AbdonMarinho - UMA NAÇÃO DE CORRUPTOS?
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 21 de Setem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

UMA NAÇÃO DE CORRUPTOS?

UMA NAÇÃO DE CORRUPTOS?

Por Abdon Marinho.

TENHO por certo que ninguém ignora os male­fí­cios da cor­rupção numa sociedade – em qual­quer sociedade.

Ela (cor­rupção) drena os recur­sos que dev­e­riam servir para con­struir esco­las, pagar mel­hor os pro­fes­sores, dotar as unidades de saúde de medica­men­tos, equipa­men­tos, médi­cos e out­ros profis­sion­ais; garan­tir a mel­hor assistên­cia aos dela neces­si­tam; dotar os esta­dos de uma infraestru­tura capaz de fomen­tar o desen­volvi­mento; treinar e armar a polí­cia para que enfrente o crime orga­ni­zado e a vio­lên­cia que assom­bra a sociedade; enfim, a cor­rupção está na raiz de todos os demais prob­le­mas enfrenta­dos pela sociedade.

Os exem­p­los estão nas diver­sas esferas de gov­erno espal­hadas pelo Brasil.

Não são pou­cas as man­i­fes­tações que cla­mam pelo fim (ou diminuição) da cor­rupção e por maiores inves­ti­men­tos nas áreas essen­ci­ais: edu­cação, saúde, assistên­cia, infraestru­tura e, prin­ci­pal­mente, segurança.

A cor­rupção sem­pre exis­tiu no Brasil – pelo menos, desde que por estas ter­ras apor­taram out­ros povos.

A despeito de sem­pre ter exis­tido — e, talvez, sem­pre exi­s­tirá –, é per­cep­tível que nos últi­mos tem­pos ela recrude­sceu. E, tanto que ao lado da vio­lên­cia é do que mais reclama a população.

Assim, tenho por certo, ainda, que a cor­rupção deva extir­pada, ou ces­sada, ou dimin­uída, etc. Estou certo?

Ape­sar de tan­tos male­fí­cios cau­sa­dos pela cor­rupção no Brasil, inclu­sive na área da segu­rança que causa mais de 60 mil homicídios/​ano e o desem­prego que já levou à indigên­cia mais de 13 mil­hões de cidadãos, lid­er­ava a cor­rida eleitoral deste ano de 2018, jus­ta­mente um cidadão con­de­nado e preso por cor­rupção e lavagem de prisão a doze anos e um mês de cadeia.

As pesquisas rev­e­lam que se não estivesse impe­dido de con­cor­rer às eleições por conta da Lei da Ficha Limpa, o encar­cer­ado pode­ria, até mesmo, gan­har a eleição no primeiro turno.

Não fos­sem os impedi­tivos legais, o Brasil, como as orga­ni­za­ções crim­i­nosas, pode­ria ser coman­dado de den­tro da cadeia.

Ainda indi­re­ta­mente, a hipótese de ter­mos o país coman­dado de den­tro da cadeia não pode ser total­mente afas­tada: as mes­mas pesquisas rev­e­lam que o “poste” que venha ser indi­cado pelo condenado/​presidiário tem chances de gan­har as eleições.

Está é a reflexão que faço: como uma pop­u­lação con­hece­dora das des­graças cau­sadas pela cor­rupção (ainda) se dis­punha a votar em um can­didato ao mais ele­vado cargo da nação alguém con­de­nado e preso por … corrupção?

A das últi­mas pesquisas DataFolha*, con­tratada pela Folha de São Paulo e TV Globo, mostrou que alguém nas condições descritas acima tem quase 40% (quarenta por cento) dos votos váli­dos dos brasileiros.

Temos, então, por baixo, con­siderando o histórico de abstenção e votos nulos, mais de 40 mil­hões de cidadãos dizendo que votariam, sim, em um cor­rupto con­de­nado e preso.

É de se inda­gar: que fim levou a indig­nação dos cidadãos? Cadê os protestos con­tra a roubal­heira dos recur­sos públi­cos? São indifer­entes a ela? Acham nor­mal tudo que acon­te­ceu no Brasil nesta década e meia?

Sem maiores delon­gas e sem con­sid­erar as pro­postas dos demais can­didatos, pudesse o condenado/​preso dis­putar a eleição, poucos duvi­dam, liq­uidaria a eleição no primeiro turno. Ou seja, teria mais da metade dos votos váli­dos.

A sociedade brasileira, deve­mos deduzir, apoia a famosa política do “rouba mas faz” ou vende que faz? Seria isso?

Vejam, prom­e­tendo com­bate firme a cor­rupção o ex-​presidente Lula, hoje na condição de condenado/​presidiário por cor­rupção assumiu o gov­erno da nação em 2003, desde então, segundo nar­ram os autos a Ação Penal 470, começou-​se as práti­cas mais odi­en­tas de cor­rupção que vieram a ser rev­e­ladas em 2005, no famoso caso apel­i­dado “Men­salão”. Fingindo-​se traído e dizendo nada saber, no ano seguinte foi reeleito pres­i­dente da República – emb­ora já sem os votos das pes­soas de bem –, e as práti­cas cor­rup­tas, que nunca ces­saram, con­tin­uaram mais fortes e agres­si­vas, con­forme nos foi rev­e­lado no curso da chamada “Oper­ação Lava Jato”.

