AbdonMarinho - NO FRACASSO DA EDUCAÇÃO NINGUÉM MERECE ABSOLVIÇÃO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

NO FRA­CASSO DA EDU­CAÇÃO NINGUÉM MERECE ABSOLVIÇÃO.

NO FRA­CASSO DA EDU­CAÇÃO NINGUÉM MERECE ABSOLVIÇÃO.

Por Abdon Mar­inho.

CONTA a história (ou seria lenda?) que Nero (Nero Cláu­dio César Augusto Ger­mânico, imper­ador romano de 13 de out­ubro de 54 até a sua morte a 9 de junho de 68), tocava lira do alto da sua col­ina enquanto assis­tia Roma arder em chamas logo abaixo.

Começo com esta ale­go­ria para dizer que ape­nas os desprovi­dos de qual­quer senso do ridículo ou os con­t­a­m­i­na­dos pela má-​fé ou os insanos de todos os gêneros podem se negar à justa indig­nação com números divul­ga­dos pelo MEC a respeito da edu­cação nacional.

Os números divul­ga­dos nos últi­mos, fazem refer­ên­cia ao IDEB de 2017, ate­s­tando que nen­hum estado da fed­er­ação (nen­hum) con­seguiu alcançar a meta esta­b­ele­cida para o ano e, em muitos casos, até houve retro­cesso.

Estas metas, reparem, são baixas, ofereceu-​se a chance de mel­ho­rar ou apre­sen­tar um nível sat­is­fatório para edu­cação em duas décadas, mesmo assim, mesmo estas metas sendo mod­estas, não foram e não estão sendo cumpri­das cumpri­das, pior esta­mos nos afa­s­tando do seu cumpri­mento, ficando para trás.

Muitos são os dados con­stantes no Índice de Desen­volvi­mento da Edu­cação Básica – IDEB, e sua análise com­porta uma série de situ­ações, entre­tanto, ao meu sen­tir, uma só tabela, ou mel­hor duas, sin­te­ti­zam o caos em que mer­gul­hou a edu­cação no Brasil.

O nosso fra­casso pode ser resum­ido no fato de ape­nas 5% (cinco por cento) dos estu­dantes do ensino médio apre­sentarem o nível ade­quado em matemática; ape­nas 24% (vinte e qua­tro por cento) pos­suem con­hec­i­men­tos bási­cos; e 71% (setenta e um por cento) apre­senta con­hec­i­mento insu­fi­ciente. Aquele que a pro­fes­sora Mari­cot­inha, no ensino primário, escrevia com esfer­o­grá­fica ver­melha “I” e man­dava um bil­hete para os pais.

Esses 5% (cinco por cento) não são de gênios da matemática, ape­nas apre­sen­tam um nível de con­hec­i­mento “adequado”.

Os que imag­i­naram ser este descal­abro próprio da aver­são ao estudo da matemática, se decep­cionaram mais ainda com o resul­tado da outra matéria básica: por­tuguês.

O estudo rev­ela que ape­nas 1,7% (um vír­gula sete por cento) pos­suem, no ensino médio nacional, o con­hec­i­mento “ade­quado” na dis­ci­plina.

É isso mesmo, ninguém leu errado, nem 2% (dois por cento) con­hecem ade­quada­mente a lín­gua de Camões. Ape­nas 28% (vinte e oito por cento) pos­suem con­hec­i­mento bási­cos do assunto e a grande maio­ria, 70,3% (setenta vír­gula três por cento), levam o “I”, de insu­fi­ciente.

Este “I” não é ape­nas de insu­fi­ciente, é, tam­bém, de imoral, indecente.

Os números são uma média, mas como já dizia um antigo pro­fes­sor, não tem mág­ica nen­huma no mundo, que possa ter uma média dessas como pos­i­tiva. Para se chegar a essa média, os números ger­adores são cat­a­stró­fi­cos.

