O ERRO DE PENSAR QUE O BRASIL É O MARANHÃO.
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- Criado: Sábado, 30 Dezembro 2017 13:01
- Escrito por Abdon Marinho
O ERRO DE PENSAR QUE O BRASIL É O MARANHÃO.
Por Abdon Marinho.
O TÍTULO, uma clara reminiscência a famosa matéria que atestou o naufrágio da candidatura de Roseana Sarney à presidência da república no início dos anos dois mil, desta vez, parece-me muito mais apropriado que seja usado em referência ao atual inquilino dos Leões.
O atual governador tem cometido o erro de pensar o Brasil a partir do que ocorre no Maranhão e colhe nesta reta final de ano uma inigualável saraivada de críticas por isso de parte da imprensa nacional.
Poucas vezes, aliás, a chamada grande mídia pegou tão “pesado” com uma autoridade quanto pegou com o senhor Dino por conta da entrevista concedida à Folha de São Paulo.
Mas, registre-se, a culpa por isso é mais do governador (e seus assessores) que da imprensa. Esta, a imprensa, está fazendo o seu papel de questionar o posicionamento das autoridades em relação aos temas postos.
Ocorre que as autoridades maranhenses – e isso já acontecia no governo Roseana Sarney – não estão habituados a serem questionados por ninguém. Lembro que a ex-governadora convocava coletivas onde os jornalistas (só os “dela”) sequer perguntavam algo, só ouviam. Uma inovação: “coletiva” onde só a entrevistada falava.
Com o atual governador, as coletivas (também para os seus) não mudaram muito, ainda que haja algumas perguntas, estas são cercadas de certos pudores, quase pedindo desculpas por perguntar.
Não se tem notícia de ninguém questionando sobre as inconsistências ideológicas ou temas igualmente espinhosos, como as operações na saúde, aluguéis camaradas, obras executadas por empresas ligadas a agiotas. Nem para que o governador tenha a oportunidade de negar, lhe são feitos os questionamentos.
Este é o caminho do desastre. Para o jornalismo e para as autoridades.
As críticas sofridas pelo governador do Maranhão por conta da entrevista à Folha é o retrato disso: os jornalistas que a comentaram, principalmente, na rádio Jovem Pan, só exploraram algumas contradições do que disse o entrevistado, e nem foram muito longe.
Fizeram o previsto. Lembro que bem antes da candidatura do senhor Dino ao governo do estado, em 2014, o alertava para os dissabores que teria de enfrentar por ser filiado ao Partido Comunista do Brasil — PCdoB, um partido que, dentre outros exotismos, defende as ditaduras norte-coreana, cubana e a venezuelana, como modelos de sociedade, inclusive com documentos oficiais sobre o tema.
Este embaraço ideológico e as próprias contradições de se dizer comunista passou ao largo das discussões políticas no ano eleitoral.
O despreparo dos adversários e mesmo o cansaço com o longevo saneysismo deu-lhe a vitória. O poder, fez com que passasse até aqui dizendo e fazendo todo tido de insanidade político-ideológicas, sem suscitar questionamentos de ninguém.
Este foi o erro. Pelo que soube o governador iniciou a entrevista da Folha afirmando “ser comunista graças a Deus”.
A frase, em si, já é de uma tolice sem tamanho.
A doutrina comunista é essencialmente materialista, incompatível com os dogmas fé religiosa. Aliás, todos sabem, o comunismo compete com a fé ou a aniquila pelo fervor e favores do povo.
A questão se agrava na eventualidade do governador ser um cristão católico. Por alto, acredito que existam mais dez Encíclicas papais afirmando – e reafirmando – a incompatibilidade do comunismo com a fé católica e mesmo com o cristianismo.
Assim, se o governador se diz católico (ou mesmo cristão) não pode, a menos que esteja “enganando” a igreja dizer-se comunista. E vice-versa.
Doutrinariamente, ou é uma coisa ou outra.
Essa ideia de comunismo cristão é alguma invenção de quem não tem o que fazer ou de quem desconhece a história. Pois a incompatibilidade é também histórica.
A ascensão dos regimes comunistas no mundo, perseguiu, como pouco se viu, as igrejas cristãs (e todo tipo de igreja). Em muitos países os templos religiosos foram postos abaixo, por ordem de seus líderes, e o patrimônio das igrejas expropriados. Não pouparam nem prédios de valor histórico e arquitetônico extraordinário, no afã de apagar a fé da memória do povo.
