AbdonMarinho - CÉSAR E O DILEMA DE LULA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

CÉSAR E O DILEMA DE LULA.

CÉSAR E O DILEMA DE LULA.

A expressão «à mul­her de César não basta ser hon­esta, tem que pare­cer hon­esta», remonta ao ano de 62 a. C., refere-​se à segunda esposa do imper­ador romano Caio Júlio César, Pom­peia Sula.

Os his­to­ri­adores nar­ram que em maio daquele ano, a festa da Boa Deusa, orga­ni­zada por Pom­peia, reser­vada, exclu­si­va­mente, às mul­heres, foi pro­fanada por um jovem rico de Roma, chamado Pub­lius Clodius, que era apaixon­ado pela esposa do imper­ador, e que, dis­farçado de mul­her, aden­trou ao recinto da festa. No mesmo dia o fato tornou-​se con­hecido e César decre­tou seu divór­cio de Pom­peia. Chamado a depor sobre o fato per­ante o Senado, que apu­rava o suposto sac­rilé­gio, o imper­ador ale­gou descon­hecer qual­quer coisa a respeito, ao que foi ques­tion­ado pelos senadores sobre a razão do decreto de divór­cio. César respondeu-​lhes: «a mul­her de César tem de estar acima de qual­quer suspeita».

Her­damos desta afir­mação a expressão tão em voga.

Ao tomar posse no cargo de pres­i­dente da República do Brasil, lá pelo meio do dis­curso primeiro, o sen­hor Luís Iná­cio Lula da Silva, pontificou:

«O com­bate à cor­rupção e a defesa da ética no trato da coisa pública serão obje­tivos cen­trais e per­ma­nentes do meu Gov­erno. É pre­ciso enfrentar com deter­mi­nação e der­ro­tar a ver­dadeira cul­tura da impunidade que prevalece em cer­tos setores da vida pública.

Não per­mi­tire­mos que a cor­rupção, a sone­gação e o des­perdí­cio con­tin­uem pri­vando a pop­u­lação de recur­sos que são seus e que tanto pode­riam aju­dar na sua dura luta pela sobrevivência.

Ser hon­esto é mais do que ape­nas não roubar e não deixar roubar. É tam­bém aplicar com efi­ciên­cia e transparên­cia, sem des­perdí­cios, os recur­sos públi­cos foca­dos em resul­ta­dos soci­ais con­cre­tos. Estou con­ven­cido de que temos, dessa forma, uma chance única de superar os prin­ci­pais entraves ao desen­volvi­mento sus­ten­tado do país. E acred­item, acred­item mesmo, não pre­tendo des­perdiçar essa opor­tu­nidade con­quis­tada com a luta de muitos mil­hões de brasileiros e brasileiras”.

O dis­curso da mudança – eixo cen­tral do texto –, parece, hoje, diante de tan­tas descober­tas sobre seus anos de presidên­cia, parece um mero jogo retórico.

O ex-​presidente com­pare­ceu, espon­tanea­mente, a Min­istério Público Fed­eral, onde, segundo informa sua mídia ali­ada, declarou-​se orgul­hoso de fazer lobby para empre­it­eiras brasileiras, ainda aque­las envolvi­das em desvios de bil­hões e bil­hões dos cofres públicos.

Não deixa de ser estranho que assuma a prática de lob­bies com tanto desas­som­bro quando prom­e­teu o com­bate à cor­rupção e a defesa da ética no trato da coisa pública, como obje­tivos cen­trais do seu governo.

Pelo que se sabe, tal meta nunca deixou o papel para enveredar pela prática, muito pelo con­trário, a cor­rupção e a ausên­cia de ética tornaram-​se um estilo de governar.

O sen­hor Helio Bicudo, advo­gado, fun­dador do par­tido dos tra­bal­hadores, que assina um dos pedi­dos de impeach­ment da pres­i­dente Dilma Rouss­eff, em entre­vista à TV Cul­tura, afir­mou ter estran­hado a ver­tig­i­nosa pros­peri­dade do ex-​presidente e de seus famil­iares, lem­brando que quando con­heceu ele habitava uma casa de 40 met­ros quadrados.

Sobre este fato ouvi de um mem­bro do par­tido dos tra­bal­hadores o seguinte ques­tion­a­mento: «– será que o Lula que tanto fez pelo Brasil não pode morar bem?». Claro que pode, tem todo direito.

