Líderes, liderados e conjuntura.
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- Criado: Domingo, 03 Dezembro 2023 15:28
- Escrito por Abdon Marinho
Líderes, liderados e conjuntura.
Por Abdon C. Marinho*.
AMIGOS próximos dizem aguardar minha opinião sobre a politica local diante da indicação do senhor Flávio Dino – até, então, um dos líderes incontestes da política maranhense –, para a vaga aberta no Supremo Tribunal Federal — STF com a aposentadoria da ministra Rosa Weber.
Essa não é uma análise fácil e dificilmente ter-se-á uma resposta “preto no branco” para tal indagação.
Se amigo leitor espera uma resposta definitiva ou mesmo uma “fumacinha” já pode ir tirando o cavalinho da chuva.
Acho que uma das primeiras análises a fazermos é sobre a situação do país.
O Brasil é hoje um país dividido e que se recusa a descer do palanque eleitoral.
A população ou pelo menos uma grande parte dela tornou-se obcecada pelo debate politico – que nada tenho contra, registre-se –, aproximando-se, muito da irracionalidade.
Vou dar um exemplo tolo, você abre uma matéria qualquer sobre um assunto qualquer, por assim dizer, trivial e basta olhar os comentários que lá você encontra, dos dois lados, referências ao Lula, ao Bolsonaro.
Debate sobre o seca no nordeste ou a enchente no sul, aparecem uma infinidade de “comentaristas” dizendo que a culpa é de um ou do outro político.
Até nos famosos “grupos da família” você encontra esse tipo de debate ou de “envenenamento” político.
Pior do que isso só mesmo a “cultura” do cancelamento.
O ator fulano de tal aparece no comercial da marca tal, muito boa por sinal. Ah, mas na campanha eleitoral ele disse que o meu candidato era isso ou aquilo, boicote total, ninguém compra mais da marca até que tirem o ator ou a atriz da campanha.
Por essas e por tantas outras tolices percebe-se que o Brasil tornou-se um país “doente”, envenenado pela política.
A esse contexto ou, principalmente, devido a ele, devemos acrescentar que o nosso conterrâneo honrado com a indicação, tornou-se uma pessoa controversa – e aqui não se faz qualquer juízo de valor quanto aos posicionamentos que o tornou “controvertido” –, a ponto de, pela primeira vez na história da República, a oposição fazer uma campanha pública, inclusive com manifestações de rua em todas as capitais e/ou grandes centros urbanos contra uma indicação para o STF, e a pressionar por todos os meios, legítimos ou não, para que o Senado não aprove o seu nome.
Na história da República apenas uma vez, segundo consta, e, ainda, na chamada “República Velha” tivemos uma recusa do Senado a uma indicação do presidente para o STF, assim mesmo sem a “campanha” orquestrada no seio da sociedade como se tem agora.
Mas, vivemos tempos inéditos.
Essa deve ser uma segunda avaliação.
Até que ponto a oposição terá força para recusar um nome indicado ao STF – inicialmente, pensei que passasse sem maiores alardes e margem elevadíssima, até porque, como poucos, preenche os requisitos constitucionais –, e, depois, até que ponto vai “vigiar” cada passo do novel ministro?
É dizer, Dino aprovado e empossado ministro STF continuará sendo vigiado 24 horas por dia, como, aliás, vem sendo outros ministros da corte?
E, assim sendo, colocado na berlinda como “adversário” político do bolsonarismo, não seria tentador jogar “tudo pro alto” e voltar ao enfrentamento político?
Veja, aqui são digressões, por vezes, divagações. Como tais, permitem que façamos esses exercícios mentais.
O plano de Dino – desde sempre –, foi ser presidente da República. Para isso, nos momentos de fragilidade política do Lula e do petismo, colocou-se na condição de inimigo número um do bolsonarismo.
Queria esse protagonismo e seria um dos nomes a disputar contra o ex-presidente Bolsonaro se o ex-presidente Lula não tivesse sido candidato.
Eleito Lula, continuou no mesmo protagonismo de enfrentamento do bolsonarismo no Ministério da Justiça, também, na intenção de se “credibilizar”, como antagonista de Bolsonaro para suceder o Lula na disputa ao maior cargo da nação.
Como já dissemos esse “protagonismo” atraiu dois sentimentos: o ódio dos bolsonaristas e o ciúme dos lulistas.
A sua indicação para a Suprema Corte não desagradou apenas os opositores, a ponto de promoverem uma inédita campanha contra seu nome, mas, também, inúmeros aliados “de primeira hora” que o tinha na conta de um possível quadro para suceder o Lula, em 2026 ou 2030.
Muitos destes aliados ficaram “ressentidos” com o fato dele (Dino) ter preferido seguir no bloco “eu comigo mesmo” para o Supremo.
Indicado ao cargo de ministro e tendo que enfrentar uma inédita “pedreira” política até vestir a toga, Dino prometeu que será seu último cargo – um casamento para a vida toda.
Faz todo sentido esse tipo de “compromisso” pois ele foi um político (sem mandato, é verdade, não sei se filiado) que virou magistrado; um magistrado que virou político; e, agora, novamente, um político em vias de virar magistrado.
