AbdonMarinho - O que a bunda não prejudica.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O que a bunda não prejudica.

O que a bunda não prejudica.

Por Abdon C. Marinho.

O ASSUNTO mais comen­tado nessa Ilha dos Amores, no Maran­hão e, até mesmo no Brasil tem sido a “per­for­mance” de uma pro­fes­sora (?), escritora (?), pesquisadora (?), ativista (?), etc. ocor­rida na Uni­ver­si­dade Fed­eral dos Maran­hão — UFMA, por esses dias. Isso porque a “palestrante” em deter­mi­nado momento de sua “palestra” subiu à mesa e exibiu as partes puden­das para a seleta plateia.

Pronto! Não teve mais nada de rel­e­vante acon­te­cendo no mundo que superasse o “bur­bur­inho” cau­sado pelo “evento acadêmico”.

Não inter­essa se os palesti­nos no norte da Faixa de Gaza, destruída numa guerra que já ceifou mais de quarenta e duas mil vida, setenta por cento delas mul­heres e cri­anças, estão, lit­eral­mente, mor­rendo de fome; não inter­essa, tam­bém, se o Estado Judeu voltou suas armas para o Líbano, e sua cap­i­tal, Beirute, enfrenta os maiores bom­bardeios que se tem notí­cia em décadas, inclu­sive, colo­cando em risco os mil­hares de brasileiros que moram naquele país; não inter­essa se a Rús­sia, que inva­diu a Ucrâ­nia em 2022, dia após dia, pro­move bom­bardeios naquele país, que resiste brava­mente, seques­tra cri­anças, mata e desloca cidadãos; não inter­essa se a fome na África leva mil­hares (ou mil­hões) à morte anual­mente ou que as guer­ras naquele con­ti­nente são as mais fer­ozes; não inter­essa as eleições amer­i­canas daqui a duas sem­anas; não inter­essa se o fundão eleitoral de 5 bil­hões nas últi­mas eleições foi usado para com­prar votos ou para tornar mais ricos alguns esper­tal­hões; não inter­essa a emergên­cia climática que o mundo todo vive e que ameaça da extinção da espé­cie humana nas próx­i­mas décadas e, porque não dizer, a extinção do próprio plan­eta.

O único assunto que inter­essa a uma parcela sig­ni­fica­tiva da nossa sociedade é o c* da palestrante (?) da UFMA.

Viramos um país de idio­tas? É isso?

Tenho visto debates acalo­rados em gru­pos de What­sApp, arti­c­ulis­tas fazendo arti­gos fer­ozes; dep­uta­dos prom­e­tendo o inferno para os pro­mo­tores do evento, cidadãos indig­na­dos, etcetera e tal.

Con­fesso que tenho ten­tado enten­der toda essa bal­búr­dia em torno desse assunto. E con­fesso que não tenho con­seguido enten­der razão de tanta polêmica.

Meu Deus, onde já se viu fazer esse tipo de “per­for­mance” numa uni­ver­si­dade? Numa uni­ver­si­dade pública? Usando recur­sos públi­cos? Qual o futuro da edu­cação do país? Como ficarão nos­sas crianças?

Os cidadãos, os rep­re­sen­tantes do povo estão indig­na­dos. Recebi até pedi­dos para escr­ever sobre o assunto.

Como disse, não con­sigo enten­der a razão de tanta polêmica. Noutros tem­pos isso seria um assunto dis­cu­tido com ares de “mux­oxo” durante um ou dois dias no depar­ta­mento da uni­ver­si­dade, talvez se esten­desse até um outro depar­ta­mento, e só.

O que vejo são os “cidadãos de bem” e indig­na­dos com a per­for­mance da “palestrante” acabaram dando uma “audiên­cia” que ela não teria em tem­pos normais.

Sob o argu­mento de “pro­te­gerem” a uni­ver­si­dade acabam por expor a mesma a uma injus­ti­fi­cada situ­ação de achin­cal­hamento público.

O que inco­modou tanto esses cidadãos de bem?

A palestra de con­teúdo, dig­amos, impróprio, deu-​se, pelo que vi, em uma sala ou um pequeno auditório, não deve ter con­tato com nem cem pes­soas na plateia; os que estavam lá, até onde sei, eram adul­tos; estavam lá por sua livre e espon­tânea von­tade; se aplaudi­ram ou se vaiaram foi por gosto próprio.

Qual o impacto disso na vida dos cidadãos? No preço do arroz, do fei­jão, da gasolina ou da inflação?

Ah, mas estavam em um ambi­ente acadêmico, não podem exibir “as partes” em tal ambi­ente.

