AbdonMarinho - Prefeitos, Vereadores e causos deliciosos.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Quinta-​feira, 09 de Maio de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

Prefeitos, Vereadores e cau­sos deliciosos.


PREFEITOS, VEREADORES E CAU­SOS DELICIOSOS.

Por Abdon C. Marinho*.

QUEM tra­balha ou tem vivên­cias pelo inte­rior e se inter­essa pelos cau­sos de nosso povo já deve ter tomado con­hec­i­mento de muitas histórias inter­es­santes, sobre­tudo, aque­las envol­vendo as autori­dades locais.

Prefeitos e vereadores, então, sem­pre dão motivos – e gostam disso –, para viverem “na boca do povo”.

Na última viagem para a baix­ada com o amigo e con­ta­dor Max Harley Pas­sos Fre­itas reviver­mos alguns cau­sos envol­vendo situ­ações pres­en­ci­adas por nós e out­ras que ape­nas ficamos sabendo por ter­ceiros.

Essas lem­branças me fiz­eram “puxar pela memória” out­ros cau­sos e moti­varam a escr­ever a nossa já tradi­cional crônica de domingo.

Como se diz lá no sertão que o “nome é que faz o fux­ico”, con­tare­mos os “mila­gres” sem dar nomes aos “san­tos” – sei que é chato isso, mas espero que a leitura seja diver­tida.

Um asses­sor entra no gabi­nete do prefeito, sem bater e sem pedir licença – bem no estilo daque­les asses­sores que acham que o prefeito lhe deve, eter­na­mente a vitória nas urnas –, dizendo:

— Prefeito, prefeito, D. Fulana de tal “caiu de uma árvore” (um aci­dente grave qual­quer, que não recordo), está toda que­brada e pre­cisamos levá-​la com urgên­cia para São Luís.

O prefeito, naquele momento rece­bia uma equipe de um órgão de con­t­role que iria fazer uma audi­to­ria nas con­tas do municí­pio – estava na “moda” as tais audi­to­rias e tudo que um prefeito temia era ser “aza­teado” para uma delas –, vira-​se, e responde:

— Não posso fazer nada, esta­mos sem qual­quer din­heiro nas contas.

Um quarto de hora depois um outro asses­sor aden­tra na sala:

— Prefeito é urgente, pre­cisamos deslo­car a D. Fulana!

O prefeito retruca:

— Já disse que não tem din­heiro nas contas.

Não demora muito, o primeiro asses­sor retorna:

— Siô, é sério, a mul­her vai mor­rer se não for “acudida”.

— Querem que faça o quê? Já disse que não temos din­heiro. Responde o prefeito.

Os audi­tores que tudo assis­tiam, já pre­ocu­pa­dos com a morte emi­nente da cidadã, argumentam:

— Seu prefeito, não tem mesmo din­heiro algum para socor­rer a senhora?

O prefeito responde:

— A única conta que temos recur­sos é a conta do FUNDEF.

Um audi­tor olha para o outro e dizem, em uníssono:

— Seu prefeito, use o din­heiro do FUN­DEF e salve a mul­her.

E assim foi feito, com o aval dos fis­cal­izadores.

Certa vez fui chamado por um prefeito para acom­pan­har umas trata­ti­vas para eleição da mesa dire­tora da câmara.

Não tinha nada a fazer em tal artic­u­lação, mas como manda quem pode e obe­dece quem tem juízo, lá segui eu com meu “fiel escud­eiro”, Afrânio, para o dito povoado dis­tante alguns quilômet­ros da sede do municí­pio. Fiquei no alpen­dre com Afrânio enquanto o prefeito estava alo­jado em um quarto da casa recebendo um e outro vereador para as “trata­ti­vas” e fechar a chapa para mesa – esse é um hábito do inte­rior do Maran­hão, os assun­tos mais sérios e sig­ilosos são trata­dos nos quar­tos de dormir.

Entra vereador e sai vereador do quarto e nada de fecharem a chapa.

Já era a quarta ou quinta vez que o prefeito chamava uma vereadora para os “ajustes” no quarto, sem que chegassem a um entendimento.

No alpen­dre, eu e Afrânio só a ouvíamos “resmungar”:

— Se ele me chamar nova­mente, não irei.

Quase meia hora recla­mando que não iria, que o aten­de­ria, quando escu­ta­mos a voz do prefeito:

— Fulana, corre aqui!