Caso não ocorra o impensável e ele se sagre ministro do STF, alguns questionamentos permanecerão presentes e vivos: o bolsonarismo o manterá na condição de “inimigo número um”, junto com o ministro Alexandre de Moraes? Ele vai “aguentar” calado todo tipo de discurso contra ele ou voltará para o embate político? Em quanto tempo?
Mesmo que fique as duas décadas no STF, com setenta e cinco anos e com os adversários fazendo sua campanha diuturnamente, não será estranho se ainda vier a disputar uma eleição presidencial.
Como os amigos podem perceber, não se trata de uma análise de conjuntura fácil de se fazer. Depende de muitas variáveis: desde a saúde de Lula a discussão de mandatos para ministros do STF – que é debate que ocorre em vários países do mundo.
A Dino talvez seja mais “interessante” dizer que foi ministro do STF do que dizer que aposentou-se como ministro do STF.
Em relação a política local é certo dizer que o dinismo não se assenta numa estrutura hierarquizada – até existe uma certa ojeriza em relação aos políticos tradicionais –, se assim fosse, bastaria dizer que o “número dois” assumiria daqui pra frente.
A ligação do dinismo é com o próprio Dino, mesmo aqueles, que, certamente, teriam alguma influência sobre ele, não se “candidatam” a sucedê-lo ou insinuam possuir tal desejo. Ainda que possuam não se manifestaram.
Querem ocupar um espaço que não sabem se se encontra vazio ou não mas sem esse compromisso da sucessão.
Orbitam em torno do dinismo três partidos principais: o PSB, ao qual esteve (ou ainda estar filiado); o PCdoB, para onde foi quando retornou a política, em 2006; e o PT, partido onde militou na primeira fase política e de onde nunca se afastou afetivamente, basta dizer que em 2003, na esteira da eleição de Lula, no ano anterior, surgiu um movimento dentro desse partido para fazer Dino candidato a prefeito de São Luís em 2004, o movimento acabou por fracassar e o retorno de Dino à política, pelas mãos de Zé Reinaldo, só veio ocorrer em 2006, quando se elegeu deputado federal.
Para sabermos o “impacto” da indicação de Dino para STF terá na política local, partindo do pressuposto que a mesma será confirmada pelo Senado, como é normal que ocorra, uma das primeiras questões a serem levantadas é a questão da “definitividade”.
O que isso significa? Significa saber se ele estará de “fato e de direito” fora da política para todo o sempre, sem qualquer pretensão de retorno, no curto, médio prazo ou mesmo depois de aposentar-se, o que, nas regras atuais acontecerá daqui a vinte anos.
Se a saída da política é definitiva e sem qualquer chance de retorno, a “coisa” muda de figura.
Cada um dos políticos e mesmo os partidos, buscarão outros projetos.
Sem a “definitividade” resolvida, em torno de qual projeto político o grupo se manterá unido e comandado por quem?
A questão do “comando” é relevante e precisa ser bem ajustada porque sem poder “dá pitaco”, exceto, muito reservado, haveria rebeliões diversas.
Uma das regras mais elementares do jogo do poder é aquela que diz não haver espaço vazio na política ou, o velho “rei morto, rei posto”.
A saída de Dino do “jogo” movimenta diversas pedras do xadrez.
Sem Dino no contexto político e como “fiador” dos espaços políticos que seus aliados ocupam no poder estadual, que tipo de compromissos o atual governador se sentirá “obrigado” a manter? Outra, se vai manter. E, voltamos a questão do comando, quem terá a “legitimidade” para cobrar?
É fato que o atual governador e o seu entorno político se consolidaram como uma nova força política no estado independente de qualquer apoio político do antecessor – as diversas “costuras” que fez e mesmo o apoio popular que mantém apesar da crise econômica que atravessa o estado, mostram isso.
Intramuros e mesmo com Dino “ativo” na política, aliados próximos do ex e do atual governador já discutiam – ou defendiam –, uma ruptura no pacto de poder que os mantinham unidos antes da indicação.
Com Dino “inativo”, qual será a estratégia: tentar assumir o comando total do grupo – e isso implicaria em abrir mais espaços de poder –, ou “apostar” no seu ocaso? No caso da primeira hipótese, o dinismo, sem Dino, aceitaria? E em que bases?
Existem outras forças políticas à espreita do possa vir acontecer.
Existe um grupo de direita no estado – muito embora poucos saibam o que seja isso –, que cresceu e se consolidou como opositores ao dinismo – e que ficaram em segundo lugar nas eleições de 2022 –, continuará forte sem o principal antagonista ou voltará à antiga expressão política?
Existe o grupo político vinculado ao senador Weverton Rocha que ficou em terceiro lugar na última disputa de governo – “herdará” parte desse eleitorado dinista a ponto de se viabilizar para a próxima eleição majoritária como governador ou para manter o cargo de senador?
Existem ainda, à direita e à esquerda, diversas forças e personagens aguardando o próximo lance político para tirarem, para si, os melhores dividendos.
O tempo, em todo caso, é o senhor razão, é aguardar para conferir.
Ou, como dizia um antigo político maranhense: quem viver verá.
Abdon C. Marinho é advogado, escritor, cronista.