AbdonMarinho - A REPÚBLICA DO PIOCERÃO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A REPÚBLICA DO PIOCERÃO.

A REPÚBLICA DO PIOCERÃO.

Volta e meia, prin­ci­pal­mente após as eleições, ressurgem os debates seces­sion­istas. Colo­cam com nat­u­ral­i­dade a ideia de dividirmos o nosso povo, por local­iza­ção geográ­fica, por raça, cor, situ­ação econômica. Nada mais tolo, nada mais absurdo. O Brasil é um só, demorou para que o con­struísse­mos assim e o cam­inho que temos é a união de todos os homens de bem em torno de um pro­jeto comum.

Os esta­dos ricos pre­cisam tra­bal­har no sen­tido de exi­girem do poder cen­tral que os esta­dos menos desen­volvi­dos alcancem o mesmo grau de desen­volvi­mento e as suas pop­u­lações o mesmo nível de acesso aos serviços públicos.

As regiões norte e nordeste sem­pre pade­ce­ram dos piores tipos de explo­ração política. Ainda durante a ditadura, enquanto os esta­dos do centro-​sul, sud­este e sul, iam as ruas pedindo o fim do régime, ou já a par­tir de de 1974 garan­tia a eleição de rep­re­sen­tantes oposi­cionistas nas direções dos seus esta­dos e uma boa rep­re­sen­tação no Con­gresso nacional, nos esta­dos do norte e nordeste as vel­has oli­gar­quias davam as car­tas. Já naquela época se falava em secessão.

Em 1976, para evi­tar uma acacha­paste der­rota nas urnas para a oposição, a ditadura lançou mão do pacote de abril, criando as sub­le­gen­das, aumen­tando em um terço a rep­re­sen­tação do Senado da República e mais out­ras medi­das ten­dentes a lim­i­tar o avanço dos opositores.

Ape­sar de tudo isso, em 76, 78 e 82, conseguiu-​se avançar e com a eleição de Tan­credo Neves, 1985, iniciar-​se um novo ciclo político.

Esse breve ret­ro­specto serve para mostrar que as ideias tolas não vem de hoje, o que temos de difer­ente são os personagens.

A maio­ria dos anal­is­tas apon­tam a última eleição como sendo a mais semel­hante com a batalha de 1989. A primeira eleição direta para pres­i­dente da República após a ditadura. Em relações aos sen­ti­men­tos, posso dizer que sim. Havia toda uma mís­tica entre o entendíamos o novo, o desco­lado, um tra­bal­hador no poder, rep­re­sen­tado pelo Lula e o can­didato rep­re­sen­tante das vel­has oli­gar­quias rurais do nordeste, dono do império de comu­ni­cação, Fer­nando Col­lor de Melo.

Como na atual cam­panha tín­hamos que desmisti­ficar as men­ti­ras dis­sem­i­nadas con­tra o Lula. Que ele iria tomar as ter­ras das pes­soas; que se você tivesse uma gal­inha teria que dividi-​la em duas e dar-​lhe uma banda; que iria tomar as mul­heres, pros­ti­tuir as cri­anças; que ele ten­tara obri­gar uma ex-​namorada a come­ter aborto; que era vio­lento con­tra as mulheres.

Eu, prati­ca­mente, um menino, ainda estu­dando para prestar vestibu­lar, ves­tia a camisa de mil­i­tante. Primeiro voto para presidente.

Lem­bro da enorme frus­tração, sen­ti­mento de vazio que senti quando as urnas apon­taram para a vitória de Collor.

Os votos de Lula, ori­un­dos, prin­ci­pal­mente dos grandes cen­tros urbanos das regiões sud­este, sul e centro-​oeste já o adver­sário pon­tif­i­cava como grande vito­rioso nos rincões mais atrasa­dos do norte, nordeste. São Paulo, que tam­bém deu vitória a Col­lor, dizia-​se que essa era dev­ida a grande colô­nia nordes­tina no estado.

Naque­les dias, os próceres do petismo, da chamada esquerda desco­lada, propalou os bor­dões de que o nordeste atrasava o Brasil. É isso mesmo, a “com­pan­heirada\» daquela época prop­unha o mesmo dis­curso tosco do divi­sion­ismo, do ódio con­tra o nordeste, etc. Essa mesma irres­ig­nação que vemos hoje con­tra a vitória de Dilma Rouss­eff viven­ci­amos con­tra a vitória de Collor.

A mesma coisa foi feita nas demais eleições per­di­das pelo Lula. Basta ver seus dis­cur­sos dele con­tra os pro­gra­mas de dis­tribuição de renda do gov­erno fed­eral na gestão de FHC. Dizia com todas as letras que os pobres do Brasil votavam com a bar­riga e não com a cabeça.

Com a chegada do Lula ao poder, em 2002 – após três der­ro­tas seguidas –, ele nada fez para prop­i­ciar as condições de desen­volvi­mento das regiões eco­nomi­ca­mente mais frágeis do Brasil, pelo con­trário, tra­tou de aumen­tar o assis­ten­cial­ismo, que tan­tas vezes o der­ro­tou e que tan­tas vezes com­bateu nas eleições.

