CEM DIAS DE VEXAME.
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- Criado: Sexta, 29 Agosto 2014 12:10
- Escrito por Abdon Marinho
CEM DIAS DE VEXAME.
Chega a cem dias a greve dos servidores do magistério de São Luís. Cem dias com estudantes fora da sala de aula. Poderia se dizer que são cem dias, sem aula, sem justiça, sem autoridade, sem bom-senso.
O sindicato do professores chamou para 28/08, uma assembleia geral da categoria para discutir a proposta da prefeitura, o fim do movimento paredista, desfiliação de entidade de classe. Segundo informa o edital a dita reunião ocorreria na praça em frente ao Palácio La Ravardière, sede da prefeitura. A razão para que a reunião ocorra em tal ambiente é a ocupação do prédio público pelos mestres, alguns acorrentados. A falta de notícias sobre a reunião leva a pensar que ainda não chegaram a uma solução para o impasse.
Independente do resultado, fim ou não do movimento, essa é uma batalha sem vencedores, uma guerra de derrotados, conforme mostraremos a seguir.
Os professores saem derrotados na medida em que paralisaram as atividades em maio com uma pauta com inúmeras reivindicações, entre elas um reajuste salarial de 20% (vinte por cento) e, após, cem dias saem com algo em torno de 6% (seis por cento), o máximo que o município pode oferecer.
A administração municipal saí igualmente derrotada. Disse que não podia ir além de 3% (três por cento), reajuste que fez os vereadores aprovarem para o conjunto de servidores e agora surge com quase o dobro da proposta anteriormente apresentada. Se sabiam que podiam ir além dos três, por que só agora, cem dias depois, apresenta mais esse percentual? De onde saiu o recurso? Que despesas tiveram que cortar?
Veja, foi com o argumento que estavam no limite, dentre outros, acredito, que conseguiram convencer o judiciário a decretar a ilegalidade da greve.
Não fazia e não faz o menor sentido que uma greve que a justiça considerou ilegal continue sem que o poder público adote qualquer providência. Sem cortar o ponto dos servidores que desafiem a decisão judicial e sem promover a abertura dos processos administrativos com vistas a demissão dos servidores grevistas. Mais que isso, que prossiga nas negociações com os ilegais. O gestor, diferente do que afirmam os grevistas, não está sendo intransigente, ele está sendo leniente. Parece acometido daquele mal que infesta as administrações públicas no Brasil: Todo mundo quer ser bonzinho, ninguém quer assumir o ónus de tomar as medidas impopulares contra os outros, sobretudo contra uma grande categoria.
Estranho que esse tipo de coisa aconteça. Se era para o gestores e grevistas ignorarem a decisão judicial por qual razão foram bater às portas do Poder Judiciário? Ora, o papel do judiciário é dirimir conflitos entre partes, dizer quem está certo e quem está errado. Foi por isso que foram buscar a prestação jurisdicional. Conseguem a manifestação da justiça em suas diversas instâncias e continuam como se nada tivesse acontecido?
Se atitude do sindicado em persistir com o movimento após a decretação de ilegalidade é um desafio a autoridade do tribunal o mesmo ocorre com relação a administração que busca o socorro do Estado/Juiz e ao obtê-lo, passa a ignorar a solução, continua a negociar, não toma as medidas cabíveis contra os recalcitrantes.
Se a intenção da administração era negociar a exaustão por meses a fio até convencer o sindicato que os seus números estavam certo, não deveriam ocupar a justiça antes da hora. A decisão judicial põe – ao menos deveria por – termo a qualquer controvérsia. Ao prosseguirem com as negociações após a manifestação da justiça, inclusive oferendo vantagens que disse antes não poder, ignorando a decisão ou, pior, enganando o corte.
Assim, a greve, também, derrota o Poder Judiciário que tem suas decisões desrespeitadas pelos dois lados. Pelo município que não teve coragem de fazer valer a decisão e pelos grevistas que simplesmente a ignoram. As consequências futuras desta derrota do judiciário serão sentidas em demandas futuras. Se todos ignoram a decisão judicial e não acontece nada, o que impede que quaisquer outros façam o mesmo?
Uma paralisação tida por ilegal deveria ter como sentido lógico a suspensão das negociações, o corte dos pagamentos, a abertura dos processos com vistas as demissões ao invés disso, a administração, fazendo pouco caso da decisão que perseguiu, continua como se nada tivesse acontecido. Esquecem, todos, gestores e sindicalistas, que há uma decisão judicial sendo desrespeitada. O Estado Democrático de Direito sendo violado. A bagunça é tamanha que o Ministério Público, o fiscal da lei, faz a intermediação das negociações que afrontam decisão da justiça e fica tudo por isso mesmo. Não deveriam está exigindo punição aos que desrespeitam a decisão judicial?
Dirão que todos os envolvidos estão tomados das melhores das intenções. O problema é que de bem-intencionados …
As vítimas deste impasse – em última análise, os maiores derrotados –, são as crianças que correm o risco de perder o ano letivo e que parecem não contar com a solidariedade de ninguém, nem dos seus professores, nem dos seus administradores. Continuarão com esse impasse até quando? Quem pagará os prejuízos que essas crianças estão sofrendo?
As crianças são os derrotadas silenciosas, todos fazem ouvidos moucos as suas necessidades.
A educação não pode ser tratada como uma questão menor. Cem dias é metade do ano letivo. O aprendizado destas crianças, no tempo que resta, está comprometido, elas não terão mais como cumprir o calendário, e se cumprirem será com atropelos, com duvidosa capacidade de absorção do conteúdo. Mas este é um problema que passa longe das preocupações de grevistas, da administração, dos conselhos tutelares e do ministério público.
Sem fazer proselitismo político, devemos indagar se a situação estaria insolúvel se se tratasse das escolas dos ricos? Decerto que não.
Se essa é uma guerra de derrotados, isso se dá porque todos os envolvidos, a exceção das crianças, estão errados. Caso encerrem já a greve por estes dias, veremos todos se cumprimentando como se nada tivesse acontecido, posando para as fotos e buscando dividendos políticos. As vítimas? Que se lixem.
Abdon Marinho é advogado.