AbdonMarinho - Bolsonaro é tão inocente quanto Lula.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 23 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

Bol­sonaro é tão inocente quanto Lula.

BOLSONARO É TÃO INOCENTE QUANTO LULA.

Por Abdon Marinho.

AOS AMI­GOS mais próx­i­mos cos­tumo dizer que nada se com­pleta tão bem quanto bol­sonar­ista e lulopetis­tas. Algo assim como goiabada com queijo, leite con­den­sado com pão massa fina, pizza com guaraná, etc.

E são tan­tas as afinidades que os seguidores de ambas as seitas se teste­munharem seus ído­los com as mãos no cofre dirão que estavam colo­cando din­heiro, com­ple­tando a a burra da viúva, nunca reti­rando.

Os ído­los da turma tam­bém não apre­sen­tam muita dis­tinção entre si. Têm como pas­satempo falarem tolices – ainda que ofen­si­vas a ter­ceiros –, o despreparo e o pés­simo hábito de jamais assumirem as respon­s­abil­i­dades pelos próprios erros e/​ou crimes. Se apan­hados com as “calças nas mãos” já sacam a mesma des­culpa: “eu não sabia”.

Quando, no longín­quo 2005, veio à tona o escân­dalo do men­salão o então pres­i­dente Lula veio a público, de um lux­u­oso hotel de Paris, dizer que não sabia de nada; que voltando ao Brasil iria apu­rar se eram ver­dadeiros os fatos nar­ra­dos e que fora traído pelas pes­soas em quem con­fi­ava.

O tempo foi pas­sando e quanto mais fatos escabrosos do seu gov­erno iam sendo rev­e­la­dos mais o sen­hor Lula ado­tava o bor­dão “eu não sabia”. Virou até “meme”, como se diz atual­mente.

Foi negando e con­tando com a leniên­cia das autori­dades de todos os poderes con­sti­tuí­dos que ex-​presidente pas­sou incólume pelo “escân­dalo do men­salão” muito emb­ora quase todos os seus com­pan­heiros e ali­a­dos par­tidários ten­ham sido chamado a prestar con­tas à justiça, ten­ham sido con­de­na­dos e até cumprido penas por crimes diver­sos.

Criou-​se a exdrúx­ula situ­ação em que prati­ca­mente todos no entorno do ex-​presidente estavam envolvi­dos em “malfeitos” diver­sos que ele não tinha o menor con­hec­i­mento de nada.

O ex-​presidente foi “traído” por todos ou quase todos.

A sorte acabou no chamado “escân­dalo do petrolão” que, mais uma vez enre­dou os grandes da República em con­luio com os grandes do empre­sari­ado numa teia de cor­rupção sem prece­dentes em qual­quer lugar do mundo, em qual­quer tempo da história, até aqui.

Inves­ti­gado, denun­ci­ado por diver­sos deli­tos o ex-​presidente chegou a ser con­de­nado e até chegou a cumprir mais de um ano de pena, saindo enclausuro por conta de uma “gen­erosa” decisão do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, que revendo entendi­mento já con­sol­i­dado, enten­deu por incon­sti­tu­cional o cumpri­mento da pena sem que o ocor­resse o trân­sito em jul­gado da sen­tença penal con­de­natória.

Foi nes­tas condições que o ex-​presidente Lula, que “nada sabia”, deixou de ser hós­pede do Estado nas dependên­cias da Polí­cia Fed­eral no Paraná.

Por fim, ape­sar de con­de­nado em quase todas as instân­cias da justiça, com infini­tos recur­sos judi­ci­ais nega­dos em todas as cortes um “habeas cor­pus” sal­vador enx­er­gou uma sus­peição já apre­ci­ada e negada incon­táveis vezes e anulou-​lhe as con­de­nações e os processos.

Um dia antes, jul­gando um inci­dente proces­sual qual­quer, o rela­tor da chamada “Oper­ação Lava Jato” enten­deu que o fórum com­pete para apre­ciar alguns dos proces­sos con­tra o ex-​presidente não era a 13ª Vara da Justiça Fed­eral de Curitiba.

Foi assim, aliás é assim, que o ex-​presidente vem tor­nando pó mil­hares de provas cole­tadas pela Polí­cia Fed­eral e pelo Min­istério Público ao longo de quase uma década e que servi­ram de fun­da­mento para con­de­nações con­sis­tentes exam­i­nadas e con­fir­madas pelos tri­bunais ordinários e superiores.

Nada disso “valeu” diante da neces­si­dade de impin­gir ao juiz que jul­gou o processo na base a pecha de sus­peito.

E assim, como se tivésse­mos vivi­dos nos últi­mos anos uma espé­cie de alu­ci­nação cole­tiva, desco­b­ri­mos que o ex-​presidente Lula é inocente, que a mon­tanha din­heiro que os cor­rup­tos devolveram para abran­dar suas penas e out­ros tan­tos que foram recu­per­a­dos em paraí­sos fis­cais nunca existiram.

Desco­b­ri­mos que, até mesmo, as con­fis­sões feitas nas delações pre­mi­adas ou os acor­dos de leniên­cia com as empre­sas que recon­hece­ram terem pago propinas de nada valeram.

O que está posto é que os proces­sos do ex-​presidente foram nulos e/​ou muda­dos para out­ras varas que não con­cluirão seus jul­ga­men­tos tão cedo ou tão breve, talvez nunca.

Assim, para todos os efeitos o sen­hor Lula é inocente.

O sen­hor Bol­sonaro que elegeu-​se com a promessa de fazer um gov­erno hon­esto viu-​se outro dia na con­tingên­cia de vir a público uti­lizar o mesmo argu­mento do ex-​presidente Lula. Acos­sado, em plena pan­demia com uma sus­peita de cor­rupção no seu gov­erno na com­pra por valor bem acima do mer­cado de um imu­nizante indi­ano sem aprovação total da Anvisa, o pres­i­dente, de forma bem com­pungida, disse aos seguidores: não tenho como saber o que se passa nos min­istérios.

