AbdonMarinho - Um governo de tirar do sério.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

Um gov­erno de tirar do sério.


UM GOV­ERNO DE TIRAR DO SÉRIO.

Por Abdon Marinho.

OUTRO dia um amigo me liga – ou manda uma men­sagem –, e per­gunta: — o pres­i­dente te tirou do sério?

Isso deu-​se logo após o reg­istro de que a pan­demia do novo coro­n­avírus cei­fara a vida de cinco mil brasileiros e o pres­i­dente sair-​se com uma das frases mais indig­nas já pro­feri­das por um gov­er­nante, em todos os tem­pos, o famoso “e daí?”.

Escrevi um texto a respeito, “E daí, sen­hor pres­i­dente?”, e, à guisa de comentá-​lo o amigo fez a indagação.

Como muitos sabem, optei pela neu­tral­i­dade no segundo turno das eleições de 2018. As duas opções que restaram, fru­tos da livre e sober­ana von­tade do povo brasileiro, não me moti­varam a sair de casa para votar.

Durante aquele ano de 2018, por diver­sas vezes, escrevi sobre os riscos do país vir a ser gov­er­nado a par­tir de suas fran­jas mais rad­i­cais rep­re­sen­tadas pelo bol­sonar­ismo de um lado, com um can­didato noto­ri­a­mente sem qual­quer preparo e, de outro, pelo petismo, que trans­for­mou o roubo do patrimônio público numa estraté­gia de poder.

Não aceitar ser con­duzido por nen­huma destas cor­rentes foi uma escolha política con­sciente da qual não me arrependo. Não aceitar nen­hum dos nomes pos­tos e não sair de casa para votar foi o meu protesto solitário e silen­cioso con­tra a escolha feita pelos demais cidadãos.

Não me arrependo de não ter con­tribuído com a devolução do poder ao um grupo que tornou a cor­rupção numa política de Estado assim como não me arrependo de não ter con­tribuído para levar um dos mais desprepara­dos gov­er­nantes de todos os tem­pos ao poder.

Disse, quando saiu o resul­tado do primeiro turno – você encon­tra o texto neste sítio e/​ou nas redes soci­ais –, “Deu PT”, uma alusão ao fato de que o gov­erno pode­ria voltar ao Par­tido dos Tra­bal­hadores — PT ou, aquilo que as segu­rado­ras uti­lizam como sigla para Perda Total — PT. Deu PT!

Inde­pen­dente disso, sem­pre torci para que o gov­erno “desse certo” – assim como fiz em todos os out­ros –, por acred­i­tar que o fra­casso dos gov­er­nos, mas do que con­se­quên­cias aos seus rep­re­sen­tantes e pro­tag­o­nistas, trazem con­se­quên­cias aos que mais pre­cisam deles.

São os mais frágeis que acabam “pagando pato” quando os gov­er­nos fracassam.

Ape­sar da tor­cida, não ape­nas minha, para que o gov­erno desse certo, o que assis­ti­mos, com menos de dois anos de mandato, já é o ester­tor de uma gestão.

Um gov­erno que a cada final de sem­ana pre­cisa que seus ali­a­dos – cada vez em número menor –, saia às ruas para defendê-​lo é porque perdeu a capaci­dade de sustentar-​se por seus próprios méri­tos.

Além das falanges de seguidores o gov­erno busca por todos os meios con­stranger as Forças Armadas a serem suas fiado­ras por temer que os demais poderes abre­vie seu fim.

Na quadra política, com o mesmo propósito, nego­cia o país jus­ta­mente com aque­les que mais jurou com­bater, a chamada “velha política”.

A conta a ser paga será alta. O gov­erno já entre­gou a Depar­ta­mento Nacional de Obras de Com­bate a Seca — DNOCS; o Fundo Nacional de Desen­volvi­mento da Edu­cação — FNDE; além de infini­tas out­ras sinecuras e emen­das parlamentares.

O gov­erno do sen­hor Bol­sonaro está “com­prando o passé” para gov­ernar, assim como fiz­eram os gov­er­nos petistas.

As suas falanges, assim como suas con­gêneres petis­tas, pare­cem não enx­er­gar nada de anor­mal nisso. Talvez achem que basta falar o nome de Deus; da família; e da defesa da posse de armas que tudo está certo. Eu tam­bém creio em Deus; sou defen­sor da família e muito antes do bol­sonar­ismo defendia o dire­ito do cidadão poder se defender em condições de igual­dade com a bandidagem.

Mas, e a mudança prometida? O fim da cor­rupção?

Ou como tan­tos out­ros era ape­nas uma cortina de fumaça para chegar ao poder – e agora, para permanecer?

Isso não é a mesma coisa que fiz­eram os petis­tas e aliados?

O bol­sonar­ismo é o petismo com sinal trocado?

Alguém con­segue dis­tin­guir alguma difer­ença entre o que o gov­erno Bol­sonaro faz agora com o que o gov­erno do Lula fez a par­tir de 2003 e que foi a gênese do “men­salão”, do “petrolão» e dos demais escân­da­los de cor­rupção que per­vert­eram a nação?

A difer­ença é que os petis­tas não demor­aram tanto. Já no ini­cio de 2003 estavam fazendo as trata­ti­vas para entrega do governo.

Logo mais os dois extremos da polit­ica brasileira estão tão semel­hantes nas más práti­cas que ao homem comum será impos­sível dis­tin­guir onde ter­mi­nou um e começou o outro.

