AbdonMarinho - ACESSIBILIDADE
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

ACESSIBILIDADE

ACES­SI­BIL­I­DADE.
Outro dia pude con­statar, com tris­teza, o quanto nós, defi­cientes, somos intru­sos na na nossa própria cidade.
Estava na porta do Tri­bunal de Justiça do Maran­hão, após uma sessão de uma de suas câmaras, quando vi um sen­hor com as duas per­nas amputadas, em uma cadeira de rodas, ten­tando entrar no pré­dio da Corte. No inclemente sol das dez e meia, esperou cerca de dez min­u­tos até que alguns de seus acom­pan­hantes se reunis­sem e, junto com um dos bombeiros que tra­bal­ham no tri­bunal, o fizesse vencer os qua­tro degraus do pór­tico prin­ci­pal.
Soube que pre­tendia falar com um dos desem­bar­gadores.
Refleti sobre o quanto ainda iria sofrer para cumprir seu intento. Grande parte dos gabi­netes para serem alcança­dos neces­si­tam do con­curso de escadas, a maior parte, impróprias para a uti­liza­ção por qual­quer por­ta­dor de defi­ciên­cia, sobre­tudo os cadeirantes.
Se o acesso ao hall de entrada carece de uma rampa, o que dizer das out­ras partes? O pré­dio não nos per­mite um acesso digno.
O acesso ao plenário só é feito por escadas. Con­sigo chegar ao plenário sem maiores difi­cul­dades, entre­tanto, alguém com um grau um pouco maior de defi­ciên­cia, não con­segue sem ajuda; sem alguém que os car­reguem para assi­s­tir a uma sessão do tri­bunal. Para com­ple­tar, antes da escada, colo­caram dois degraus, sem cor­rimão e com um can­teiro entre eles e a parede. Deve ter sido uma cru­el­dade adi­cional com os defi­cientes do Maran­hão ou para não sujarem a parede ao ten­tar um apoio para vencer os degraus.
São coisas sim­ples que facil­i­taria a vida de todos e que as pes­soas não dão importân­cia. Tenho certeza que no hall de acesso ao pleno, tanto na parte infe­rior, quanto na supe­rior, caberia um ele­vador, assim como tenho certeza que meio metro de cor­rimão – para aju­dar a vencer os dois degraus – não iria que­brar o tri­bunal. A ampli­ação de um gabi­nete, emb­ora tenha «engolido» parte dos degraus nos trouxe um pouco mais de con­forto, podemos usar a parede para nos apoiar.
Os leitores devem pen­sar que toda essa difi­cul­dade de acesso se deve ao fato do pré­dio do tri­bunal con­tar com duas cen­te­nas de anos o que difi­culta, em muito, qual­quer facil­i­tação ao acesso. Tem muito disso tam­bém. Mas há, prin­ci­pal­mente, falta de sen­si­bil­i­dade dos arquite­tos e gestores na exe­cução destas refor­mas. Não cus­taria muito colo­car uma rampa metálica para o acesso ao pré­dio ou, se não quisessem alterar a fachada, fazer uma entrada junto ao setor de pro­to­colo ou do outro lado, com um rampa interna. Tam­bém, não cus­taria muito, terem feito a escada de acesso ao plenário no nível do corre­dor, colo­cando um ele­vador junto a mesma.
Se a situ­ação é essa no cen­tenário pré­dio do tri­bunal de justiça não pensem que o acesso aos defi­cientes foi facil­i­tado no pré­dio novís­simo do fórum da cap­i­tal. Fui uma vez lá e avi­sei aos meus sócios: vocês cuidam dos proces­sos em primeiro grau. Na única vez que fui con­statarei que as min­has per­nas não eram páreo para aquela arquite­tura.
Quando encon­tro algum colega, quase sem­pre recla­mam que não vou ao fórum, respondo que não sou eu que não ir, é o fórum que não me quer por lá.
É tudo muito longe e não há um acesso mais perto dos ele­vadores para nós defi­cientes ou para qual­quer outro. Para agravar a situ­ação os ele­vadores são pequenos – capaci­dade para cinco ou seis pes­soas, com uma vaga reser­vada para o ascen­sorista –, sig­nif­i­cando, em dias, de movi­mento, uma fila de quinze a vinte min­u­tos, no mín­imo.
Diria que é um pré­dio impróprio para as pes­soas com difi­cul­dades de loco­moção.
Vejam, temos um pré­dio bonito, lux­u­oso, caro, porém, inacessível, ao menos como dev­e­ria.
Recla­mava que os ele­vadores eram minús­cu­los – ape­nas para efeitos de com­para­ção, o pré­dio da justiça fed­eral, na Areinha, con­struído há trinta anos, com um fluxo de pes­soas bem menor que o fluxo do fórum da cap­i­tal, pos­sui ele­vadores com capaci­dade para doze pes­soas e não tem uma vaga ocu­pada por ascen­sorista –, quando um colega me disse: quando voltares lá, faça uma visita às escadas, se, Deus nos livre, algum dia ocor­rer um incên­dio, elas (as escadas) serão respon­sáveis por algu­mas mortes. Não sei se com exagero, afirmou-​me que as escadas não per­mitem o tráfego simultâ­neo de duas pes­soas. Duvidei de suas palavras. Não é crível que um pré­dio com uma cir­cu­lação de mil­hares de pessoas/​dia não pos­sua escadas capazes de supor­tar uma evac­uação, em caso de emergên­cia, ou mesmo para uti­liza­ção diária, dizem que está na moda o uso de escadas.
Pois é, triste ao con­statar que a cidade que tanto amamos, não aceita nossa existên­cia, não está preparada e não quer que uti­lize­mos seus espaços.
Como exem­plo, citei os dois prin­ci­pais pré­dios da Justiça maran­hense, mas os maus exem­p­los do que não se deve fazer se mul­ti­pli­cam por muitos out­ros. Certa vez fui a prefeitura, penei para vencer a escada prin­ci­pal. Não sei se já colo­caram algum ele­vador por lá.
Nas pou­cas vezes que fui a Procu­rado­ria da República, no antigo pré­dio do cen­tro, sofri para chegar ao segundo pavi­mento. O pré­dio pos­sui uma escada muito bonita, mas que é um suplí­cio para ser ven­cida, prin­ci­pal­mente por quem pos­sui qual­quer difi­cul­dade de loco­moção.
Os exem­p­los de falta de aces­si­bil­i­dade se mul­ti­pli­cam. São ruas esbu­ra­cadas, calçadas irreg­u­lares, pré­dios com escadas ater­rado­ras. Acho que os arquite­tos e as autori­dades do Maran­hão devem pos­suir algum fetiche por escadas. Cada uma mais impo­nente é descon­fortável que a outra. Fico apa­vo­rado só em vê-​las.
Os órgãos públi­cos sabedores destas difi­cul­dades pode­riam facil­i­tar um pouco a nossa vida, somos cidadãos como quais­quer out­ros. O fórum pode­ria colo­car um acesso mais próx­imo para os por­ta­dores de neces­si­dades espe­ci­ais; o TUMA pode­ria chamar alguém para peque­nas cor­reções que tor­nasse a nossa vida um pouco mais fácil. Se não tem como chegar aos gabi­netes que colo­quem um gabi­nete de atendi­mento com fácil acesso para que os defi­cientes pos­sam ser aten­dido, com hora mar­cada, por qual­quer desem­bar­gador. Não cus­taria tanto e não ofend­e­ria a suas excelên­cias aten­derem uma pes­soa em local que lhe fosse mais acessível ao invés de submetê-​la a humil­hação que pres­en­ciei o cidadão pas­sar, nar­rada no começo do texto.
Recen­te­mente, depois de anos, fui a UFMA, logo na entrada, a minha primeira visão foi de um pré­dio em con­strução com uma escada impo­nente à frente. Soube que será a nova bib­lioteca. Já fiquei pen­sando: será que con­stru­irão algum acesso para pes­soas, que como eu, amam livros e odeiam escadas?
Abdon Mar­inho é advogado.

