AbdonMarinho - A CRENÇA DE TOMÉ E O VOTO DE SARNEY.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A CRENÇA DE TOMÉ E O VOTO DE SARNEY.

A CRENÇA DE TOMÉ E O VOTO DE SARNEY.

No evan­gelho de João con­sta que: …”Tomé, um dos doze, chamado Dídimo, não estava com eles quando veio Jesus. Disseram-​lhe, pois, os out­ros dis­cípu­los: ‘Vimos o Sen­hor’. Mas ele disse-​lhes: ‘Se eu não vir o sinal dos cravos em suas mãos, e não puser o dedo no lugar dos cravos, e não puser a minha mão ao seu lado, de maneira nen­huma o crerei’. E oito dias depois estavam outra vez os seus dis­cípu­los den­tro, e com eles Tomé. Chegou Jesus, estando as por­tas fechadas e apresentou-​se no meio, e disse: ‘Paz seja con­vosco’. Depois disse a Tomé: ‘Põe aqui o teu dedo, e vê as min­has mãos, e chega tua mão, e põe-​na no meu lado, e não sejas incré­dulo, mas crente’. E Tomé respon­deu, e disse-​lhe: ‘Sen­hor, Deus meu’. Disse-​lhe Jesus: Porque me vistes, Tomé, crestes, bem-​aventurados os que não viram e creram\»”. Evan­gelho de João, Capit­ulo 20, ver­sícu­los 2429.

Faço essas con­sid­er­ações antes de aden­trar na questão do suposto voto do senador Sar­ney em Aécio Neves, no segundo turno das eleições, con­forme já foi ampla­mente divul­gado por diver­sos meios de comunicação.

As ima­gens que cor­reram o mundo, segundo informa um site de notí­cias, foram peri­ci­adas pelo espe­cial­ista Ricardo Molina, pro­fes­sor da Uni­camp, que atestou a veraci­dade das mes­mas e con­fir­mando que o senador teria dig­i­tado os números 4 e 5 e depois a tecla con­firma. Votando, por­tanto no can­didato oposi­cionista, Aécio Neves.

Desde que as noti­cias do suposto voto começaram a cir­cu­lar que pes­soas e asses­sores do senador se ocu­pam em negar, acusaram o vídeo de ser fraud­u­lento, que o fato não ocor­rera, que era mon­tagem, etc.

A prin­ci­pal col­una política do jor­nal “O Estado do Maran­hão”, edição do dia 31 de out­ubro último, se ocupou do assunto, dizendo trata-​se de uma fraude, o título é até neste sen­tido “Desmonte de uma fraude”, apre­senta como fun­da­mento uma suposta declar­ação da empresa TV Amapá, afil­i­ada da Rede Globo e mem­bro da Rede Amazônica de Tele­visão, onde con­staria a seguinte declar­ação: “Declaro para todos os fins que não é autên­tico o vídeo atribuído a esta emis­sora. Trata-​se, na ver­dade de uma mon­tagem fraudulenta”.

São palavras fortes e, por isso mesmo, mere­ce­do­ras de esclarecimentos.

A emis­sora diz que o vídeo que lhe é atribuído não é autên­tico. Beleza, tudo estaria per­feito se não hou­vesse uma perí­cia téc­nica ate­s­tando sua aut­en­ti­ci­dade e que não há qual­quer mon­tagem no mesmo.

Mas é com­preen­sível que a empresa não pode­ria – emb­ora con­tradizendo uma perí­cia feita por téc­nico de recon­hecida com­petên­cia –, dizer algo difer­ente do que disse, primeiro pela pressão que deve ter sofrido por parte do senador e segundo por ter cometido um crime.

O código eleitoral, em seu arte 317 é claro: \«Vio­lar ou ten­tar vio­lar o sig­ilo da urna ou dos invólu­cros. Pena — reclusão de três a cinco anos”. Caso se entenda que houve uma vio­lação ao sig­ilo da própria urna – car­ac­ter­i­zado pela gravação inde­v­ida do depósito do voto na mesma – ou do invólu­cro – caso entenda fil­mar o ato de votar estaria se violando o depósito do voto –, por parte da empresa, os respon­sáveis se sujeitam a pena esta­b­ele­cida, que con­ven­hamos, não é uma pena branda. No caso de se enten­der que ape­nas houve a vio­lação do sig­ilo do voto, isto tam­bém é crime, tip­i­fi­cado no CEL, artigo 312, a pena que é um pouco mais branda: Vio­lar ou ten­tar vio­lar o sig­ilo do voto: Pena — detenção até dois anos.

Em qual­quer dos casos uma pena, uma con­de­nação criminal.

O voto, nos ter­mos da Con­sti­tu­ição Fed­eral, é direto e secreto. Trata-​se de uma garan­tia con­sti­tu­cional a evi­tar que as pes­soas escol­ham seus rep­re­sen­tantes moti­va­dos por qual­quer coisa, que não sua von­tade livre e sober­ana, e sem rece­ber qual­quer tipo de pressão ou represália posterior.

A solução encon­trada – não fosse a con­tradição com a infor­mação téc­nica –, atende tanto ao senador que pode escapar à pecha de “traíra”, quando da empresa que escapa ao processo por vio­lação a leg­is­lação crim­i­nal eleitoral.

Ape­sar de tudo, o episó­dio tem um sen­tido pos­i­tivo. Serve para que a Justiça Eleitoral torne ainda mais indevassável as cab­ines de votação. A garan­tia do sig­ilo do voto e da urna é um pres­su­posto para a manutenção da democ­ra­cia brasileira. O voto, de ninguém, rico ou pobre, famoso ou anôn­imo, politico ou não, pode ser exposto da forma como vem sendo hoje em dia. O ato de votar é solene, for­mal e pre­cisa ser val­orizado. Não é por que se diz que a eleição é uma festa da democ­ra­cia que se possa pre­scindir dos rit­u­ais. Cada eleitor um voto. Ninguém pode votar pelo pai, mãe, amigo, viz­inho. Menos ainda divul­gar por qual­quer meio o voto, nem o próprio.Trata-se uma garan­tia con­sti­tu­cional, não podemos esque­cer disso.

Encerro dizendo que é aqui onde Sar­ney encontra-​se com Tomé. No caso de Tomé, somente vendo pas­sou a crente, no caso de Sar­ney, nem vendo ou peri­ci­ado é lic­ito acred­i­tar que votou em quem disse que que não votou.

Abdon Mar­inho é advogado.