AbdonMarinho - A SOBERBA QUE MÃE DA INGRATIDÃO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A SOBERBA QUE MÃE DA INGRATIDÃO.

A SOBERBA QUE É MÃE DA INGRATIDÃO.
Por Abdon Mar­inho.
AINDA hoje encon­tro, vez por outra, quem se lem­bre – e comigo fale –, sobre um texto escrito há alguns anos inti­t­u­lado “O Menino Só”. Lá dis­corro sobre a suposta solidão do gov­er­nador do Maran­hão no exer­cí­cio do seu mandato.
Cer­cado mais por fãs e ado­radores (que o diga o coro “pux­ado” no último car­naval: “Dino eu te amo!”, umas das cenas mais con­strange­do­ras que já ouvi falar), disse lhe fal­tar ami­gos reais, aque­les capazes de dar con­sel­hos ou lhe apon­tar os equívo­cos de forma altiva, sem temer qual­quer represália. Ou seja, coisa que só os ami­gos ver­dadeiros são capazes de fazer.
Assento isso dizer que faltou-​lhe um amigo leal para lhe pon­derar o quanto equivocou-​se no trata­mento dis­pen­sado ao ex-​governador José Reinaldo Tavares nos últi­mos anos, forçando-​o a bus­car abrigo noutro grupo político, segundo dizem, junto ao dep­utado estad­ual Eduardo Braide, do PMN, que lança-​se no desafio de dis­putar o gov­erno estad­ual.
Os ilu­mi­na­dos que cer­cam o gov­er­nador cer­ta­mente fes­te­jarão o fato do ex-​governador ter tomado a ini­cia­tiva do rompi­mento e não ter esper­ado o sen­hor Dino ofi­cializar que ele não seria o seu can­didato – e do seu grupo –, ao Senado da República. São uns tolos.
Lendo os fatos de longe, acho que José Reinaldo Tavares demorou a bus­car um outro rumo e apos­tar numa ter­ceira via que – ainda incip­i­ente –, tem um grande poten­cial de cresci­mento, e não mais esperar um gesto do atual gov­er­nador que não veio – e que nunca viria.
Os sinais que o gov­er­nador não lhe seria grato foram bem claros.
Desde os primeiros dias da atual gestão que lhe man­dam reca­dos que ele era uma “per­sona non grata” no gov­erno que aju­dou a con­struir e na causa pela qual devo­tou ou maiores sac­ri­fí­cios, até mesmo o da pri­vação da liber­dade.
Com cinquenta ou mais anos de vida pública e tendo sido fiador do pro­jeto político, já no começo da gestão viu-​se desautor­izado – e de forma gros­seira –, pelo lugar-​tenente do gov­er­nador, novel na política, que nunca fez um sac­ri­fí­cio por qual­quer causa ou mesmo teve votos, em qual­quer eleição, sufi­cientes para uma suplên­cia digna.
O desprezo dos atu­ais inquili­nos dos Leões pelo ex-​governador sem­pre foi algo bem per­cep­tível e não uma trama dia­bólica dos adver­sários.
Eu mesmo, que não tenho um papel ativo na política, mas con­hece­dor dos sac­ri­fí­cios do ex-​governador pela causa do grupo político que se auto­de­nom­ina “anti-​Sarney” – emb­ora hoje com mais gente daquele grupo que outra coisa –, por mais de uma vez, vi-​me na con­tingên­cia de sair em seu socorro, con­strangido, com tal “ver­gonha alheia”, pelo trata­mento que lhe era dis­pen­sado.
Ape­sar de tudo, do desprestí­gio e mesmo das admoes­tações públi­cas, o ex-​governador manteve-​se firme defend­endo o gov­erno e o gov­er­nador, encar­ando as humil­hações que sofria como se estas ainda fos­sem parte da cota do sac­ri­fí­cio a que se impusera.
Fez isso até mesmo após o gov­er­nador, pub­li­ca­mente, declarar que o seu primeiro can­didato a senador seria o dep­utado Wev­er­ton Rocha, do PDT, e que os demais pos­tu­lantes, entre eles o ex-​governador José Reinaldo, teriam que bus­car a sua via­bi­liza­ção política ou social. Nas lem­branças dos meus tem­pos de infân­cia: irem para o tapa.
