AbdonMarinho - Farinha pouca, meu pirão primeiro.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 22 de Setem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

Far­inha pouca, meu pirão primeiro.

FARINHA POUCA, MEU PIRÃO PRIMEIRO.

Por Abdon Marinho.

DESCON­TADAS algu­mas arrobas que pos­sui a mais, o gov­er­nador do Maran­hão, tal qual a D. Bela, per­son­agem imor­tal de Zezé Macedo na “Escol­inha do Pro­fes­sor Raimundo», do saudoso genial Chico Any­sio, só pensa “naquilo”. Para ele, no caso, “aquilo” é a presidên­cia da República. Espé­cie de sonho e/​ou obsessão que o persegue desde sem­pre.

Os que não con­hecem a história ficam sem enten­der muitos dos seus posi­ciona­men­tos e man­i­fes­tações.

Foi, basi­ca­mente, o que acon­te­ceu com essa rev­e­lação de uma artic­u­lação urdida pelo comu­nista visando a fusão do seu par­tido, o PCdoB com o PSB e/​ou uma espé­cie de “MDB de esquerda”, agru­pando todos os descon­tentes de todas as leg­en­das “de esquerda” para enfrentar o bol­sonar­ismo nas eleições de 2022, son­hando ser ele o grande con­du­tor e can­didato do grupo, con­forme rev­elou “O Globo”, em edição recente.

No mesmo artigo, sua excelên­cia «assina» o ates­tado de óbito da esquerda brasileira e escreve o epitá­fio na sua lápide, avaliando, den­tre out­ras coisas, que as chamadas “esquer­das” não elegerão nen­hum prefeito de cap­i­tal nas eleições munic­i­pais deste ano.

Não é que a avali­ação esteja errada, pelo con­trário, pelas infor­mações que temos, parece cor­reta, é pela forma como se avalia.

Aqui mesmo, no estado que con­duz – e que as pesquisas apon­tam pos­suir apoio majoritário –, não ape­nas cam­in­ham para perder a eleição da cap­i­tal, como, tam­bém, nos municí­pios mais impor­tantes do Maran­hão.

A própria região met­ro­pol­i­tana, onde a pre­sença do gov­erno estad­ual é mais sen­tida, até pela influên­cia das mais vari­adas mídias, as “chamadas esquer­das” não devem eleger ninguém.

O curioso é que em muitos municí­pios, inclu­sive na região met­ro­pol­i­tana, temos o gov­erno estad­ual fazendo “parce­rias” con­tra os can­didatos da esquerda, até mesmo con­tra o próprio par­tido do gov­er­nador, o PCdoB.

Outro dia expus a curiosa parce­ria que ocorre entre o gov­erno estad­ual é um pré-​candidato de Paço do Lumiar, um dos municí­pios mais impor­tantes do estado.

A impressão que fica é que o gov­er­nador, para jus­ti­ficar a sua “análise” de que a esquerda brasileira não elegerá nen­hum prefeito de cap­i­tal – e acres­cento, de municí­pios impor­tantes –, “torce” e/​ou até “tra­balha” para o fra­casso dos par­tidos do seu campo, para depois dizer: “eu não disse”, e apresentar-​se como o grande tim­o­neiro do tal pro­jeto do “MDB da esquerda”.

Há alguns dias, um fato político me chamou a atenção: um impor­tante secretário do gov­erno estad­ual, fil­i­ado ao par­tido do gov­er­nador, foi à imprensa dizer que estava “fechado” com um outro can­didato que não era o do seu par­tido.

Achei o gesto muito estranho. Não entro no mérito sobre a qual­i­dade do can­didato que escol­hera, com certeza um exce­lente nome.

O meu estran­hamento foi pelo fato em si.

Ora, con­heço o PCdoB, pes­soal­mente, desde que voltaram a legal­i­dade, em mea­dos de 1985. Ape­sar de não ser fil­i­ado a par­tido – ainda era ado­les­cente –, par­tic­i­pava de dis­cussões com diver­sos comu­nistas por conta da orga­ni­za­ção do movi­mento estu­dan­til e, ainda que com menos assiduidade, nunca perdi o diál­ogo com algu­mas pes­soas do par­tido, nem quando, em 1994, fiz­eram um acordo “secreto” com o grupo Sar­ney e não apoiaram as forças políti­cas da oposição.

