AbdonMarinho - Home
Bem Vindo a Pagina de Abdon Marinho, Ideias e Opiniões, Sexta-feira, 29 de Novembro de 2024



A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade.

Escrito por Abdon Marinho

A DEMOCRACIA DE CADA UM.

Por Abdon Marinho.

— AH, MEU FILHO, quem “destrata” quer comprar. 

A frase já dita em meus textos tantas vezes, como sabem, faz parte dos ensinamentos do meu saudoso pai. Ele, apesar de analfabeto por parte de pai, mãe e parteira, nunca deixou de ter uma palavra sobre os temas do cotidiano e nos ensinar. 

E essa frase, que conhecemos desde tempos imemoriais, a magia do tempo nos mostra, nunca foi tão atual.

Vejamos, na atual quadra política, o paralelo que podemos traçar entre o cenário político nacional e o local, aqui, numa questão bem específica.

Desde que o atual presidente da República assumiu o mandato que tem sido tratado como o ditador, autoritário, indigno e um risco à democracia.

Desde o começo do governo quem tem feito um esforço sobre-humano e, às vezes, bizarro, para ser a antítese ao governo do senhor Bolsonaro é o governador do Maranhão, o senhor Dino, integrante do Partido Comunista do Brasil – PCdoB. 

Se o presidente diz que o céu está azul-anil, lá vem o governador dizer que o céu está encarnado como a bandeira da China; se diz que faz frio, o governador diz que está quente como no deserto do Saara. E por aí vai. 

Reconheça-se que neste intento, por alguns momentos, o governador até chegou a ser reconhecido como o verdadeiro opositor ao presidente, levando-o a dizer-se pré-candidato à presidência da República, praticamente, quatro anos antes do pleito. Algo inédito.

Um dos principais pontos de antagonismo, sem dúvida, foi a proposta de reforma da previdência, encaminhada pelo governo federal logo nos primeiros dias da nova legislatura.

A reforma da previdência, como sabemos, era uma emergência nacional. Claro que ninguém gosta de limitar ou mesmo cessar direitos que foram conquistados ao longo de anos – embora muitos dos supostos “direitos” sejam, na verdade, privilégios de uma elite perdulária que desde sempre viveu às custas do Estado.

Apesar de todos saberem da sua necessidade, sobretudo, os dirigentes dos estados federados, o governador maranhense e seus aliados tudo fizeram para torpedear a reforma da previdência e “desidratá-la” ao máximo. 

Em determinado momento,  quando os parlamentares chegaram a um consenso com os governadores visando a inclusão de estados e municípios na reforma, o “nosso” governador foi o único (salvo melhor juízo) a colocar-se contra, e não assinar o acordo, obrigando a aprovação da reforma sem os estados e municípios. 

Noutra frente, seus aliados no parlamento uniram-se ao que de mais reacionário existe dentro do Congresso Nacional para garantir privilégios e reduzir a economia do país com a reforma. 

Mesmo depois que a reforma foi aprovada na Câmara dos Deputados, já em votação no Senado, foi uma aliada sua que apresentou – e conseguiu aprovar –, uma emenda à proposta, reduzindo ainda mais a economia do país com a reforma. 

Esse breve histórico é importante para entendermos a forma de agir de sua excelência em relação ao público externo e interno.

Enquanto, além das fronteiras do Maranhão, o que mais se ouve da boca de sua excelência são termos como diálogo, debate, democracia, liberdade e outras coisas mais do “anedotário” – de anedota mesmo, pois parece piada –, para o público interno a conversa é bem distinta. 

A Emenda Constitucional nº. 103, com o que “sobrou” da reforma da previdência, após sofrer todo tipo de boicote do governador maranhense e seus aliados, foi promulgada pelo Congresso Nacional no dia 12 de novembro, pois bem, já no dia 19 de novembro, menos de oito dias, e considerando um feriado nacional (proclamação da República) e um final de semana, já estava sua excelência, o “nosso” governador, batendo às portas da Casa de Manuel Beckman, “ordenando” aos valentes deputados da sua base que aprovassem na legislação estadual as alterações da reforma que tanto criticou.

Só não aprovou a adesão do estado a reforma no espaço de duas ou três horas porque um ou dois deputados da oposição pediram vistas regimental do projeto. Mas, já no dia seguinte o projeto estava sendo votado, acredito que daquela velha maneira “os senhores deputados que concordam permaneçam como estão”. Pronto! Estava sacramentada a adesão às novas normas constitucionais da reforma da previdência.