Como disse, eu não con­sigo enten­der como uma “per­for­mance” que pode ou não ser con­sid­er­ada de bom ou mau gosto ganhe tanto destaque.

Foi a exibição da bunda? Foi por ser a bunda de uma mul­her trans? Foi por ser na uni­ver­si­dade? Foi por, suposta­mente, envolver recur­sos públi­cos?

Em 1987, por­tanto, há quase quarenta anos, a rede globo de tele­visão, com 80% ou mais da audiên­cia em canal aberto exibiu a nov­ela “Brega&Chique”, no horário das 7 horas. Essa nov­ela, na aber­tura, ao som da música “pelado” do grupo Ultraje a Rigor, exibia um homem total­mente nu, lit­eral­mente, pelado com as mãos no bolso, como dizia música.

Chegá­va­mos em casa, voltando do colé­gio – os que estu­davam à tarde –, e lá estava a “família brasileira” no sofá da sala, com um prato de comida na mão vendo uma nov­ela que exibia na aber­tura um homem total­mente pelado.

Foi assim de abril a novem­bro de 1987.

No iní­cio ainda ten­taram cen­surar diante da pressão de alguns seg­men­tos, mas depois lib­er­aram total­mente a aber­tura da nov­ela, que foi, inclu­sive, reex­ibida out­ras vezes na parte da tarde. Nos inter­va­los da nov­ela eram exibidas diver­sas peças pub­lic­itárias dos gov­er­nos, fed­eral, estad­u­ais e munic­i­pais.

Desde então pul­u­lam nudes em diver­sos pro­gra­mas tele­vi­sivos nas redes de tele­visões aber­tas e fechadas, cenas de sexo picantes, sem que isso des­perte a atenção ou a indig­nação de quem quer que seja.

Querem ver outra coisa? Todos os anos os gov­er­nos fed­eral, estad­u­ais e munic­i­pais des­ti­nam mil­hões e mil­hões dos orça­men­tos públi­cos para as fes­tas de car­naval no país inteiro. Me respon­dam: já viram alguma pes­soa indig­nada pelo fato homens e mul­heres se exibirem para mil­hares ou mil­hões semi­nuas e muitas vezes até nuas?

Essa sem­ana o assunto da “per­for­mance” na UFMA estava em rede nacional no Brasil Urgente ou no Jor­nal da Band com os mes­mos ares de escân­da­los que teste­munhamos nes­sas pla­gas. Aí lem­brei que quando mais jovens per­dia noites de sonos para assi­s­tir os “car­navais proibidões” da … Band.

A per­for­mance da UFMA, no ambi­ente da UFMA é mais danosa do que assis­ti­mos diari­a­mente nos vários meios de comu­ni­cação de massa, inclu­sive con­cessões públicas?

Vejam os sen­hores que muitos dos dep­uta­dos indig­na­dos e revolta­dos com o que acon­te­ceu na UFMA, de gosto duvi­doso ou não – não me cabe jul­gar –, des­ti­nam mil­hares de reais para os even­tos de con­teúdo sim­i­lar ao que repreen­dem.

Acho, inclu­sive, que dev­e­riam des­ti­nar suas emen­das para bol­sas de estu­dos.

Encerro dizendo que não sou con­tra ou a favor desse tipo de “per­for­mance” numa uni­ver­si­dade pública ou pri­vada, mas, dizendo, que se não fosse a “indig­nação” aço­dada o assunto teria “mor­rido” naquela sala e para uma plateia de 30 ou 40 pes­soas, se é que tinha esse número de pes­soas lá.

O escân­dalo trouxe uma vis­i­bil­i­dade e exposição que os indig­na­dos pro­te­tores da uni­ver­si­dade não que­riam (?). Ou será que o que que­riam, efe­ti­va­mente, era “lacrar” em cima do episódio?

Será que a exibição na UFMA cau­sou mais dano do que divul­gação feita pelos cidadãos de bem pro­te­tores da universidade?

Não deixa de ser bisonho que os mais indig­na­dos são jus­ta­mente aque­les que dia sim e no outro tam­bém recla­mam con­tra a cen­sura, a falta de liber­dade de expressão, a ditadura do judi­ciário, o Xandão …

Será que a liber­dade de expressão que tanto pregam e dizem defender não alcançaria a aquela per­for­mance também?

Se sou con­vi­dado para uma festa e ela não faz meu estilo, eu não vou. Se sou con­vi­dado para uma palestra e o assunto não tem nada a ver comigo, os pre­mio com minha ausên­cia; se a tele­visão exibe algo que não gosto, mudo de canal ou desligo a tele­visão.

Acho que é o mel­hor cam­inho.

Abdon C. Mar­inho é advo­gado.