Na antiga União Soviética, isso se deu por ordem direta de Lenin e Stálin.
Ainda hoje, no que restou de comunismo no mundo, a religião é restringida (ou proibida). Os casos de prisões e banimentos pelo fato das pessoa professarem uma fé ou, simplesmente, possuírem uma bíblia são correntes.
Uma pessoa dizer que defende um régime, como o norte-coreano, e dizer-se cristão não faz sentido pois são situações inconciliáveis.
Mais. Depreende-se da entrevista a FSP a informação de que o governador mantém no seu gabinete imagens de diversos santos. Antes apenas São Francisco ornamentava o gabinete, agora são diversos.
Pois bem, esse apreço por imagens de santos – e digo isso com a sinceridade de quem tem enorme admiração pela arte sacra –, é incompatível com a cena que vi (e não acreditei) do governador (que estava junto com o prefeito da capital), prostrado, sob chuva torrencial durante um culto evangélico.
Veja, qualquer um pode professar a fé que queira e da forma que quiser, mas não faz sentido – e isso não tem nada a ver com desprestígio à fé de ninguém –, você prostrar-se diante de um pastor se você não é evangélico, se você não respeita na essência aquilo que aquela fé defende, sem lhe respeitar os dogmas.
Um dos princípios do protestantismo é a não idolatria.
Já vimos até pastores evangélicos destruindo imagens de sacras. E, para nossa tristeza, mesmo cidadãos comuns, por conta destes dogmas – e também insanidade –, vandalizarem igrejas católicas.
Assim, não faz nenhum sentido, você prostrar-se como o mais fiel dos devotos diante de um pastor (e o que me chamou a atenção: sob chuva torrencial) e manter uma santaria em casa ou no trabalho como forma de proteção.
Quem está enganando quem?
Além dIsso tudo ser incompatível entre si, o é com a doutrina comunista. Pois esta é, repito, essencialmente, materialista, anti-religiosa e anticlerical.
Não sou eu que digo isso, é a história, são os exemplos do dia a dia.
Do mesmo modo, chega às raias da bizarrice o fato de muitos, no Maranhão e no Brasil, se dizerem comunistas e possuírem verdadeira adoração pelo dinheiro, pelo luxo, pela ostentação.
E aqui é o que mais tem.
O cidadão se diz comunista e mora nos mais exclusivos endereços da capital, possui os mais valiosos apartamentos ou mansões, carrões importados e muito dinheiro nas contas bancárias.
E nem se fale da forma pouco republicana como tais patrimônios foram obtidos.
Conforme alertei, desde sempre, estas contradições, embora todos finjam não ver por aqui – e talvez não vejam mesmo, pois não sabem o que é uma coisa ou outra ou ainda por acharem que tudo que sai da boca do rei é verdadeiro e dogmático –, mais cedo ou mais tarde, certamente, não passaria despercebida no restante do país.
Foi o que se deu quando o senhor Dino, pensando falar para o público interno – parte dele composto por subordinados –, começou a falar sandices para a imprensa nacional.
O Brasil possui bons jornalistas, capazes de entender o que está dito e o que ficou oculto nas palavras, como a interpretação que deram à defesa que faz de Lula e o temor de Bolsonaro.
Interpretaram que o governador maranhense possui pouco ou nenhum apreço pela democracia –embora fale tanto em povo –, pois no mesmo parágrafo em que defende a candidatura de um condenado pela Justiça – chegando a insultar as decisões do Poder Judiciário –, revela que, se pudesse, impediria a candidatura do seu principal oponente, quando esta decisão – certa ou errada –, pertence ao povo.
A esta imprensa restou claro, em um ou dois parágrafos, que o governador dos maranhenses tem um pendão pelo autoritarismo bem semelhante do posto em prática pelas ditaduras comunistas, das quais queremos distância e das quais não sentimos saudades.
As contradições em si, com a história, com os princípios jurídicos ou democráticos, fizeram da entrevista de estreia do governador na mídia nacional foi algo próximo do desastre.
E olhem que foi só a “interpretação da entrevista”. Poderia ser bem pior, se fosse submetido a uma coletiva onde questionassem estes e outros pormenores.
Certamente iriam pensar que somos governados por alguém que possui a consistência ideológica de um colegial do século passado.
Espera-se que aprenda com a entrevista e que, antes de uma nova incursão no cenário nacional, enfrente estas e tantas outras contradições.
O Brasil não é o Maranhão.
Abdon Marinho é advogado.