Em todos estes anos – e depois, com o apro­fun­da­mento dos estu­dos da história a par­tir da rup­tura dos dis­si­dentes com o Par­tido Comu­nista Brasileiro, o antigo PCB, nos anos 50 do século pas­sado, jus­ta­mente por aquele par­tido ado­tar revi­sion­ismo con­tra as práti­cas stal­in­istas, mas isso é assunto para outro texto –, sem­pre soube que um dos pilares do par­tido era o chamado “cen­tral­ismo democrático”.

O que sig­nifi­cava (ou sig­nifica) que podiam dis­cu­tir, “se matar” na base, mas cumpririam, rig­orosa­mente, as decisões do par­tido. Nas vezes que ques­tionei isso, os ami­gos diziam que era pela “causa” maior. Nunca soube que causa era essa.

Quando vi um secretário do gov­er­nador, mais que isso, um “comunista-​raiz”, declarar que estava “fechado” com outro can­didato, entendi que havia “uma causa maior” pelo meio e que o can­didato ofi­cial do par­tido comu­nista seria “cris­tian­izado”, ou seja, para constar.

Os mais jovens não devem saber mas o termo “cris­tianizar” remonta a eleição pres­i­den­cial de 1950 do século pas­sado, quando o PSD lançou um can­didato, Cris­tiano Machado, mas com o avançar da dis­puta, e mesmo no iní­cio da mesma, prati­ca­mente todos os líderes do par­tido o aban­do­nou.

O Cris­tiano Machado ficou foi longe de gan­har as eleições, mas o fol­clore da política nacional gan­hou um novo termo: “cris­tianizar”.

Como vêem, Abdon Mar­inho tam­bém é cul­tura. Rsrsrs.

A certeza que o can­didato ofi­cial seria “cris­tian­izado” ficou mais patente quando diver­sos out­ros secretários de esta­dos, “da con­fi­ança do gov­er­nador”, ainda que de par­tidos políti­cos difer­entes, ao invés de guardarem dis­crição, expuseram pub­li­ca­mente suas can­di­dat­uras.

Excesso de democ­ra­cia ou movi­mento combinado?

A situ­ação ficou tão con­strange­dora que outro dia “virou notí­cia” alguém do PCdoB declarar apoio for­mal ao can­didato do par­tido. É sério.

E, por último, o vati­cino do gov­er­nador do estado – emb­ora falando para a política nacional –, de que a “esquerda” não elege­ria nen­hum prefeito de cap­i­tal, o can­didato do par­tido dele, obvi­a­mente, incluso.

Quem con­hece política sabe que nen­hum gesto é em vão.

Raposa velha neste ter­reiro, o pai do can­didato do par­tido do gov­er­nador já avi­sou que no seu dicionário não con­sta a palavra desistên­cia. Talvez querendo dizer não aceitar ser deix­ado para trás, como tantos.

Reca­dos dados de todos os lados resta saber o resul­tado de tudo isso.

O jabuti está em cima da árvore e duas per­gun­tas se fazem necessárias: quem o colo­cou e por que o colo­cou.

A mim soa estranho que um gov­erno que “se vende” como tendo o apoio de quase 70% (setenta por cento) de apoio pop­u­lar, com uma forte pen­e­tração na mídia, não con­siga trans­ferir esse apoio para o “seu” can­didato.

Mais estranho, ainda, que o gov­er­nador já tenha “ven­dido” der­rota do “seu” can­didato ao país inteiro.

A situ­ação fica mais esquisita quando sabe­mos que o can­didato do par­tido do gov­er­nador – até onde sabe­mos, repita-​se –, não pos­sui qual­quer mácula no cur­rículo, nunca se envolveu em escân­da­los, pos­sui família estru­tu­rada, e quem con­vive com ele, diz que é boa praça, exce­lente pes­soa, etc.

Diante disso, não podemos deixar de per­gun­tar, até porque, per­gun­tar não ofende, por qual motivo e tão pre­mat­u­ra­mente o par­tido já o “cris­tian­i­zou” e o gov­er­nador já pub­li­cou que ele não se elege?