Caso os gov­er­nantes do Brasil – e aqui falo de todas as esferas de poder, fed­eral, estad­ual e munic­i­pal –, tivessem um mín­imo, um ínfimo sen­ti­mento de con­strang­i­mento ou de ver­gonha, não ficava um no cargo. Por von­tade própria, todos pediriam licença para saírem dos seus car­gos, renun­cia­riam. Alguns, talvez, até devessem come­ter suicí­dio por ver­gonha do desas­tre, pois estão com­pro­m­e­tendo o futuro do país como nação soberana.

Mas não fazem isso, jamais farão. Como a des­graça atinge a todos, indis­tin­ta­mente, acham que a culpa é do “sis­tema”, a respon­s­abil­i­dade, por­tanto, de todos, o que sig­nifica, de ninguém.

Os mais desaver­gonhados, diante de tamanho vex­ame, até pos­suem ousa­dia sufi­ciente para comem­o­rar e diz­erem que fazem um “exce­lente” tra­balho na área.

As dis­ci­plinas matemática e por­tuguês, são as mais bási­cas de todas, lida-​se com elas desde o iní­cio da apren­diza­gem.

Não faz sen­tido chegar ao fim do ensino médio e, ao se tirar uma média do con­hec­i­mento ade­quado das mes­mas, ter­mos pouco mais de três por cento. Ou seja, mais de noventa e cinco por cento apre­sen­tam con­hec­i­mento básico ou insu­fi­ciente, com vitória larga para insu­fi­ciên­cia e ainda tem os que apare­cem para achar – e mais, fes­te­jar –, como se tivésse­mos gan­hado um Nobel?

Perderam a ver­gonha, o senso do ridículo, a des­façatez? Tomem tento, senhores.

Mais, como digo no título deste texto, essa é uma tragé­dia da qual ninguém merece ser absolvido.

Os gov­er­nantes pos­suem a maior parte da respon­s­abil­i­dade, falta-​lhes com­pro­misso com a edu­cação, a com­preen­são de que sem edu­cação o país, o estado, os municí­pios não vão a lugar algum, e que se “cria” uma pop­u­lação de “escravos”, inca­pazes de decidir o próprio destino.

Será essa a estratégia?

Desde a Con­sti­tu­ição de 1988 a edu­cação brasileira tem rece­bido recur­sos expres­sivos – se não sufi­cientes, bem supe­ri­ores ao que se des­ti­nava ao setor até então –, situ­ação que mel­horou ainda mais com as leis de val­oriza­ção do mag­istério (Fundo de Manutenção e Desen­volvi­mento do Ensino Fun­da­men­tal e de Val­oriza­ção do Mag­istério FUN­DEF e depois o Fundo de Manutenção e Desen­volvi­mento da Edu­cação Básica – FUN­DEB ).

O que acon­te­ceu, ape­sar da mel­ho­ria no aporte de recur­sos e val­oriza­ção do mag­istério? Sig­ni­fica­ti­va­mente para o apren­dizado, nada. Na ver­dade a edu­cação tem cam­in­hado para traz.

Essa é a con­clusão do IDEB de 2017.

Como explicar isso? Exis­tem diver­sas razões e todos os dias tomamos con­hec­i­mento de “malfeitos” com a qual­i­dade do ensino e o mau uso dos recur­sos.

Não raro, chega-​nos noti­cias (que infe­liz­mente não temos como provar mas que mere­ce­ria atenção das autori­dades), de manip­u­lação de con­cur­sos de pro­fes­sores, sobre­tudo, nos municí­pios.

Como desco­bri­ram que os recur­sos do FUN­DEB eram sem­pre mel­hores e mais “seguros” que os ori­un­dos do FPM, muitos gestores manip­u­laram os con­cur­sos para aprovar os seus apanigua­dos, muitos dos quais sem qual­quer qual­i­fi­cação.

Resul­tado: o mais com­pleto fra­casso do ensino fun­da­men­tal. Pes­soas sem con­hec­i­men­tos bási­cos para si, encar­regadas da for­mação de cri­anças.

