AbdonMarinho - BUROCRACIA E “INFORMALIDADE”.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

BURO­C­RA­CIA E “INFORMALIDADE”.

BURO­C­RA­CIA E “INFORMALIDADE”.

Por Abdon Marinho.

EMB­ORA dirigindo muito pouco ou quase nada, por estes dias fui ao Depar­ta­mento Estad­ual de Trân­sito — DETRAN/​MA, ren­o­var minha carteira de habil­i­tação. Tenho CNH há vinte anos. Por ser defi­ciente e usar ócu­los a minha carteira pos­sui duas obser­vações A e D.

Emb­ora achando tudo isso uma maçada quedei-​me à exigên­cia da buro­c­ra­cia e dirigi-​me ao órgão que atendeu-​me com presteza e pri­or­i­dade. Cobrou-​me a taxa dev­ida – que paguei lá mesmo através de um aplica­tivo – dev­i­da­mente recol­hida ao caixa da Sec­re­taria de Fazenda do Estado — SEFAZ, con­forme apare­ceu no recibo bancário.

Feito isso o servi­dor me fotografou, recol­heu mais uma vez min­has impressões dig­i­tais — a quarta fez que faço isso – ou seja, em todas as renovações.

Até ai tudo bem, tudo nor­mal a exceção do abor­rec­i­mento de ter que cumprir esse rit­ual a cada cinco anos.

O que chamou minha atenção nesta incursão pelo DETRAN foi a quan­ti­dade de oper­ações finan­ceiras em “din­heiro vivo” que ocor­rem por lá.

Explico. Após meu atendi­mento no órgão o servi­dor emi­tiu uma guia de encam­in­hamento para os exames médi­cos e sendo gen­til, recomen­dou: – Ah, doutor, o paga­mento dessa taxa é em din­heiro.

Estran­hei, mas como estava “pre­venido” já sep­a­rei os R$ 70,00 (setenta reais) para o paga­mento da ben­dita taxa – que no meu caso por ser uma sim­ples CNH cat­e­go­ria B, saiu por 68 e uns tro­ca­dos. Chegando a clin­ica a recep­cionista rece­beu o din­heiro e, como recibo, carim­bou um “pago” com duas mãoz­in­has de “pos­i­tivo”, na guia que recebi no DETRAN.

O médico examinou-​me e viu que estava “tudo con­forme”, entre­tanto não con­seguiu reg­is­trar as min­has obser­vações na CNH (A e D) ou fazia uma ou fazia a outra.

Gen­til e querendo resolver pediu a recep­cionista que lig­asse ao DETRAN, pois, segundo ele, uma vez que se tratava de uma ren­o­vação e não havendo qual­quer alter­ação nas min­has condições físi­cas, dev­e­ria poder fazer o registro.

Não pode. A sen­hora que o aten­deu no órgão infor­mou que no ano pas­sado mudaram o pro­ced­i­mento e que nos casos como o meu, teria que pas­sar por nova peri­cia da junta médica do Estado.

Cheguei a brin­car com o médico: – doutor, será que curei essa poliomielite adquirida há cinquenta anos e ninguém me avisou?

Gen­til­mente a recep­cionista pas­sou o tele­fone e pediu que agen­dasse com a junta. O que fiz de lá mesmo, mar­cando para a sem­ana seguinte no DETRAN.

No dia e hora mar­cada lá estava eu de volta ao DETRAN, na recepção da Junta Médica, por estar cheia aguardei do lado de fora. Era o décimo quarto. Quando esvaziou um pouco voltei a recepção e fui abor­dado por um senhor:

– o sen­hor já pagou a taxa?

Sur­preso retruquei: – que taxa?

O sen­hor então esclare­ceu: – o sen­hor terá que pagar uma taxa de R$ 210,00 (duzen­tos e dez reais) para a real­iza­ção da perí­cia.

A minha sorte é que dis­punha desta quan­tia no bolso.

O sen­hor esclare­ceu que a taxa era em “espé­cie” não admitindo outra forma de pagamento.

Depois de alguns min­u­tos na recepção pude perce­ber out­ras pes­soas (uma ou duas) que “despre­venidas” foram emb­ora sem fazer a peri­cia médica. Vi, ainda, out­ras recla­mando da quan­ti­dade de taxas que já tin­ham desem­bol­sado no órgão. As típi­cas con­ver­sas de recepção: uns dizendo que gas­taram muito, out­ros recla­mando que já pagaram taxas disso ou daquilo.

No meu caso, especi­fico, não sei se have­ria neces­si­dade de mais uma peri­cia – tem­pos atrás já pas­sara por uma –, ou se era ape­nas para a arrecadar.

Mas o que ver­dadeira­mente me chamou a atenção, repito, foi a “infor­mal­i­dade” com que lidam com din­heiro den­tro da repar­tição pública ou nas suas cre­den­ci­adas.

Ora, será que o Estado ou os municí­pios têm algum con­t­role destes recur­sos? Destas taxas qui­tan­das através de carim­bos de “pago” ou reci­bos de papelaria? Há o recol­hi­mento do ISS dev­ido aos municí­pios?

Não se trata de pouco din­heiro.

Segundo dados do DETRAN temos atual­mente quase dois mil­hões de motoris­tas habil­i­ta­dos, cada um destes, pelo menos uma vez a cada cinco anos tem que pagar suas taxas junto ao DETRAN e suas cre­den­ci­adas.

Se cada um só pagar a taxa sim­ples – que paguei, motorista cat­e­go­ria B –, esta­mos falando de mais R$ 130 mil­hões de reais. E quan­tos não são os motoris­tas sub­meti­dos à perí­cia médica pagando cada um R$ 210,00 (duzen­tos e dez)?

Exis­tem as infini­tas taxas “infor­mais” para reg­u­lar­iza­ção de veícu­los? De quan­tos mil­hões de reais esta­mos falando?

Segundo o DETRAN, temos bem mais de um mil­hão de veícu­los cadastra­dos no órgão. Quanto em reais cada um deles teve que “mor­rer” para poder cir­cu­lar? Quanto foi pago em taxas “informais”?

Assisto os municí­pios pade­cerem com a falta de recur­sos.

Fiquei pen­sando no quanto estão deixando de arrecadar só junto a essa fonte.

Por mais que me esforce não con­sigo acred­i­tar que esteja havendo algum con­t­role, mesmo do Municí­pio de São Luís – em tese, o mais estru­tu­rado –, não tem como con­tro­lar esses serviços. E se tem, se não está havendo nen­hum de tipo sone­gação de receita, por que não emitem as guias de arrecadação para serem pagas junto aos ban­cos? Ficaria muito mais seguro para todos os envolvi­dos.

Não con­segui cap­tar a razão de um órgão público lidar com “din­heiro vivo”.

Acho que vou per­gun­tar a algum amigo que tra­balha na Receita Fed­eral do Brasil.

Alguém saberia o motivo?

Abdon Mar­inho é advogado.