Acred­ito que nem eu, nem Bicudo, ou qual­quer outro cidadão brasileiro, tenha algo con­tra a pros­peri­dade de quem quer que seja, desde que hon­esta, fruto do tra­balho sério, pelo contrário.

O que se ques­tiona – e com base no que esta­mos vendo, assistindo, lendo – é a estranha coin­cidên­cia de tal pros­peri­dade casar jus­ta­mente com o tempo em o sen­hor Lula rece­beu a con­fi­ança do povo para con­duzir os des­ti­nos do Brasil, dizendo que «ser hon­esto é mais do que ape­nas não roubar e não deixar roubar. É tam­bém aplicar com efi­ciên­cia e transparên­cia, sem des­perdí­cios, os recur­sos públi­cos foca­dos em resul­ta­dos soci­ais concretos.»

O sen­hor Lula prometeu-​nos mudança de práti­cas. Mas, que mudança há, quando a cada dia que passa, desco­b­ri­mos que um filho, de zelador de zoológico, virou empresário mul­ti­m­il­ionário? Um outro de aux­il­iar mas­sag­ista, tam­bém, virou empresário do setor de mar­ket­ing tendo rece­bido, suposta­mente, por uma Medida Pro­visória edi­tada no gov­erno do pai? Quando lobista declara em delação que teria repas­sado dois mil­hões a uma nora? Um sobrinho, de microem­presário, a par­ceiro de obras de engen­haria ao redor do mundo? O próprio ex-​presidente ter rece­bido mimos, como reforma de sítio, de aparta­mento triplex, jat­in­hos e din­heiro, muito din­heiro por «palestras» de empre­it­eiras envolvi­das até a medula em fraudes, cor­rupção e sone­gação? A mídia informa que por ape­nas dez «palestras» teriam cus­tado a empre­it­eira Ode­brecht a quan­tia de qua­tro mil­hões. Acho que pou­cas pes­soas já falaram tão caro. Out­ras empre­sas pagaram for­tu­nas idênticas.

A ninguém é líc­ito imag­i­nar que tanta pros­peri­dade, em tão pouco tempo, foi obtida de forma ile­gal, ilícita. Mas, a ninguém pode ser negado o dire­ito de ques­tionar o por quê de tanto tal­ento e aptidão para a ini­cia­tiva pri­vada não tenha sido des­per­tada antes de chegarem ao poder, quando ainda, moravam «de favor» ou dividiam o imóvel de 40 met­ros quadra­dos, segundo o Dr. Bicudo.

O dire­ito à sus­peição e ao estran­hamento nos é dev­ido desde que os escân­da­los com a ter­mi­nação «ão» (men­salão, petrolão, eletrolão…) pas­sou a ser rotina nas nos­sas vidas; desde que a cúpula do gov­erno e dos par­tidos do gov­erno, deixaram às pági­nas políti­cas dos jor­nais e pas­saram a ser fig­ur­in­has con­heci­das no noti­ciários poli­ci­ais; desde que muitas destas lid­er­anças pas­saram a ser hós­pedes do Estado por crimes como cor­rupção, for­mação de quadrilha e tan­tos outros.

Os gov­er­nos petis­tas do ex-​presidente Lula e da atual pres­i­dente Dilma Rouss­eff, troux­eram muitas con­quis­tas ao povo brasileiro, como o Bolsa Família (que feitas inúmeras ressal­vas e abu­sos) mel­horou a vida de muitas pes­soas mis­eráveis, como o Minha Casa Minha Vida; como a expan­são do crédito do Fies, como o Prouni, o PRONATEC, e tan­tos out­ros. Entre­tanto, o germe da cor­rupção, do embuste e da men­tira, fez com que des­perdiçassem a chance de superar os inúmeros entraves ao desen­volvi­mento do Brasil, quando já pas­sava da hora do país não mais con­viver com «o rouba mais faz».

Assim, o ex-​presidente Lula fez tábula rasa de suas próprias palavras: «E acred­item, acred­item mesmo, não pre­tendo des­perdiçar essa opor­tu­nidade con­quis­tada com a luta de muitos mil­hões de brasileiros e brasileiras”.

Pois bem, des­perdiçou. O que vemos, hoje, no sem­blante de mil­hões de brasileiros e brasileiras é o descrédito, a angús­tia, a incerteza, a falta de fé num futuro mel­hor. Aquele, que, no iní­cio do dis­curso de posse, naquele dia 1° de janeiro de 2003, disse que a esper­ança havia ven­cido o medo, nos lega, nova­mente, o medo como herança.

Abdon Mar­inho é advogado.