Comen­tários

0 #2 ALBERTO MARTO DA SIL 07-​06-​2015 20:40
Parece piada, mas situ­ações iguais à que viven­ciei em 1985, ainda se repetem hoje em dia em vários pré­dios: acom­pan­hando meu irmão tetraplégico em uma perí­cia médica do INSS, no antigo posto em frente à Fonte da Pedras — Mer­cado Cen­tral, pre­ci­sei de mito embasa­mento legal para con­vencer o médico per­ito de plan­tão, pasme!!!!! que ele teria que descer os 22 degraus de uma escada íngrime, pois sem ele­vador ou rampa eu não iria expor meu irmão ao risco de um novo aci­dente ao ser içado com a cadeira car­regada por out­rem.……
Deve­mos, todos, nos inco­modar e exi­gir aces­si­bil­i­dade aos cadeirantes, aos com visão reduzida ou falta, aos idosos e a toda e qual­quer pes­soa a apre­sente de forma reduzida.
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0 #1 ALBERTO MARTO DA SIL 07-​06-​2015 20:39
Ver­dade, meu caro amigo Abdon. A maio­ria dos espaços públi­cos na nossa cidade ainda con­tinua inacessível. E a culpa?????? Ainda é deb­itada aos gestores que não pos­suem sen­si­bil­i­dade, que não sabem que uma sig­nif­i­cante parcela da pop­u­lação,- cres­cente,- pos­sui algum tipo de defi­ciên­cia impedi­tiva da loco­moção ver­ti­cal e até hor­i­zon­tal; de «arquite­tos» , «engen­heiros» e out­ros téc­ni­cos que «esque­cem» as nor­mas legais atu­ais para con­struções acessíveis, o que inclui, além de ram­pas e ele­vadores, cor­rimões e vão de porta.
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