E ela sem nem pedir licença, cor­reu para o quarto para ter com o prefeito.

Seu Afrânio olhou para mim e disse:

— Oxe, agora mesmo ela não disse que não iria?

Virei-​me e disse:

— Ah, seu Afrânio, esses são os “mis­térios” da política.

O certo é que o prefeito con­seguiu “fazer” a mesa da câmara. Mas pouco tempo depois os vereadores, não se sabe por qual motivo, se rebe­laram con­tra ele e já estavam falando e cas­sação de mandato – me procurou.

— Doutor, os vereadores estão querendo me cas­sar. Disse-​me.

— É mesmo, prefeito. Deve­mos nos nos pre­ocu­par com isso.

Respondeu-​me:

— Não pre­cisamos nos pre­ocu­par, pois além de terem razão, a vice-​prefeita é de minha total con­fi­ança.

Disse isso, batendo no peito do lado do coração:

— A comadre Fulana é daqui, ô.

Dias depois desco­b­ri­mos que a artic­u­lação para cassá-​lo par­tira da pro­po­ria vice.

A situ­ação virou um bor­dão do escritório. Quando quer­e­mos nos referir a alguma situ­ação de “trairagem”, dize­mos: — a comadre Fulano é daqui, ô!

Voltando a falar no hábito das pes­soas do inte­rior faz­erem seus negó­cios mais sérios nos quar­tos de dormir, certa fez fui chamado para fazer a defesa, em processo eleitoral de uma prefeita recém-​eleita, acu­sada pelos adver­sários de com­pra de votos.

Fui con­ver­sar com ela:

— Mas a sen­hora deu alguma coisa, algum din­heiro, para alguém?

Ao que ela me respon­deu com a sin­ceri­dade que se espera de todo cliente:

— Doutor, só faze­mos política com din­heiro, aqui todo mundo pede tudo. Mas lhe garanto que nen­huma teste­munha que colo­quem no processo vão provar que dei qual­quer coisa, pois o que dei a algum eleitor foi den­tro do quarto e sem ninguém para ver.

Gan­hamos o processo.

No ter­ceiro ou quarto mandato den­tro da mesma família, a acusação mais comum lançada con­tra o chefe político local era que ele havia con­sti­tuído uma “oligarquia”.

Os adver­sários só dizia isso: era oli­gar­quia pra lá, era oli­gar­quia pra cá.

Certo dia um ali­ado político desse prefeito chegou pra ele e disse:

—Pois é, seu Fulano, esses adver­sários só ficam falando de oli­gar­quia pra cá e pra lá, mas a “nossa” oli­gar­quia é tão boa.

Deter­mi­nado prefeito acos­sando um empresário saiu-​se com essa:

— Muito bem meu amigo, fize­mos aqui esse negó­cio, falta só a parte do vereador?

O empresário virou-​se para ele e indagou:

–– Como assim, prefeito, do vereador?!

Ao que ele respon­deu, apon­tando para si:

–– sim, do vereador. Prefeito não pede din­heiro, quem pede é vereador.

Certa vez o prefeito ia tran­si­tando com um grupo de vereadores no próprio carro, quando um dos edis, saiu-​se com essa:

–– sabe prefeito, acho que o sen­hor dev­e­ria des­ti­nar uma verba para recu­per­ação dessa via, ela está muito ruim.

O prefeito retru­cou:

–– É ver­dade, vereador fulano, mas se inve­stir o recurso na estrada não terei como ajudá-​los na eleição que se aproxima.

O autor da pro­posta então respondeu:

–– Pen­sando bem prefeito, o sen­hor tem razão, a estrada assim, com esses bura­cos, ajuda a evi­tar aci­dentes.

O certo é que a estrada nunca foi feita – até hoje. Acho que aju­dar a reduzir as estatís­ti­cas de aci­dentes de trân­sito.

Um der­radeiro causo envol­vendo o mesmo público é de um prefeito que disse, certa vez:

–– Uma das min­has primeiras medi­das será dar um iPad para cada vereador.

O inter­locu­tor, sem enten­der, per­gun­tou:

–– Mas, por qual razão, prefeito?

O prefeito, não perdeu a viagem:

–– Ah, meu amigo, aí pede.

E caíram na gargalhada.

Assim cam­inha a humanidade. Qual­quer coin­cidên­cia com fatos viven­ci­a­dos por alguns dos leitores é “mera semelhança”.

Abdon C. Mar­inho é advo­gado.