Mas isso não será difer­ente do que antevi ainda no iní­cio de 2018.

Uma nação con­ti­nen­tal como a nossa não pode ser con­duzida por fran­jas rad­i­cais (de dire­ita ou de esquerda) que não rep­re­sen­tam nem trinta por cento da pop­u­lação. Se pare­cem maiores é ape­nas quando as colo­camos uma con­tra a outra.

O despreparo do pres­i­dente não pode­ria pro­duzir fru­tos difer­ente do que esta­mos assistindo agora. O que todos já sabiam, agora, por ocasião desta pan­demia, parece mais desnudo e mor­tal que nunca.

Esta­mos diante do caso clás­sico da ignorân­cia que mata.

E, pior que isso, a morte e o sofri­mento do povo não causa qual­quer pesar no grupo politico que está dirigindo o país.

Após pro­tag­oni­zar uma crise atrás da outra e perder com­ple­ta­mente a gov­er­nança do país, esperava-​se que com a pan­demia, o pres­i­dente – a exem­plo do que ocor­reu noutros países –, coor­de­nasse os “esforços de guerra” para com­bater o vírus.

Como temos assis­tido desde o começo da pan­demia o pres­i­dente fez o cam­inho inverso: min­i­mi­zou, ignorou, con­fron­tou os que que­riam um enfrenta­mento nos moldes do que ocor­ria no resto do mundo; sabotou as medi­das de iso­la­mento, e, com isso, enquanto os demais países que fiz­eram tudo con­forme a recomen­dação das autori­dades san­itárias, o Brasil se torna o novo epi­cen­tro da pan­demia, sem saber quando voltare­mos ao nor­mal, afu­gen­tando, com isso, os investi­dores e, até mesmo, voos de out­ros países.

A dura real­i­dade – ape­nas as fran­jas bol­sonar­is­tas não con­seguem ver –, é que o país, em plena crise, encontra-​se à deriva, coman­dado por um grupo de alo­pra­dos, com mania de perseguição e sérias sus­peitas de portarem dis­túr­bios mentais.

No último dia 22 de maio o min­istro do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, Celso de Mello, sus­pendeu o sig­ilo do vídeo de uma reunião ocor­rida um mês antes do pres­i­dente e seus min­istros.

O que vimos foi um fes­ti­val de hor­rores, mas digna de uma cachaçada em um bar pés-​sujos, do que uma reunião min­is­te­r­ial.

Só para reg­is­trar, no dia 22 de abril, além da data que se atribui o nasci­mento do país, 520 anos antes, o dia começou com o informe das sec­re­tarias estad­u­ais de saúde reg­is­trando 43.592 casos de coro­n­avírus no Brasil e o número de óbitos chegando a 2.769.

A reunião do chefe da nação com seus min­istros não dedi­cou um momento para se sol­i­darizar com as famílias ou para tratar das medi­das de enfrenta­mento da pan­demia. Muito pelo con­trário, no momento que vi o pres­i­dente falando no assunto foi para recla­mar de uma nota de pesar do super­in­ten­dente da polí­cia rodoviária fed­eral que dizia que um patrul­heiro mor­rera por conta covid-​19; ou para o min­istro do meio ambi­ente dizer que dev­e­riam aproveitar a pre­ocu­pação dos brasileiros nor­mais com a pan­demia para pas­sar a “pauta-​bomba” con­tra a pro­teção ambi­en­tal; ou para a min­is­tra dos Dire­itos Humanos ameaçar de prisão prefeitos e gov­er­nadores por dec­retarem medi­das de iso­la­mento social como forma de com­bater a pan­demia; ou para o próprio pres­i­dente des­ti­lar seu ódio e xin­gar gov­er­nadores e prefeitos que estavam adotando as medi­das necessárias que ele dev­e­ria estar coman­dando – como os out­ros chefes de nação ao redor do mundo.

Se não vimos nada de pre­ocu­pação com o perec­i­mento de quase três mil vidas naquela opor­tuna reunião, o desre­speito saudado como “van­tagem” por uma massa de vas­sa­los, se repetiu todos os dias, assim como as medi­das de sabotagem.

A sab­o­tagem delib­er­ada do chefe da nação é respon­sável pela morte de mil­hares de brasileiros e pela destru­ição da econo­mia do país.

Quem é o louco que vai inve­stir em país con­duzido por um lunático, um menino do buchão, cer­cado por uma patota de idiotas?

No dia 22 de maio, os quase três mil mor­tos, de um mês antes, já eram mais de 21 mil mor­tos e o Brasil já era anun­ci­ado como o novo epi­cen­tro da pan­demia. E, mais uma vez, o que se viu foi o pres­i­dente e suas fran­jas igno­rando a morte e o sofri­mento do povo para fazer uma polit­i­calha rasteira e indigna; con­frontar os poderes e rev­e­lar uma ignorân­cia jurídica incom­patível com o cargo que ocupa.

O que se viu foi o pres­i­dente – e agora seus min­istros –, igno­rando que todos: do pres­i­dente da República ao mais sim­ples dos tabaréus, estão sub­or­di­na­dos à lei e que a maio­ria da pop­u­lação não tol­er­ará ameaças à ordem insti­tu­cional e a sub­ver­são da Con­sti­tu­ição da República.

Não são os democ­ratas que devem se quedar aos arrou­bos autoritários, são estes, os autoritários, que dev­erão ser expur­ga­dos da vida pública.

Não voltare­mos à barbárie!

Abdon Mar­inho é advo­gado.