A BUSCA PELA IMPUNIDADE.
QUANDO menino, lá no sertão, ouvia dizer que nos “fins dos tempos” iriam acontecer coisas estranhas, diferentes. Na minha inocência ficava atento a tudo para saber se o fim estava próximo. Um formigueiro fora de tempo ou de lugar, um pássaro cantando fora de hora era motivos para preocupações.
O tempo passou e o mundo não acabou. Não como temia.
Por estes dias voltou-me as preocupações com o fim dos tempos. Sinais claro começam a se avistar.
Outro dia mesmo vi diversos intelectuais, advogados e mesmos autoridades constituídas reclamando da "celeridade da Justiça".
Vejam que este é um fato extraordinário, inusitado. Militando há anos nesta seara, o que sempre ouvi foram reclamações sobre a lentidão da Justiça pátria. E, não vem de hoje. O saudoso Rui Barbosa já nos idos do Império e princípio da República dizia que a justiça tardia não era senão a injustiça manifesta.
O fato inédito é por conta da marcação do julgamento, em segunda instância do ex-presidente, Lula.
O alarido, por conta disso, foi tamanho que ensejou ao presidente do TRF reclamado por sua "celeridade” a se manifestar asseverando que os prazos estavam dentro da normalidade e que processos daquela natureza correm, pelo menos a grande maioria, neste espaço de tempo.
Tempos estranhos em que mesmo autoridades, reclamam, publicamente, e sem constrangimentos, do alcance da Justiça.
Na verdade as elites, os detentores dos foros por prerrogativas de função, nunca tiveram qualquer interesse em julgamentos justos, na verdade sempre buscaram a prerrogativa de ficarem acima da lei.
Os "grandes” acham que as leis não servem para eles.
Isso foi o que disse o então presidente Lula quanto um dileto amigo foi apanhado em "malfeitos": “o Sarney não é uma pessoa comum”.
Agora, com o julgamento do Lula marcado, tentam passar a mesma ideia: que a Justiça está perseguindo o Lula; que ele não pode ser julgado; que a justiça está “célere” por que quer afastar o Lula da disputa presidencial.
Criam campanhas internacionais para difamarem a Justiça brasileira.
Em meus vagares indago: que inocente foge ao julgamento da Justiça do seu país como o diabo foge da cruz?
O senhor Lula foi investigado pela Polícia Federal, denunciado pelo Ministério Público Federal, julgado e condenado por um juiz federal. Claro que todos estes agentes podem ter errado e cometido uma injustiça contra o condenado.
Por conta dos erros a que estão sucetíveis os humanos, temos no nosso ordenamento outras instâncias judiciais, para reverem e, quando for o caso, corrigirem as injustiças, porventura, existentes.
Não vivêssemos tempos estranhos o senhor Lula, seus defensores, adoradores e sabujos, tão logo saiu a sentença do juízo de primeiro grau, teriam corrido para bater as portas do tribunal competente pedindo celeridade na avaliação do seu caso pela instância superior.
Inconformado pela injustiça buscaria com fervor que o tribunal atestasse sua inocência.
Não vimos nada disso. Querem justamente o oposto.
Certos dos crimes cometidos, buscam levar o julgamento para as calendas. Na instância inicial criaram todo tipo de embaraço ao andamento do processo; julgado foram atrás de todo os tipos e recursos e, agora, na eminência de terem o processo examinado, não por apenas um, mas por três desembargadores, ao invés de festejar a possibilidade de comprovar sua inocência, acusam a justiça de "célere".
E, pela movimentação de bastidores, parecem que não ficarão apenas na reclamação desavergonhada.
Preparam, com ajuda de autoridades, movimentos sociais, sindicatos e outros que os valham, estrondosa manifestação, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, contra a Justiça. Trata-se, como se vivêssemos numa republiqueta de bananas, de uma clara tentativa de intimidar a Justiça, um ato claro de sedição a atentar contra a democracia brasileira.
Qual a leitura que, sensatamente, podemos fazer destes acontecimentos?
Ao que parece, já trazem consigo a certeza de que as provas são contundentes e que o TRF não terá como reformar sentença para inocentar o condenado.
Se assim não fosse qual o sentido de se constranger um tribunal como se quisesse que tome uma decisão com base na pressão popular e não nas provas?
Aliás, o ato de constrangimento explícito, de pressão, até enfraquece uma possível decisão que favoreça o ex-presidente.
Caso decidam por sua inocência quem irá acreditar que foi com base nas provas e não na pressão das ruas?
Noutra quadra acreditam que a Justiça brasileira, em pleno século XXI, se sujeita a receber pressões da turba?
Se for assim, significa dizer que não merece qualquer respeito por parte dos jurisdicionados.
Ora, não temos como olvidar aquilo que verdadeiramente querem os donos do poder e seus sabujos, sejam eles intelectuais, artistas, militantes ou simplesmente aduladores: querem a Impunidade para si e para os seus. Apenas isso. Querem ficar fora do alcance da lei.
Os poderosos cumprem o horroroso ritual de se protegerem. São atrapalhos às investigações, ao andamento dos processos, são os generosos indultos.
Lá atrás Lula e Dilma fizeram isso, Temer faz o mesmo.
Todos têm medo da Justiça e por isso querem uma só para eles.
Se a Justiça não alcança a todos, indistintamente, para que serve?
Abdon Marinho é advogado.
Escrito por Abdon Marinho
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