Como alguém que não sabe ler, escr­ever ou ainda os rudi­men­tos da matemática pode ensi­nar algo as crianças?

Não bas­tasse a gravi­dade de tal infor­mação, criou-​se nas cor­po­rações de “edu­cadores” a ideia de que todo o recurso do FUN­DEB deve ser rateado entre eles inde­pen­dente de apre­sentarem resul­ta­dos ou não.

Aqui não se ques­tiona o dire­ito “sagrado” à val­oriza­ção profis­sional, de forma alguma, entre­tanto é fato que val­oriza­ção da cat­e­go­ria não se fez sen­tir nos resul­ta­dos apre­sen­ta­dos por estes profis­sion­ais nas suas trincheiras de lutas: a edu­cação das cri­anças.

São infini­tas leis que aumen­tam salários, reduzem car­gas horárias, sem que se leve em conta as neces­si­dades dos estu­dantes e as pos­si­bil­i­dades dos entes pagadores.

Têm-​se um piso mín­imo para 40 horas/​semanais, mas muitos quer­erem (e recebem) para tra­bal­har 20, 16, 12 e até 6 horas sem­anais.

Não digo que gan­hem bem, mas gan­ham mel­hor que out­rora para tra­bal­har bem menos. De onde se indaga: Gan­har bem e tra­bal­har pouco tem servido para mel­ho­rar a qual­i­dade do ensino? Os números mostram que não.

Isso sem con­tar a infini­tas fraudes na con­cessão de diplo­mas e cer­ti­fi­ca­dos emi­ti­dos sem con­t­role e acom­pan­hamento do MEC ou dos con­sel­hos e ainda a notória leniên­cia das admin­is­trações que os aceitam com o único propósito de inflar inde­v­i­da­mente os salários dos “mestres”.

Como podem pre­tender trans­mi­tir val­ores, for­mar cidadãos se não entregam as cri­anças uma edu­cação de qual­i­dade para as quais são regia­mente pagos?

Como podem ensi­nar val­ores, se muitos – não todos –, não sen­tem qual­quer con­strang­i­mento em jun­tar um diploma gra­cioso – e não raro falso –, para mel­ho­rar o con­tra­cheque no final do mês?

Como dizia, nunca antes da Con­sti­tu­ição de 1988 as car­reiras lig­adas à edu­cação foram tão val­orizadas, ape­sar disso, nunca se ensi­nou tão pouco e tão mal. Já disse isso inúmeras vezes, os últi­mos IDEB’s ates­tam isso.

Chega a ser ina­cred­itável que diante de números tão ver­gonhosos as rep­re­sen­tações das cat­e­go­rias não digam nada, não se man­i­festem, silen­ciem. Não ven­ham a público, nem mesmo para pedir desculpas.

Mas essa equação não estaria per­feita sem inclusão de mais um lado: os pais, as famílias, os respon­sáveis por estas cri­anças e ado­les­centes.

A edu­cação, sobre­tudo a pública, é custeada com recur­sos de toda a sociedade. Mas os pais e/​ou respon­sáveis pelos os alunos, os pagadores dos impos­tos, são omis­sos, não par­tic­i­pam, não fre­quen­tam as esco­las, não fis­cal­izam a qual­i­dade da ali­men­tação ou do ensino que é ofer­tado aos seus fil­hos. São todos cúm­plices do caos.

E vou além, estes país e/​ou respon­sáveis, não querem ter qual­quer respon­s­abil­i­dade com for­mação daque­les que troux­eram ao mundo, não ensi­nam qual­quer valor ético ou moral a eles. Agem como se as esco­las fos­sem respon­sáveis não ape­nas pela trans­mis­são de con­hec­i­men­tos, mas tam­bém pela for­mação moral destas cri­anças e adolescentes.

Trata-​se, por óbvio, de um mod­elo que tinha tudo para dar errado. E deu.

Abdon Mar­inho é advogado.