Não teve nada de diálogo, de debates, convencimentos e todas essas coisas “horríveis” da democracia. Foi aprovada na base da “lei do mais forte”. 

Vejam que não questiono a aprovação do projeto em si. Os entes federados devem submeter-se às normas gerais da Constituição da República, o que se discute aqui é a contradição existente entre o discurso para o público externo e o que é praticado internamente. 

Até onde se sabe, outros estados, supostamente, em situação até pior que a nossa, não “correram” para aplicar as novas alíquotas, mesmo aqueles governadores que, também, se mostraram contrário à reforma, muito menos, “interditaram” quaisquer possibilidades de diálogo dos representantes do povo. 

Com efeito o artigo 9º, da Emenda Constitucional, estabelece: “§ 4º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão estabelecer alíquota inferior à da contribuição dos servidores da União, exceto se demonstrado que o respectivo regime próprio de previdência social não possui deficit atuarial a ser equacionado, hipótese em que a alíquota não poderá ser inferior às alíquotas aplicáveis ao Regime Geral de Previdência Social”.

À luz da ação empreendida temos, por certo, a admissão indireta que a previdência social do estado está “quebrada”, ou seja, possui déficit autuorial a ser equacionado. 

O que, aliás, sempre soubemos – apesar dos reiterados desmentidos dos governantes –,  e que a oposição denuncia desde muito tempo. 

A previdência estadual, na atual gestão, saiu de uma situação confortável, com recursos investidos suficientes para arcar com suas despesas, para uma situação, segundo dizem, de acumular um déficit de mais de 2 bilhões de reais no mesmo espaço de tempo e ter que se desfazer do seu patrimônio imobiliário para tentar diminuir o “rombo”. 

Talvez estas verdades inconvenientes, mas incontestáveis, justifiquem a interdição do debate democrático, pelo governo, na Assembleia Legislativa. Ou, talvez, os deputados estaduais não tenham “moral” suficiente para impor o debate político sobre as questões do estado, fazendo valer o mandato que lhes conferiram às urnas. Ou, talvez, estejam todos comungando do surto autoritário que domina o estado. Que, aqui não enxergam, mas que são doutores em apontar em relação ao governo federal. 

Aliás, todos aqueles que se esgoelaram protestando contra a reforma da previdência e o governo federal, aqui, quando o governo mandou aprovar a “adesão” a parte da reforma não disseram nada, silenciaram, emudeceram, acharam tudo muito bem, obrigado. 

Segundo soube, um deputado da oposição desafiou quaisquer dos deputados da situação a dizer o que tinha em determinado artigo da lei que estava em discussão, não obteve resposta. E olha que projeto (que virou lei) era bem “mixuruca”. 

Arrisco dizer que não imaginava que em pleno século XXI, com tantas informações circulando, fôssemos ter uma representação política tão deficiente. Um governador senhorial impondo-se sobre um parlamento ajoelhado. 

Como na música, “vejo o futuro repetir o passado, vejo um museu de grandes novidades”.

Ao testemunhar os deputados estaduais aprovarem um projeto de lei de tanta importância sem qualquer discussão, sem um debate democrático sobre a situação do estado; aprovar sem ler em questão de horas, vapt-vupt; ver a imprensa, quase toda, silenciar como um cordeiro, faz-me recordar de como eram as coisas no início do século passado, como se o presente (e o futuro) repetisse o passado.

Já contei aqui essa história – mas não custa repetir –, conta a “lenda”, que no tempo dos coronéis as eleições eram “pro forma”. O rico coronel, instalava a seção eleitoral no alpendre de sua casa de fazenda e os caboclos formava a fila para votar. O coronel, então, preenchia cédula devidamente “votada” e dobrada para que “eleitor” a depositasse na urna, sob suas vistas. Se algum dos “eleitores” tomasse a iniciativa de tentar abrir a cédula para ver em quem “votara”, já lhe atalhava o coronel: — o que é isso caboclo, você não sabe que o voto é secreto?

Como podemos constatar, falta bem pouco para o governo e a Assembleia Legislativa retornem a esse nível. Já alcançamos as votações “vapt-vupt”, para retornar as cédulas “votadas”, falta bem pouco.

Abdon Marino é advogado.