Os números da ban­dalha rev­e­la­dos nesta oper­ação, que são de todos con­heci­dos – grandiosos e superla­tivos –, rev­e­lam que o país não foi gov­er­nado por par­tidos e políti­cos mais sim por uma sofisti­cada orga­ni­za­ção crim­i­nosa que tinha duas mis­sões prin­ci­pais: a primeira assaltar, com deste­mor, os cofres públi­cos; a segunda enga­nar os incau­tos com esmo­las.

Emb­ora inelegível por conta do primeiro processo e talvez o de menor apelo, vez que a propina se deu através de reforma em um aparta­mento e num valor que, salvo mel­hor juízo, não alcançou dois mil­hões de reais, o fato é que ele foi con­de­nado em duas instân­cias judi­ci­ais – o que é sufi­ciente para impedi-​lo da dis­puta –, e as demais instân­cias não encon­traram, à primeira vista, qual­quer mácula no processo.

Assim, quando a sociedade, através das pesquisas de opinião, enquanto durou a nati­morta can­di­datura, o apon­tava como franco favorito, estava sim­ples­mente dizendo que a cor­rupção com­pro­vada e/​ou san­cionada não é impedi­tivo para que as pes­soas dis­putem mandatos ele­tivos e, partindo daí, podem até eleger dep­uta­dos e senadores dis­pos­tos a por fim a “Lei da Ficha Limpa” ou mesmo votarem medi­das que difi­cul­tem ou impeçam o com­bate à cor­rupção ou, noutro giro, dizendo que os órgãos de con­t­role: Polí­cia Fed­eral, Min­istério Público e o próprio Poder Judi­ciário brasileiro encontram-​se car­co­mi­dos pela cor­rupção e, por­tanto, segundo essa nar­ra­tiva, o jul­ga­mento do ex-​presidente foi o maior erro judi­ciário que se tem noti­cia no mundo.

Este é o país que quer­e­mos? Decerto, é o que temos.

A situ­ação obje­tiva posta é essa: um con­de­nado pode ser can­didato? Pode ser eleito? Pode diri­gir uma nação? Caso afir­ma­tivo, o que impede que out­ros con­de­na­dos, tam­bém, pos­sam ser can­didatos? O que os impede de pas­sar men­sagens aos seus dis­cípu­los infor­mando que devem votar neste ou naquele can­didato? Se o con­de­nado Lula pode (pelo menos isso é o que defende muitos dos seus ali­a­dos), por que o Mar­cola ou o Fer­nand­inho Beira-​mar, não podem? Todos estão, per­ante a lei, na condição de con­de­na­dos, pre­sos, cumprindo suas penas.

O Tri­bunal Supe­rior Eleitoral — TSE, com acerto sepul­tou a can­di­datura do ex-​presidente con­de­nado, proibindo-​o – assim como faz com todos os demais con­de­na­dos –, de par­tic­i­par da cam­panha. Não era sem tempo. A candidatura-​fake só tinha o condão de trazer muito mais insta­bil­i­dade ao país e ver­gonha para suas insti­tu­ições. Com acerto agiu ao igno­rar a suposta recomen­dação lim­i­nar de dois mem­bros de um obscuro comitê da ONU, cuja a com­posição são dezoito, solic­i­tando que o Brasil pas­sasse por cima de toda sua leg­is­lação para garan­tir que o ex-​presidente par­tic­i­passe da disputa.

O Brasil não é – ainda – uma republi­queta de bananas.

O ex-​presidente foi con­de­nando e por isso mesmo impe­dido de par­tic­i­par da dis­puta eleitoral, com base em leg­is­lação mundial­mente recon­hecida e aceita, não com base em leis de exceção, a intro­mis­são de quem quer que seja, em tal assunto, chega a ser ofen­sivo à sobera­nia nacional.

O espan­toso de tudo isso, não é, entre­tanto, que se ofenda as pes­soas de bens com pre­ten­sões estapafúrdias.

Noutros tem­pos, um boato sobre a inte­gri­dade moral de uma pes­soa, já lev­ava a afastar-​se – por voltante própria –, de qual­quer dis­puta política, agora já não basta um boato, já não basta uma notí­cia, já não basta uma ou duas con­de­nações, já não basta a prisão, os valentes, mesmo após o vered­ito de todas as instân­cias judi­cias, cla­mam, nas ruas pelo jul­ga­mento das urnas. Para estes são elas que devem dizer se alguém, inde­pen­dente de qual­quer coisa, encontra-​se apta ou não a con­duzir os des­ti­nos da nação.

Cla­mam assim na esper­ança que, mais uma vez, a voz da mul­ti­dão faça o que já fiz­era há mais de dois mil anos, quando escol­heu Barrabás à Jesus Cristo.

O pior é que, pelo andar da car­ru­agem, mais uma vez a história tinha tudo para se repe­tir, pois vive­mos num país onde as pes­soas (grande parte delas) não vêem con­strang­i­mento na cor­rupção que san­gra a nação e nega seus dire­itos bási­cos, como saúde, edu­cação, segu­rança, infraestru­tura, cul­tura e tan­tos out­ros. O roubar muito fazem os líderes.

Essa é a nossa sociedade.

Abdon Mar­inho é advogado.

*Datafolha /​Folha de S. Paulo e TV Globo Pesquisa do dia 22/​08/​2018, real­izada entre os dias 20 e 21/​08/​2018; Reg­istro nº: BR-​04023/​2018; Amostra: 8.433; Margem de erro: +-2 pon­tos per­centu­ais.