AbdonMarinho - A DEMOCRACIA DE CADA UM.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 24 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A DEMOC­RA­CIA DE CADA UM.

A DEMOC­RA­CIA DE CADA UM.

Por Abdon Marinho.

AH, MEU FILHO, quem “destrata” quer com­prar.

A frase já dita em meus tex­tos tan­tas vezes, como sabem, faz parte dos ensi­na­men­tos do meu saudoso pai. Ele, ape­sar de anal­fa­beto por parte de pai, mãe e parteira, nunca deixou de ter uma palavra sobre os temas do cotid­i­ano e nos ensi­nar.

E essa frase, que con­hece­mos desde tem­pos imemo­ri­ais, a magia do tempo nos mostra, nunca foi tão atual.

Vejamos, na atual quadra política, o para­lelo que podemos traçar entre o cenário político nacional e o local, aqui, numa questão bem específica.

Desde que o atual pres­i­dente da República assumiu o mandato que tem sido tratado como o dita­dor, autoritário, indigno e um risco à democracia.

Desde o começo do gov­erno quem tem feito um esforço sobre-​humano e, às vezes, bizarro, para ser a antítese ao gov­erno do sen­hor Bol­sonaro é o gov­er­nador do Maran­hão, o sen­hor Dino, inte­grante do Par­tido Comu­nista do Brasil – PCdoB.

Se o pres­i­dente diz que o céu está azul-​anil, lá vem o gov­er­nador dizer que o céu está encar­nado como a ban­deira da China; se diz que faz frio, o gov­er­nador diz que está quente como no deserto do Saara. E por aí vai.

Reconheça-​se que neste intento, por alguns momen­tos, o gov­er­nador até chegou a ser recon­hecido como o ver­dadeiro opos­i­tor ao pres­i­dente, levando-​o a dizer-​se pré-​candidato à presidên­cia da República, prati­ca­mente, qua­tro anos antes do pleito. Algo inédito.

Um dos prin­ci­pais pon­tos de antag­o­nismo, sem dúvida, foi a pro­posta de reforma da pre­v­idên­cia, encam­in­hada pelo gov­erno fed­eral logo nos primeiros dias da nova legislatura.

A reforma da pre­v­idên­cia, como sabe­mos, era uma emergên­cia nacional. Claro que ninguém gosta de lim­i­tar ou mesmo ces­sar dire­itos que foram con­quis­ta­dos ao longo de anos – emb­ora muitos dos supos­tos “dire­itos” sejam, na ver­dade, priv­ilé­gios de uma elite per­dulária que desde sem­pre viveu às cus­tas do Estado.

Ape­sar de todos saberem da sua neces­si­dade, sobre­tudo, os diri­gentes dos esta­dos fed­er­a­dos, o gov­er­nador maran­hense e seus ali­a­dos tudo fiz­eram para tor­pedear a reforma da pre­v­idên­cia e “desidratá-​la” ao máx­imo.

Em deter­mi­nado momento, quando os par­la­mentares chegaram a um con­senso com os gov­er­nadores visando a inclusão de esta­dos e municí­pios na reforma, o “nosso” gov­er­nador foi o único (salvo mel­hor juízo) a colocar-​se con­tra, e não assi­nar o acordo, obri­g­ando a aprovação da reforma sem os esta­dos e municí­pios.

Noutra frente, seus ali­a­dos no par­la­mento uniram-​se ao que de mais rea­cionário existe den­tro do Con­gresso Nacional para garan­tir priv­ilé­gios e reduzir a econo­mia do país com a reforma.

Mesmo depois que a reforma foi aprovada na Câmara dos Dep­uta­dos, já em votação no Senado, foi uma ali­ada sua que apre­sen­tou – e con­seguiu aprovar –, uma emenda à pro­posta, reduzindo ainda mais a econo­mia do país com a reforma.

Esse breve histórico é impor­tante para enten­der­mos a forma de agir de sua excelên­cia em relação ao público externo e interno.

Enquanto, além das fron­teiras do Maran­hão, o que mais se ouve da boca de sua excelên­cia são ter­mos como diál­ogo, debate, democ­ra­cia, liber­dade e out­ras coisas mais do “ane­dotário” – de ane­dota mesmo, pois parece piada –, para o público interno a con­versa é bem dis­tinta.

A Emenda Con­sti­tu­cional nº. 103, com o que “sobrou” da reforma da pre­v­idên­cia, após sofrer todo tipo de boicote do gov­er­nador maran­hense e seus ali­a­dos, foi pro­mul­gada pelo Con­gresso Nacional no dia 12 de novem­bro, pois bem, já no dia 19 de novem­bro, menos de oito dias, e con­siderando um feri­ado nacional (procla­mação da República) e um final de sem­ana, já estava sua excelên­cia, o “nosso” gov­er­nador, batendo às por­tas da Casa de Manuel Beck­man, “orde­nando” aos valentes dep­uta­dos da sua base que aprovassem na leg­is­lação estad­ual as alter­ações da reforma que tanto criticou.

Só não aprovou a adesão do estado a reforma no espaço de duas ou três horas porque um ou dois dep­uta­dos da oposição pedi­ram vis­tas reg­i­men­tal do pro­jeto. Mas, já no dia seguinte o pro­jeto estava sendo votado, acred­ito que daquela velha maneira “os sen­hores dep­uta­dos que con­cor­dam per­maneçam como estão”. Pronto! Estava sacra­men­tada a adesão às novas nor­mas con­sti­tu­cionais da reforma da previdência.