Esta colo­cação foi deix­ada clara pelo próprio gov­er­nador em entre­vista de fim de ano ao Jor­nal Pequeno. E, mesmo depois dela, o ex-​governador declarou que só não seria can­didato ao lado dele (Flávio Dino) se este não o quisesse.
A este apelo o gov­er­nador, sequer, fez um gesto de boa von­tade. Fin­giu ou fez que não ouviu.
Ora, qual­quer um no Maran­hão que tenha vivido ou par­tic­i­pado da política do estado na última década é sabedor que ninguém mais que o ex-​governador era mere­ce­dor da “can­di­datura nata” ao Senado da República pelo grupo que estar no poder, que ele.
A começar pelo fato de ter “inven­tado” e “ban­cado” o iní­cio da car­reira do sen­hor Dino quando este era um ilus­tre descon­hecido da política maran­hense.
É fato público que foi José Reinaldo, então gov­er­nador, que “inspirou” aquela can­di­datura aproximando-​o de impor­tantes políti­cos estad­u­ais que, então, lhes tin­ham sérias descon­fi­anças, como prefeito Cleo­mar Tema e o ex-​prefeito e ex-​deputado Hum­berto Coutinho – este último recen­te­mente fale­cido –, que, com o aval do gov­erno, o acud­i­ram com os votos necessários para lhe fazer dep­utado fed­eral e ini­ciar a pavi­men­tação do seu cam­inho ao exec­u­tivo estad­ual.
Já naquela época, este o claro e público propósito do gov­er­nador que son­hava com a ren­o­vação política no estado.
Um amigo que esteve pre­sente ao velório de Hum­berto Coutinho, em Cax­ias, confidenciou-​me alguns dias depois: — Abdon, a emoção do gov­er­nador no dis­curso de agradec­i­mento ao morto era de visível con­traste com a frieza àquele que fora respon­sável por tão profícua amizade: Zé Reinaldo.
Como me é comum, para não perder a piada, ainda que de gosto duvi­doso, retruquei: — É, meu amigo, talvez isso se deva ao fato de Hum­berto Coutinho estar morto enquanto José Reinaldo estar mais vivo que nunca.
Mas, como dizia, retor­nando ao tema, desde 2006 que o ex-​governador coloca os inter­esses do grupo que estar no poder diante dos seus.
Fez isso no próprio 2006 quando pode­ria ter entregue o gov­erno ao vice-​governador Jura Filho – e assim retornar o gov­erno ao grupo Sar­ney –, para candidatar-​se, e ser eleito, senador, pois tinha “cacife” para isso, mas preferiu con­duzir aquela eleição que fez Jack­son Lago gov­er­nador; colo­cou nova­mente em 2010, quando o grupo apron­tou a “ursada” de lançar cinco can­didatos para as duas vagas de senador, o que liq­uidou com suas chances; e em 2014, quando, em nome da unidade, abriu mão para a can­di­datura de Roberto Rocha.
Agora, em 2018, com o gov­er­nador que “fez” sur­fando na pop­u­lar­i­dade, com duas vagas em dis­puta, depois de tan­tos sac­ri­fí­cios, o mín­imo que o grupo político, que tanto aju­dou, dev­e­ria fazer era, sequer, admi­tir que hou­vesse dis­cussão sobre a primeira can­di­datura, pois a do ex-​governador era, inques­tion­avel­mente, a nat­ural, ninguém dis­cu­tiria isso. Todos, aliás, ainda dis­cor­dando de algu­mas de suas posições, tin­ham sua can­di­datura como certa.
A outra vaga na chapa seria preenchida por quem mel­hor se via­bi­lizasse politi­ca­mente, pois José Reinaldo já fora via­bi­lizado ao longo dos anos.
Este era o roteiro da lóg­ica mais razoável.
A solidão do poder ou, talvez, a soberba, não deixou o gov­er­nador perce­ber uma lição, que de tão óbvia, chega a ser primária: política faze­mos evi­tando prob­le­mas e não criando-​os.
Um erro grave para quem se acha mere­ce­dor de planos mais ele­va­dos que o gov­erno do Maran­hão.