O gov­erno Lula pas­sou a encar­nar o papel ante­ri­or­mente desem­pen­hado pelas vel­has oli­gar­quias estad­u­ais. Man­teve as vel­has estru­turas e colocou-​se acima delas. como prove­dor da política de esmolas.

É ilusório dizer que o nordeste cresce mais que as out­ras regiões. Na ver­dade, a pobreza é tamanha que qual­quer incen­tivo econômico aparece, como é o caso da injeção dos mil­hões men­sais dis­tribuí­dos nos pro­gra­mas de trans­fer­ên­cia de renda.

Não é pos­sível que aceite que se reduziu a mis­éria, quando se con­stata que só no “Bolsa Família” temos cerca de 55 mil­hões de ben­e­fi­ci­a­dos, sem con­tar os out­ros pro­gra­mas. Não se trata de uma política de Estado de redução da mis­éria, se assim fosse, par­tiríamos de um número ele­vado de bene­fí­cios e iríamos reduzindo ao longo dos anos. O que está acon­te­cendo é que a cada ano temos é mais gente sendo inscritas nestes programas.

Trata-​se de um crime con­tra essas pes­soas que não estão se lib­er­tando da mis­éria e sim ape­nas tro­cando de sen­hores. Acres­cento que com desvan­ta­gens para elas e para o país. As famílias mais pobres, cuja a taxa de natal­i­dade vinha em declínio, pas­sou a aumen­tar pois a cada filho se recebe um ben­efi­cio a mais. Maldizendo, a situ­ação se assemelha, em muito, aque­les idos do colo­nial­ismo, em que os sen­hores incen­ti­vavam o cresci­mento da pop­u­lação cativa para terem mais mão-​de-​obra. No caso, aqui, busca-​se o eleitorado cativo.

Nas últi­mas eleições, como no coro­nelismo de out­rora, os donos do poder fazem questão de ameaçar, difundir todo tipo de temor aos mais frag­iliza­dos. São basi­ca­mente as mes­mas ameaças que faziam os coro­néis, os mil­itares e que fez o Col­lor, na eleição de 1989. Só mudaram de lado os ameaçadores, os ameaça­dos per­manece­ram os mesmos.

A votação da pres­i­dente na sua local­iza­ção geográ­fica é o reflexo disso. Numa estranha coin­cidên­cia os seus mais 54 mil­hões de votos quase que cor­re­spon­dem ao número de ben­e­fi­ci­a­dos pelo Bolsa Família. Basta com­parar o mapa de ben­efi­ciários do Bolsa Família com o mapa de votação da pres­i­dente eleita e ver­e­mos que não há dis­tinção entre eles.

Numa outra coin­cidên­cia, os esta­dos do Piauí, Ceará e Maran­hão são onde há mais famílias são ben­e­fi­ci­adas, com dois, Piauí e Maran­hão, tendo mais de 50% (cinquenta por cento) das suas pop­u­lações inscritas nos pro­gra­mas soci­ais. Maran­hão, Piauí e Ceará lid­er­aram a votação em favor da can­di­data ofi­cial, dando a pres­i­dente eleita mais de 76% (setenta e seis por cento) dos votos.

O Maran­hão que tem mais de trinta municí­pios entre os cem mais depen­dentes a votação alcançou quase 80% (oitenta por cento). As pes­soas temerosas votam no inter­esse mais ime­di­ato: no din­heiro que lhe cai nas suas con­tas todo fim de mês.

Um dos casos mais emblemáti­cos de sub­mis­são política que lem­bro, é o caso de Bacabeira no Maran­hão. Aos que não lem­bram, no começo de 2010, o pres­i­dente da República, Sr. Lula, com pres­i­dente do Senado, Sr. Sar­ney, acom­pan­hados da min­is­tra da Casa Civil, Dilma Rouss­eff, do min­istro de Minas e Ener­gia, Sr. Edi­son Lobão, da gov­er­nadora do Maran­hão, Sra. Roseana Sar­ney e mais dezenas de políti­cos e adu­ladores de todos os naipes, foram àquele municí­pio lançar a pedra fun­da­men­tal da Refi­naria Pre­mi­nun de Bacabaira, qua­tro anos e quase dois bil­hões depois, o que era para ser uma refi­naria, virou um descam­pado, dezenas de famílias e comu­nidades de anti­gos quilom­bos deslo­cadas, dezenas de empresários que­bra­dos, a refi­naria, sim­ples­mente, foi para as cal­en­das, na atual crise pela qual passa a empresa, não se sabe nem mais se voltará a fazer parte dos seus planos de inves­ti­men­tos. Diante disso, do maior este­lion­ato eleitoral da história do país iria se imag­i­nar que os eleitores estivessem revolta­dos com quem os enganou, não? Em qual­quer outro lugar, sim, em Bacabeira a can­di­data que pro­moveu o engodo em 2010, con­seguiu 88,43% dos votos.

Esse é o retrato da República do Pio­cerão: os cidadãos não estão nem aí para nada, não lem­bram o dia de ontem desde que pos­sam sacar seu bene­fí­cio no fim do mês.

Abdon Mar­inho é advogado.