
Em um texto anterior, onde tratei deste assunto, por considerar tão abjeto o comportamento do candidato, dei-lhe o benefício da dúvida. Não se pode acusar alguém de um crime tão grave sem que existam provas contundentes do fato.
Mas, se o candidato não cometeu o crime, que providências foram adotadas contra aquelas pessoas que teriam “armado” contra ele e forjado exame médico datado do dia 5/11, atestando a contaminação?
A polícia abriu inquérito para apurar crime tão grave contra a saúde pública ou contra o candidato?
A declaração fornecida pelo Laboratório Central do Estado — LACEN MA é falsa?
Se é falsa por que até agora as autoridades não vieram a público dizer isso?
Se é verdadeira porque não tomaram providências para impedir a atitude criminosa do candidato?
Se falsa, quais providências adotaram contra os falsificadores?
Vejam, sem querer ser “palmatória do mundo”, por um mínimo de coerência em relação a cantilena do governador no plano nacional, antes de declarar a apoio a um candidato acusado de condutas tão graves e abjetas, sua excelência, por respeito a população que governa e principalmente da capital, deveria ter chamado uma coletiva e respondido para patuleia os questionamentos acima.
Simplesmente isso. Êpa, doutor, volte a fita. Esclareça isso antes.
Não é coerente que o governador do estado que mais cobra o respeito das autoridades federais à crise sanitária ocasionada pelo novo coronavírus, se vista de “cabo eleitoral” de um candidato acusado do horrendo crime de espalhar uma doença sabendo-se infectado, e, ainda, que isso ocorra pela ganância desmedida pelo poder.
Isso se ele for culpado, repito.
Mas se não é, o governador do estado não deveria declarar publicamente que ele, o candidato, foi vítima de uma acusação sórdida?
Não deveria colocar a polícia na “cola” dos falsificadores do exame do candidato e da declaração do Laboratório Central do Estado — LACEN MA?
Na minha ótica tais omissões soam como incoerências.
Êpa, doutor, volte a fita. Esclareça isso antes, repito.
Assim como é incoerente o governador do estado e demais autoridades investidas de “cabos eleitorais” apontarem que o confronto que ocorrerá na capital é contra o candidato do senhor Bolsonaro quando é justamente o candidato que apoiam o “companheiro” de partido dos filhos do presidente.
Não se pode enganar ou humilhar o povo com esse tipo de narrativa. É infamante. É um insulto à nossa inteligência.
Querem nos insultar? Insultem. Mas, pelo menos isso, não nos tratem como estúpidos.
Como disse no início deste texto, no Maranhão, não duvido nem se me disserem que boi “avoa”. Quem diria, por exemplo, que um candidato depois de ser chamado de “bandido”, de ter ofendidos o pai, internado em estado grave, o partido e família e de ter classificado tal ato como covarde, iria, simplesmente, fingir que nada foi dito, que ofensas não foram lançadas, se contentaria com um «chocho» e irônico pedido desculpas, para apoiar o “candidato do governador”?
Êpa, xingaram meu pai, cuspiram na minha mãe e o que digo é: “bola pra frente”?
Ora, me compre um bode.
O candidato que disse a plenos pulmões que não deixaria “o bandido” chegar a prefeitura, aceita “na boa” o apoio do “bandido” e dos “fichas sujas”?
Os fatos narrados – e outros mais graves que todos assistimos nesta campanha – , não aconteceram no século passado, não, foi na “semana passada”, todos os cidadãos ainda têm gravados na memória os insultos. Se bem que depois do que estou vendo, nem sei se podemos considerar como insultos. Se ficou bem para todos, então eram “elogios”.
Será que ignoram o que seja decoro? O que seja decência? O que seja dignidade?
De repente, depois das ofensas mútuas, de ofenderem até a família em situação difícil, se abraçam e dizem que está “tudo bem”?
É assim mesmo? É essa a lição para atual e futuras gerações: que vale tudo pelo poder?
Será que isso é normal e eu que estou completamente “fora de tempo”?
Essa é a nova política?
O novo tempo para o Maranhão?
Não, meus senhores, mil vezes, não. Isso não pode e não está certo. Não foi isso que aprendi com meu pai, que era analfabeto por parte de pai, mãe e parteira.
Esse tipo de política é degradante. Está errada e é da conta de todos. Até dos covardes, que silenciam e acham normal.
Um pouco de coerência, um pouco de decência, um pouco de decoro, por favor.
É o que fica.
Abdon Marinho é advogado.