Não teve nada de diál­ogo, de debates, con­venci­men­tos e todas essas coisas “hor­ríveis” da democ­ra­cia. Foi aprovada na base da “lei do mais forte”.

Vejam que não ques­tiono a aprovação do pro­jeto em si. Os entes fed­er­a­dos devem submeter-​se às nor­mas gerais da Con­sti­tu­ição da República, o que se dis­cute aqui é a con­tradição exis­tente entre o dis­curso para o público externo e o que é prat­i­cado inter­na­mente.

Até onde se sabe, out­ros esta­dos, suposta­mente, em situ­ação até pior que a nossa, não “cor­reram” para aplicar as novas alíquo­tas, mesmo aque­les gov­er­nadores que, tam­bém, se mostraram con­trário à reforma, muito menos, “inter­di­taram” quais­quer pos­si­bil­i­dades de diál­ogo dos rep­re­sen­tantes do povo.

Com efeito o artigo 9º, da Emenda Con­sti­tu­cional, esta­b­elece: “§ 4º Os Esta­dos, o Dis­trito Fed­eral e os Municí­pios não poderão esta­b­ele­cer alíquota infe­rior à da con­tribuição dos servi­dores da União, exceto se demon­strado que o respec­tivo régime próprio de pre­v­idên­cia social não pos­sui deficit atu­ar­ial a ser equa­cionado, hipótese em que a alíquota não poderá ser infe­rior às alíquo­tas aplicáveis ao Régime Geral de Pre­v­idên­cia Social”.

À luz da ação empreen­dida temos, por certo, a admis­são indi­reta que a pre­v­idên­cia social do estado está “que­brada”, ou seja, pos­sui déficit autuo­r­ial a ser equa­cionado.

O que, aliás, sem­pre soube­mos – ape­sar dos reit­er­a­dos des­men­ti­dos dos gov­er­nantes –, e que a oposição denun­cia desde muito tempo.

A pre­v­idên­cia estad­ual, na atual gestão, saiu de uma situ­ação con­fortável, com recur­sos investi­dos sufi­cientes para arcar com suas despe­sas, para uma situ­ação, segundo dizem, de acu­mu­lar um déficit de mais de 2 bil­hões de reais no mesmo espaço de tempo e ter que se des­fazer do seu patrimônio imo­bil­iário para ten­tar diminuir o “rombo”.

Talvez estas ver­dades incon­ve­nientes, mas incon­testáveis, jus­ti­fiquem a inter­dição do debate democrático, pelo gov­erno, na Assem­bleia Leg­isla­tiva. Ou, talvez, os dep­uta­dos estad­u­ais não ten­ham “moral” sufi­ciente para impor o debate político sobre as questões do estado, fazendo valer o mandato que lhes con­feri­ram às urnas. Ou, talvez, este­jam todos comungando do surto autoritário que dom­ina o estado. Que, aqui não enx­ergam, mas que são doutores em apon­tar em relação ao gov­erno fed­eral.

Aliás, todos aque­les que se esgoe­laram prote­s­tando con­tra a reforma da pre­v­idên­cia e o gov­erno fed­eral, aqui, quando o gov­erno man­dou aprovar a “adesão” a parte da reforma não dis­seram nada, silen­cia­ram, emude­ce­ram, acharam tudo muito bem, obri­gado.

Segundo soube, um dep­utado da oposição desafiou quais­quer dos dep­uta­dos da situ­ação a dizer o que tinha em deter­mi­nado artigo da lei que estava em dis­cussão, não obteve resposta. E olha que pro­jeto (que virou lei) era bem “mix­u­ruca”.

Arrisco dizer que não imag­i­nava que em pleno século XXI, com tan­tas infor­mações cir­cu­lando, fôsse­mos ter uma rep­re­sen­tação política tão defi­ciente. Um gov­er­nador sen­ho­r­ial impondo-​se sobre um par­la­mento ajoel­hado.

Como na música, “vejo o futuro repe­tir o pas­sado, vejo um museu de grandes novidades”.

Ao teste­munhar os dep­uta­dos estad­u­ais aprovarem um pro­jeto de lei de tanta importân­cia sem qual­quer dis­cussão, sem um debate democrático sobre a situ­ação do estado; aprovar sem ler em questão de horas, vapt-​vupt; ver a imprensa, quase toda, silen­ciar como um cordeiro, faz-​me recor­dar de como eram as coisas no iní­cio do século pas­sado, como se o pre­sente (e o futuro) repetisse o passado.

Já con­tei aqui essa história – mas não custa repe­tir –, conta a “lenda”, que no tempo dos coro­néis as eleições eram “pro forma”. O rico coro­nel, insta­lava a seção eleitoral no alpen­dre de sua casa de fazenda e os cabo­c­los for­mava a fila para votar. O coro­nel, então, preenchia cédula dev­i­da­mente “votada” e dobrada para que “eleitor” a deposi­tasse na urna, sob suas vis­tas. Se algum dos “eleitores” tomasse a ini­cia­tiva de ten­tar abrir a cédula para ver em quem “votara”, já lhe atal­hava o coro­nel: — o que é isso cabo­clo, você não sabe que o voto é secreto?

Como podemos con­statar, falta bem pouco para o gov­erno e a Assem­bleia Leg­isla­tiva retornem a esse nível. Já alcançamos as votações “vapt-​vupt”, para retornar as cédu­las “votadas”, falta bem pouco.

Abdon Marino é advo­gado.