Para usar um termo da moda, uma vari­ante do “eu não sabia”.

O gov­erno do sen­hor Bol­sonaro, por mais que seus “alu­a­dos” insis­tam em não querer enx­er­gar não fica dis­tante do gov­erno do sen­hor Lula no que­sito pro­bidade admin­is­tra­tiva. Basta dizer que a exceção do Par­tido dos Tra­bal­hadores — PT, todos os demais par­tidos políti­cos que se lam­buzaram não era petista inte­gram e dão sus­ten­tação ao gov­erno ocu­pando posições de destaque nos min­istérios e noutros organ­is­mos por onde cor­rem os dutos de din­heiro da República.

Ao dizer que não tem como saber o que se passa nos min­istérios – e aí pre­cis­aríamos dis­cu­tir o papel dos órgãos de con­t­role que asses­so­ram à Presidên­cia –, está bus­cando uma “carta de seguro” para fugir às suas respon­s­abil­i­dades.

O pres­i­dente sabe muito bem como se deu a eleição dos seus can­didatos para as mesas da Câmara e do Senado e o quanto os cofres públi­cos tiveram que ser alivi­a­dos; sabe muito bem o que tem feito para garan­tir, diante das enormi­dades que faz, para não sofrer um processo de impeach­ment; sabe muito bem quem são os ali­a­dos que trouxe para o núcleo do poder, inclu­sive aque­les que foram jul­ga­dos e con­de­na­dos pelos esque­mas de cor­rupção dos gov­er­nos petis­tas.

O sen­hor Bol­sonaro, com quase três décadas de Con­gresso Nacional, não seria ingênuo a ponto de acred­i­tar que essa turma que ele levou para den­tro do Palá­cio do Planalto teria se regen­er­ado.

Essa suposição é con­fir­mada com a declar­ação do dep­utado Miranda, em rede nacional, de que ao aler­tar o pres­i­dente sobre a pos­sível ban­dalha den­tro do Min­istério da Saúde ele fora logo dizendo tratar-​se de “rolos” de dep­utado fulano de tal.

Logo, por dedução, é de imaginar-​se que o pres­i­dente, difer­ente do afir­mado que não pode­ria saber de tudo que se pas­saria no seus min­istérios, já tinha, pelo menos uma vaga ideia da existên­cia de raposas vigiando o galinheiro.

O episó­dio da vacina é ainda mais grave para o pres­i­dente quando recor­damos de alguns episó­dios, como por exem­plo que a Pfizer quase “arreben­tou” às por­tas do palá­cio para ofer­e­cer sua vacina, uma das mais req­ui­si­tadas do mundo, a um preço bem infe­rior ao que estava ofer­e­cendo a out­ros países e o gov­erno “esnobou”; quando lem­bramos que o pres­i­dente disse – e o áudio está aí para quem quiser pesquisar e ouvir –, que os vende­dores de vaci­nas que viesse nos procu­rar; quando desautor­i­zou pub­li­ca­mente, em rede de rádio tele­visão e canais dig­i­tais, a com­pra pelo Min­istério da Saúde da vacina do con­sór­cio Butantan/​Sinovac; quando falou todas aque­las tolices con­tra as vacinas.

Aí você pega tudo isso com­para com a pressa em adquirir a polêmica vacina indi­ana, com o processo cor­rendo como nunca; com o pres­i­dente man­dando carta ao primeiro-​ministro indi­ano dizendo que tinha inter­esse em adquirir esse imu­nizante; com o filho do pres­i­dente abrindo as por­tas do BNDES para empresa Pre­cisa, por coin­cidên­cia sócia de outra empresa que já dera um calote mil­ionário no próprio Min­istério da Saúde; com o Min­istério da Saúde igno­rando tex­tu­ais recomen­dações da Advocacia-​geral da União para a cel­e­bração do con­trato; igno­rando a rejeição da Anvisa as condições do próprio lab­o­ratório pro­du­tor da vacina.

Quando você se dar ao tra­balho exam­i­nar e fazer essas com­para­ções percebe que tem “caroço nesse angu”, como diria vovó.

Sou ten­tado a acred­i­tar que esse “rolo”, como disse o pres­i­dente, não envolve ape­nas o dep­utado que con­tinua líder do gov­erno.

Muito emb­ora, assim como o ex-​presidente Lula, o atual pres­i­dente possa ale­gar que não tem como saber tudo que acon­tece no gov­erno, pelo menos neste episó­dio da vacina não tem como ale­gar não saber. Além dele próprio e de famil­iares terem prat­i­ca­dos atos a favor do negó­cio, con­forme declarou o dep­utado Miranda e seu irmão, ele foi avisado o que estava se pas­sando, inclu­sive sobre as inco­muns pressões para os servi­dores públi­cos autor­izarem paga­men­tos a serem feitos para empresa Off Shore, em paraíso fis­cal, e que nada tinha a ver com o con­trato cel­e­brado.

Mesmo assim, somos obri­ga­dos a aceitar que tanto o sen­hor Lula quanto o sen­hor Bol­sonaro são inocentes. O primeiro por ter sido “descon­de­nado” pelo STF e o segundo por nunca ter sofrido qual­quer incô­modo da parte do Min­istério Público e justiça do país.

Assim, temos que o sen­hor Bol­sonaro é tão inocente quanto o sen­hor Lula.

A lit­er­atura jurídica do país pode­ria até criar um novo tipo penal: o tipo dos inocentes por excesso de provas.

Abdon Mar­inho é advogado.