A estraté­gia de empurrar e escolha até o ponto de não deixar aos pos­tu­lantes outra alter­na­tiva que não fos­sem aceitarem quais­quer migal­has ofer­tadas pelo dono do poder, não fun­cio­nou com José Reinaldo, que antes tarde do que nunca, fugiu do ardil.
O rompi­mento do ex com o atual gov­er­nador não é, em nada, bom para este último. Não ape­nas do ponto de vista eleitoral, como, sobre­tudo, do político.
A primeira leitura que a classe política – que já tem descon­fi­anças em relação ao gov­er­nador –, fará é: “ora, se ele tra­tou ‘assim’ Zé Reinaldo que o ‘fez’ na política, como vai nos tratar, agora, mais for­t­ale­cido por um segundo mandato?”.
Esta leitura e, prin­ci­pal­mente, o enga­ja­mento do ex-​governador numa can­di­datura de Eduardo Braide – que não fez feio na eleição para prefeito da cap­i­tal –, trará uma nova e boa per­spec­tiva a uma ter­ceira via que catal­is­ará os apoios dos insat­is­feitos com o gov­erno comu­nista mas que não querem nem saber de um retorno aos gov­er­nos do grupo Sar­ney.
O gov­er­nador, embeve­cido pelo poder, talvez, não tenha se dado conta do real sig­nifi­cado do gesto de José Reinaldo, que, registre-​se, demorou a não mais poder em fazê-​lo, na esper­ança de con­tar com apoio – que não veio –, pois, ainda que não agre­gasse muitos votos, até mesmo dev­ido às condições mate­ri­ais, tem uma imensa facil­i­dade de tirá-​los, prin­ci­pal­mente, pela capaci­dade de artic­u­lação que tem e pela história que con­struiu ao longo dos anos. Não tem político no Maran­hão que não lhe seja deve­dor de algo, mesmo que de um gesto de con­sid­er­ação.
A isso some-​se a extra­ordinária capaci­dade de fazer política de Eduardo Braide, que entra numa guerra onde só tem gan­har. Se tiver a inteligên­cia para explo­rar os pon­tos fra­cos deste e dos gov­er­nos que o ante­cedeu, tem grandes chances de fazer uma grande cam­panha.
Não tenho dúvi­das que o gov­er­nador enfrentará um con­tratempo extra com o qual não con­tava. Ainda mais, que essa não será uma única baixa.
O ex-​governador, fora do grupo, cer­ta­mente forçará a saída de um apoio esdrúx­ulo do Par­tido Democ­ratas — DEM ao pro­jeto comu­nista. Já era inusi­tado que tal apoio viesse dev­ido à situ­ação nacional, agora isso se torna mais dis­tante.
Outra baixa que é con­tada como certa – e tam­bém fruto da inabil­i­dade do atual inquilino dos Leões –, é a do dep­utado Waldir Maran­hão, que cobra aquilo que segundo ele foi um com­pro­misso acer­tado com teste­munhas: de que seria o can­didato a senador na chapa do gov­er­nador pela sua “par­tic­i­pação” episó­dio do impeach­ment.
O dep­utado, a mais de um amigo já con­fi­den­ciou que cobrará pub­li­ca­mente do gov­er­nador tal com­pro­misso, inclu­sive remem­o­rando aque­las que teriam sido suas palavras: — Waldir, meu amigo, eu não teria cor­agem de lhe pedir para assi­nar algo que estas mãos não assi­nassem.
Segundo estes ami­gos, isso teria sido dito o gov­er­nador olhando para as próprias mãos.
São muitos com­pro­mis­sos e pouca a dis­posição – e mesmo condições para cumprir –, o que provoca os des­gastes que não teria se tivesse agido com leal­dade com os que lhe devotaram amizade. Hon­rando os com­pro­mis­sos assum­i­dos e descar­tando os que não teria condições para cumprir.
O rompi­mento do ex-​governador José Reinaldo com o atual Flávio Dino é a prova de este último fal­tou não ape­nas com os seus deveres de ali­ado político, mas tam­bém com os deveres da amizade.
O tempo, sen­hor razão, fará a justiça der­radeira.
Abdon Mar­inho é advogado.