Só lem­brando, aqui mesmo na cap­i­tal, muitas can­di­dat­uras, antes de suas escol­has em con­venções, saíram para dis­puta com per­centu­ais infe­ri­ores ao can­didato do PCdoB e sagraram-​se vito­riosas.

Daí soar estranho tamanho desin­ter­esse pela can­di­datura ofi­cial do par­tido a ponto de sua maior lid­er­ança, o gov­er­nador, já ter “recon­hecido” a der­rota antes mesmo de entrar no ringue. E por nocaute.

Quer me pare­cer que, em nome de sua “causa maior” o gov­er­nador queira “dá um cav­alo de pau” na sua estraté­gia política.

Como disse no iní­cio – e em diver­sos out­ros momen­tos –, sua excelên­cia só pensa “naquilo”, na presidên­cia.

Desde que pôs os pés nos Leões que sua ener­gia – e o poder do estado –, é dire­cionada para este propósito, já se vão quase sete anos nisso.

Lá atrás, se não me falha memória, em 2012 ou 2013, alertei, sua excelên­cia, para o risco de candidatar-​se pelo PCdoB ao gov­erno do estado, um par­tido arraigado em dog­mas e posi­ciona­men­tos difí­ceis de serem com­pat­i­bi­liza­dos com à sociedade brasileira.

Não deu bola, e a vitória nas urnas – moti­vadas prin­ci­pal­mente pelo cansaço do povo com o grupo Sar­ney e, tam­bém, porque não tinha como deixar de gan­har do opos­i­tor –, fez foi achar que estava no cam­inho certo e que o povo brasileiro aceitaria ser gov­er­nado por um par­tido com o histórico do Par­tido Comu­nista do Brasil — PCdoB.

Depois de tanto tempo, parece que sua excelên­cia viu que a briga lá em cima é para “cachorro grande”, e que o seu par­tido, con­forme já aler­tou o próprio Lula, num “chega pra lá” ele­gante, é a sua prin­ci­pal desvantagem.

Nesse tempo todo, em entre­vis­tas para uma imprensa dócil, o gov­er­nador já negou os duzen­tos anos do comu­nismo, já des­disse a maio­ria dos seus dog­mas, já o ten­tou “casar com o Cris­tian­ismo” e tan­tas out­ras coisas.

Tudo que foi ten­tado não deu o resul­tado esper­ado, por isso é sabedor da sua enorme desvan­tagem, ainda mais que o “mote” do atual pres­i­dente – e do bol­sonar­ismo –, para as eleições de 2022, será o com­bate à “ameaça comu­nista”.

Ciente disso, o gov­er­nador e seus ali­a­dos, den­tro do par­tido, ten­taram “inven­tar” um tal de movi­mento 65, que, efe­ti­va­mente, até parece coisa de movi­mento, mas, estu­dan­til, e não de quem pre­tende diri­gir o país.

Sair do par­tido – como já foi ensa­iado algu­mas vezes –, não pegaria bem, pas­saria a impressão de opor­tunismo.

Sem con­tar con­tar que os próprios cama­radas do par­tido pode­riam se sen­tir “traí­dos”.

A estraté­gia política que mel­hor se apre­senta para sua excelên­cia é apos­tar – e mesmo torcer, talvez “tra­bal­har” –, para o insucesso dos par­tidos de esquerda nes­tas eleições munic­i­pais, para quedá-​los a aceitar a “sua ideia” da fed­er­ação de par­tidos, o tal de “MDB de esquerda”.

Só reg­is­trando que tal ideia nem é orig­i­nal. O MDB orig­i­nal, quando surgiu, foi como uma “fed­er­ação de diver­sas forças políti­cas colo­cadas na clan­des­tinidade pela ditadura.

Ele, como “pai” da ideia à frente, para dis­putar as eleições pres­i­den­ci­ais, já sem o estigma do comu­nismo e com o apoio de todas as forças políti­cas de dire­ita, cen­tro até a extrema esquerda.

Esse é o jabuti. Na tradução lit­eral do que já dizia minha avó: “— far­inha pouca, meu pirão primeiro”.

Abdon Mar­inho é advo­gado.